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As teorias psicanalíticas sobre a adolescência, desde Freud até às contribuições mais recentes, porque de natureza essencialmente clínica, permitem uma compreensão extremamente rica do processo de autonomia adolescente. Dentro delas mostram-se particularmente pertinentes para o nosso trabalho as contribuições que, numa linha de desenvolvimento, dis- cutem o problema da autonomia no contexto do processo de individuação e

Em recente trabalho de revisão sobre a "individuação adolescente" Steinwand (1984) afirma que o conceito de individuação fornece um meio coerente de conceptualizar e de integrar vários aspectos do desenvol- vimento adolescente relativos à autonomia.

0 lugar que este conceito tem ocupado na reflexão psicanalítica sobre a autonomia, e a importância que nós próprios lhe atribuímos no nosso trabalho, merece que relembremos algumas noções:

- A contribuição de Mahler e colaboradores insere-se, dentro do campo analítico, na teoria das relações de objecto.

- Mahler descreve o processo de separação-individuação durante a primeira infância na base de dois conjuntos de desenvolvimentos com- plementares e interdependentes: a separação, que diz respeito à "emergência da criança fora da fusão "simbiótica com a mãe" e a

individuação, que diz respeito "às realizações que marcam a assunção

pela criança das suas próprias características individuais" (Mahler et ai., 1975, p. 16). Duas mudanças básicas operam neste modelo: a mudança comportamental e a representacional.

0 grau e a flexibilidade com que a criança realiza uma actividade comportamental independente remete para uma mudança comportamental; o grau e a estabilidade da diferenciação entre o self e as representações objectais remete para uma mudança representacional, ambas se influen- ciando mutuamente.

- A individuação é um processo que "não conhece fim e permanece sempre activo" (Mahler et ai., 1975, p. 15) e a sua conceptualização tem vindo a ser alargada, quer por autores de orientações psicodinâmica, quer interaccional. Dentro desta última orientação, Karpel (1976) define-o como sendo um "processo através do qual a pessoa se torna cada

vez mais diferenciada dum. contexto passado e presente. Este processo compreende uma'multitude de mudanças intrapsiquicas e interpessoais que partilham uma direcção comum" (op cit., p. 66).

- 0 processo de individuação ocorre portanto ao longo de todo o ciclo de vida e conhece ocorrências desenvolvimentais nodais distintas ao longo do ciclo vital de que se conhecem algumas: diferenciação ini- cial entre self e objecto, estabelecimento da constância do objecto, diferenciação do self e mudança nas representações objectais.

0 processo de individuação, que se inicia na primeira infância, caracteriza-se nesse periodo por um alto grau de ligação à família (e sobretudo à mãe) e um baixo grau de separação, a medida que as capacidades do bébé crescem e o tornam capaz de estabelecer uma maior autonomia na família, o grau de ligação e de separação modificam-se, mas a criança continua a viver com uma forte necessidade de proximidade e dependência dos pais. Na fase de constância libidinal do objecto, ganham preponderância os comportamentos de autonomia, e diminuem os compor- tamentos de adesão (clinging behaviors) e negativistas (negativistic behaviors).

A criança passa por um conjunto de estádios: diferenciação (differentiation)/4-10 meses, ensaios (practicing)/10-16 meses,

reaproximação (rapprochement)/16-24 meses, consolidação (consolidation)

/ 24-36 meses e à medida que aprende a agir com mais autonomia e se vê a ela própria como um ser separado, torna-se menos dependente emocional- mente da mãe. As vicissitudes deste processo estão na estreita dependência da qualidade do "holding" materno, da qualidade do vínculo emocional mãe-bébé: se a relação é caracterizada pelo predomínio da an- siedade, hostilidade ou rejeição, a separação psicológica é perturbada e a internalização da imagem materna pode não se realizar totalmente.

A progressão satisfatória do processo de separação-individuação nos primeiros 3 anos de vida é portanto condição sine-qua-non para que o desenvolvimento posterior da autonomia da criança e do adolescente pros- siga. Se a qualidade do par simbiótico não for suficientemente boa, "a criança em vias de individuação sofre uma falha evidente do quadro de referência para perceber a realidade exterior extrasimbiótica e, conse- quentemente, o seu universo intrapsíquico de representações não possui nenhuma fronteira nitida entre o self e o objecto" (Mahler, 1981, p. 43) e nestes casos é de prever maiores dificuldades na separação adoles- cente.

