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5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

5.9 Construções finitas x infinitivas

Tomando-se por base o trabalho de Duarte, M. E; Kato, M e Barbosa, P. (2003) que aponta que as formas plenas para indeterminação do sujeito apareceram com maior frequência nas sentenças finitas, enquanto o sujeito nulo e o clítico se aparecem preferencialmente nas

infinitivas, - foi elencado como possível fator linguístico

favorecedor das variantes. Os resultados estão apresentados no Gráfico 12 a seguir:

Considerando que a maioria dos corpora é constituída por sentenças finitas, o número de ocorrências de todas as variantes em tais sentenças supera em muito nas infinitivas (Tabela 9 Apêndice). Entretanto, em termos percentuais, pelo expressivo aumento no emprego de vocêgenem sentenças de infinitivo ao longo do período analisado, percebe-se que essa forma verbal favorece seu emprego. 71% das sentenças de infinitivo do corpus atual têm vocêgenna posição de sujeito, contra 22% na década de 70. Já nas sentenças finitas, embora vocêgentambém lidere entre as variantes de indeterminação, o pronome aparece em percentual menor, 49% das ocorrências de sentenças finitas na década atual.

38% 14% 21% 11% 22% 71% 16% 49% 19% 9% 24% 26% 1% 1% 23% 11% 19% 5% 15% 2%

INFINITIVAS DEC 70 INFINITIVAS DÉC ATUAL FINITAS DÉC 70 FINITAS DÉC ATUAL

Gráfico 12: Frequência das variantes em relação ao tipo de sentença no PB

Como o infinitivo é atribuído genericamente à totalidade das pessoas, e a nenhuma em particular, essa forma, por si só, já exprime a ausência de um sujeito determinado, dispensando, portanto, até mesmo a partícula se, que carregaria a mesma informação. Contrariando essa previsão, os dados atestam a perda gradual nesta posição do pronome nulo (de 38 para 14%) e do clítico se (de 19 para 5%), com o consequente aumento do preenchimento da posição de sujeito gramatical de sentenças no infinitivo. No Gráfico 13 a seguir é possível visualizar essa tendência.

Ainda com relação ao apagamento do pronome se, conforme discutido em Holmberg (2010), na ausência do pronome ou de algum antecedente possível, a interpretação do sujeito nulo de um verbo na terceira pessoa em LSNPs é de indeterminação. Assim, pode-se afirmar que o se indeterminado não tem mais razão de ser, ou sob o ponto de vista de Galves (1987), a ausência do traço /+ pronominal/ na concordância no PB faz com que o se seja dispensável para expressar a indeterminação em sentenças finitas.

Já nas infinitivas, a situação se inverte, de acordo com Galves (1987) e Nunes (1990), que mostram que parece estar em curso no PB dois processos de mudança antagônicos: enquanto em um processo, o se indeterminador é elidido em sentenças finitas, no outro, o se é inserido em sentenças no infinitivo.

Conforme mostrado por Galves (1987, 2001), a possibilidade de o tópico ser antecedente do sujeito nulo do infinitivo faz com que o emprego do se seja necessário na sintaxe dessas construções no PB, como marcador de indeterminação. Em uma sentença como (186),

37% 23% 20% 1% 19% 14% 71% 9% 1% 5% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80%

NULO VOCÊ A GENTE NÓS SE

Gráfico 13: Distribuição das variantes nas construções de infinitivo no PB

extraída de Galves (1987), é possível entender a razão da inserção do se antes de infinitivo no PB:

(186) João é difícil de pagar103.

Galves (1987) dá a seguinte explicação para a ambiguidade dessa sentença (186) no PB: ela pode significar que João paga dificilmente ou que é difícil pagá-lo. No PE, só a segunda interpretação é possível. Por essa razão é que no PB também é possível dizer:

(187) João é difícil de se pagar.

Entretanto, os dados do PB atual não atestam esse fato. O que se evidencia pelo Gráfico 13 é um decréscimo no emprego de se indeterminador nas construções de infinitivo no período analisado, de 19 para 5%. Apesar dessa redução no emprego do clítico se ao longo do período analisado, na década atual percebe-se maior emprego desse pronome nas construções infinitivas em relação às finitas, com realização respectivamente em 5% e 2% dos dados analisados, conforme Gráfico 12.

Considerando-se a hipótese deste estudo de que o pronome você está exercendo no PB função de elemento indeterminador, em competição com o se indeterminador, os dados do Gráfico 13 sugerem que a diminuição no emprego de se nas construções de infinitivo está sendo compensada pelo emprego de você, que aumentou significativamente na década atual. Este resultado consubstancia a proposta deste estudo do percurso da indeterminação no PB: de se a cê. Os exemplos a seguir do corpus atual evidenciam esse emprego:

(188) Porque sem isso não tem condição de vocêgenabrir uma pós-graduação. (UFV- M2 26)

(189) Então, o PDI, Plano de Desenvolvimento Institucional é extremamente importante pra vocêgentraçar o rumo da universidade. (UFV- M2 26)

(190) Para vocêgenconstruir alguma coisa, uma casa, um prédio, qual é a estratégia a se desenvolver para vocêgenpoder atingir isso? (UNI - M3 27)

Além do pronome vocêgenque não consta da variedade europeia do Português, outra estratégia de indeterminação que revela divergência marcante entre as duas variedades da língua diz respeito ao clítico se, que ainda é bastante produtivo em PE. Conforme discutido acima,

Galves (1987) mostra que, além da baixa produtividade do clítico se no PB, seu emprego ainda se distingue do PE em relação à inserção do se indeterminador em sentenças com infinitivo, onde esse emprego não é canônico. Se no PB o se estaria sendo inserido nas construções infinitivas para desfazer ambiguidade, em que o sujeito da oração matriz pode ser interpretado como sujeito da oração encaixada, no PE essa ambiguidade é inexistente.

Para averiguação da suposta não ocorrência do clítico se em construções de infinitivo no PE foi elaborado o Gráfico 14.

Os dados do Gráfico 14 também revelam uma curiosidade em relação ao vem sendo discutido acerca do emprego do clítico se no PE: esse pronome é igualmente produtivo em construções finitas e infinitivas, com realização em respectivamente 31,2% e 20% dessas construções na atualidade. Os exemplos a seguir sinalizam que a inserção do clítico se em construções de infinitivo no PE não é para desfazer ambiguidades.

(191) Quer dizer, de se ver a alegria da criança ao ver-me por exemplo quer dizer é uma coisa que enfim penso que é verdadeira. (OEI-C- 3H)

(192) Se gosto do Cacém para se viver, não é assim não acho muito atraente não é como digamos... (CAC-A-3H)

(193) Não sei se é possível criar-se um grupo de psicólogos para professores que acompanhe essas pessoas de uma maneira particular (CAC- C- 3H)

(194) ... que é muito fácil se aprender a língua quando se é novinho não é? (CAC- C- 3M)

(195) Para se poder fazer a tal prevenção diária em casa Ø fazer (higienizações) vulgarmente também denominadas por () aplicações de ( ) aplicações de flúor. (CAC-A-3M) 63,3% 34% 2,7% 71% 8,3% 20% 0,7% 0,0% 20,0% 40,0% 60,0% 80,0% NULO NÓS SE A GENTE

Gráfico 14: Ocorrência das estratégias de indeterminação no PE por tipo de construção - década atual