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Continuidades e mudanças nos métodos de pesquisa

Embora já exista um extenso trabalho de catalogação e organização do arquivo do Núcleo DOCOMOMO-BAHIA, é necessário que todo seu conteúdo se torne totalmente acessível através da sua digitalização. Além disso, é importante que se complete a maior parte das fichas mínimas do arquivo para que possam ser inseridas e consultadas no site do núcleo. Provavelmente seja necessário complementar as informações existentes através da pesquisa em arquivos.

Também é relevante realizar uma expansão do acervo. Para isso, devem ser estabelecidos outros procedimentos para que os edifícios que não tenham aportado mudanças muito importantes, mas que marcam pro- fundamente o contexto urbano, possam ser detectados, caracterizados e interpretados. Os meandros da cidade modernista precisam ser mais bem explorados para possibilitar a incorporação de arquiteturas consideradas menos influentes, mas que, nem por isso, deixam de caracterizar Salvador.

Com o intuito de realizar tal exploração, o Núcleo DOCOMOMO- BAHIA iniciou um inventário da cidade moderna. A pesquisa inclui, em um primeiro momento, todas as edificações com características moder- nas encontradas – incluindo as edificações ecléticas. Em um segundo momento, selecionam-se os edifícios considerados mais significativos para que se possa aprofundar a pesquisa sobre eles. A delimitação espacial

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de tal inventário corresponde com a área de expansão da cidade em mea- dos do século XX, envolvendo tanto os bairros mais centrais como aque- les periféricos, procurando, assim, o maior alcance possível2.

As bases para a formulação do inventário são outros dois docu- mentos de mesma natureza: o Inventário Geral do Patrimônio Ambiental e Cultural da Prefeitura de São Paulo (IGEPAC-PMSP) e o Formas de Análisis e Intervención en el Património Construído (FAIPAC-UPC). Em tais inventários realiza-se uma breve caracterização dos edifícios, dos seus usos atuais e originais e dos seus estados de conservação. Também são inseridos documentos gráficos para identificação das construções. Desta forma, parte-se de um exame das características materiais dessas edificações, instrumento fundamental para a documentação e preservação das arquiteturas modernas soteropolitanas.

Foi realizada uma primeira etapa do inventário em dois bairros da cidade, Barris e Nazaré.3 Com os inventários notou-se que as arquiteturas

desses bairros estão consideravelmente conservadas, entretanto, há deter- minadas circunstâncias que as estão afetando e introduzindo mudanças que causam descaracterização. Em ambos os bairros, nota-se que os edi- fícios adotam as diferentes facetas da arquitetura moderna. Há poucos edifícios com soluções mais impactantes que aportem soluções estéticas, sociais ou técnicas específicas Mas há assimilação e mutação das soluções arquitetônicas dominantes. Também é possível observar, nesses bairros, a persistente existência de ruas possuidoras de conjuntos arquitetônicos coesos que mostram como se dão as conformações urbanas características do século XX.

O bairro dos Barris possui uma parte que está mais transformada e outra que mantém, em grande medida, suas características iniciais. Trata-se de um bairro predominantemente residencial, mas que está se tornando comercial, com a presença de equipamentos que têm alterado

2 Embora o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico da Bahia (IPAC-BA) tenha realizado um importante inventário da arquitetura soteropolitana nos anos 1970, esse documento concentra-se nas produções arquitetônicas anteriores ao modernismo, e apresenta, princi- palmente, aquelas manifestações mais monumentais.

3 A primeira parte do “Inventário do Patrimônio Arquitetônico e Urbano da Modernização Soteropolitana”, relizada entre 2012-2013, contou com a participação dos seguintes bol- sistas de Iniciação Científica, vinculados ao PIBIC/CNPq/UFBA: Anna Luiza Nunes, Luis Guilherme Pires e Maiara Gastar. Também contou com a participação da bolsista do Programa Permanecer, Moema Sales.

sua dinâmica e provocado a transformação dos edifícios: a Biblioteca Pública dos Barris (projeto de Rodrigo Pontual, Henrique Alvarez e Ulrico Luercher, realizado em 1968) e dois centros comerciais. Ainda assim, há uma preservação das suas principais marcas arquitetônicas e urbanas, mantendo soluções características da primeira metade do século XX.

Existe um importante conjunto de casas que incorpora os dife- rentes aspectos da arquitetura moderna, com a presença de casas neo- coloniais, mas com maior destaque para casas com traços de art déco. É possível perceber, também, a presença de edifícios residenciais com essas características.

