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Desde o Brasil República (1889) até o final da década de 1980, a conduta clássica da diplomacia brasileira foi de alinhamento negociado com as potências hegemônicas e o capital estrangeiro, salvo alguns intervalos caracterizados pelos governos de Eurico Gaspar Dutra (1945-1949), Café Filho (1954-1955) e Castelo Branco (1964-1967), os quais se alinharam de forma automática aos Estados Unidos (BANDEIRA, 1989) (MOURA 1991).

Esses autores destacam ainda, o modelo desenvolvimentista que se estabeleceu gradativamente no Brasil a partir dos anos 1950, no segundo governo Vargas, seguido pelo governo de Juscelino Kubitschek (1956 – 1961). Vizentini (2004) apresenta estudo sobre os governos militares, destacando o modelo desenvolvimentista ascendente a partir do governo do presidente Castelo Branco (1964 – 1967), seguindo-se o apogeu do modelo com o “milagre econômico” no governo do presidente Médici (1969 – 1974), e o declínio desse modelo a partir do governo do presidente Geisel (1974 – 1985).

Conforme Batista (1994), o alinhamento negociado entra em declínio no início da década de 1990 com o governo Collor, que adotou sem reservas o Consenso de

Washington128 e os valores neoliberais como doutrina predominante. Esse autor mostra que o “Consenso” tinha como objetivo avaliar as reformas econômicas na América Latina, porém acabou por ratificar as propostas do economista John Williamson, tornando-se a política oficial do FMI, indicada para promover o "ajustamento macroeconômico" dos países em desenvolvimento que passavam por dificuldades.

Tais propostas do Consenso de Washington embasaram-se nos conceitos neoliberais de diminuição do Estado e do seu poder de fazer políticas sociais de forma autêntica e soberana. Surge como reação ao Estado de Bem-Estar Social, sendo disseminado como sinônimo de modernidade e definido como resposta às exigências da “globalização”. Essa doutrina teve como principais defensores a administração Reagan (1981-1989) nos EUA e a primeira ministra britânica, Margareth Thatcher (1979 – 1990) na Inglaterra (BATISTA, 1994).

Já Wainwright (1998) mostra que os conceitos filosóficos do neoliberalismo têm como principal teórico o economista e filósofo austríaco Frederick Von Hayek. Suas metas foram traçadas após a Primeira Guerra Mundial, quando o liberalismo austríaco havia fracassado e o socialismo, assim como o nacionalismo, estavam em ascensão. Assim, os fundamentos filosóficos de Hayek se opõem à noção positivista do conhecimento, como um modelo das ciências naturais que formulava leis gerais, através da descrição das conjunções regulares dos fenômenos, que levaria ao socialismo.

Para Wainwright (1998, p.11), “os fundamentos de Hayek continuam a fornecer o capital filosófico do qual se nutrem as políticas neoliberais de todas as matizes, conscientes ou não”. Com o fracasso das economias centralmente planejadas do bloco soviético, renovou-se o valor desse capital filosófico, imbuindo o livre mercado de uma qualidade “sagrada”.

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De acordo com Batista (1994), esse “consenso” foi um conjunto de medidas formuladas em novembro de 1989 por economistas de instituições financeiras baseadas em Washington, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. A avaliação do consenso de Washington abrangeu 10 áreas: 1) disciplina fiscal; 2) priorização dos gastos públicos; 3) reforma tributária; 4) liberalização financeira; 5) regime cambial; 6) liberalização comercial; 7) investimento direto estrangeiro; 8) privatização; 9) desregulação; e 10) propriedade intelectual (p. 118).

O marketing dessas idéias neoliberais disseminou-se pelos meios de comunicação, que passou a admitir a falência do Estado, visto como incapaz de formular sua política macroeconômica, além de defender a conveniência de se transferir essa responsabilidade aos organismos internacionais. Não se discutia se o Estado podia ou devia ser empresário, monopolizando atividades estratégicas. Passou-se simplesmente a admitir, como fim lógico, que o Estado não estaria mais em condições de um atributo essencial da soberania, o de fazer a política monetária e fiscal (BATISTA, 1994).

A adoção desse modelo, após o fim da bipolaridade da guerra fria129, levou o Brasil, a uma ostensiva aceitação da dependência aos Estados Unidos, com a abertura unilateral do mercado no início da década de 1990, estabelecendo, assim, uma percepção diferenciada do interesse nacional.

Nesse sentido, segue-se com a verificação do discurso e das propostas do PT, no que se refere à defesa do interesse nacional130 nas principais questões de sua agenda externa, assinalando as propostas de integração do Brasil com blocos os econômicos do Mercosul e da Alca, além do posicionamento em relação ao FMI e ao pagamento da dívida externa.

É importante esclarecer que o Programa de Governo de um partido é um elenco de intenções, no qual esse apresenta para os eleitores suas propostas e seu discurso oficial. Além das intenções, retrata ainda a conjuntura política,

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Conforme Batista (2005), no final da década de 1980 e início de 1990 os países latino- americanos pareciam comportar-se como países derrotados. Reagiram defensivamente com complexo de culpa, como se estivessem saindo de uma longa noite de totalitarismo político e econômico, como se houvessem sido eles, juntamente com os países da Europa Oriental, vencidos também na guerra fria. Resignados e acomodados sem nenhuma vontade perceptível de se afirmar como verdadeiras nações (p.102-103).

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Conforme Bobbio (2004), o Interesse Nacional deve ser distinguido entre o contexto das relações internacionais e das relações internas. No contexto das relações internacionais, o Interesse nacional é entendido como uma necessidade de segurança que cada Estado tem dentro das condições anárquicas que predominam no sistema internacional. O Interesse nacional, nesse sentido, visa defender ainda os próprios interesses econômicos, ou de qualquer outra natureza, quando em conflito com outros Estados. Pode ainda levar à busca por espaços vitais para garantir o acesso a mercados e à matérias-primas estratégicas, como também levar à integração. No contexto da política interna, será entendido como o interesse da generalidade dos habitantes de um país, que se contrapõe aos interesses particulares de cada um dos cidadãos e de cada um dos grupos sócio-econômicos.

econômica e social em que o partido concorreu às eleições. Entretanto, Programas de Governo e propostas de ação são apresentados de forma um tanto genérica, não permitindo que seja medido de forma mais consistente o conteúdo desses posicionamentos progressivos. Para não cair no vazio ou na generalidade de propostas, optou-se em mostrar a evolução do discurso petista na área de política externa a partir dos documentos oficiais de sua fundação até 1989, para, em seguida, apresentar suas propostas a partir dos Programas de Governo.