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3. A Linguagem como Modeladora da Construção de Conhecimento em

3.2. A Construção de Modelos segundo Lemke

Lemke (1997) a construção de conhecimento científico escolar implica que o professor e os seus alunos falem a mesma linguagem, ou seja, que construam um significado comum:

(1) para os vocábulos que definem os conceitos científicos ou suas propriedades; (2) para as formas de estruturação de conhecimento que utilizam.

3.2.1. O Desenvolvimento de Significado Comum durante a Construção de

Sistemas Conceptuais

Os sistemas conceptuais (ou modelos) ensinam-se principalmente através da linguagem, complementada com diagramas, noções matemáticas e experiência prática. Em termos de linguagem, uma teoria científica ou um sistema conceptual corresponde a um padrão temático de relações semânticas sobre um dado assunto. Um padrão temático expressa uma forma de visualizar a rede de relações entre os significados atribuídos aos seus termos chave. Os termos chave identificam os itens temáticos do padrão: são, na sua maioria, conceitos específicos, caracterizados pelas suas relações semânticas,

correspondendo a pequenos fragmentos de padrões temáticos.

A construção do padrão temático deve permitir aos alunos “falar ciência” sobre o assunto de uma forma aceitável, ou seja, permitir que estes consigam expressar-se verbalmente sobre o tema, interpretá- lo, elaborar raciocínios para resolver problemas ou utilizá- lo num exame. Para tal, os alunos têm que aprender a dominar o uso interligado de termos particulares e o significado das suas relações semânticas, numa dada disciplina. O sentido atribuído a uma dada expressão verbal é determinado pela construção das relações entre as palavras ou frases, ou seja, da sua integração num padrão semântico. Sabe-se que os mesmos termos são interpretados de acordo com a sua utilização em contextos anteriores, sendo o significado atribuído de acordo com as interligações estabelecidas. Para que se possa elaborar devidamente um padrão temático, é necessário que o professor o explicite devidamente e que os alunos descrevam sobre o tema todos os significados possíveis. Só se pode criar sentido comum se se compartilharem as mesmas maneiras de criar significado. Lemke (1997) constata que, em situações de ensino, os padrões temáticos científicos são deixados muitas vezes implícitos, o que implica que as diferenças entre os padrões do professor e dos alunos raramente são verbalizadas. A interferência negativa das falhas de comunicação, durante a construção do padrão temático, é especialmente sentida em duas situações:

(1) Não explicitação das concepções prévias, pelos alunos – estas devem ser expostas para que o professor possa conhecer os pontos de vista dos alunos sobre um tema, dado que todas estas concepções contribuem para a elaboração semântica dos temas em estudo. Assume-se, como importante, que os alunos aprendam os pontos de vista da ciência e sobre eles elaborem o padrão temático científico, nem sempre sendo necessário que abandonem as suas concepções prévias.

(2) Não verbalização, pelo professor, de conhecimentos tácitos necessários à elaboração dos conceitos. Este último ponto é muito importante em trabalho experimental laboratorial dado que são desenvolvidas, de forma interligada, uma actividade linguística e uma actividade prática. A assunção, pelo professor, de que os alunos desenvo lvem os processos de construção do padrão temático segundo conhecimentos tácitos semelhantes aos seus, pode penalizar o desenvolvimento do trabalho em todos os seus níveis (das representações, das acções e da linguagem).

3.2.2. Construir Significado Comum Desenvolvendo os Géneros Maiores e Menores da Escrita Científica : Ensinar a Falar e a Raciocinar segundo os Formatos Próprios da Ciência

Lemke (1997) perspectiva o raciocínio, não como um processo mental, mas como um processo linguístico que pode ser ensinado. Raciocinar através da linguagem implica seguir padrões específicos de argumentação, desde as premissas às conclusões. O raciocínio desenvolve-se utilizando a linguagem verbal, oral e escrita, ou pela utilização de outras formas de actividade mais complexas, tais como, resolver problemas e experimentar. Falar ou raciocinar sobre ciência, no sentido mais amplo, combina sempre um padrão temático de relações semânticas com um padrão estrutural de organização da expressão. Um proporciona o conteúdo e outro a forma de organização do argumento. O padrão mais simples corresponde ao modo da organização da linguagem e denomina-se estrutura retórica. Os padrões mais amplos e complexos, por exemplo, um relatório de laboratório ou um artigo de investigação científica, são estruturas de género. Lemke (1997) enfatiza a necessidade de ensinar os alunos a utilizar correctamente os recursos semânticos da linguagem no desenvolvimento de padrões temáticos e de estruturas de género específicas da ciência. Para aprender a falar e escrever sobre ciência, os alunos necessitam da gramática e de formas de organização utilizadas na escrita científica. Entre os “géneros menores” da ciência encontram-se formas simples como: descrições, comparações, definições e silogismos, semelhantes a formas utilizadas noutras disciplinas. Os géneros maiores da ciência, como os relatórios de laboratório são mais complexos e mais especializados no trabalho científico. Os géneros maiores e menores da ciência devem ser objecto de ensino detalhado no que respeita à associação das estruturas, à identificação das suas partes constituintes, à explicitação das funções de cada uma em relação ao todo e à associação do significado de cada parte com as demais. É importante que os alunos desenvolvam os géneros de escrita científica e os pratiquem.

3.3. O Uso da Linguagem em Trabalho Laboratorial

Como síntese pode afirmar-se que ensinar a falar ciência envolve a aplicação de um modelo específico de organização de trabalho, abrangendo os processos de construção de conhecimento verbais e não verbais. Este esquema geral deve ser adaptado de acordo

com o tipo de trabalho laboratorial que se realiza e a metodologia que se desenvolve. A elaboração do relatório escrito sobre cada actividade é objecto de ensino e de aprendizagem ao longo do ano, dado tratar-se de uma disciplina de iniciação ao trabalho laboratorial. No entanto, mesmo que os alunos estejam já familiarizados com a estrutura própria de um relatório científico, cada novo trabalho experimental laboratorial apresenta problemas de vários níveis (conceptuais e processuais) que é necessário equacionar a fim de que os alunos compreendam o significado do que realizam. A construção de conhecimento durante a actividade depende da capacidade de explicitação das problemáticas subjacentes e do seu tratamento ao longo do trabalho experimental. No presente trabalho de investigação assume-se que o relatório escrito, elaborado pelos alunos, representa a forma holística de construção de conhecimento verbal em trabalho experimental laboratorial. O relatório reflecte o modo como aplicam o esquema geral de trabalho, como seleccionam o conhecimento teórico a estudar experimentalmente, como equacionam os problemas e, de um modo geral, como realizam a articulação entre teoria e experimentação, ao longo das diversas etapas do trabalho.

Considera-se a análise da construção do esquema conceptual (e das respectivas relações semânticas) elaborado nas diversas secções do relatório, um indicador precioso sobre um vasto conjunto de parâmetros indicadores da construção do conhecimento em trabalho experimental laboratorial, a saber:

(a) sobre as concepções prévias, a nível conceptual – processual, aplicadas no trabalho; (b) sobre a selecção e organização dos conhecimentos considerados necessários ao

desenvolvimento do trabalho;

(c) sobre a forma como é interpretada e aplicada a metodologia; (d) sobre os resultados registados e a correspondente interpretação; (e) sobre as conclusões elaboradas a partir do trabalho.

4. Utilização do Trabalho Prático no Ensino e na Aprendizagem das Ciências