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2 Desenvolvimento Sustentável

2.3 Conceitos de consumo relacionados às questões socioambientais

2.3.1 Consumo Sustentável

O consumo sustentável é definido, a priori, como a utilização de produtos e serviços que atendam as necessidades básicas e tragam melhoria na qualidade de vida da sociedade, ao mesmo tempo em que se minimiza o uso de recursos naturais e materiais tóxicos, bem como a geração de resíduos e emissão de poluentes ao longo do ciclo de vida, de modo a atender as

necessidades das gerações atuais sem comprometer o atendimento das necessidades das gerações futuras (LUSKIN, 2007; COSTA; TEODÓSIO, 2011).

Este tipo de consumo deve ser visto como um ato de equilíbrio intra e intergerações, de modo a manter condições de acesso ao consumo com base nos princípios de qualidade de vida e proteção ambiental. Desse modo, para se promover o consumo sustentável deve-se ir além de inovações tecnológicas e das mudanças individuais de consumo, enfatizando-se ações coletivas e mudanças políticas, econômicas e institucionais para fazer com que os padrões e níveis de consumo se tornem mais sustentáveis (CONSUMERS INTERNATIONAL; MMA; IDEC, 2005; PORTILHO, 2005; COSTA; TEODÓSIO, 2011).

A ideia de consumo sustentável está associada a um processo e, portanto, não se resume ou se limita a mudanças no comportamento do indivíduo, nem no design de produtos ou na forma de prestação de um serviço para atender a esse novo nicho de mercado (PORTILHO, 2005; COSTA; TEODÓSIO, 2011). Neste contexto, devem ser definidos as responsabilidades e os papéis das empresas, dos governos e da sociedade em promover um desenvolvimento sustentável. Qualquer tentativa por parte dos atores acima mencionados para modificar os padrões e níveis de consumo precisa ser baseada em uma concepção realista e abrangente do consumo, que leva em conta as complexidades do consumo como uma atividade social e cultural (DOLAN, 2002).

As práticas de consumo são desenvolvidas, como um fenômeno cultural, a partir manifestações de ligações locais e globais de interdependências sociais. Olhar continuamente para o consumidor como o único que determina a insustentabilidade do consumo efetivamente descontextualiza suas práticas de tais interdependências. Deve-se aceitar que o processo de promoção do consumo sustentável é mais complexo do que uma mudança de valores e práticas individuais e na adoção de tecnologias limpas de produção (DOLAN, 2002; SCHAFER; CRANE, 2005). Dessa forma, é necessário adotar uma abordagem integrativa que contemple os espaços de atuação entre os diversos atores responsáveis pelas variações nos padrões e níveis de consumo na busca por torná-los sustentáveis.

Grande parte dos esforços para se promover o consumo sustentável é baseada em um conjunto de suposições teóricas chamado de paradigmas de valores éticos, que adotam valores sociais, a exemplo de solidariedade humana e de sensibilidade ecológica, como elementos determinantes da transição para o consumo sustentável (HOLT, 2012). Entretanto, dados demonstram que as pegadas ecológicas dos consumidores continuam a crescer, mesmo com relatórios como os das pesquisas realizadas pelos Institutos Akatu e Ethos (2010; 2012) que abordam a relação entre o consumidor brasileiro e a sustentabilidade, os quais aponta que a

maioria das pessoas declara lealdade aos valores ambientais, mas mantém comportamentos de consumo insustentáveis, evidenciando a necessidade de impor um olhar crítico sobre essas bases conceituais e formular um modelo alternativo que leve a intervenções mais específicas. Isto corrobora o argumento de Gonçalves-Dias (2009), quando afirma que há um hiato entre as atitudes e os comportamentos dos consumidores para o consumo sustentável, o que significa dizer que o fato dos indivíduos declararem que são a favor do meio ambiente não denota que eles façam a sua parte em realizar as mudanças necessárias em suas atividades cotidianas de consumo.

