• Nenhum resultado encontrado

2.2 CONSTITUIÇÃO

2.2.2 Conteúdo do título constitutivo

Sabe-se que a constituição da propriedade horizontal sobre um edifício está vinculada, de forma simultânea, aos requisitos estipulados pelo Código Civil português190, pelo Código do

Notariado191, pelo Código do Registro Predial192, bem como pelo Regime Jurídico da

Urbanização e Edificação193. No entanto, o presente trabalho atém-se principalmente aos

dispositivos do Direito Civil, com alguns deles aplicados ao notariado e às conservatórias. Sendo assim, conforme supramencionado, podem-se enumerar, inicialmente, os seguintes requisitos básicos para a constituição da propriedade horizontal, nos termos do artigo 1414.º, do Código Civil português: que a propriedade horizontal recaia sobre um edifício e que este seja dividido por frações autónomas que se constituam em unidades independentes, isto é,

189 MENDES, Armindo Ribeiro. DIÁRIO DA REPÚBLICA – Código Civil português. 190 Artigos 1414.º e seguintes.

191 Decreto-Lei n.º 207/1995, artigos 59.º ao 62.º.

192 Decreto-Lei n.º 224/1984, artigos 81.º, 82.º, 87.º, 92.º, 95.º n. 1, r), dentre outros. 193 Decreto-Lei n.º 555/1999.

44

distintas e isoladas entre si, mas com saída própria para uma parte comum do prédio ou via pública (artigo 1415.º, Código Civil português).

Já no artigo 1418.º, o referido código apresenta o conteúdo do título constitutivo, ou seja, os requisitos específicos do título que são aplicáveis genericamente194 a quaisquer das

formas de constituição anteriormente mencionadas. No mencionado artigo, são enumerados no n.º 1 dois requisitos obrigatórios, sendo que a falta de cumprimento de algum deles acarretará a nulidade do título, nos termos do artigo 1418.º, n.º 3, do mesmo código.

O primeiro requisito de caráter obrigatório é a especificação das partes do edifício correspondentes às diversas frações, tornando-as individualizadas, pelo que devem constar “não só a referência à sua localização no prédio (número e lado do andar, por exemplo), mas também uma descrição sumária da sua composição (número de divisões e seu tipo)”195.

Já o segundo, também obrigatório, consiste na fixação de valor a cada fração, por percentagem ou permilagem, do valor total do prédio no qual, conforme preceitua José Alberto Vieira196, repercutirá efetivamente no exercício do direito de propriedade horizontal do

condómino, visto que: caberá a cada condómino, na proporção do valor da fração, a fruição nos frutos gerados pelas partes comuns do edifício, bem como as despesas e encargos das partes comuns e das inovações; ademais, o direito ao voto do condómino na assembleia será determinado pelo valor de sua fração no conjunto do valor total do edifício.

Diante da obrigatoriedade desses dois requisitos, a falta de cumprimento de algum deles acarreta a nulidade do título, nos termos do artigo 1418.º, n. 3, do Código Civil português. A taxatividade da lei em considerar nulo o título que deixa de fixar o valor relativo de cada fração é considerada, para alguns autores197, um excesso legal, porquanto o vício poderia ser sanado

nos termos do artigo 59.º, n.º 2, do Código do Notariado, e a nulidade decretada somente se não utilizado o recurso.

Em seguida, o referido artigo 1418.º estipula requisitos facultativos, ao constar que “o título constitutivo pode ainda conter, designadamente”198: a finalidade a que se destina cada

uma das frações ou parte comum; o regulamento do condomínio, ao que deverá constar o uso, a fruição e a conservação, tanto das partes comuns quanto das frações autónomas; e a previsão do compromisso arbitral a fim de solucionar os possíveis litígios que possam surgir na relação

194 FERNANDES, Luís A. Carvalho – Lições de direitos reais, p. 377. 195 Ibidem, p. 379.

196 VIEIRA, José Alberto. Op. cit., p. 641.

197 FERNANDES, Luís A. Carvalho – Lições de direitos reais, p. 382. 198 DIÁRIO DA REPÚBLICA – Código Civil português.

45

condominial. Apesar de serem requisitos facultativos, a nulidade poderá ocorrer pela dissonância das informações entre a menção ao fim a que se destina cada fração ou parte comum e ao que foi fixado no projeto aprovado pela entidade pública competente, conforme preceitua o artigo 1418.º, n. 3, do Código Civil português.

