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CONTEXTUALIZAÇÃO DAS PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS NA REGIÃO DA ÁREA DE ESTUDO

8. ETNO HISTORIA E ARQUEOLOGIA REGIONAL

8.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DAS PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS NA REGIÃO DA ÁREA DE ESTUDO

A região do município de Itaituba é pouco conhecida do ponto de vista arqueológico. No entanto, há informações sobre a existência de sítios arqueológicos na área do rio Tapajós, especialmente nos municípios de Santarém (baixo Tapajós), Aveiro e Itaituba (Médio Tapajós). Em pesquisa no site do IPHAN foram encontrados registros de sítios arqueológicos nesta região, sendo 26 em Itaituba, 11 em Santarém e 4 em Aveiro.

O sítio mais conhecido da região fica no município de Santarém, mas municípios vizinhos também são conhecidos pela ocorrência de extensões sítios de terra preta contendo cerâmica tapajônica. Alguns desses sítios são conhecidos da comunidade científica desde o século XIX, quando se intensificou o povoamento da cidade de Santarém e foram observados a existência de “achados” fortuitos de material arqueológico. A cidade assenta-se sobre um sítio arqueológico que era habitado, até o século XVII, por grupos indígenas conhecidos como “tapajós”, aos quais deram o nome ao rio que banha a cidade.

As primeiras investigações arqueológicas no baixo Amazonas foram realizadas por Barbosa Rodrigues (botânico) e Hartt (geólogo). O botânico Barbosa Rodrigues, em1872, visitou o sambaqui de Taperinha e outras povoações, ao longo do Tapajós, como Alter-do-Chão, Boim, Aveiros, Pinhel, Brasília Legal e Itaituba, até a região das cachoeiras, a fim de fazer registro da vegetação e dos extintos Tapajós. Assim, estes cientistas, que fizeram escavações (não estratigráficas) e coletas de superfície, de Taperinha até Itaituba (cachoeira do Boruré), sugerem a ocupação tapajônica por toda a extensão do rio.

Gomes, a este respeito constata que “em Itaituba, localizada cerca de 371 km ao sul de Santarém, Barbosa Rodrigues encontrou fragmentos de cerâmica de dois tipos, a primeira sem ornamentação e a segunda com motivos geométricos pintados com tinta vermelha, além de um machado de diorito compacto. Mas é na região das cachoeiras, abaixo de Itaituba, que Barbosa Rodrigues faz sua maior

descoberta. Na cachoeira de Apuí e na do Boruré, encontrou as mesmas rochas de que eram feitos os machados e em alguns pontos julga ter visto vários sulcos nas pedras, o que indicaria o local de onde estes artefatos eram polidos. Baseado na cerâmica e também num estudo que fez de dezoito machados provenientes de locais diferentes, desde Taperinha até a cachoeira do Bururé, Barbosa Rodrigues chega à conclusão de que os Tapajó habitavam o Baixo Tapajós, mas com o correr dos anos expandiram-se pela margem direita chegando até a cachoeira do Boruré”.

A partir da evidência descoberta em Piracanã, nas proximidades de Itaituba, Barbosa Rodrigues incorre numa generalização para toda a área, dizendo que os Tapajó usavam igaçabas duplas – compostas de uma panela colocada dentro de um

pote decorado com motivos geométricos – para enterrar seus mortos (GOMES,

2002).

Hartt pesquisou o sambaqui de Taperinha, descrevendo a cerâmica encontrada. Além disso, observou a existência de sítios de terra preta nas chapadas das serras, em decorrência da fertilidade e distância das enchentes. Tal como salienta Gomes (2002), “quando descreve a cerâmica [Hartt], a impressão que se tem é a mais complexa diversidade, ao relatar a ocorrência de exemplares polidos com argila vermelha e sem pintura, gravados com incisões geométricas, ornamentadas com impressão de dedos ou asas representando animais e, finalmente, com a impressão de esteira de folhas de palmeiras. Aliás, esta caracterização é estendida aos vestígios de outras localidades na área em questão, a exemplo de Panema, Itaituba, Diamantina e Ipaupixuna, visitadas tanto por eles quanto por outros pesquisadores”.