Mas se pelo contrário a qualidade do "holding" materno for boa, o que pressupõe que a mãe seja capaz também ela de se separar psicologica- mente do seu bébé e de tolerar a sua autonomização progressiva, "uma larga porção do investimento disponível retira-se da esfera simbiótica para se fixar nos aparelhos autónomos do self e das funções do Eu - mar- cha, percepção, aprendizagem" (op. cit., p. 37) e nestes casos é possível prever uma evolução posterior favorável à autonomização.

Durante a latência consolidam-se as internalizações e identificações às instâncias egóicas e super-egóicas parentais que vão continuar a exercer uma influência dominante no desenvolvimento da per- sonalidade adolescente. A individuação adolescente vai lidar com estas internalizações (introjectos parentais) e com as identificações ao ego parental. Com a puberdade, as mudanças corporais e cognitivas vão ter um impacto crucial ao nível da visão que o adolescente tem de si próprio e das suas relações objectais, potenciada agora com a emergência do pen- samento formal. A diferenciação do self e as mudanças nas representações objectais conhecem de novo um momento de intensificação nesta fase adolescencial do desenvolvimento.

- A individuação adolescente não é uma recapitulação do processo infantil, como alguns autores sugerem (Ernest Jones, por ex.), mas a continuação dum fenómeno desenvolvimental progressivo que tende, nesta fase, para o estabelecimento do que Erikson (1968) designou por aquisição da identidade do ego ou ainda para o que Bios (1977) designou por aquisição do carácter.

A individuação pode ainda ser conceptualizada em termos de "linha desenvolvimental", tal como foi descrita por A. Freud (1965), para quem a progressão da "dependência para uma auto-confiança emocional e para relações objectais adultas" (op. cit., p. 64) ocorre durante a adolescência.

Voltando a Steinwand (1984), na opinião do autor, o conceito de individuação permite uma conceptualização larga, abrangendo e integrando vários aspectos desenvolvimentais: "o ênfase em tal conceptualização apoia-se nos aspectos progressivos, adaptativos e cada vez mais auto- reguladores do funcionamento humano. A individuação durante a adolescência normal diz respeito a três áreas de desenvolvimento inter- relacionadas: emergência do pensamento operacional formal dentro da es- fera do "apparatus" egóico da autonomia primária; adaptação funcional crescente a um maior e mais complexo ambiente social através do "apparatus" da autonomia secundária que se cristaliza, no final da adolescência, numa estrutura de carácter individual; e desvinculação ou separação emocional dos objectos infantis internalizados" (op. cit., p. 49).

As contribuições que, na perspectiva psicanalítica, iremos rever, tratam estes e outros aspectos que nos parecem pertinentes para a questão da autonomia e portanto para a fundamentação do nosso trabalho.

1. 1. As perspectivas de S. Freud, Anna Freud, P. Bios e outros autores de orientação analítica.

Foi, quanto a nós, Freud quem primeiro destacou a importância primordial da individuação-separação ao equacionar, no início do século, os fundamentos básicos do desenvolvimento adolescente.

Freud, vê na separação adolescente - progenitores, uma tarefa dolorosa mas essencial ao desenvolvimento do Homem e da Sociedade: "o desligar do individuo da autoridade dos pais é uma das mais necessárias mas também uma das mais penosas realizações do desenvolvimento. E in- teiramente necessário que se realize e devemos supor que todo o ser humano normal consegue, em certa medida, consumar essa separação. Com efeito, o progresso da sociedade depende, em geral, da oposição das duas gerações" (Freud, 1909, p.237).

Subordina a aquisição do estatuto de adulto, em termos maturacionais, à realização da tarefa da separação interna dos objectos primitivos, acentuando os aspectos pulsionais e mudanças envolvidas pela ocorrência da puberdade. Freud afirma que "na puberdade, quando o instinto sexual faz as suas primeiras exigências o antigo objecto familiar incestuoso é retomado de novo e carregado de libido [ ]. A partir daí, o indivíduo humano tem que dedicar-se à grande tarefa de se separar dos seus pais e até que esta tarefa não esteja cumprida, ele não deixa de ser criança e não pode tornar-se membro da comunidade so- cial. Para o rapaz a tarefa consiste em separar os seus desejos libidinais da mãe empregando-os na escolha de um objecto de amor ex- terior" (Freud, 1917, p. 336).

