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Sabemos que o desenvolvimento das forças produtivas no capitalismo tem desencadeado como expressão o aprofundamento da questão social e, conseqüentemente, o acirramento dos conflitos por intermédio das classes sociais, na tentativa incessante de se reproduzirem objetiva e subjetivamente. Está em jogo, portanto, permanentemente, interesses antagônicos entre capital e trabalho representados por sujeitos coletivos que compõem as classes fundamentais: de um lado, aqueles que controlam os meios de produção e reprodução da sociedade; de outro, os que possuem como única e principal fonte de sobrevivência a venda da sua força de trabalho sendo, portanto, dirigidos e dominados. Esse antagonismo vem orientado as experiências históricas que conformam os rumos da cooperação a partir de dois principais elementos: a luta de classes e o controle social.

A cooperação vem caminhando entre a disputa de projetos de sociedade fundamentalmente diferenciados. “Bastaria uma breve análise na história dos séculos 19 e 20 para perceber que os liberais, a socialdemocracia, os marxistas e anarquistas se pronunciaram sobre o mesmo (...) estamos numa sociedade em disputa. Como não poderia deixar de ser, o cooperativismo e o associativismo não escapam a esta luta” (NOVAES, 2007, p.09). Isso muito embora exista nesses últimos séculos a construção de uma hegemonia que tenha consolidado o controle da burguesia enquanto classe. Para isso, segundo Netto e Braz (2007), no âmbito da produção,

num primeiro momento, o capitalista reuniu os trabalhadores que assalariava num mesmo espaço físico, o que lhe permitia supervisionar as tarefas produtivas (...). Os trabalhadores executavam as suas operações sob formas de cooperação e as técnicas produtivas eram inteiramente controladas pelos trabalhadores (...). O fato de os trabalhadores deterem o conhecimento reduzia em muito o poder do capitalista, que deles dependia em larga medida. Pode-se afirmar que, no trabalho cooperativo, o controle do capitalista sobre o processo de trabalho era apenas forma (nas palavras de Marx, encontramos aqui a subsunção formal do trabalho ao capital). Na segunda metade do século XVIII, (...) à cooperação passa a suceder a manufatura. Aqui, já não se trata de reunir trabalhadores num espaço físico determinado; trata-se de reuni-los e de especializar as suas atividades – com a manufatura, o capital introduz na produção uma divisão do trabalho específica (...). O período manufatureiro desobstrui a via para que o processo de trabalho seja realmente comandado pelo capital (...). É então que se instaura a produção especificamente capitalista, implementada através de máquinas (...) e típica da grande indústria (...) o trabalhador passa a ser um

apêndice das máquinas, a sua desqualificação se acentua e igualmente se aprofunda a divisão do trabalho (...) a divisão entre a concepção dos processos e a sua execução (...). Quando o processo de trabalho está subordinado realmente ao capital, quando o trabalhador perde o controle desse processo, o capital encontra as melhores condições para incrementar a produção do excedente – vale dizer, a subsunção real do trabalho ao capital propicia a este último potenciar a extração de mais-valia (p.111-113).

Nesse sentido, diante da subsunção real do trabalho ao capital, a cooperação dos assalariados passa a depender da amplitude da concentração dos meios de produção em mãos dos capitalistas, do domínio e da “magnitude do capital que cada capitalista dispõe dos meios de subsistência de numerosos trabalhadores” (MARX, 2008, p.383). Agora, certo montante mínimo é “condição necessária para a conversão de muitos processos isolados e independentes num processo de trabalho social, combinado (...). O comando do capitalista no campo da produção torna-se então tão necessário quanto o comando de um general no campo de batalha” (Idem).

Isso porque, para Marx (2008), tal como “uma orquestra exige um maestro”, todo trabalho coletivo desenvolvido em grande escala demanda uma direção que articule simultaneamente as atividades individuais. Essa função “assume-a o capital logo que o trabalho a ele subordinado se torna cooperativo” (p.384). Portanto, a classe que tem o controle da sociedade, tem o controle na produção e, conseqüentemente, sob o processo de trabalho como um todo, ou seja, sob os meios (instrumental) de trabalho; os objetos de trabalho; e sob o próprio trabalho em si. É dominante, então, a classe detentora da técnica e da propriedade, o que, como vemos hoje, com os oligopólios, tem cada vez mais se concentrado nas mãos de poucos.

