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2 A RATIFICAÇÃO DA CONVENÇÃO SOBRE OS ASPECTOS CIVIS DO

3.5 Críticas internacionais: as dificuldades enfrentadas no cumprimento da CH80 pelo

sítio do Ministério da Justiça que deverá ser preenchido em português e na língua falada no Estado de Refúgio.

A partir do momento em que toma ciência de uma remoção ou de uma retenção ilegal de um menor de 16 anos, a ACAF recebe, analisa e encaminha o pedido de cooperação jurídica internacional para Autoridade Central referente ao Estado para o qual a criança foi movida, buscando obter as informações necessárias para compreender o ocorrido, bem como para identificar e localizar a criança. Caso essa não seja localizada, a INTERPOL deve ser acionada. Nos casos mais complexos, os Consulados brasileiros presentes no Estado de Refúgio podem ser acionados com o fito de prestarem apoio no retorno do infante ao Brasil (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018, p. 12).

3.5 Críticas internacionais: as dificuldades enfrentadas no cumprimento da CH80 pelo Brasil

Desde a adesão do Brasil à CH80, o país tem recebido diversas críticas da comunidade internacional no que se refere ao cumprimento da referida convenção. A maioria dessas refere-se à morosidade com a qual os pedidos são processados no país. O caso de mais longa duração ainda pendente no Brasil possui 11 anos e ainda aguarda a sua resolução no STF (Brazilian Times, 2017).

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Os documentos necessários são: Cópia do documento de identificação do requerente, com foto (RG, passaporte, etc); Cópia da certidão de nascimento da criança; Cópia da certidão de casamento dos genitores, se for o caso; Cópia de sentença de guarda, se houver; Cópia da sentença de divórcio, se houver; Cópia de comprovante de união estável ou casamento, se houver; Cópia de decisões judiciais anteriores ou posteriores à transferência ilícita; Cópia da autorização de viagem, se houver; Documentos que comprovem que o Brasil era o país de residência habitual da criança antes da subtração internacional ilegal perpetrada pelo genitor, como cartão de vacina, plano de saúde, declarações de matrícula escolar, de vizinhos, de entidades/locais frequentados pela criança, etc.; Documentos que comprovem que o genitor exercia os cuidados com a pessoa da criança e/ou o direito de decidir seu local de residência, como decisões judiciais de guarda/visita, comprovantes de pagamento de alimentos, de planos de saúde etc.; Foto da criança e da pessoa que supostamente a subtraiu; e Informações que levem à localização da criança no país para onde ela alegadamente foi transferida ou retida, se disponíveis.

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O formulário pode ser encontrado seguinte link: http://www.justica.gov.br/sua-protecao/cooperacao- internacional/subtracao-internacional/arquivos/formulario-em-pdf.

O Decreto 3.413/2.000, em seu artigo 11, estabelece um prazo para que seja prolatada uma decisão quanto à situação da criança:

Artigo 11 – As autoridades judiciais ou administrativas dos Estados Contratantes deverão adotar medidas de urgência com vistas ao retorno da criança. Se a respectiva autoridade judicial ou administrativa não tiver tomado uma decisão no prazo de 6 semanas a contar da data em que o pedido lhe foi apresentado, o requerente ou a Autoridade Central do Estado requerido, por sua própria iniciativa ou a pedido da Autoridade Central do Estado requerente, poderá solicitar uma declaração sobre as razões da demora. Se for a Autoridade Central do Estado requerido a receber a resposta, esta autoridade deverá transmiti-la à Autoridade Central do Estado requerente ou, se for o caso, ao próprio requerente.

Assim, conforme o artigo descrito acima, as respectivas autoridades judiciais responsáveis deverão adotar medidas de urgência objetivando o retorno da criança para sua residência em até 06 semanas. Salienta-se que o prazo estabelecido é consideravelmente mais curto do que é visto nas práticas comuns do Poder Judiciário, de forma que urge a necessidade de estabelecer uma estrutura que garanta um procedimento verdadeiramente célere e que garanta a resolução do caso dentro do prazo da CH80.

Destaca-se que o objetivo do legislador ao estabelecer tal prazo foi de reduzir ao máximo as consequências negativas do deslocamento ilícito de menores, de forma que o retorno da criança fosse efetivado da maneira mais célere e eficiente possível. Conforme os comentários feitos pelo GPECH, a fixação desse prazo não foi aleatória, mas sim objetivou proteger os interesses da criança subtraída de sua residência habitual.

E, embora existam alguns casos que se conseguiu alcançar a resolução dentro do prazo estabelecido, a predominante demora na resolução dos casos de sequestro internacional de menores reportados no Brasil gerou um grande número de críticas advindas da comunidade internacional.

De acordo com Mônica Sifuentes (2009, p. 03), as maiores reclamações referem- se à demora do procedimento judicial e, principalmente, a três fatores específicos:

1) Os conflitos de jurisdição entre a Justiça Comum, dos Estados e a Justiça Federal; 2) Desconhecimento por parte dos Juízes e dos demais operadores do Direito sobre o conteúdo da Convenção de 1980;

3) Ausência de previsão, na legislação interna, de um procedimento judicial específico para atender à celeridade prevista na Convenção.

