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Continuidade de Cuidados em Cuidados Críticos

1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1.3. Continuidade de Cuidados em Cuidados Críticos

O Projeto elaborado centrou-se na pessoa adulta grande queimada em situação crítica, que sofre portanto, uma alteração aguda, interrompendo, de forma grave, o seu modo normal de vida, pois, frequentemente “existe pouco tempo para a adaptação para a alteração do estado de saúde ao estado de doença” (Roper, Logan & Tierney, 1995, p. 8). Ainda segundo as autoras, a pessoa exige do profissional de Enfermagem que o ajude a adaptar-se à situação; dão valor não ao que é feito mas sim ao “como é feito”. A pessoa vítima de queimaduras constitui-se um desafio difícil para os profissionais de saúde. Além da gravidade da lesão, há o desconforto do doente, o seu sofrimento e o dos seus familiares e a incerteza sobre o futuro (BBA, 2012).

Também Pinto, Montinho & Gonçalves (2010) abordam esta aspeto quando referem que as queimaduras levam a alterações no sistema familiar e provocam desorganização, exigindo à família uma nova reestruturação de forma a encontrar novas funcionalidades. Segundo os mesmos, e ao ser colocado em causa o equilíbrio familiar, a família é obrigada a movimentos de reorganização.

Cabe ao Enfermeiro ser facilitador deste processo de adaptação da pessoa e família à situação traduzindo e seguindo na sua prática uma abordagem de cuidados centrados na pessoa doente e respetiva família assegurando a continuidade dos cuidados. Segundo o Institute for Patient – and family – Centered Care (2009), os cuidados centrados no doente e família constituem “uma abordagem inovadora para o planeamento, execução e avaliação dos cuidados de saúde que se baseia em parcerias mutuamente benéficas entre a pessoa em situação de doença, famílias e prestadores de cuidados”. Hobbs & Sodomka (2000) citados por Guion, Mishoe, Passmore & Witter (2010), acrescentam que os profissionais que apoiam este conceito compreendem e realizam os princípios essenciais de dignidade e respeito da informação, partilha, participação e colaboração. Estes acabam por capacitar as famílias e, por outro lado, levam a uma mudança de pensamento dos profissionais de saúde passando da interiorização do conceito de estarem a servir os doentes para a interiorização do conceito de parceria com os doentes.

O College & Association of Registered Nurses of Alberta (2008) refere que o conceito “Continuidade de cuidados” como um conceito distinto mantém-se

indefinido na literatura embora outros termos tais como “coordenação do cuidado”, “gestão de processo” e “planeamento da alta” sejam, muitas vezes, usados como sinónimos.

Ainda segundo a mesma associação, hoje em dia existe uma compreensão partilhada de que a continuidade de cuidados é definida por dois elementos fundamentais: cuidados ao longo do tempo - passado, presente e futuro; e um foco nas necessidades individuais de saúde do cliente e no seu contexto pessoal indo de encontro ao defendido por Roper, Logan & Tierney (1996).

A continuidade do cuidado é muitas vezes vista como um resultado do cuidado experienciado pelo cliente através do continuum de cuidados, enquanto gestão de processo e coordenação do cuidado são considerados abordagens ou modelos usados para obter a continuidade de cuidados.

A investigação aponta para diferentes tipos de continuidade: informativa, de gestão e relacional/interpessoal11. A ênfase no tipo de continuidade depende do tipo e da definição de cuidados. Haggerty et al (2003); Holland & Harris (2007) & Cameron et al (2006) citados pelo College & Association of Registered Nurses of Alberta (2008), caracterizam-nos da seguinte forma: a) Continuidade informacional refere-se à transferência eficiente e eficaz da informação e conhecimento acumulado do cliente a fim de estabelecer pontes entre eventos de cuidados separados e assegurar que o cuidado atual é apropriado para a pessoa doente, à medida que eles se movem de uma configuração do cuidado para outro; b) continuidade de gestão refere-se a uma abordagem consistente e coerente para a provisão do serviço (protocolos de atendimento, planos de gestão partilhada, etc) para assegurar que os cuidados dos vários profissionais estão ligados, ordenados, são complementares e realizados em tempo útil; c) continuidade relacional ou interpessoal refere-se a um relacionamento terapêutico contínuo entre o profissional e o cliente que liga os cuidados passados aos atuais e aos futuros.

Payne, Hardey & Coleman (2000) abordam esta temática nesse sentido: a da importância da comunicação entre enfermeiros, destes com os médicos e outros profissionais de saúde, bem como dos enfermeiros com o doente e seus

familiares/pessoas de referência como forma de assegurar a continuidade de cuidados. Acrescentam que a transferência de informação ocorre formalmente através dos registos de enfermagem e passagens de ocorrências verbalmente bem como, informalmente, durante as atividades de Enfermagem.

Carna (2008), citada por College & Association of Registered Nurses of Alberta (2008) refere que a falta de pessoal, o aumento da carga de trabalho e da complexidade dos cuidados aos clientes e as situações onde os profissionais têm pouca experiência constituem-se como desafios para atingir esta continuidade de cuidados através do continuum de cuidados.

Lee et al (2006), Reid et al (2002), Rosser & Schultz (2007) & van Servellen et al (2006) citados pelo College & Association of Registered Nurses of Alberta (2008) referem que “a investigação tem demonstrado que a continuidade de cuidados está associada ao melhor acesso ao cuidado, a uma melhor adesão ao rastreio e tratamento prescrito, ao reconhecimento de problemas não identificados, a melhores outcomes ao nível da vacinação, à redução do número de hospitalizações, ao menor uso de salas de emergência, ao aumento da satisfação do cliente e a uma redução geral de custos”, sendo que o papel do enfermeiro é visto como parte integrante da continuidade dos cuidados.

McFetridge, Gillespie, Goode & Melby (2007) também reconhecem a importância da continuidade de cuidados, pois a ausência de uma estruturada e lógica transição de informação entre serviços pode levar a uma fragmentação no atendimento à pessoa em situação de doença e a incidentes críticos ou omissões nos cuidados a serem prestados. Estes autores referem ainda que afim de assegurar a prestação de cuidados efetiva e holística a partir do momento em que foram iniciados, existe a necessidade de uma comunicação verbal, não verbal e escrita entre os enfermeiros dos diferentes departamentos. Só através do trabalho colaborativo entre as equipas de enfermagem dos diferentes serviços a continuidade de cuidados está assegurada. Este trabalho bidirecional permite melhorar, ainda mais, a compreensão dos papéis de cada um assim como as respetivas expetativas. Indo de encontro ao explanado por McFetridge et al (2007) no que concerne aos riscos da ausência de uma estruturada e lógica transição de informação entre serviços, também a Ordem dos Médicos e SPCI (2008), no guia de recomendações

de transporte do doente crítico, refere que um dos erros mais comuns é a ausência de registos. Recomendam algumas medidas preventivas de complicações que passam por: a) passagem formal à equipa de transporte dos dados clínicos do doente; b) Entrega de toda a documentação e registos no hospital de destino; c) “devem ser efetuadas, ao longo do transporte, os registos, com intervalos adequados, da situação clínica do doente, nomeadamente todas as alterações ou terapêuticas administradas”.

Após a decisão de se efetivar o transporte, quer ele seja primário ou secundário, existe a necessidade de um planeamento e efetivação que contemple todos os aspetos por forma a assegurar a continuidade de cuidados.

A continuidade de cuidados constitui-se como um elemento fundamental para garantir a qualidade. Até porque, a sua ausência, pode colocar em causa a eficácia e eficiência dos cuidados (Al-Azri, 2008).