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Construção de respostas para a questão: Em que aspectos essa abordagem metodológica possibilita o diálogo com o campo de pesquisa em Educação em

Aula 1: Sistema Excretor Aula 2: Sistema Nervoso Temática da situação

7 DIÁLOGO COM A LITERATURA: CONSTRUINDO RESPOSTAS ÀS QUESTÕES DE PESQUISA

7.3 Construção de respostas para a questão: Em que aspectos essa abordagem metodológica possibilita o diálogo com o campo de pesquisa em Educação em

Ciências?

Nessa seção, buscamos explorar o potencial de nossa abordagem metodológica para contribuir com avanços no campo de pesquisa em Educação em Ciências. Nesse sentido, estabelecemos alguns diálogos, não exaustivos, entre elementos da síntese da análise exploratória dos dados empíricos e esse campo de pesquisa.

A partir dessa síntese, por exemplo, observamos que o uso de nossa abordagem metodológica torna visível, dentre outros aspectos, a diversidade de formas de se discordar em cada turma e como as pessoas aprendem Ciências ao participarem de eventos de desacordo. Esses resultados inserem-se na discussão mais ampla do campo da Educação em Ciências sobre as definições de argumento e argumentação e suas implicações para os processos de aprendizagem. E favorecem um entendimento diferenciado das discussões em sala de aula.

Nesse sentido, pesquisadores têm apresentado várias contribuições da argumentação científica para os processos de aprendizagem72. Esses resultados de pesquisa também contribuem para o campo de pesquisa, como, por exempo, as críticas ao modelo tradicional de ensino, destacando a importância das interações discursivas, estimulando a elaboração de currículos que favorece a participação dos estudantes e projetos de formação de professores73.

Paralelamente, outros pesquisadores, como McDonald e Kelly (2012), discutem as limitações da argumentação científica para os processos de aprendizagem, sugerindo que esses processos são mais complexos do que a argumentação científica é capaz de representar74. Assim, esses autores discutem as potencialidades do discurso “sense- making” para o processo de argumentar para aprender.

Outros pesquisadores, parecem buscar a conciliação entre essas duas dimensões, como Berland e Reiser (2010). Nesse estudo, os estudantes são engajados em “sense- making” colaborativo e em análise estrutural dos argumentos a partir do modelo de Toulmin. Nessa perspectiva, os elementos-chave do discurso para argumentação

72 Uma discussão mais aprofundada dessa questão foi desenvolvida na seção 2.3, p. 33-34. 73

Uma discussão mais aprofundada dessa questão foi desenvolvida na seção 2.3, p. 34-37. 74 Uma discussão mais aprofundada dessa questão foi desenvolvida na seção 2.4, p. 44-45.

científica possibilitam o movimento do discurso entre objetivos da persuasão e do “sense-making”. Essas possibilidades de movimento do discurso possibilitaram que nas diferentes salas de aula pesquisadas houvesse argumentação com características de argumentação científica. Porém, o engajamento nos objetivos de persuasão e “sense- making” foram diferentes, configurando diferentes formas de argumentação científica.

A partir desse contexto de pesquisa, podemos dizer que nossa abordagem metodológica aproxima-se mais da pesquisa de Berland e Reiser (2010), no sentido de dar visibilidade a diferentes formas de argumentar. Outro aspecto de aproximação entre a pesquisa desses autores e a nossa é que em ambas as pesquisas, questionamentos podem integrar o discurso argumentativo e favorecer essa diversidade de formas de argumentação. Entretanto, observamos algumas diferenças que são importantes para o avanço do campo de pesquisa, pois as contribuições dessas pesquisas são complementares. Por um lado, o estudo desses pesquisadores dá visibilidade à diversidade de formas de argumentação em situações de ensino planejadas para ensinar Ciências através da argumentação e ensinar a argumentar cientificamente. Nossas pesquisas, por outro lado, dão visibilidade a essa diversidade considerando situações não planejadas/estruturadas tendo como referência a argumentação científica (ver por exemplo, SOUTO, 2010; SOUTO; CAPELLE; MUNFORD, 2011; MUNFORD; TELES, 2013; SOUTO-SILVA; MUNFORD, 2014). Evidentemente essas duas perspectivas metodológicas diferentes podem ser utilizadas tanto em contextos de pesquisa em que as atividades estão voltadas para a argumentação quanto em contexto em que isso não ocorre.

