Nesta seção é apresentada a aplicação da arquitetura adaptativa proposta em um
processo real de controle de velocidade de um motor de corrente contínua (CC). Uma visão
esquemática do sistema é ilustrada na Ągura 13.
Figura 13 Ű Esquema geral do sistema proposto para controle de velocidade de um motor de
corrente contínua.
Microcontrolador
u
y
D
V
M
gT
C
2R
1R
Q
4R
3R
Fonte Ű O autor.O sistema considerado para o presente estudo de caso consiste em um motor CC, 𝑀,
mecanicamente acoplado a um tacogerador, 𝑇
g. O motor CC é acionado por um circuito
eletrônico, composto pelos resistores 𝑅
1e 𝑅
2, pelo transistor de junção bipolar 𝑄 e pelo diodo
𝐷. Uma fonte externa, 𝑉 , é empregada para alimentar o circuito de potência do sistema. O
sinal de realimentação que provém de 𝑇
gé Ąltrado pelo capacitor 𝐶 e um divisor de tensão
(resistores 𝑅
3e 𝑅
4) é utilizado para ajustar a magnitude do sinal de saída para a faixa
suportada pelo microcontrolador. Os valores dos componentes usados para este estudo de caso
experimental são mostrados na tabela 4.
O problema de controle consiste em manter a velocidade do motor CC em diferentes
patamares de referência. A variável de saída, 𝑦, é manipulada por um sinal de tensão na
entrada do sistema, 𝑢, modulado por PWM. Devido à natureza desse processo, não seria uma
tarefa complexa a elaboração de um modelo analítico completo que compreenda todos os
fenômenos elétricos e mecânicos relativos ao sistema para inicialização de seus respectivos
valores no algoritmo proposto. Entretanto, para sistemas em que a compreensão dos fenômenos
que o regem é mais complexa ou a determinação de seus parâmetros reais para compor um
modelo analítico se torna uma tarefa difícil, este estudo de caso tem por objetivo mostrar
que a inicialização dos parâmetros do modelo empregado no controlador proposto pode ser
feita de forma simples e prática, sem a necessidade de uma modelagem completa. Isso é
Tabela 4 Ű Valores dos componentes do sistema proposto para controle de velocidade de um
motor de corrente contínua.
Componente EspeciĄcação
𝑅
1220 Ω
𝑅
22, 2 × 10
3Ω
𝑅
36, 8 × 10
3Ω
𝑅
410 × 10
3Ω
𝑄
TIP41C
𝐷
1N4007
𝐶
2200 × 10
−6F (16 V)
𝑀
12 W (@ 12 V)
𝑇
g9 V
𝑉
12 V
válido porque, diferentemente do estudo de caso apresentado na seção 4.1, nesse experimento
os parâmetros variam de acordo com o ponto de operação. Logo, apenas a escolha de uma
estrutura do modelo de predição condizente com a resposta dinâmica do sistema e inicializá-la
de forma adequada já é suĄciente para, ao longo do tempo, a arquitetura adaptativa rastrear
as dinâmicas não modeladas.
Por motivos de segurança e desempenho operacional, não é recomendada a inicialização
dos coeĄcientes do modelo do sistema com valores nulos ao mesmo tempo que a malha de
controle é estabelecida. Logo, propõe-se a realização de um ensaio de resposta ao degrau
em malha aberta para obtenção de um modelo linear prévio sobre uma determinada região
de operação do processo. O ensaio foi realizado por meio da aplicação do sinal de controle,
𝑢, com amplitude de 10% sobre a região compreendida entre 30% a 40% da capacidade
máxima do atuador empregado. A ação de controle deslocou a saída do sistema, 𝑦, em uma
região compreendida entre 20% a 30% da velocidade total do motor CC. O resultado desse
procedimento aplicado ao sistema da Ągura 13 com os dados deslocados para o eixo zero é
mostrado na Ągura 14.
A partir do resultado apresentado, propõe-se aproximar o comportamento de velocidade
do motor CC na região escolhida por um modelo linear que descreve uma dinâmica de primeira
ordem sem atraso de transporte. A função de transferência identiĄcada no domínio da frequência
e discretizada com segurador de ordem zero na entrada é descrita por:
𝐺(𝑠) =
𝐾
á 𝑠 + 1
=
0, 9
0, 4𝑠 + 1
Ts=100 ms⊗⊗⊗⊗⊗⊗⊃ 𝐺(𝑧) =
0, 1991𝑧
−11 ⊗ 0, 7788𝑧
−1.