O trabalhador como consumidor ocupa uma posição de crescente importância para a manutenção do curso tranqüilo da produção capitalista. Todavia, permanece completamente excluído do controle tanto da produção quanto da distribuição (...). Trata-se de uma contradição que introduz complicações adicionais no sistema produtivo vigente, baseado numa divisão socialmente estratificada do trabalho (...). No decurso do desenvolvimento

humano, a função do controle social foi alienada do corpo e transferida para o capital (MÉSZÀROS, 2002, p.55).

Assim, a história mais recente tem registrado um contínuo embate entre as classes que vêm forjando importantes experiências de resistência no seio da luta social. Chamamos a atenção para aquelas que, orientadas pela perspectiva socialista, têm construído o legado da

classe trabalhadora, especialmente no âmbito da cooperação na produção em meio às contradições da dinâmica capitalista.

Lembremos os desafios que se colocavam aos trabalhadores no início do século XX, dos quais Rosa Luxemburgo foi uma das grandes interlocutoras ao pautar a questão Reforma ou Revolução?, tão cara a socialdemocracia alemã e, mais precisamente, ao revisionismo de Eduardo Bernstein27. Os acontecimentos desse período influenciam as mais diversas organizações de trabalhadores em todo o mundo, até hoje, que se dispuseram a empreender processos organizativos orientados para a construção de uma nova hegemonia de classe. Diante do caráter atual dessa questão, especialmente com a reestruturação produtiva emergente no século XXI, que posteriormente iremos tratar, ousamos fazer uma breve referência às contribuições de Luxemburgo (1999).

O grande alvo de suas críticas foi à concepção que começava a ganhar espaço no Partido Social-democrata Alemão (SPD), respaldada pelas idéias de Bernstein da teoria dos “meios de adaptação”, que, em suma, renuncia a transformação social e vê nas reformas o próprio fim da luta de classes. Na verdade, tal concepção ganhou fôlego e contribuiu para a participação do partido e de grande parcela de trabalhadores na Primeira Guerra Mundial. A crítica de Rosa estruturou-se, fundamentalmente, a partir de experiências ascendentes em sua época, que apontavam para a impossibilidade de construir o socialismo através de reformas graduais do capitalismo, com multiplicação de cooperativas de produção e consumo, o aumento do poder sindical e a ampliação da democracia parlamentar.

O resultado mais próximo e mais provável é uma mudança de tática visando obter por todos os meios os resultados práticos da luta, isto é, as reformas sociais. O ponto de vista de classe, nítido e irreconciliável, que só tem razão de ser se tiver em vista a conquista do poder, tornar-se-á cada vez mais um obstáculo, a partir do momento em que os resultados práticos imediatos venham a constituir a finalidade principal. A conseqüência direta será a adoção de uma „política de compensações‟, em outras palavras uma „política de barganha‟, e uma atitude conciliacionista (LUXEMBURGO, 1999, p.61).

Desta forma, Rosa aponta uma contradição fundamental: esses meios (sindicatos, cooperativas, reformas sociais e democratização política do Estado) historicamente não podem suprimir a lei do valor. No caso dos sindicatos, a luta é reduzida para a regularização

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“Um dos principais teóricos do Partido Socialdemocrata alemão e da II Internacional, cerca de 1890. Levantou mais tarde a bandeira da revisão do marxismo. Aderiu à social-democracia pela altura de 1870 (...). As idéias de Bernstein tiveram uma imensa influência, não somente sobre a socialdemocracia alemã, mas também sobre todo o movimento operário internacional. Pois o revisionismo é a expressão ideológica da adaptação da classe operária às condições criadas pelo capitalismo no curso do período de 1800 a 1911. Ele reflete as aspirações pequeno-burguesas da aristocracia operária” (LUXEMBURGO, 1999, p.121-122).

da exploração capitalista. No caso do Estado, por ser um “Estado de classe”, representante dos interesses dos capitalistas, as reformas por ele praticadas não é uma aplicação do “controle social, isto é, do controle da sociedade trabalhando livremente no seu próprio processo de trabalho, mas um controle da organização de classe do capital sobre o processo de produção do capital” (LUXEMBURGO, 1999).