Outra similaridade que podemos observar entre nossos estudos e o estudo de outros pesquisadores (BERLAND; REISER, 2010; CHIN; OSBORNE, 2010; MCNEILL; PIMENTEL, 2010), é o fato de a definição de argumentação também estabelecer diálogos com pesquisas sobre quando questões, dúvidas ou incertezas são consideradas como parte do processo argumentativo. Nesse sentido, o que conta como argumentação vai além do conceito de conflito, o qual consiste em “uma disputa ou debate entre pessoas que se opõem uns aos outros, contrastando os lados para um problema” (JIMÉNEZ-ALEIXANDRE; ERDURAN, 2007, p. 12, tradução nossa75

). Nessa perspectiva de argumentação, que integra conflito e questões, as pessoas podem

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a dispute or debate between people opposing each other with contrasting sides to an issue (JIMÉNEZ- ALEIXANDRE; ERDURAN, 2007, p.12).

apresentar posicionamentos opostos, como também podem apresentar dúvidas, incertezas e questões em relação a um posicionamento. Nessa perspectiva, portanto, outras situações, além das que envolvem conflito, podem ser consideradas (e analisadas) como argumentativas.

Entretanto, no campo de pesquisa em Educação em Ciências, a integração ainda é limitada, considerando que há linhas de pesquisa bastante consolidadas que estão voltadas para cada um desses dois aspectos (conflito e questões) separadamente. Há alguns estudos que investigaram relações entre questões e argumentação (por exemplo Chin e Osborne, 2010; ou McNeil e Pimentel, 2010). Porém, em geral, o que conta como argumentação na pesquisa em educação em ciências tende a corresponder predominantemente à noção de conflito ou contraposição de duas ideias/posicionamentos. Dessa forma, essa definição corresponde a situações em que alunos e/ou professores engajam-se na defesa de duas ou mais posições bem definidas e devem utilizar evidências para sustentar suas posições. Assim, há vários estudos que investigam com grande aprofundamento como alunos (VILLANI; NASCIMENTO, 2003; SIMON, 2008; OSBORNE ET AL., 2013; TAVARES; JIMÉNEZ- ALEIXANDRE; MORTIMER, 2010; NEWTON; DRIVER; OSBORNE, 1999; JIMÉNEZ-ALEIXANDRE; RODRÍGUEZ; DUSCHL, 2000) e como professores argumentam (SADLER, 2006; ZEMBAL-SAUL ET AL., 2002; ZEMBAL-SAUL, 2009; DRUMOND, 2007; SÁ; QUEIROZ, 2007; AVRAAMIDOU; ZEMBAL-SAUL, 2005).

Os estudos sobre questões, por sua vez, tendem a não estabelecer relações com a argumentação e centralizam suas análises nas questões elaboradas por estudantes (AGUIAR; MORTIMER; SCOTT, 2006; AGUIAR; MORTIMER; SCOTT, 2010; CHIN; OSBORNE, 2008; COSTA ET AL., 2000; DORI; HERSCOVITZ, 1999; HOFSTEIN ET AL., 2005; VAN ZEE ET AL., 2001).