O processo adolescente é desde logo definido por Freud, no duplo registo, um reflectindo o outro, em que ocorre: no registo da realidade externa, contemporâneo e contextual, expresso na forma dum conflito de

gerações e no registo da realidade interna, no abandono das ligações aos primeiros objectos de amor e investimento em novos objectos heteros- sexuais extra-familiares.

Um motivo poderoso para o adolescente se separar dos pais seria pois, na perspectiva freudiana, a ressurgência da problemática edipiana. Defender-se da ligação edipiana implica o repúdio inconsciente dos pais e por essa via, dos outros adultos apanhados no papel de pais substitutos. 0 exercício da autoridade adulta encontra inevitavelmente aí uma área de conflitualidade a que o adolescente responde idiossincraticamente.

0 registo externo, modelado pelas circunstâncias históricas, cruza-se com o registo interno dum passado e presente internalizado, ou seja, representado e interpretado pelo próprio indivíduo.

Anna Freud (1958), que enfatiza as mudanças quantitativas e qualitativas das pulsões instintivas e as defesas do ego enquanto deter- minantes da separação, afirma que a libido do púbere "está na altura de se desligar (detaching) dos seus pais e de catexizar novos objectos. 0 luto pelos objectos do passado é inevitável" (op. cit., p. 262).

A teorização do processo de separação interno da libido dos primeiros objectos de amor é retomada pelos autores de orientação analítica em termos de perda de objecto e processo de luto, permitindo este, novas identificações e novos investimentos em objectos exteriores à família. Loewald (1962) fala de trabalho de luto enquanto processo de abandono gradual do objecto perdido mas envolvendo também processos de internalização de elementos da relação com o objecto a ser abandonado e adquirindo daí o significado de emancipação. Max Sugar (1968) descreve o "luto normal adolescente" em três fases: separação-protesto na adolescência inicial, desorganização, caracterizada de tumulto, rebelião, vazio e depressão, na adolescência média e a fase de reorganização caracterizada por uma acalmia, na adolescência tardia.

A importância do luto dos imagos parentais e a escolha do objecto heterosexual é reforçada por Dias Cordeiro (1979) que vê nessas tarefas dois organizadores do psiquismo adolescente, o segundo não podendo ocor- rer satisfatoriamente, sem a realização do primeiro.

Amaral Dias & Nunes Vicente (1984), aprofundam o conceito, afir- mando que o luto adolescente pelo abandono do passado opera através de lutos parciais obrigatórios: luto pela fonte de segurança, luto renovado do objecto edipiano, luto pelo Ideal do Eu, luto pela bissexualidade e luto pelo grupo. A escolha de novos objectos de amor exteriores à família, pressupondo já a capacidade egóica de funcionar autonomamente dos pais, estaria portanto na estreita dependência do trabalho intra- psíquico dos vários lutos.

Retomando a questão da autonomia adolescente, poderíamos então con- cluir que, segundo a concepção psicanalítica clássica, um motivo poderoso para o adolescente se tornar autónomo seria a ressurgência da problemática pré-edipiana e edipiana. 0 adolescente torna-se autónomo porque repudiando o laço incestuoso (edipiano) aos pais, como meio para evitar a regressão a fixações edipianas e pré-edipianas, abandona também todos os laços egóicos aos pais (Josselyn, 1952, Baiser, 1966, in Jos- selson, 1980).

Esta conceptualização, na estreita dependência do paradigma dinâmico ou pulsional de Freud, tende a preconizar a existência, na fase adolescente, dum "ego fraco" perante um "sistema pulsional forte", a existência duma turbulência (turmoil) emocional forte, necessária, desejável e sinónima de normalidade (A. Freud, 1958) e postula a existência de relações conflituosas e pouco calorosas entre pais e filhos.

Peter Bios alarga e modifica as conceptualizações psicanalíticas dominantes.

Ao sugerir que durante a adolescência tem lugar um segundo processo de separação - individuação, Bios reintroduz a sistemática de Mahler na compreensão da autonomia adolescente pondo a tónica na importância das relações de objecto.