(69)
Busca-se em malha fechada uma resposta transitória similar com a de malha aberta, em
que 𝑇
s= 100 ms foi deĄnido como vinte vezes menor que o tempo de acomodação (em torno
Capítulo 4. Estudos de Caso 73
Figura 14 Ű Ensaio de resposta ao degrau em malha aberta do sistema proposto para o estudo
de caso experimental.
0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5 0 2 4 6 8 10y
(%)
real modelo 0 0.5 1 1.5 2 2.5 3 3.5 4 4.5Tempo (s)
0 5 10u
(%)
Fonte Ű O autor.obtido em (69) foi avaliada pela magnitude do coeĄciente de determinação 𝑅
2. Geralmente,
essa métrica apresenta valores entre 0 e 1, indicando quão bem o modelo obtido se aproxima
dos valores reais. O modelo se ajusta perfeitamente aos dados considerados quando 𝑅
2= 1.
O coeĄciente é calculado por meio da equação:
𝑅
2= 1 ⊗
n√︁max i=1[𝑦
real(𝑖) ⊗ 𝑦
modelo(𝑖)]
2 n√︁max i=1[𝑦
real(𝑖) ⊗ ¯𝑦
real]
2,
(70)
sendo obtido 𝑅
2= 0, 9876, indicando que o modelo linearizado com dinâmica de primeira
ordem se ajusta bem ao representar o sistema real para o sinal de entrada considerado.
A sintonia do estimador é feita a partir da determinação do grau de cada polinômio a
ser estimado na estrutura de modelo escolhida, sendo 𝑛
a= 1 e 𝑛
b= 1, uma vez que o modelo
do sistema foi aproximado para primeira ordem. Dez termos de resíduos foram acrescentados
como parcela de média móvel, a Ąm de reduzir o efeito de polarização. A veriĄcação dos
parâmetros estimados do modelo resultante foi realizada da mesma forma que no estudo de
caso anterior presente na seção 4.1. Para este experimento, um adequado nível de aprendizado
do estimador foi alcançado com 𝜌 = 0, 2. Esse valor foi obtido a partir de testes experimentais
no sistema iniciando com 𝜌 = 0, 1. Assim como no experimento anterior, neste estudo de
caso é feita uma avaliação do desempenho da abordagem proposta frente à inserção de erros
de modelagem no modelo linear determinado a partir do ensaio de resposta ao degrau em
malha aberta. Com isto é possível mostrar que, apesar de o controlador proposto ter sido
iniciado com valores do modelo discrepantes do ponto de operação no qual foi linearizado e
dependendo da grandeza do erro cometido no modelo, a abordagem proposta consegue se
adaptar e estimar os parâmetros reais do sistema ao longo do tempo, considerando a estrutura
de modelo e cenário de controle escolhidos para o presente estudo de caso experimental. O
erro cometido no modelo foi selecionado arbitrariamente de forma extrema, levando em conta
possíveis ocorrências em situações práticas, sendo de 60% tanto para o ganho como para a
constante de tempo do modelo linearizado. A função de transferência discreta com erro de
modelagem é dada por:
𝐺
erro(𝑠) =
0, 9 × 0, 4
0, 4 × 0, 4𝑠 + 1
Ts=100 ms⊗⊗⊗⊗⊗⊗⊃ 𝐺
erro(𝑧) =
0, 1673𝑧
−11 ⊗ 0, 5353𝑧
−1.
(71)
Logo, o vetor de parâmetros estimados e a matriz de covariância são inicializados, respectiva-
mente, como
θ
̂︀∗(1) = [0, 5353 0, 1673 0
1×10]
Te P (1) = 1 × 10
−3I. Diferentemente da seção
4.1, nesse estudo de caso foi utilizado um modelo do ruído com dez termos de resíduos passados.
Essa quantidade de termos pode ser escolhida por meio de alguns testes experimentais, em
que veriĄca-se as funções de autocorrelação do resíduo e correlação cruzada entre o sinal de
entrada e o resíduo para garantir que os parâmetros estimados não polarizem. Contudo, nesse
trabalho foi apenas escolhida uma quantidade relativamente alta para reduzir ao máximo os
efeitos de polarização, uma vez que a ordem do vetor estendido de parâmetros estimados não
altera signiĄcativamente o tempo de execução do algoritmo. Assim como na seção 4.1, foi
escolhido um baixo valor do traço inicial de P para evitar, principalmente, um transitório com
elevadas amplitudes dos parâmetros estimados nos instantes iniciais de operação do controlador
em malha fechada.