Assim, a promoção do consumo sustentável prevê a necessidade de estabelecer ações coletivas e mudanças políticas, econômicas e institucionais, defendidas nos discursos e debates internacionais sobre o desenvolvimento sustentável e que convergem sobre a necessidade de articulação entre atores do Estado, do mercado e da sociedade civil através de relações de colaboração como uma forma de enfrentar os desafios de construir ações e políticas capazes de renovar as práticas de consumo (COSTA; TEODÓSIO, 2011), para se atingir os requisitos em termos de acesso aos recursos naturais, garantia de um meio ambiente equilibrado e justiça social intra e intergerações.

Holt (2012) defende que se devem realocar os investimentos em sustentabilidade realizados por governos, por empresas e por ONG’s que visam promover mudanças de valores nos consumidores, para uma associação de forma colaborativa no mercado que seja focada em movimentos sociais que visam ultrapassar o lock-in ideológico encontrado em mercados insustentáveis. As principais possibilidades de avanço na promoção do consumo sustentável advindas de relações de colaboração entre governos, empresas e ONGs incluem o desenvolvimento de uma democracia participativa e a ampliação da cidadania (SANTOS; AVRITZER, 2005; TEODÓSIO, 2008), a partir de uma ampla participação dos atores dos três setores nos espaços públicos dos debates e ações sobre as mudanças que são necessárias, cada qual desempenhando seus papéis como corresponsáveis nesse processo de transformação. Deve-se garantir um processo transparente, informativo e participativo para o debate e a tomada de decisão (GUIMARÃES, 2001) em termos de mudanças necessárias para se promover o consumo sustentável.

Além de envolver os governos, as ações e as estratégias propostas para promover o consumo sustentável envolvem cada vez mais indivíduos, organizações não-governamentais (ONGs) e empresas, oferecendo alguns insights sobre como a cidadania estaria agora se expandindo para novos domínios (MICHELETTI; STOLLE, 2012). Em teoria, há um espaço de manobra considerável para mudanças nos atuais padrões de consumo e de estilos de vida

por meio de um processo emancipatório, mesmo que eles estejam profundamente enraizados em determinadas condições socioeconômicas e sejam culturalmente específicos (SACHS, 2007). A noção de cidadania contemporânea significa um processo de aprendizado social e de construção de novas práticas políticas concretas que permitam avançar em direção a um novo quadro de referência das práticas de consumo (COSTA; TEODÓSIO, 2011).

A promoção do consumo sustentável deveria, portanto, considerar o funcionamento de sistemas ainda pouco conhecidos de planejamento e gestão de problemas sociais – ao mesmo tempo integrados, descentralizados e sensíveis à complexidade embutida no comportamento não linear dos sistemas socioambientais (VIEIRA, 2007; TEODÓSIO, 2008). Os avanços nesta direção dependem de certo nível de intervencionismo por parte do setor público, de um comprometimento ativo e sustentado das comunidades locais e da formação de redes colaborativas envolvendo o tripé do ideal democrático-participativo: a Sociedade Civil, o Estado e o Mercado (VIEIRA, 2007).

Ademais, deve-se considerar consumo e produção fazem parte de um ciclo de atividades interdependentes, em torno das quais estão um conjunto de diferentes questões, iniciativas e estratégias (BARBER, 2007). Portanto, para se promover mudanças nos padrões e nos níveis de consumo, não se pode prescindir de aspectos relacionados à produção.

Desse modo, esta explanação sobre a necessidade de adotar uma perspectiva integrativa para promover o consumo sustentável, com foco numa gestão compartilhada entre governos, empresas e sociedade civil, com base no contexto onde as mudanças são propostas, é fundamental para esta tese assim como para estudos futuros. Possibilita compreender a complexidade que envolve o tema e promove a identificação das lacunas teóricas existentes, evidenciando a importância da proposição de um framework, cuja proposição inicial é apresentada a seguir.