Posteriormente, a região de Santarém foi pesquisada várias vezes, entre 1922 e 1926, por Curt Nimuendaju (indigenista vinculado ao MPEG e ao Museu de Gotemburgo, na Suécia), preocupado em mapear as culturas pré-colombianas e coletar artefatos arqueológicos e etnográficos para museus europeus. Nas cartas que escreve para Carlos Estevão de Oliveira, percebe-se seu interesse pelas “pedras verdes”, conferindo todas as informações que obtinha sobre sua ocorrência. Em 1923, o pesquisador visita Vila Franca à procura de destas informações, não

conseguindo, porém, encontrar os muiraquitãs. Em 1924, localiza uma destas pedras, em Oriximiná, e, no mesmo ano, adquire ídolos de pedra verde, em Óbidos. Nimuendaju alertou que a cidade de Santarém foi construída sobre depósitos arqueológicos, ao identificar a terra preta contendo fragmentos de cerâmica. Propôs, assim, que nesta cidade se encontraria o ponto principal de difusão da cultura tapajônica (Amoroso 2001; Nimuendaju 2000).

Nimuendaju identificou, também, 65 sítios arqueológicos na região de Santarém, Vila Franca, Alter do Chão, rio Curuá-Uma e a margem direita do Amazonas (Gomes 2002).

A publicação de Nimuendaju (1949) baseia-se em fontes etnohistóricas e nas observações empíricas por ele assistidas, sobre os Tapajó, a partir dos cronistas Acuña, Betendorf, Heriarte e Laureano de La Cruz. Constatou que, os Tapajó eram numerosos, habitavam a foz do Tapajós, eram exímios ceramistas e guerreiros, além de possuírem organização social baseada em relações hierárquicas.

Posteriormente, foram realizadas pesquisas arqueológicas voltadas para a análise estilística da cerâmica Santarém, baseadas em teorias difusionistas e análises descritivas da cultura material, como são os casos das análises de Palmatary (1939; 1960), Kroeber (1941), Frederico Barata (1950; 1951; 1953a, 1953b, 1954) e Corrêa (1965).

Na década de 1970, destacam-se os trabalhos arqueológicos de Meneses (1971) e MacDonald (1972), os quais fazem inferências sobre o significado da cerâmica Santarém. Meneses, entre os anos de1971 e 1973, realizou um levantamento nos municípios de Santarém e Prainha, como parte dos estudos do

Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas na Bacia Amazônica

(PRONAPABA), localizando 25 sítios arqueológicos (Simões e Araújo-Costa, 1978). Assim como aqueles identificados por Nimuendaju, estes sítios localizam-se em áreas de limite entre a várzea e a terra firme, próximos a lagoas e parecem ter sido contemporâneos, havendo estradas que os ligavam (Prous, 1991).

Em 1973, o geógrafo Nigel Smith identificou um sítio de terra preta com cerca de 2hectares, na rodovia Cuiabá-Santarém, na intersecção com o igarapé Moju, a cerca de125 km ao sul de Santarém (Simões e Araújo-Costa, 1978). Já em 1993, Guapindaia realiza o estudo técnico de uma coleção museológica.

Desde 1987, Anna Roosevelt vem desenvolvendo pesquisas na área de Santarém, principalmente na área do porto da cidade. A partir de 2007, suas pesquisas se realizaram com apoio da Universidade Federal do Pará além de adotar na região novas técnicas analíticas, pautadas nas datações radiocarbônicas e por termoluminescência. “Como exemplo destas técnicas, Roosevelt cita [ainda] a escavação estratigráfica por níveis naturais, os estudos dos padrões de assentamento, as análises cerâmicas com ênfase nos atributos e na iconografia, além de uma séria de métodos de recuperação e processamento de vestígios biológicos (GOMES, 2002).

Em suas pesquisas, Roosevelt constatou que “o meio ambiente tropical não pode ser mais visto como barreira ecológica para o antigo povoamento na Amazônia e nem como fator de decadência de sociedades complexas” (GOMES, 2002).

Assim, os relatos etnohistóricos (utilizados desde os pioneiros), com destaque, aqui, para os da área Tapajós, são importantes fontes para a

compreensão da Etno-história local, todavia, em decorrência de sua “natureza

parcial e fragmentária”, devem ser analisados de forma crítica, associados às interpretações arqueológicas (GOMES, 2002).

Gomes, em 2001, iniciou sua pesquisa na comunidade Parauá, localizada a cerca de120 km ao sul de Santarém, à margem esquerda do rio Tapajós, com o projeto “Dinâmica populacional das ocupações barrancóides no baixo Tapajós”. Um de seus objetivos era o de verificar a extensão da ocupação relacionada à sociedade dos Tapajós e melhor entender como áreas periféricas se relacionavam àquela sociedade (GOMES 2002).