A sintonia das variáveis de controle foi determinada com a escolha de 𝑁 = 25 de forma
a garantir que toda a dinâmica requerida em malha fechada seja considerada na predição
feita pelo controlador. Por simplicidade, 𝑁
u= 3 foi mantido. O Ąltro de predição do GPC
foi selecionado como 𝑇 (𝑧) = 1 ⊗ 0, 5𝑧
−1. Levando em conta os horizontes escolhidos e como
o sistema é SISO, foi Ąxado Ó = 1 constante e estabelecido Ú = 10, a Ąm de manter um
compromisso entre a minimização de um baixo esforço do sinal de controle e rápida resposta
transitória para seguimento de referência. Ambas as ponderações permaneceram constantes
para todo o horizonte escolhido. Neste experimento, foi estabelecido que o sinal de controle
deve estar compreendido na região de operação mínima e máxima do atuador. Além disso, foi
determinado que os incrementos de controle devem ocorrer em torno de ∘12% da conversão
DA de 12 bits do microcontrolador. Vale ressaltar que essa taxa de variação foi imposta sobre o
Capítulo 4. Estudos de Caso 75
transistor apenas para avaliar na arquitetura proposta o funcionamento desse tipo de restrição
no cálculo da ação de controle pelo ADMM.
Considerando a sintonia escolhida, o cenário geral de controle proposto consiste em
aplicar uma série de mudanças de referência em degrau que levam a planta para distintos pontos
de operação. A arquitetura de controle adaptativo proposta foi comparada com os resultados
obtidos por um controlador GPC regular. Nos casos considerados, todos os controladores
utilizados para comparação foram sintonizados com os mesmos parâmetros descritos. Os
resultados obtidos para o controle em malha fechada são apresentados na Ągura 15.
Os resultados mostram que todos os controladores foram capazes de seguir a referência
para o cenário de controle estabelecido. A abordagem proposta iniciando com o modelo linear
descrito pela equação (69), FAGPC-ML, apresentou comportamento transitório adequado em
todos os pontos de operação considerados. Já o FAGPC iniciando com erro sobre o modelo
linearizado dado em (71), FAGPC-EML, nas amostras iniciais não apresentou um transitório
satisfatório em comparação com as respostas obtidas pelos controladores FAGPC-ML e GPC
regular com erro de modelagem Ąxo, FGPC-EML. Isso acontece principalmente porque os
valores iniciais assumidos para o modelo não eram uma boa representação da planta no ponto
de operação inicial, e o número de amostras usadas para estimar os coeĄcientes do modelo
da planta era muito pequeno, então houve uma grande mudança no modelo utilizado para
predição. Após o primeiro transitório, é possível observar que ambos os controladores propostos,
FAGPC-EML e FAGPC-ML, possuem uma resposta dinâmica melhor que o GPC tradicional.
Além disso, a abordagem proposta é capaz de manter quase a mesma forma da resposta durante
todas as mudanças de referência em degrau, enquanto que a resposta obtida pelo FGPC-EML
depende signiĄcativamente da região de operação, apresentando maiores sobressinais.
No segundo e terceiro gráĄcos da Ągura 15 são mostradas as ações de controle aplicadas
por cada controlador e os limites da taxa de variação (linha traço-ponto) que foram formulados
como restrições no problema de otimização. É observado que a restrição de incremento do
sinal de controle não foi violada pelo otimizador ADMM em todos os controladores. Além de
apresentar melhor comportamento dinâmico da saída do processo, as ações de controle de
ambos os controladores propostos, FAGPC-EML e FAGPC-ML, tiveram poucas diferenças entre
si, salvo os primeiros instantes. Em contrapartida, o FGPC-EML resultou em ações de controle
menos suaves e amortecidas. Para reforçar a análise da comparação entre os controladores, na
tabela 5 são mostrados os valores de IAE e TVCS calculados para os dados obtidos na Ągura
15.
Os valores do índice IAE indicam que todos os controladores tiveram desempenhos em
malha fechada muito próximos, mas a implementação regular do GPC com erro no modelo
linearizado teve desempenho superior aos controladores propostos. Isso pode ser justiĄcado
não só por causa do inferior desempenho nos primeiros instantes da abordagem proposta,
mas também do tempo de subida menor alcançado pelo FGPC-EML considerando a mesma
sintonia. Logo, o valor absoluto do erro de seguimento de referência é reduzido quando
4.
Estudos
de
Caso
76
com arquitetura adaptativa proposta iniciando com erro no modelo linearizado (FAGPC-EML) e com arquitetura adaptativa proposta
iniciando com o modelo linearizado (FAGPC-ML).
0 5 10 15 20 25 30 20 30 40 50 60 70 80 y (%) FGPC-EML FAGPC-EML FAGPC-ML 0 5 10 15 20 25 30 0 50 100 u (%) 0 5 10 15 20 25 30 Tempo (s) -20 0 20 " u (%) Fonte Ű O autor.