Daí o equívoco em considerar que se pode realizar o socialismo pelas cooperativas e torná-las o fim ao invés de um dos meios. Sobre isto, Rosa expõe diversos argumentos que vão de encontro à concepção de cooperativas defendida por Bernstein:

Os dois meios, graças aos quais se propõe Bernstein a realizar a reforma socialista, isto é, cooperativas e sindicatos, evidenciam-se pois absolutamente incapazes de transformar o modo de produção capitalista (...) renuncia espontaneamente à luta contra o modo de produção capitalista, dirigindo o movimento socialista apenas no sentido da luta contra o modo de repartição capitalista. (LUXEMBURGO, 1999, p.85)

Ao analisar as cooperativas, em especial as cooperativas de produção, Rosa chama atenção para a sua essência híbrida dentro da economia capitalista composta por uma pequena produção socializada dentro de uma troca capitalista. Considerando que, na economia capitalista, a troca domina a produção, fazendo da exploração impiedosa, isto é, da completa dominação do processo de produção pelos interesses do capital, em face da concorrência. Rosa atenta para o caso da cooperativa de produção, onde os “operários vêem-se na necessidade contraditória de governar a si mesmos com todo o absolutismo necessário e desempenhar entre eles mesmos o papel de patrão capitalista” (LUXEMBURGO, 1999, p.81). Segundo ela, é desta contradição que morre a cooperativa de produção, “quer pela volta à empresa capitalista, quer, no caso de serem mais fortes os interesses dos próprios operários” (Idem).

Neste caso, complementa Rosa, “as cooperativas de produção têm de limitar-se, na melhor das hipóteses, a um pequeno mercado local” tendo em vista que todos os ramos mais importantes da produção capitalista estão excluídos da cooperativa de produção. Eis porque, sem levar em consideração o seu caráter híbrido, “as cooperativas de produção não podem ser consideradas uma reforma social geral”, pela simples razão de pressupor a sua realização geral, antes de tudo, a supressão do mercado mundial e a dissolução da economia mundial atual em pequenos grupos locais de produção e de troca, “constituindo no fundo, por conseguinte, um retrocesso da economia do grande capitalismo à economia mercantil da Idade Média” (LUXEMBURGO, 1999, p.82-83).

Já para Marx e Engels, conforme nos apresenta Bottomore (2001), a idéia da cooperativa em si não é condenada, mas apenas as suas deformações.

Nesse sentido, as cooperativas apoiadas pelo Estado na Prússia e a defesa em termos socialistas que Lassalle delas fazia foram atacadas por Marx. Os armazéns cooperativos são considerados como arranhões superficiais na face do capitalismo a não ser que façam parte de associações produtivas das forças e relações de produção e „as forças organizadas da sociedade‟ (poder de Estado) tenham sido transferidas, por meio da atividade da classe operária, para os próprios produtores (p.20).

Assim, é feita uma crítica central aos desdobramentos da “teoria da adaptação ao capitalismo” tendo em vista que leva a cargo toda a reforma socialista em cooperativas, “de luta contra o capital de produção, isto é, contra a principal base da economia capitalista, a uma luta contra o capital comercial e, principalmente, contra o pequeno e médio capital comercial, isto é, unicamente contra pequenos ramos do tronco capitalista” (Idem).

Desta forma, diante do legado que Rosa Luxemburgo nos deixou enfrentando muitos dos impasses e desafios de sua época, atentamos para o equívoco que algumas organizações de trabalhadores historicamente têm enfrentado ao restringir as relações de cooperação na produção a uma forma fixa, como as cooperativas. Estas foram (e são) apenas uma dos meios mais comuns de materialização e institucionalização do trabalho cooperado. O ponto central, a nosso ver, é atentarmos para os desafios do controle dos trabalhadores sobre as decisões políticas, condições e relações de trabalho, o que demanda observarmos as tendências desse processo transcorridas pela história.