Partindo dos relatos de Nimuendaju de que os tapajós ocupavam a margem direita dorio Tapajós, Denise Gomes queria saber se a ocupação estendia-se

também para a margem esquerda do rio. De maneira contrária às suas expectativas (e provavelmente às de Roosevelt), Gomes identificou (nos nove dos 10 sítios pesquisados, em uma área de 40 km²) cerâmica associada à Tradição Borda Incisa (definida por Meggers e Evans, 1961). Sendo estes sítios datados entre 3800 e 1000 anos AP, representam ocupações horticultoras que se estenderam até o início da ocupação Santarém, convivendo com ela por curto período de tempo (SCHAAN, 2009; GOMES, 2002).

Atualmente, encontra-se em curso um projeto de levantamento de sítios arqueológicos ao sul da cidade de Santarém, ao longo da BR-163, na região do platô de Belterra. Este levantamento é coordenado pela arqueóloga Denise Schaan, parcialmente financiado pelo DNIT, como parte do Programa de Arqueologia Preventiva da BR-163.

Além disto, partir de 2008, a Universidade Federal do Pará (UFPA) tem realizado trabalhos de prospecção e escavação em sítios arqueológicos localizados ao longo das rodovias BR-163 e BR-230. Assim, no trecho da BR-230 entre Miritituba e Rurópolis foram identificados 26 sítios arqueológicos (SCHAAN, 2009; SCHAAN & SANTOS, 2009).

Junto à margem esquerda do rio Tapajós, próximo ao município de Itaituba, foi identificado sítio com sepultamentos em urnas, que atualmente vem sendo escavado pela equipe de arqueologia da UFPA.

Próximo a região, a Inside Consultoria cientifica também esta desenvolvendo um projeto de arqueologia na área de influência do Projeto Volta Grande localizado na margem direita do rio Xingu, município de Senador José Porfírio, na região conhecida como “Volta Grande do Xingu”. O potencial arqueológico da área foi demonstrado, sobretudo, pelo levantamento em campo, que resultou na identificação de uma ocorrência e nove sítios arqueológicos pré-coloniais (Barbosa & Silva, 2011).

O potencial arqueológico das áreas de influencia do Projeto Tocantinzinho foi demonstrado pelas pesquisas iniciais realizadas pela Inside Consultoria em 2009

e 2011, quando foram realizados os diagnósticos preliminares do patrimônio arqueológico do Site e da estrada de acesso do projeto (FERREIRA & SILVA, 2009; BARBOSA & SILVA, 2011).

O levantamento de dados secundários, que resultou na contextualização etno-histórica, etnográfica e arqueológica da área da pesquisa, indicou ter sido, a área de abrangência do projeto, ocupada por populações indígenas. O potencial arqueológico da área foi demonstrado, sobretudo, pelo levantamento em campo, que resultou na identificação de sítios arqueológicos pré-coloniais. De um modo geral, correspondem a sítios habitação lito-cerâmicos a céu aberto implantados também em áreas de afloramentos rochosos situadas na direita do rio Tocantins (FERREIRA & SILVA, 2009).

Os sítios arqueológicos podem ser impactados pelas atividades do Projeto Tocantinzinho. O Projeto visa à realização de pesquisas minerais, que comprovem a viabilização do aproveitamento econômico do depósito mineral de ouro da reserva garimpeira do Tapajós. As atividades minerais que serão realizadas na região causarão profundos impactos no solo, tanto na superfície como em sub-superfície. Uma quantidade muito grande de solo será removida para a verificação da existência de ouro e outros minerais. Esta retirada poderá causar danos irreversíveis para o patrimônio arqueológico (FERREIRA & SILVA, 2009).

O patrimônio arqueológico também será afetado com a construção da infraestrutura do projeto, como acampamentos, casas, galpões, estradas, diques, mina para retirada de minério, etc. Antes da construção destas estruturas deverão ser realizados estudos arqueológicos para a identificação e preservação do patrimônio, já que diversos sítios serão destruídos e/ou afetados pela prática da mineração (FERREIRA & SILVA, 2009).

A região do rio Tapajós apresenta, portanto, um grande potencial arqueológico, em que os diversos compartimentos ambientais da região foram utilizados por grupos humanos dos períodos formativo e da pré-história recente. Foram registrados sítios em áreas de várzea, nos limites entre várzea e terra firme,

nos platôs, no topo de serras, etc. Assim, a ocupação destes diferentes locais possui significados tanto cultural como cronológico ou político, a ser mais bem investigado, fator que reforça a necessidade de mais pesquisas arqueológicas na região.

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