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Créditos excluídos da recuperação judicial e sua análise

3 ANÁLISE DOS ASPECTOS ESTRUTURAIS DA

3.1 Falhas dos aspectos estruturais da recuperação judicial que

3.2.2 Créditos excluídos da recuperação judicial e sua análise

Consoante já exposto, a LREF exclui dos efeitos da recuperação judicial o crédito decorrente de alienação fiduciária de bens móveis ou imóveis, de arrendamento mercantil, de compra de imóvel cujos contratos contenha cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou com reserva de domínio, o adiantamento de contrato de câmbio, as obrigações contratadas nas câmaras compensação e de liquidação, por fim, o crédito tributário.

93 REsp nº 1.800.032 - MT (2019/0050498-5), Rel. Min. MARCO BUZZI, DJe: 10/02/2020.

94 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, apelação nº 5000461-37.2019.8.21.0008/TJRS, 6ª

Considerando que deve ser respeitado a norma jurídica, tais créditos não devem ser incluídos na recuperação judicial ainda que, no caso específico, a não inclusão implicar na impossibilidade de restruturação da empresa.

No entanto, a interpretação que envolve os créditos excluídos deve ser analisada restritamente, vez que, a regra, é a submissão do crédito na recuperação judicial, conforme se verifica no art. 49, caput, da LREF. Portanto, as hipóteses previstas na lei referente a exclusão dos créditos é uma exceção da lei, devendo sua análise, em conjunto com o princípio da preservação da empresa, se dá de modo a não ampliar as causas de exclusão da submissão ao procedimento , já que a finalidade da lei é permitir a reorganização da empresa para sua preservação.

A esse respeito, as lições clássicas da doutrina remetem o entendimento de que a norma de exceção deve ser analisada restritivamente para que não se retire a razão de ser da lei95, no caso da LREF, não se deve estender as hipóteses de crédito não submetidos à recuperação judicial e sua aplicação.

Nessa linha, podemos verificar a questão da cessão fiduciária de crédito, a LREF dispõe que o proprietário fiduciário de bem imóvel e móvel está excluído da recuperação judicial, todavia, acabou por estender a norma para cessão fiduciária de crédito.

A alienação fiduciária se trata de garantia prevista no art. 66-B, da Lei 10.931, de 2004, que alterou a Lei 4.728, de 1965, na qual prevê a possibilidade de alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito.

Manuel Manoel Justino Bezerra Filho (2019), Ivanildo Figueiredo (2018) ensinam que a cessão fiduciária somente deveria ser excluída da recuperação judicial se tivesse constado expressamente na LREF.

95 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica aplicada ao direito. Rio de Janeiro: Forense, 1970, p. 225 e

ss; REALE, Miguel. Lições preliminares. 27. ed ajustada ao novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 277 e ss.

Consoante destaca Manoel Justino Bezerra Filho (2019, p. 188), a LREF não foi elaborada para permitir a cessão fiduciária, visto que tal garantia não era conhecida pelo legislador, considerando o pouco tempo de vigência da lei que a instituiu:

A Lei 11.101/2005 não foi elaborada para permitir a introjeção da figura da cessão fiduciária de recebíveis, esta Lei lida apenas com a alienação fiduciária, pois esta era a forma existente e conhecida do legislador de então, que não conhecia a cessão e não a considerou para fins de elaboração da Lei. Por isto mesmo, para a LREF a cessão não existe, a cessão não foi considerada em sua estrutura e portanto, nenhum credor pode gozar do benefício da cessão fiduciária, em caso de recuperação judicial.

Entendimento diverso é lecionado por Fábio Ulhoa Coelho (2009), Márcio Calil de Assumpção e Melhim Namem Chalhub (2009), que enquadram como bens móveis os direitos creditórios, em geral, inclusive os representados por títulos de crédito, o que permite a exclusão da cessão fiduciária da recuperação judicial.

O entendimento é consolidado no Superior Tribunal de Justiça96 no sentido de excluir a cessão fiduciária de crédito do âmbito da recuperação judicial, independentemente de a cessão ter ou não sido registrada no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, porém pode-se concluir, que a intepretação ocorreu de forma ampliativa no fato de inserir a cessão fiduciária dentro do conceito de bem móvel, o que viola a interpretação restritiva e a finalidade da lei.

Outro ponto que envolve créditos excluídos, cuja regra de hermenêutica em conjunto com o princípio da preservação da empresa, se trata de perecimento da garantia da alienação e cessão fiduciária.

A LREF, como mencionado, afasta a alienação fiduciária dos efeitos da recuperação judicial porquanto o bem dado e garanta já pertence ao credor, de modo que a obrigação, se não paga, e liquidada com as garantias dadas.

96 REsp 1.202.918-SP, Rel. Min. Villas Bôas Cueva, julgado em 7/3/2013 e REsp 1.412.529-SP, Rel.

Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/12/2015, DJe 2/3/2016.

Nesse assunto, Márcio Calil de Assumpção e Melhim Namem Chalhub (2009, p. 136) destacam:

A exclusão dos bens e dos direitos de crédito objeto de garantia fiduciária do plano de recuperação decorre do fato de não integrarem o patrimônio da recuperanda, uma vez que, antes do pedido de recuperação, ela já os havia transferido/cedido, ainda que em caráter fiduciário, ou credor fiduciário.

Todavia, somente deve ser excluída da submissão da recuperação judicial as obrigações que a garantia seja existente e executável, sob pena do credor buscar a satisfação do crédito em outros bens da empresa em recuperação judicial.

Denota-se que a lei específica de alienação e cessão fiduciária no âmbito do mercado financeiro e de capitais, dispõe que se aplica às referidas garantias os arts. 1.421, 1.425, 1.426, 1.435 e 1.436 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

O art. 1.436 do Código Civil dispõe as formas de extinção da garantia, a saber: (i) extinguindo-se a obrigação; (ii) perecendo a coisa; (iii) renunciando o credor; (iv) confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e de dono da coisa; (v) dando-se a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa garantida, feita pelo credor ou por ele autorizada.

Na prática, na hipótese de ocorrer ato que implique na extinção da garantia, torna-se a obrigação destituída de garantia, o que deve implicar na sua submissão à recuperação judicial, sob pena do credor, que não possui o bem objeto da garantia, ser privilegiado perante os demais credores, o que é vedado pela par conditio creditorum.

Na mesma toada, a garantia fiduciária deve ser especificada, ou seja, os bens, objeto da garantia, deve ser identificado no contrato tanto no caso de imóvel, móvel e títulos de crédito.

A ausência de especificação da garantia também dá ao credor privilégios de satisfação do crédito, ao permitir que o credor possa buscar bens indiscriminadamente da empresa para pagamento da sua obrigação.

A exclusão do crédito na recuperação judicial deve estar vinculada expressamente nas hipóteses previstas na LREF, ao passo que o credor fiduciário somente pode satisfazer a sua dívida, fora da recuperação judicial, com a garantia prestada, logo, o credor não pode escolher a forma de satisfazer a dívida deve observar a garantia prestada, se existente (WAISBERG, 2018), sob pena de renúncia.97

Se após à excussão da garantia, o crédito não ter sido totalmente satisfeito, o saldo deve ser submetido à recuperação judicial, pois não se deve permitir a expropriação de outros bem que não foram dados como garantia fiduciária.