Blos(1962), que inicialmente tinha descrito as fases da adolescência, enfatizando a sua heterogeneidade em termos de posições e movimentos das pulsões e do ego, confere, mais tarde, ao segundo processo de individuação, o estatuto particular de motor ou estruturador de todo o processo adolescente: "Para lá destes aspectos tipicos das fases adolescentes reconhecemos um componente na reestruturação psíquica que puxa como um fio condutor, através de todo o trabalho da adolescência. Este inexorável componente manifesta-se com igual pertinácia tanto na pré-adolescência como na adolescência tardia. E con- ceptualizado aqui enquanto segundo processo de individuação da adolescência" (Bios, 1967, p. 62).

Bios (1967) acentua a perda das dependências familiares, de natureza emocional e afectiva e põe o ênfase na mudança das relações ob- jectais aos pais. Postula como objectivos desenvolvimentais desta segunda individuação a aquisição dum sentimento de self autónomo e com limites bem determinados: "o que na infância é a ruptura da membrana simbiótica para se tornar uma criança individuada" (Mahler, 1963) torna-se na adolescência a perda das dependências familiares, o abandono dos laços objectais infantis" (op. cit., p. 163).

As mudanças no self (introsado na infância com o self parental) e nas representações objectais opera-se numa linha de continuidade relacional, contribuindo para estas mudanças os aspectos infantis e contemporâneos da relação: "o afecto acompanhando a perda de objecto tem sido ligado ao estado de luto e trabalho de luto. Permanece normalmente uma continuidade na relação com o pai actual depois do abandono do carácter infantil da relação. 0 trabalho da individuação adolescente está relacionado com ambos estes aspectos infantis e contemporâneos"

(op.cit., p.182), e a propósito da possível confusão entre as representações dos objectos parentais afirma: "esta confusão é agravada quando os pais participam nas posições mutativas do adolescente e se revelam incapazes de manterem o seu lugar de adulto fixo perante uma criança em maturação" (op. cit., p. 182).

Referindo-se ainda ao esforço que o adolescente faz para se separar das dependências infantis, identifica modalidades de separação que podem inviabilizar a separação interna, referindo como ilustração disso, os adolescentes que ao forçar uma distância fisíca, geográfica, moral e ideativa da família ou do local da sua infância, tentam evitar uma separação interna.

No que diz respeito às mudanças estruturais que permitem o desalojar dos objectos infantis internos, Bios introduz o conceito de perda do Eu parental, o qual funcionaria até à adolescência, como auxiliar do Eu infantil. Esta perda implicaria o pôr a descoberto duma estrutura egóica mais ou menos intacta ou defeituosa, consoante as condições em que ocorreu o primeiro processo de separação - individuação. O fracasso do processo de individuação na adolescência deveria ser portanto atribuído, pelo menos em parte, a uma organização defeituosa do Eu, precocemente alicerçada.

Esta perspectiva tem sido apoiada por numerosos autores, que numa linha de investigação psicopatológica e desenvolvimental têm compreen- dido os quadros clínicos adolescentes à luz das vicissitudes da separação infantil.1

1. (1) Os trabalhos desses autores foram por nós revistos e encontram-se em artigo: Fleming M. (1983). A separação adolescente- progenitores. Análise Psicológica, 4 (III), 521-542.

Ainda no que diz respeito às mudanças estruturais, assume par- ticular importância a tarefa da desidealização dos pais da infância, considerada por Bios como a parte mais difícil da separação adolescente. Na adolescência tardia e na pós-adolescência, a emergência de qualidades integrativas associadas ao self permite um processo adaptativo - uma revisão das primeiras identificações rejeitadas, provisórias e aceites. 0 "ego ideal" formação psiquíca do final da adolescência e herdeira do complexo de Édipo negativo toma conta da função reguladora do super ego.

A plasticidade e fluidez do desenvolvimento típico da adolescência diminui: "a psicologia da adolescência deve então ser vista como um sis- tema energético que tende para alcançar cada vez mais altos níveis de diferenciação até que se estabilize a si próprio num padrão" (Bios 1962, p. 158).

Nesta perspectiva, poderíamos dizer que a autonomia é concep- tualizada enquanto um processo gradual de auto-regulação cada vez menos' na dependência da esfera externa parental, conduzindo a padrões de com- portamento regulados agora essencialmente por uma instância propulsora: o ego ideal, onde se conglomeram as partes do self mais identificadas às partes boas dos objectos internos parentais e permitindo ao adolescente ?rojectar-se e projectar o seu próprio futuro com confiança.