Ao contrário do que muito tem se perpetuado, as ações em busca de uma organização da produção capaz de possibilitar uma vida em bases mais igualitárias, coletivas e cooperadas faz parte de um longo percurso da humanidade. No entanto, como já afirmamos, esse caminho toma forma e condicionantes sócio-históricos diferenciados sob a regência da sociabilidade capitalista, repercutindo decisivamente nas práticas organizativas das classes e seus desdobramentos. Sobre isto, ressalta Novaes (2007):

As iniciativas autogestionárias de produção dos meios de vida deixam um rastro histórico desde há pelo menos dois séculos. Assumem formas institucionais e de organização variadas, sempre espremidas e impulsionadas pelas condições materiais e sociais da ocasião, em cenários de guerras, crises econômicas ou irrupções revolucionárias. Mas, também, durante a ascensão do capitalismo transnacional nos seus 30 anos „gloriosos‟. Nesses ciclos de lutas sociais, a autogestão (e cooperação) configura um movimento espasmódico e em espiral. Como sentido geral, pode-se arriscar a idéia de que trazem dentro de si todas as possibilidades para a superação das relações

sociais e do modo de produção capitalista. E, também, todos os limites que essas conjunturas encerram (p. 14-15)

Portanto, nos lançamos ao propósito de caracterizar, brevemente, esse percurso que, construído sob a luta de classes, nos deixa uma importante herança. Isso poderá nos trazer elementos fundamentais para analisarmos, mais adiante, a realidade contemporânea.

Tomamos como ponto de partida o mesmo indicado por Novaes (2007). Trata-se de um período que retrata a revolta de 1839-1842, na França, dos tecelões de Lion, na época, uma importante cidade industrial francesa. A forma de luta dos canuts, mestres tecelões da seda, que chegaram a tomar a cidade por várias semanas com o lema “viver trabalhando ou morrer lutando” aponta, mesmo que de forma embrionária, um marco nas experiências que passam a reivindicar a cooperação dos trabalhadores, sob o controle destes. Essa luta foi precursora dos acontecimentos de 1848, “cravando a insígnia do direito ao trabalho”. O que os trabalhadores verdadeiramente reivindicaram era o “direito de participar na organização dos processos de produção da vida material e social” (p.16), mesmo que de forma antagônica ao que anunciava a ideologia industrial-burguesa insurgente.

Durante o século XIX, as principais lutas e organizações de classe apontaram algumas formas de resistência dos trabalhadores frente ao processo de expansão mundial do capital, dentre as quais, as associações e as cooperativas. As estratégias, portanto, procuravam primar por um processo organizativo que possibilitasse a fusão de duas principais funções: organização para a produção dos meios de vida, por meio de diversas formas de cooperação, e a resistência coletiva e política.

Deste período até a Comuna de Paris, em 1871, a associação foi o princípio articulador de relações sociais igualitárias, coletivistas e democráticas dos trabalhadores (...). A associação era como que o princípio e o meio para a superação das relações concorrenciais e individualizantes do capitalismo no interior das unidades de produção, da sociedade, do Estado e para além das fronteiras nacionais (NOVAES, p.16-17)

No século XX a conjugação entre formas e instrumentos político-organizativos de trabalhadores e períodos revolucionários, de acirramento das contradições entre as classes, possibilitou o desencadeamento de diversas experiências atravessadas pelo viés da cooperação, com imensas particularidades que, no entanto, esta pesquisa não poderá contemplar.

No caso particular da agricultura, de acordo com Fabrini (2010), temos, por exemplo, a experiência de produção coletiva e coletivização das terras após a Revolução

Russa, o que deu origem aos kolkozes (cooperativas de produção) e sovkozes (fazendas estatais).

Na China, na primeira metade do século passado, com o objetivo de prosseguir com o processo de transformação do modo de propriedade dos meios de produção e das relações de produção no meio rural, foram criados os grupos de ajuda mútua, as cooperativas de base, as cooperativas agrícolas de produção e as comunas populares rurais. Estas se dividiam em brigadas de produção (uma cooperativa) que, por sua vez, eram divididas em equipes de trabalho (antiga aldeia ou grupo de ajuda mútua). Com a orientação que dizia: “a cada um de acordo com seu trabalho”, a distribuição de renda ocorria entre os produtores.

Na realidade latino-americana, com suas particularidades no âmbito da formação econômica e social, um conjunto de ações no campo democrático e popular é desencadeado concomitante ao avanço do capitalismo monopolista dirigido pelo imperialismo norte- americano em aliança com as burguesias nacionais.