A presença da Praça Almirante Coelho Neto tem uma implantação singular que dá uma ambiência marcante para várias construções, como as apresentadas a seguir:

Figura 12 – Casa situada na Praça Almirante Coelho Neto, esquina com a Rua Comendador Gomes

da Costa, 116. Fonte: Moema Medeiros, 2012. Figura 13 – Escola Estadual Magalhães Neto (antiga Escola G. Calmon) na Praça Alm. Coelho Neto, s;/n. Fonte: Moema Sales, 2012.

Figura 14 – Casa na Rua General Labatut, 03. Fonte: Moema Medeiros, 2012. Figura 15 – Casa na Rua Teodoro Sampaio, s/n. Fonte: Ana Carolina Bierrenbach, 2011.

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Figura 16 – Edifício Lamarc, situado na Rua Junqueira Ayres, 46. Fonte: Moema Medeiros, 2012. Figura 17 – Edifício Barris, situado na Rua General Labatut, 05. Fonte: Moema Medeiros, 2013.

O bairro de Nazaré é muito extenso e a pesquisa limitou-se às partes mais próximas da Arena Fonte Nova, o estádio construído para a copa do mundo em Salvador. O bairro ainda mantém muitas das suas características preservadas, no entanto, deve-se acompanhar o desenrolar da situação dos edifícios com a presença desse equipamento. Nota-se que a presença de um equipamento de grande porte pode acelerar a transformação de certas partes da cidade, como parece ter sido o caso do Hospital Martagão Gesteira, em Nazaré. Na rua onde esse edifício está localizado, observa-se a mudança de usos e importantes transformações nas características das construções. Mesmo assim, pode-se dizer que se trata de um bairro bastante conservado. Há uma correla- ção entre a sua conformação urbana e as suas características arquitetônicas. Nas ruas Boulevard América e Boulard Suiço, loteadas nos anos 1930, seguindo padrões das cidades-jardins, existem, predominantemente, residências do estilo art déco, neocoloniais ou pitorescas. No Jardim Baiano, loteado nos anos 1950, há maior presença de arquitetura modernista de caráter funcionalista.

Figura 18 – Casas situadas na Rua Boulevard América. Fonte: Anna Luiza Nunes e Luis Guilherme

Pires, 2012. Figura 19 – Casas situadas na Rua Arquimédes Gonçalves. Fonte: Anna Luiza Nunes e Luis Guilherme Pires, 2012.

Enquanto exemplares mais relevantes há dois edifícios com solu- ções modernistas funcionalistas:

Figura 20 – Edificio “Jardim Baiano”, situado na Rua Arquimédes Gonçalves, 153. Fonte: Anna

Luiza Nunes e Luis Guilherme Pires, 2012. Figura 21 – Hospital “Martagão Gesteria”, situado na Rua José Duarte, s/n. Fonte: Anna Luiza Nunes e Luis Guilherme Pires, 2012.

Considera-se que a continuação dessa pesquisa de campo é neces- sária, mas não suficiente. Deve-se aprofundar a pesquisa em arquivos já consultados – como o Arquivo Público do Estado da Bahia, o Arquivo Municipal (Fundação Gregório de Mattos), o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia ou a Biblioteca Pública do Estado da Bahia. Precisam ser consultados outros arquivos que possam propiciar acesso a informa- ções diferenciadas – como no caso do CEAS (Centro de Arquivo e Ação Social) ou nos arquivos da Obra Social de Irmã Dulce, entre outros.

Uma pesquisa em periódicos especializados já foi realizada, con- tudo, deve ser, também, ampliada. O núcleo DOCOMOMO-BAHIA efe- tuou uma pesquisa em um jornal de grande circulação – “A tarde” – e essa pesquisa já foi ampliada para o “Diário de notícias”. Considera-se fundamental a inclusão de outras fontes que possibilitem a apresentação de compreensões diferenciadas da cidade moderna. Para tanto, é possível contar com livros, filmes e músicas que tenham essa cidade como pano de fundo.

A pesquisa no jornal “Diário de notícias”4 foi feita com a intenção

de incorporar as diferentes facetas das manifestações arquitetônicas e da conformação da cidade moderna. O interesse foi adicionar tanto aquelas notícias sobre os edifícios mais influentes quanto os mais corriqueiros, ou

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aqueles que estão sendo superados durante a etapa examinada. Também se procurou acrescentar notícias sobre as transformações que acontecem em Salvador objetivando colher informações sobre a cidade que a moder- nização pretende afirmar e aquela que pretende superar.

