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4 O ESPAÇO ESCOLAR NA PROTEÇÃO INTEGRAL E O RELATO DA EXPERIÊNCIA

4.2 A CONTRIBUIÇÃO DA INTERVENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NA DISCUSSÃO DO ECA

EDUCAÇÃO INFANTIL DO MUNICÍPIO DE PALHOÇA

É de extrema importância que todos os profissionais que atuam diretamente na área da infância e juventude conheçam o Estatuto da Criança e do Adolescente, configura-se como elo entre educação, comunidade, saúde, conselhos comunitários e conselhos tutelares.

A falta de conhecimento da sociedade em geral e das escolas sobre os caminhos legais para encaminhamentos de situações envolvendo crianças e adolescentes foi o que motivou o desenvolvimento da intervenção com o grupo de professores acima citados.

A partir do estágio curricular obrigatório realizado no Escritório Modelo de Advocacia (EMA), foi elaborada uma proposta para execução do projeto de intervenção com o objetivo de capacitar professores da Rede municipal de Palhoça sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. A execução do projeto aconteceu nos meses de outubro e novembro de 2008, no espaço físico da Unisul, na Ponte do Imaruí em Palhoça. Participaram da capacitação 16 professoras da Rede municipal de educação infantil do município de Palhoça/SC. Os encontros foram realizados quinzenalmente. Sinaliza-se aqui que todas as professoras eram do sexo feminino. As creches/escolas escolhidas encontram-se nas proximidades da Unisul, facilitando assim a participação e a viabilidade da execução do trabalho.

Durante os encontros observou-se que as professoras participaram ativamente das discussões sobre a importância do conhecimento do Estatuto da Criança e do Adolescente e a importância das garantias desses direitos fundamentais e previstos na Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990.

No primeiro encontro foi abordada a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente com debates. Inicialmente, realizaram-se: a) uma dinâmica de grupo para apresentação das participantes, as 16 professoras das creches/escolas das proximidades da universidade; e b) a apresentação da conselheira tutelar e palestrante do município de Florianópolis, Cristina Valerim (Figura 1), que veio para falar sobre o Conselho Tutelar e suas atribuições. “Em cada Município haverá, no mínimo, um Conselho Tutelar de cinco membros escolhidos pela comunidade local para mandato de 03 anos, permitida uma recondução” (ECA, 1990, art. 13). A palestrante abordou que o Conselho Tutelar é um órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente definidos nesta Lei (ECA, 1990, art. 131). Para a utilização plena do potencial transformador do Conselho Tutelar, é imprescindível que o conselheiro, o canditado a conselheiro e todos os cidadãos conheçam bem sua organização: características básicas, atribuições legais e competências. Uma vez criado o Conselho Tutelar, renovam-se os seus membros. Foi discutido pela palestrante e pela comunidade escolar que o Conselho Tutelar pode exercer o papel e as funções do Poder Judiciário, na apreciação e no julgamento dos conflitos de interesse; o Conselho Tutelar deve encaminhar ao Ministério Público notícias de fato que constituam infração administrativa ou penal contra crianças e

adolescentes, conforme está na Lei; deve ainda fiscalizar os abrigos inscritos no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).

As atribuições do Conselho Tutelar consistem em aplicar medidas para garantir o cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, e o Conselho deve agir para tentar cumpri-las: zelar pelos direitos; garantir absoluta prioridade na efetivação de direitos; orientar a construção da política municipal de atendimentos. Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), cap. IV, do direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer:

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – direito de ser respeitado por seus educadores;

III – direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores;

IV – direito de organização e participação em entidades estudantis; V – acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.

Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.

Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:

I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;

II – progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador;

VII – atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.

§ 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela freqüência à escola. Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.

Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de:

I – maus-tratos envolvendo seus alunos;

II – reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares;

III – elevados níveis de repetência.

Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiências e novas propostas relativas a calendário, seriação, currículo, metodologia, didática e avaliação, com vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos do ensino fundamental obrigatório.

Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.

Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da União, estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.

Figura 1 − Capacitação sobre Conselho Tutelar

No segundo encontro foram abordados os temas de violência sexual, violência psicológica, negligência em geral e suas principais consequências. Teve a participação do Programa Sentinela do município de Florianópolis, que trouxe suas experiências, dando uma visão mais ampla e um conhecimento teórico, focando na troca de experiências com a comunidade escolar presente e realizando um debate multiplicativo. As principais dúvidas foram trazidas pelas próprias professoras das creches/escolas. Falar de violência sexual não é uma tarefa fácil, é um tema que preocupa os profissionais que trabalham na área. A sexualidade ainda está carregada de crendices, preconceitos e dúvidas. O profissional precisa ter muito cuidado de não passar a ideia de que qualquer carícia entre pais e filhos está envolta de sexualidade abusiva.

De acordo com Azevedo e Guerra (1985), sexualidade abusiva é todo ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual entre um ou mais adultos e uma criança menor de 18 anos, tendo por finalidade estimular sexualmente a criança ou utilizá-la para obter uma estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa.