A contribuição de Bios, se bem que de indiscutível valor, não esclarece, na perspectiva de Erna Furman (1973), a articulação entre o funcionamento psíquico em termos metapsicológicos e a individuação, em- bora Bios se lhe refira quando afirma que "a individuação adolescente é o reflexo das mudanças estruturais que acompanham a separação emocional dos objectos infantis internalizados" (Bios, 1967, p. 164).

Na perspectiva da autora essa articulação deveria constituir-se como um desafio para o trabalho dos psicanalistas e ela própria tenta, através da apresentação de dois casos clínicos de adolescentes, uma compreensão aprofundada da relação entre as "lutas psíquicas adoles- centes" e o conceito de separação - individuação. Constata clinicamente

que existem muitas similitudes e paralelismos entre o funcionamento men- tal da criança e do adolescente (a intensidade dos impulsos, a presença de componentes pulsionais pré-genitais, o uso de defesas primitivas, as mudanças na natureza do self e das representações do objecto, as novas identificações e os novos investimentos da imagem do corpo e da actividade do Eu) e embora ponha reservas em considerar a adolescência como uma repetição desenvolvimental - a diferença entre as tarefas desenvolvimentais da infância e da adolescência é grande - reconhece a importância do estudo e da compreensão entre as duas fases de desenvol- vimento: infantil e adolescente.

As posições de Ruthellen Josselson (1977 a, b; 1980) apoiadas em material clinico (psicanálise de adolescentes) e observações empíricas na adolescência, aprofundam a conceptualização de Peter Bios e constituem ura ponto de reflexão importante para a compreensão da autonomia adolescente.

Com efeito, para Josselson (1980), o conceito de individuação é central para a compreensão do desenvolvimento do ego, permite ligar a adolescência a um processo contínuo de desenvolvimento e permite ainda articular entre si outros processos centrais dizendo respeito ao ego adolescente: a autonomia e a formação de identidade.

A articulação operar-se-ia, segundo a autora, do seguinte modo: "A Autonomia é o outro lado da individuação.

A medida que a individuação se processa, a autonomia cresce. Isso depende se se olha para aquilo de que o adolescente se afasta

(individuando-se) ou para aquilo de que ele se aproxima (ganhando autonomia) [...]. Oe aspectos do sujeito que se tornaram individuados e autónomos devem ser incorporados na identidade. Então, há uma sequência interdependente entre: individuação/autonomia/formação de identidade"

De acordo com esta perspectiva e à qual já fizemos referência na Introdução Geral, seria possivel estudar o processo de individuação adolescente através do estudo dos comportamentos de autonomia, tal como Mahler et ai. (1975) fez para o periodo infantil, já que a "individuação é primariamente um processo intrapsíquico que é apesar disso afectado pela e expresso na realidade" (Josselson 1980, p. 193). Josselson en- contra aliás um paralelo entre as dinâmicas de individuação infantil e adolescente: a adolescência precoce apresenta muitas das características da sub-fase dos ensaios (practicing) na sua ausência de ambivalência face aos pais, a adolescência média com a sub-fase da reaproximação (rapprochment) no seu desejo ambivalente de se ligar e de repudiar o apoio egóico parental, traduzindo-se numa ambivalência sobre a autonomia.

Encontramos assim uma conceptualização da autonomia alicerçada em dois pólos, o da distância e o da reaproximação aos pais: "tal como acontece com a criança, a individuação do adolescente envolve ao mesmo tempo alguma distância face aos pais e esforços compensatórios para reestabelecer a ligação" (Josselson, 1980, p. 195).

Nesta conceptualização, o crescimento da autonomia do ego processa-se através de acréscimos graduais de competência mas preser- vando as relações com os pais a cada momento. Assim sendo, se os laços objectais edípicos podem ser abandonados, tal como foi conceptualizado por Bios, eles não são cortados.

Para concluir e tentando sintetizar o pensamento de Josselson sobre a autonomia adolescente diríamos que, de acordo com aquela psicanalista e investigadora:

- a autonomia, a individuação e a formação de identidade são fenómenos intimamente ligados e interdependentes; a individuação envolve a separação psicológica da "realidade" pais e dos pais introjectados; o processo de individuação decorre ao longo da vida e envolve mudanças no grau de autonomia vs. ligação (connectedeness); durante a adolescência

subsiste a necessidade de ligação aos pais tal como subsiste a ambivalência sobre a autonomia; a essência destes processos refere-se à consciência progressiva da necessidade de reorganizar o mundo interno de acordo com as mudanças desenvolvimentais.

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