Com essa pesquisa foi possível ter uma maior acesso sobre as arqui- teturas e a cidade moderna, em suas múltiplas e complexas facetas, que devem ser ampliadas e interpretadas devidamente. Tome-se como exem- plo a situação do bairro da Liberdade, um local periférico da cidade. Nas consultas ao “Diário de notícias”, percebe-se a intenção de inclusão de equipamentos públicos e privados no bairro, com a intenção de fazer com que a população do local se insira minimamente nos padrões de uma cidade civilizada. Mas, embora isso aconteça e o bairro se transforme de forma contundente, pode-se perceber que certos modos de construção e de apropriação do bairro ainda perduram na atualidade.

Figura 22 – Escola Duque de Caxias. Fonte: Ana Carolina Bierrenbach, 2013. Figura 23 – Cine-Liberdade. Fonte: Ana Carolina Bierrenbach, 2013.

Também devem ser realizadas mais pesquisas sobre os arquitetos modernistas atuantes em Salvador durante o século XX. Há poucos traba- lhos sobre o arquiteto modernista soteropolitano mais notório, Diógenes Rebouças5, e sobre outros importantes arquitetos e engenheiros, como

Arézio Fonseca, Ary Penna Costa, Carlos Costa Pinto, Emanuel Berbert,

5 Sobre Diógenes Rebouças, ver: NASCIMENTO, Valdinei. Salvador na rota da modernidade. Salvador: Mestrado em Arquitetura e Urbanismo, 1998. ANDRADE, Nivaldo. Arquitetura

Paulo Ormindo Azevedo, Pasqualino Magnavita6 etc. Outros arquitetos

que se estabelecem em Salvador também têm sido pouco estudados. É o caso de Fernando Frank, Lev Smarcevski, Yoshiakira Katsuki7, etc. Faz-se

necessário, ainda, um aprofundamento de pesquisa sobre a atuação de arquitetos que não se fixaram na cidade, como Alexander Buddeus, Freire e Sodré, Hélio Duarte, Paulo Antunes Ribeiro, Roberto Capello, etc. Há outros que não apresentam indícios sobre sua relação com a cidade e são menos conhecidos: Carlos Porto, Luiz Arantes, Manso Cabral, Rodolfo Staffa etc.

Outro campo de pesquisa a ser mais explorado é a presença das construtoras na cidade. Existem várias atuantes e é importante ter acesso aos seus arquivos para que se possa complementar informações e ampliar possibilidades de interpretação sobre a arquitetura modernista sotero- politana. As construtoras mais presentes em Salvador são a Christiane Nielsen, a Construtora Odebrecht, a Construtora Nacional, a Construtora Comercial e Industrial do Brasil, a Construtora Imobiliária de Construção, a Construtora Soares & Leoni, a Construtora E.Kemmnit, Severo e Villares etc.

Com a ampliação dos métodos de pesquisa propostos, pretende-se incluir no arquivo tanto outras edificações modernas que são conforma- doras da cidade modernista, como também, propiciar aos pesquisadores e profissionais informações sobre as suas características materiais e ima- teriais. A pesquisa deve possibilitar que se conserve a história da arquite- tura moderna soteropolitana e, simultaneamente, propiciar instrumentos que auxiliem na preservação das suas características históricas e estéticas. Embora o núcleo já tenha realizado uma extensa pesquisa, há muito trabalho pela frente e trata-se de uma tarefa urgente, uma vez que a cidade continua no mesmo processo de substituição do velho pelo novo de forma mais acentuada do que antes.

6 Sobre Pasqualino Magnavita, ver: MAGNAVITA, Pasqualino. “Transcrição da palestra do arquiteto Pasqualino Romano Magnavita”. In: BIERRENBACH, Ana Carolina; GALVÃO, Anna Beatriz; NERY, Juliana. Cadernos do PPGAU-FAUFBA. Salvador, PPGAU, 2009. 165-188.

7 Sobre Yoshiakira Katsuki, ver: GARCIA, Cione. A obra de Yoshiakira Katsuki. Dissertação de mestrado. Salvador, PPGAU, 2002.

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Referências

BENJAMIN, Walter. Magia, técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994. BIERRENBACH, Ana C; GALVÃO, Anna B; NERY, Juliana. Cadernos do PPGAU

-Desafios da preservação – referências da arquitetura e do urbanismo modernos no Norte e Nordeste. Salvador, PPGAU/FAUFBA, 2009.

BIERRENBACH, Ana C. Fluxos e influxos: arquiteturas modernas, modernização e modernidade em Salvador na primeira metade do século XX. Arquitextos 139.02, Dezembro de 2011. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br>.

DIEGOLI, Leila (Org.). Inventário Geral do patrimônio ambiental e cultural:

metodologia – Cadernos do IGEPAC-SP – 1. São Paulo: PMSP. DPH, 1986.

GAGNEBIN, Jeanne Marie. História e narração em Walter Benjamin. São Paulo: Perspectiva, 1994. 131p.

Casas de Mario Di Lascio nos