Alguns desses estudos investigam “os efeitos de ensinar aos alunos habilidades de questionamento” (CHIN; OSBORNE, 2008, p. 1, tradução nossa76

) (DORI; HERSCOVITZ, 1999; COSTA ET AL., 2000; VAN ZEE ET AL., 2001; HOFSTEIN ET AL., 2005). O estudo de Dori e Herscovitz (1999), por exemplo, investigou a capacidade dos estudantes de levantar questões através do uso de problemas do mundo real, nesse caso, a qualidade do ar. Como estratégia para estimular os alunos a levantarem questões,

eles participaram de várias atividades, como leitura, análise de tabelas e gráficos, construção de pôsteres sobre o tema. Os resultados sugeriram melhoria na qualidade e quantidade de questões levantadas pelos estudantes e que as estratégias adotadas contribuíram para os estudantes tivessem consciência da viabilidade e necessidade de procurar soluções práticas para os problemas dados.

Outros estudos, por sua vez, examinam as “respostas dos professores, e percepções dos estudantes, a questões dos estudantes” (CHIN; OSBORNE, 2008, p.1, tradução nossa77). Nos estudos de Aguiar; Mortimer e Scott (2006, 2010), os autores investigaram as contribuições que as perguntas dos alunos fazem para a construção de sentido na sala de aula de ciência e como essas perguntas influenciam e modificam os conteúdos e a estrutura do discurso na sala de aula. Esses autores destacaram que a construção de significado em salas de aula de Ciências é permeada pela tensão entre duas culturas diferentes “– de um lado, o conhecimento científico escolar e de outro, o conhecimento cotidiano – com suas respectivas visões de mundo, regras de validação, formas de raciocínio e de linguagem” (AGUIAR; MORTIMER; SCOTT, 2006, p.1).

Como resultado, esses autores observaram que, ao perguntar, os estudantes buscaram conexões entre os conhecimentos da ciência e os próprios conhecimentos, experiências e interesses. Além disso, estimularam a participação de outros estudantes e criam um ambiente de troca de ideias, de contestação, sendo que novas soluções puderam ser discutidas. Outro aspecto foi que forneceram um feedback para o professor, que reestruturou sua explicação aos interesses, experiências e conhecimentos prévios dos alunos. Nesse sentido, o discurso da sala de aula não depende da escolha de um indivíduo, mas emerge das interações entre professor e alunos. Além disso, ao formular perguntas, estudantes exibiram atitudes dialógicas face às palavras da ciência, fazendo um cruzamento com suas próprias palavras, experiências e conhecimentos prévios.

Apesar de esses estudos não discutirem sobre a argumentação, seus autores reconhecem que as questões dos estudantes estruturam e são estruturadas por conflitos entre as perspectivas da cultura da científica escolar e a cultura do cotidiano. Esse reconhecimento de que as perguntas, de certo modo, representam esses conflitos, possibilita uma aproximação mais significativa entre estudos sobre questões e definições de argumentação que abranjam, além de conflitos, também questões.

77 teachers’ responses to, and students’ perceptions of, students’ questions (

CHIN; OSBORNE, 2008, p.1).

As discussões apresentadas, ao longo do capítulo, apesar de estarem em construção, possibilitam dar visibilidade aos aspectos da argumentação que podem ser caracterizados a partir do uso de nossa abordagem metodológica alternativa, assim como, possibilitam explicitar como o processo de integração entre os aspectos da Pragma-dialética e da Etnografia em Educação exigiu grande adaptação da teoria da argumentação. Além disso, essas discussões evidenciam a inserção mais limitada de nossos resultados de pesquisa em discussões mais amplas do campo da Etnografia em Educação. Porém, a inserção em discussões mais amplas do campo da Educação em Ciências pareceu-nos muito profícua. Nesse sentido, com nossos resultados de pesquisa inserimo-nos em discussões sobre as definições de argumento e argumentação e suas implicações para os processos de aprendizagem; e estabelecemos diálogos com pesquisas sobre “sense-making” e sobre “questões”. Esse diálogo, portanto, sinaliza possíveis contribuições da presente pesquisa para os avanços do campo de pesquisa em Educação em Ciências.