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Mo SAICO DE EXPERIÊNCIAS

Experiência 1 Corredor dos Sentidos

A proposta inicial do projeto consistiu em levar os alunos, dos 7os anos do ensino fundamental, a atuar em situações nas quais se-

riam privados do sentido da visão, a fim de que outras percepções fossem aguçadas, como a do olfato, do paladar, do tato e da audição. Ao início, percorreram um trajeto determinado pelas professoras, descalços e de olhos vendados, partindo de um local aberto e indo em direção a um espaço previamente preparado, no qual tocaram e caminharam sobre materiais de diferentes texturas e densidades, como papelão, plástico, algodão, folhas, pedras, lixas; obstáculos de alturas variadas; e sentiram gostos e aromas de alimentos e ele- mentos da natureza. Os materiais foram dispostos de diferentes maneiras – pendurados, colados em paredes ou colocados no chão ou sobre mesas. Outra preocupação desta pesquisadora foi a de haver, no espaço da atividade, música inserida na estética contem- porânea. Para isso, foi escolhida a composição de Karlheinz

Stockhausen, Gesang der Junglinge (Canto dos Jovens Adoles- centes) (1955-1956). Esse tipo de repertório foi utilizado como re- curso facilitador da vivência de sensações consideradas, de certa maneira, desconhecidas, uma vez que as organizações sonoras distam do padrão auditivo habitual da juventude, o que estimula a abertura para novas experiências.

Figura 3.1 – Aluno explorando o sentido do tato.

Figura 3.2 – Alunos de olhos vendados.

Ao término do percurso discutiu-se a respeito das sensações vividas, se seria ou não possível perceber um objeto sem o sentido da visão, de que maneira a percepção acontecia, em que tipo de am- biente eles imaginaram que estavam durante a caminhada e qual fora a reação deles ao verem e compararem com o que havia no local. Os jovens tiveram a oportunidade de fornecer depoimentos orais e escritos a respeito de suas experiências.

No corredor dos sentidos passamos por vários medos, não sabíamos o que viria pela frente. Ficamos com um pouquinho de medo, por não saber o que estava acontecendo com a gente. Senti um pouquinho de dor no pé por causa das pedras que pisamos, a única coisa ruim é que não foi toda a sala que colaborou com o corredor dos sentidos, e quem levantou a venda, provou que sem a visão não é ninguém. (7o B)

Eu senti medo, solidão, nojo e perigo. Parecia que estava num filme de terror, estava trêmula e nervosa. E quando vi, não tinha nada de perigoso, só coisas normais, como: amoeba, caixas de ovos, espuma, plantas, areia, isopor e plástico-bolha, nada era perigoso. Por isso que eu adorei a experiência, foi incrível, totalmente demais. (7o A)

Figura 3.3 – Trabalho de movimento corporal.

Conduzir os colegas foi muito legal, pois eu vi que tinha uma responsabilidade enorme. Eu estava conduzindo uma pessoa que não enxergava – eu tinha que conduzi-la, ajudá-la. Mas tenho certeza de que se alguém me conduzisse seria muito legal, me sentiria dependente. Para escolher uma pessoa para me conduzir teria que ser de confiança. Eu não sei se naquele momento meus amigos estavam confiando em mim, por isso achei legal e diferente. (7o C)

A partir desse exercício de sensibilização, cada professor tra- balhou separadamente em sua disciplina com ênfase no processo de invenção. Nos encontros de Música, os objetos que fizeram parte do percurso – pedra, água, papel, algodão, folhas – serviram de ponto de partida para a exploração e consequente composição mu- sical. A atividade exigiu dos alunos julgamento, seleção, exclusão e estruturação de suas ideias até que se dessem por satisfeitos. De- pois de pronta, a composição foi grafada, momento em que novas discussões surgiram a respeito de que tipo de notação e sinais se- riam utilizados, de tal forma que fosse compreensível ao grupo. Os resultados foram apresentados e compartilhados entre os alunos da classe.

Eu achei diferente, foi para mostrar melhor nossos sentidos. Olfato, audição, tato, sentir tudo sem enxergar. Também foi legal, porque po- díamos sentir o que estava pisando, parecia que estávamos numa floresta de verdade!!! Não sabíamos o que estava acontecendo, estávamos com os olhos tampados. (7o B)

Figura 3.5 – Trabalho de composição musical.

Figura 3.6 – Partitura musical elaborada por aluno 2.

O projeto foi finalizado com a vinda dos pais para a escola, a fim de participarem da mesma experiência de seus filhos, desta vez coordenada, não pelos professores, mas pelos próprios jovens, que os conduziram à sensibilização e à percepção dos sentidos. A con- clusão se deu com a manifestação, por parte dos pais, a respeito do que sentiram e pensaram durante o trajeto. Os depoimentos mos- traram a eficácia da proposta em vários aspectos, na busca pelo res- peito às diferenças e sensações do outro, na humanização ocorrida pela inversão de papéis entre professores e alunos, os quais na

função de coordenadores, tinham plena consciência dos objetivos da atividade e, também, na relação filhos e pais, em que os pri- meiros guiaram os últimos e serviu para que pais refletissem a res- peito da situação difícil ou prazerosa em que ela pode se tornar. A atividade proporcionou, ainda, um momento de aproximação ín- tima e afetiva entre ambos.

A experiência foi valiosa também no campo da sensibilização, que aguçou sentidos, sensações, imaginação e criatividade pouco exploradas na sociedade moderna.

Um fator a ser destacado é a importância da contextualização no processo de aprendizagem, a qual funcionou como “chave de es- cuta” para a compreensão do que estava sendo proposto e para o envolvimento por parte dos estudantes. O percurso de sensibili- zação preparou os alunos para suas composições e invenções, pois não encontraram dificuldade em elaborá-las. Além disso, a união das duas linguagens proporcionou coerência ao trabalho, visto de ângulos diferentes, mas com um mesmo fim.

Esse projeto teve a duração de três meses. Após sua finalização, cada professora seguiu com propostas e conteúdos de sua área es- pe cífica. Notou-se que, durante o projeto, o envolvimento dos alunos com as atividades foi grande. No entanto, houve regressões à medida que outras propostas surgiram e a relação mestre/ apren diz se modificou, acompanhada de conflitos em alguns casos.

Eu descobri que confio na minha filha porque não senti medo em momento algum.

Percebi que posso confiar no meu filho.

Figura 3.8 – Pais conduzidos por seus filhos.