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Contexto histórico O neo pragmatismo de Richard Rorty

Rorty, dos quinze até os vinte anos de idade, tinha como base para o seu projeto filosófico, a filosofia de Platão. Entretanto, mais amadurecido, Rorty já não via com tanto entusiasmo a filosofia que tanto o inspirou. Na verdade, o Rorty amadurecido não conseguia compreender dois pontos importantes da filosofia de Platão. O primeiro ponto: o primeiro objetivo de Platão teria sido a capacidade de oferecer um argumento irrefutável, ou seja,

12 Subjetivismo é a doutrina segundo a qual o mundo de cada indivíduo é construído do material disponível em

sua consciência, material que é conectado ao mundo exterior, se é que é conectado, somente de maneira indireta. Davidson alerta para o fato de que o subjetivismo não é uma doutrina “inofensiva” de que toda a fonte de nosso conhecimento empírico está nos sentidos; é a doutrina que diz que as evidências últimas para nossas crenças sobre o mundo externo são algo não conceitualizado que nos é dado, diretamente, na experiência.

conseguir um poder argumentativo total sobre os outros? O segundo é o momento em que todos os questionamentos estão somados e não se deseja mais argumentar.13

Desta forma, concluímos que a decepção com a filosofia de Platão acabou por levar Rorty à sua condição posterior de acreditar que não se pode abarcar realidade e justiça em uma só visão. Rorty insiste em afirmar que realidade e justiça são coisas separadas e que só se ligam por meio da contingência.

A realidade, o que é o mais real para uma pessoa, aquilo que ela ama com todo o seu coração, alma e mente, o que ela tem como certeza, diz respeito ao seu projeto privado. Trata-se da responsabilidade que alguém tem com suas idiossincrasias. A justiça, o que tem a ver com a responsabilidade de alguém com as outras pessoas, não é derivada dessa sua responsabilidade para com seu projeto privado, nem está ligada a isto por qualquer outro vínculo, a não ser os vínculos contingentes que se estabelecem entre nós quando nos compadecemos de outros – ou porque somos ensinados a nos compadecer de outros, ou porque alguém ou alguma coisa nos sensibilizou para a dor alheia ou, ainda, porque tivemos uma experiência semelhante àquela pela qual quem necessita de nossa ajuda está passando. (GHIRALDELLI, 1999. p. 23).

Além das duas questões anteriores que motivaram Rorty a romper com a filosofia de Platão, as três fases por que passou a filosofia norte-americana foram decisivas por este rompimento. A primeira fase foi a notável importância dos escritos de John Dewey, este conhecido como o filósofo da democracia.14 A segunda fase se refere à influência dos positivistas lógicos, em especial Rudolf Carnap, nos Estados Unidos, visto que, eles se

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JUNIOR, G. P. Richard Rorty. A filosofia do novo mundo em busca de novos caminhos. Petrópolis: Vozes, 1999. 123 p.

14 John Dewey (1859-1952). Contribuiu decisivamente para a metafísica, epistemologia, filosofia da mente,

filosofia da ciência e a estética. Ele é lembrado também por sua filosofia da educação e por sua filosofia social, que formam a base de todo o seu pensamento. Considera o pragmatismo como um procedimento capaz de julgar discursos a partir de experiências em práticas sociais. Para ele experiência é a relação entre os elementos do universo, que só ganham status ontológico no âmbito destas relações. Diante de uma prática argumentativa, a mesma, para que tenha validade, precisa passar pelo crivo da “assertividade garantida”. As condições textuais e contextuais da prática argumentativa são obtidas da observação e consideração da experiência.

instalaram neste país porque fugiam das perseguições nazistas durante a segunda guerra mundial.15Por fim, a terceira fase é caracterizada pela decadência do positivismo lógico.16

Quine, por sua vez, nos leva a uma doutrina holística do significado. Ou seja, o significado de uma palavra ou frase individual é compreendido única e exclusivamente pelas suas relações com uma trama determinada de conceitos, uma teoria, um complexo de disposições que indicam uma forma de vida a coisas semelhantes.

Na realidade, o holismo irá romper com a visão dual que a perspectiva tradicional tratava uma relação ao significado e significação. De acordo com os positivistas lógicos, significado é o que é da própria coisa, ou seja, o que lhe é intrínseco, enquanto que a significação é o incerto, externo. Desta forma, vemos que no cerne do pragmatismo está a visão holística, ou seja, uma visão contextualista ou anti-essencialista.