Outro informe bem importante que o Programa Sentinela deu diz respeito às pistas que os profissionais das creches/escolas podem obter caso tenham algum indício na sua sala ou com qualquer criança ou adolescente com quem trabalhem. Nesse caso, os profissionais devem comunicar a direção da escola, que enviará um relatório para o Conselho Tutelar tomar

as devidas providências cabíveis. Algumas professoras elencaram os seguintes comportamentos: dificuldade de caminhar, infrações urinárias fortes, baixo controle dos esfíncteres, odor vaginal ou anal, entre outros indicadores e comportamentos das crianças e dos adolescentes.

Outra forma de violência e a mais comum é a violência psicológica, uma das formas mais praticadas contra as crianças e os adolescentes que vem ferir os seus direitos. Por outro lado, é a mais difícil de ser detectada pelos profissionais da área, pelo seu aspecto subjetivo e por não deixar marcas no corpo.

Figura 2 − Capacitação sobre a violência e a negligência em geral

No terceiro e último encontro, solucionamos algumas dúvidas pendentes por meio de debates sobre os casos ocorridos nas crehes/escolas, foram feitas avaliações escolares e discutido o Estatuto da Criança e do Adolescente. Em virtude de todos serem livres e iguais em dignidade e direitos, a creche/escola tem o dever de comunicar todos os casos de violência ou negligência para as autoridades competentes de sua comarca. Os professores, pais e alunos, comprometidos e envolvidos no processo de ensino/aprendizagem, devem participar da elaboração dos procedimentos, métodos e instrumentos avaliativos, atendendo ao estabelecido no ECA em seu artigo único 53: é direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico bem como participar da definição das propostas educacionais das creches/escolas em que seus pupilos estão inseridos. Para finalizarmos essa capacitação, que foi transmitida pela estagiária e acadêmica de Serviço Social da Unisul, autora deste trabalho, é importante ressaltar que, para falar em proteção integral às crianças e aos adolescentes no espaço escolar, faz-se necessário considerar que alguns aspectos do contexto socioeconômico (estrutural) e familiar interferem direta ou indiretamente no processo educacional.

A partir das capacitações, pôde-se observar que foi um trabalho de grande importância para o EMA, que poderá dar-lhe continuidade com outros acadêmicos do Serviço Social ou de áreas afins. O trabalho acabou superando as expectativas, segundo as avaliações realizadas e apresentadas neste Trabalho de Conclusão de Curso, feitas no final das capacitações com os professores que estavam presentes.

Quanto aos objetivos da capacitação, todos eles foram atingidos, conforme avaliação de 100% das participantes.

Objetivo da capacitação atingido

100% 0% 0% Sim Em par t es Não

Gráfico 1 – Objetivo da capacitação

Em relação à capacitação, agregaram-se conhecimentos sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, todas as professoras informaram que sim, que novos conhecimentos foram agregados.

Possibilitou agregar conhecim ento sobre o tem a

100% 0% 0% Sim Em partes Não

Gráfico 2 – Conhecimento sobre o tema

Fonte: Elaborado pelas autoras, 2009.

Quanto à duração e metodologia da capacitação, 100% das participantes avaliaram que foi suficiente, bem como a comunicação foi clara por parte da facilitadora da capacitação e das convidadas dos encontros.

Em relação à carga horária total da capacitação, 90% das professoras avaliaram que foi suficiente.

Carga horária total atendeu as necessidades

90% 10% 0%

Sim Em partes Não

Gráfico 3 – Carga horária total da capacitação

Fonte: Elaborado pelas autoras, 2009.

Quanto ao cumprimento dos horários (início e fim) dos encontros, 60% das professoras avaliaram que foram cumpridos e 40%, que foram cumpridos em parte. Em relação à divulgação prévia dos encontros, apareceu o mesmo percentual do cumprimento de horários, ou seja, 60% informaram que houve a informação prévia, bem como 40%

informaram que houve em partes. É importante sinalizar que as datas dos encontros foram informadas à Secretaria de Educação do município.

Houve participação de 70% das participantes nos debates e nas reflexões, e 30% em partes, o que é natural, porque algumas participam mais do que outras nos debates, até em função do próprio conhecimento do assunto.

Participação do grupo no debate

70% 30% 0% Sim Em partes Não

Gráfico 4 – Participação nos debates

Fonte: Elaborado pelas autoras, 2009.

Para concluirmos as participações e darmos um fechamento geral de todo o conteúdo e suas abordagens, é importante destacar que as professoras das creches/escolas criticaram a atuação do Conselho Tutelar de seu município, que, segundo elas, não vem dando respaldo diante das situações em que é acionado, pois a grande maioria manifestou a dificuldade na relação com esse órgão, que é de grande importância, junto com a participação das creches/escolas, nos casos de suspeita ou violência em geral.

As professoras sugeriram também uma equipe de profissionais como Assistente Social, Pedagogo e Psicólogo para assessorar os conselheiros, visto que a maioria não tem formação acadêmica para um melhor encaminhamento às instituições. Considera-se fundamental o contato com a comunidade escolar, pois se pensa na desmistificação dos preconceitos existentes em nossa sociedade em geral em relação à criança e ao adolescente. Pôde-se perceber que quase nenhum profissional das creches/escolas sabia dos direitos fundamentais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.

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