Capítulo 4. Estudos de Caso 77
comparado com os outros controladores, mesmo com os sobressinais observados na resposta
transitória. Entretanto, é notável que não houve sobressinais, ou foram mínimos, nos transientes
obtidos pelos controladores propostos, indicando que o modelo atualizado a cada período de
amostragem apresentou maior Ądelidade na predição do comportamento da saída da planta.
Os valores de TVCS sustentam esta análise, evidenciando que menores esforços de controle
foram mais penalizados na função custo pelos controladores FAGPC-EML e FAGPC-ML. Desta
forma, caso o tempo de acomodação seja um fator crítico no controle deste sistema, a solução
mais viável seria diminuir a ponderação do esforço de controle na função custo minimizada
pelo otimizador ADMM, aumentando então a velocidade de convergência da saída para a
referência.
Tabela 5 Ű Valores de IAE e TVCS para comparação de desempenho entre controladores da
Ągura 15.
Controlador
IAE
TVCS
FGPC-EML
1,45% 0,63%
FAGPC-EML 1,55% 0,57%
FAGPC-ML
1,49% 0,48%
Na Ągura 16 é mostrada a evolução do fator de esquecimento direcional e dos parâmetros
do modelo estimado para todos os pontos de operação considerados na Ągura 15. Nota-se
por inspeção visual que, após um curto período de transiente inicial, os parâmetros estimados
convergem para os correspondentes ao ponto de operação do processo. O fator de esquecimento,
Ð, apresentou valores iniciais baixos caracterizado por dar mais importância às primeiras
medições na estimação e atualização dos coeĄcientes da estrutura de modelo empregada. É
observado que o controlador FAGPC-EML iniciou com os valores de ganho e polo iguais aos
obtidos para o modelo linearizado com erro, enquanto o FAGPC-ML foi inicializado com o
vetor de parâmetros estimados correspondente ao modelo linearizado.
Um segundo experimento foi realizado para avaliar os controladores propostos quando
são submetidos a variações nos parâmetros do processo. Para isso, foi realizada uma alteração
na montagem da Ągura 13. Como os motores são diferentes em sua fabricação, o motor
utilizado como tacogerador, 𝑇
g, foi invertido com o motor principal, 𝑀. Desta forma, 𝑇
gpassa
a funcionar como fonte motriz e 𝑀 fornece o sinal de realimentação para o microcontrolador.
Isso permite provocar modiĄcações tanto no comportamento estático como dinâmico do
sistema original.
Foram implementadas as mesmas versões de controladores, considerando a mesma
sintonia e cenário de controle selecionados anteriormente. Todos os parâmetros que compõem
a arquitetura adaptativa foram inicializados de igual modo que no primeiro experimento para
todos os controladores testados. O GPC regular com erro no modelo linearizado foi novamente
utilizado para Ąns de comparação. Os resultados são mostrados na Ągura 18.
Figura 16 Ű Evolução dos parâmetros do estimador para os controladores FAGPC-EML e
FAGPC-ML.
0 5 10 15 20 25 30 0 0.5 1 , FAGPC-EML FAGPC-ML 0 5 10 15 20 25 30 0.4 0.6 0.8 1 ^ Kss FAGPC-EML FAGPC-ML 0 5 10 15 20 25 30 Tempo (s) 0.4 0.6 0.8 1 jp1 j FAGPC-EML FAGPC-ML Fonte Ű O autor.Novamente é observado que cada controlador empregado foi capaz de rastrear as
referências em degrau e garantir erro nulo em regime permanente. Mesmo o FAGPC-ML
iniciando com o modelo linearizado correspondente ao sistema original, não produziu oscilações
e apresentou comportamento dinâmico adequado durante todas as mudanças de referências
ocorridas. O erro cometido no modelo linearizado pelo FAGPC-EML ocasionou novamente um
transiente indesejado nas amostras inicias. Contudo, ao longo do tempo a resposta transitória
Ącou muito próxima do FAGPC-ML dada a capacidade de adaptação da abordagem proposta.
Os valores de IAE mostrados na tabela 6 indicam que um melhor desempenho foi novamente
alcançado pelo FGPC-EML. Porém, apesar dos erros de seguimento de referência atingirem
valores nulos mais rapidamente, é possível analisar que o mesmo apresentou resposta menos
amortecida e com oscilações. As ações de controle calculadas pelo ADMM são ilustradas no
segundo e terceiro gráĄcos da Ągura 18. Assim como no experimento anterior, as restrições
formuladas no problema de otimização foram respeitadas para todos os controladores. Já os
sinais de controle de ambas as abordagens propostas foram menos oscilatórias e mais suaves.
Apesar de menores tempos de subida da variável de saída nas abordagens adaptativas, devido
Capítulo 4. Estudos de Caso 79