Devem-se observar alguns dos requisitos previstos no Código do Notariado, pelo que se destaca o artigo 59.º199, ao estabelecer que os instrumentos de constituição da propriedade

horizontal só podem ser lavrados mediante documento, passado pela câmara municipal, comprovativo de que as frações autónomas satisfazem os requisitos legais. Além disso, em se tratando de prédio construído para transmissão em frações autónomas, esse documento pode ser substituído pela exibição do respectivo projeto de construção e, nesse caso, dos posteriores projetos de alteração aprovados pela câmara municipal200.

Por fim, conforme visto anteriormente, deve-se observar como requisitos a previsão de dois artigos: o artigo 1438.º-A, que permite a constituição da propriedade horizontal ao conjunto de edifícios contíguos funcionalmente ligados entre si pela existência de partes comuns afetadas ao uso de todas ou algumas das unidades ou frações que os compõem; e o artigo 55.º, do Decreto-Lei n.º 39/2008, ao estipular os requisitos do título para constituição da propriedade horizontal de propriedade plural em empreendimentos turísticos.

Este último artigo enumera, no item n.º 1, diversos requisitos específicos a essa espécie de empreendimento relacionado à propriedade horizontal, considerados obrigatórios na elaboração do título constitutivo. Entre outros requisitos previstos no referido artigo, mencionam-se: a identificação da entidade exploradora do empreendimento, bem como a descrição física e registral das várias frações autónomas ou lotes, de forma que fiquem perfeitamente individualizadas; o valor relativo de cada fração autónoma ou lote, expresso em percentagem ou permilagem do valor total do empreendimento; o fim a que se destina cada uma das frações autónomas ou lotes, bem como a identificação e descrição das instalações e equipamentos do empreendimento; o critério de fixação e atualização da prestação periódica

199 Estabelece o artigo 59.º, do Código do Notariado: “1 - Os instrumentos de constituição da propriedade

horizontal só podem ser lavrados se for junto documento, passado pela câmara municipal, comprovativo de que as frações autónomas satisfazem os requisitos legais. 2 - Tratando-se de prédio construído para transmissão em frações autónomas, o documento a que se refere o número anterior pode ser substituído pela exibição do respectivo projecto de construção e, sendo caso disso, dos posteriores projectos de alteração aprovados pela câmara municipal. 3 - O documento autêntico que se destine a completar o título constitutivo da propriedade horizontal, quanto à especificação das partes do edifício correspondentes às frações autónomas ou ao seu valor relativo, expresso em percentagem ou permilagem, não pode ser lavrado sem a observância do disposto nos números anteriores.” DIÁRIO DA REPÚBLICA – Código do Notariado.

46

devida pelos proprietários e a percentagem desta que se destina a remunerar a entidade responsável pela administração do empreendimento, bem como a enumeração dos encargos cobertos por tal prestação periódica, entre outros201.

Deve-se ainda ressaltar aos requisitos específicos do título constitutivo no caso de um conjunto turístico (resort), previstos no item n.º 2, do referido artigo. Ademais, o item n.º 3 estipula a obrigatoriedade de um regulamento de administração do empreendimento, que deverá fazer parte do título constitutivo, devendo conter normas de conservação, fruição e funcionamento das unidades de alojamento, das instalações e dos equipamentos de utilização comum bem como dos serviços de utilização comum.

Sendo assim, percebe-se que o sistema jurídico português é claro ao estabelecer os requisitos de constituição da propriedade horizontal, principalmente diante das atualizações legislativas que acompanham, efetivamente, a evolução dos empreendimentos de grande porte, bem como as diversas inovações relacionadas aos conjuntos habitacionais com áreas comuns cada dia mais completas. No tópico seguinte, serão abordadas as hipóteses de modificação do título constitutivo.