Ao aderir ao holismo, Rorty destaca três questões importantes. A primeira é que não existe algo como a característica não relacional de X. A segunda: conhecer X é algo que tem a

15 O positivismo lógico também denominado empirismo lógico ou neo-positivismo, foi uma corrente filosófica

desenvolvida pelos membros do círculo de Viena com base no pensamento empírico tradicional e no desenvolvimento da lógica moderna. Esta corrente restringiu o conhecimento à ciência e utilizou o verificacionismo para rejeitar a metafísica não como falsa, mas como destituída de significado. A importância da ciência levou os positivistas lógicos a estudarem o método científico e explorar a teoria da confirmação. Nos dias de hoje as correntes desdobradas do positivismo lógico em especial de Thomas Khun, que estabelece o caráter paradigmático da ciência, e de Paul Feyerabend que demonstrou que na prática cientifica a ciência não evolui segundo normas pré-estabelecidas geraram graves problematizações de suas idéias. Rudolf Carnap (1891-1970) foi um dos mais importantes membros do Círculo de Viena. John Dewey, apesar de ser a maior referência naquele momento quando se tratava de pragmatismo, já havia publicado muito ao mesmo tempo em que tais publicações eram inconsistentes e contraditórias, por exemplo, ao criticar o representacionismo epistemológico, Dewey usava a própria epistemologia para explicar seu posicionamento contrário à esta corrente. Isso gerou inconsistências. A idéia dos positivistas lógicos era a de que os nossos problemas filosóficos eram problemas de linguagem. A partir da análise da linguagem poderíamos ter a imagem espelhada do real, ou seja, o emparelharmos a linguagem correta às sensações empíricas teríamos o espelho do real.

16 A decadência do positivismo lógico se deu no momento em que temos a fusão entre a filosofia analítica e o

pragmatismo. Os dois principais filósofos responsáveis por esta fusão foram Willard V. O. Quine (1908-2000) e Donald Davidson (1917-2003). Os positivistas lógicos afirmavam que a melhor linguagem para reduzir à filosofia é a linguagem das ciências físicas, ou seja, para uma linguagem se sustentar a mesma precisa se reduzida à da ciência física. Porém, Quine afirmou que dois princípios importantes que trariam consequências epistemológicas, ontológicas e metafísicas e consequentemente a queda do positivismo lógico, ao afirmar dois princípios. O primeiro é o princípio da indeterminabilidade da tradução, ou seja, uma crítica à idéia da mente ser um conteúdo de significados. O segundo é o princípio da inescrutabilidade da referência, ou seja, não podemos traduzir um texto igualmente em outra linguagem. Davidson seguindo a mesma linha de Quine, porém radicalizando suas idéias, afirmou que a linguagem está presente como estrutura organizada, mas o entendimento mútuo é realizado por meio da imaginação.

ver com colocá-lo em relação com uma série de outras coisas. Por fim, conhecer X é lidar com X. 17

Veja que as duas primeiras teses nos mostram nitidamente suas características holísticas e contextualistas, a terceira percebemos um acabamento de um ponto de vista pragmático. “A sustentação dessas três teses conjuntamente não permite a adoção da ideia de que há aparência e essência, de que conhecer é se apropriar ou representar essências ou modelos aproximados delas.” (GHIRALDELLI, 1999, p.32).

Em outras palavras, segundo Ghiraldelli (1999), sustentar estas três teses é não aceitar o platonismo e seu dualismo metafísico. Desta forma, percebemos a rejeição, por parte de Rorty, em relação ao dualismo metafísico de Platão e consequentemente a toda corrente adepta ao representacionismo e ao fundacionismo.

Não há como endossar a idéia de que a vida cotidiana, o “mundo fenomênico” - onde acontece a vida social e, portanto, a justiça – é a manifestação derivada de outro mundo, não relacional, o “mundo da verdade”, das essências, o reino do Bem. Se queremos a justiça, temos de construí-la de acordo com os outros e, portanto, contingentemente.(GHIRALDELLI, 1999. p. 32).

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JUNIOR, G. P. Richard Rorty. A filosofia do novo mundo em busca de novos caminhos. Rio de Janeiro: Vozes, 1999, p, 32.

2 CRÍTICA À METAFÍSICA. POSICIONAMENTOS DE RICHARD RORTY E JÜRGEN HABERMAS.