Nesse contexto, em Cuba, com o desenvolvimento do processo revolucionário que culminou em 1959, quando, a partir daí, a revolução promoveu um conjunto de transformações, inclusive a realização de uma ampla reforma agrária, iniciou-se a construção das bases do Sistema Cooperativista Cubano, constituído, em geral, por Cooperativas de Produção Agropecuária (CPAs) e Unidades Básicas de Produção Cooperativa (UBPCs). Atualmente, segundo Fabrini (2010), também existem as Cooperativas de Crédito e Serviço (CCSs), de natureza privada.

Poderíamos citar também as diversas experiências que ocorreram em outros países no mesmo século, especialmente no leste europeu após a Segunda Guerra Mundial, como Bulgária, antiga Tchecoslováquia, Hungria, ex-Iugoslávia, Polônia, ex-República Democrática Alemã, Romênia. Outras, muito embora tenham tido pouco tempo de existência, emergiram em momentos de grande efervescência política e crise econômica repercutindo sob o acirramento dos conflitos e contradições de classes. Sobre isso, fazemos referência a períodos como: a Guerra Civil Espanhola; o Governo Allende, no Chile; a Revolução dos Cravos, em Portugal (1974-1976); as comissões de fábricas, no Brasil (1970-1980).

Frente a esse breve percurso histórico, observamos que as experiências caminham contraditoriamente entre os avanços na correlação de forças políticas e os limites das tendências e condicionantes sócio-históricos que reafirmam o controle do capital e não dos trabalhadores. Por isso, a questão do controle, mesmo “sendo um tabu absoluto sob a dominação do capital” é “o mais vital dos incentivos para o processo de vida dos indivíduos”, enquanto sujeitos “autônomos autodeterminados” (MÉSZÀROS, 2002, p.969).

Assim, antes de tudo, é fundamental recorrermos, novamente, a um ensinamento central para que possamos continuar nossa análise na direção que escolhemos: “não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência”.

A subordinação à concorrência capitalista, cuja hegemonia está na relação estruturalmente hierárquica e antagônica entre capital e trabalho, impõe entraves às experiências de cooperação. Há grande possibilidade dessas experiências - principalmente sendo pontuais e sem sustentação em um projeto político - definharem ou mesmo se readequarem as relações típicas de uma empresa capitalista. Nesse sentido, a luta passa a ser somente contra o modo de repartição capitalista, não pela sua superação.

Em suma, “os meios se tornam fins em si mesmos”, o que nos remete aos “velhos” paradigmas formulados pelo reformismo. Há, portanto, uma tendência das necessidades impostas pelo capital e pelo mercado orientarem as estratégias de produção e de distribuição do produto do trabalho cooperado: em vez de produzir para as necessidades humanas, produzem para a valorização do capital.

Na atualidade, em plena emergência da crise do capital, a faceta do neoliberalismo e da reestruturação produtiva promove um conjunto de mudanças na vida dos trabalhadores e de suas organizações. Como já indicamos no início desse capítulo, por um lado, uma série de mecanismos é desenvolvida pela classe dominante no intuito de enfrentar os impasses na acumulação durante a crise. Alternativas à situação de intenso desemprego, por exemplo, através de “empreendimento populares” - muitas vezes na forma de cooperativas e associações que não necessitem de grande capitalização -, são incentivadas por intermédio do discurso da colaboração, transferindo a responsabilidade pelas causas da crise aos próprios trabalhadores e garantindo o controle social e níveis necessários de exploração.

Por outro lado, tem tido notoriedade em vários países, especialmente na América Latina, diversas lutas e organizações da classe subalternizada que vêm repondo a necessidade de conjugar a cooperação entre os trabalhadores na produção a um projeto político de classe. Isso é fruto de um processo contraditório que gera o controle e a dominação capitalista, como também o seu contrário: a incontrolabilidade do capital e, portanto, os germes da sua superação.

O capital sempre foi e continua a ser um modo necessariamente incontrolado e incontrolável de controle sociometabólico que precisa subjugar tudo o que estiver no caminho de sua auto-expansão (...). A grande diferença hoje é que a irrestringibilidade do capital percorreu seu curso histórico, tornando a incontrolabilidade do sistema uma ameaça grande demais para ser ignorada pelo outro lado. Isto é o que confere ao projeto socialista marxiano maior

relevância hoje do que nunca antes, pois apenas a busca do verdadeiro