Em relação ao primeiro problema, sabe-se que o Brasil adota o modelo federalista e, consequentemente, possui duas esferas de competência judicial: a federal, que julga, em sua maioria, processos em que a União ou parte da administração indireta16 (suas autarquias e as empresas públicas) ocupa uma das partes processuais, e a estadual, que julga os casos que não se incluem na categoria anterior, exceto àqueles de natureza trabalhista.

A Constituição Federal estabelece como competência da Justiça Federal a apreciação de questões relacionadas aos tratados ou contratos firmados entre a União e algum Estado Estrangeiro em seus artigos 21, I e 109:

Art. 21. Compete à União:

I – manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;

[…]

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

III – as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional;

É comum que, quando for proposta perante a Justiça Federal a ação que requer o cumprimento da CH80, já tramite na Justiça Estadual uma ação que, equivocadamente, tem como objetivo fixar direito de guarda, proposta pelo genitor que está de posse da criança. A segunda ação é geralmente proposta para dar uma aparência de legalidade à conduta ilegal de sequestro executada. E isso pode facilmente acontecer pois, para que a ação seja proposta na Justiça Federal, é necessário que a ACAF receba o pedido de cooperação jurídica e, somente caso não logre êxito em obter o retorno do menor de forma amistosa, ocorre o encaminhamento do pedido à Advocacia-Geral da União, que peticiona ao juiz federal (SIFUENTES, 2009, p. 04).

Para sanar tal situação, que é constante fonte de conflitos, é indicado que se busque um elemento de conexão, de forma que se possibilite o conhecimento, de ambos juízes, estadual e federal, dos procedimentos e providências determinados por um ou outro (STF, 2018).

Outro motivo para a lentidão do processamento das demandas referentes à CH80 no Brasil é o desconhecimento de tal convenção por parte dos operadores jurídicos do país. É

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A denominada Administração Indireta é aquela criada pela Administração Direta (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) com o fito de desempenhar tarefas administrativas, tais como serviços públicos, de forma descentralizada. São as autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista.

evidente a pouca divulgação que a CH80 teve em território nacional, ela somente passou a receber destaque após a ocorrência do caso Sean Goldman, em meados de 2000, caso que foi amplamente divulgado pela mídia e em que aconteceram erros subsequentes por parte do judiciário brasileiro. Essa ignorância acarreta em atrasos tanto no processo administrativo quanto no judicial, quer seja por causa de pedidos formulados incorretamente ou seja por erros processuais (SIFUENTES, 2009, p. 04).

Por fim, salienta-se a ausência de previsão de um procedimento judicial especial capaz de cumprir a celeridade prevista na CH80. Como já dito anteriormente, a CH80 estabelece em seu art. 11º o prazo de 06 semanas para que a respectiva autoridade, administrativa ou judicial, manifeste-se e adote medidas de urgência que culminem no retorno da criança subtraída ilicitamente.

De acordo com Nádia de Araújo (apud SIFUENTES, 2009, p. 05), o prazo especificado já é de difícil cumprimento devido a uma contradição presente na CH80, pois, mesmo que se exija que a situação se resolva em um prazo curto, também se requer uma análise detalhada do caso, para julgar se a saída do menor de sua residência habitual foi ilícita. Ademais, o rito normalmente adotado nos casos de cooperação internacional que envolvem a aplicação da Convenção de Haia de 1980 não é um rito específico julgado por juízes conhecedores do assunto, mas sim é o procedimento cautelar de busca e apreensão (SIFUENTES, 2009, p. 05) que, embora seja célere, não se adequa perfeitamente às aos pleitos referentes aos casos de sequestro interparental, já que a CH80 possui uma série de definições operacionais específicas.

Sobre o mesmo assunto, o Grupo Permanente de Estudos sobre a Convenção da Haia de 1980, por meio de seus comentários tecidos à legislação (STF, 2018), reitera a necessidade da criação de uma ação que seja de natureza própria e autônoma, pois o rito atual é ineficiente e incapaz de atender às necessidades das partes envolvidas no processo:

No entanto, há necessidade de revisão doutrinária sobre o tema, a fim de que se esclareça que a ação de busca, apreensão e restituição de menor, promovida pela Advocacia-Geral da União com base na Convenção, é ação própria e autônoma, ensejando amplo espectro probatório e não exigindo a propositura de ação de conhecimento. Ela não se confunde com a ação de busca e apreensão regulada pela Lei Adjetiva Civil. Certo é que no Brasil tem-se o instituto da antecipação de tutela (art. 273 do CPC) que permite ao juiz, já na inicial da ação, fazer um adiantamento do mérito do pedido. Observa-se, ainda, que vários países signatários têm criado leis próprias para a busca e apreensão de criança de que trata a presente Convenção.

Porém, o GPECH, ciente dessas críticas internacionais, sugere, segundo Sifuentes (2009, p. 09), uma série de medidas capazes de sanar os problemas listados acima:

1) Criação de classes processuais específicas sobre o sequestro internacional de crianças, no sistema informatizado da Justiça Federal, facilitando o controle da tramitação de todos os processos que ali ingressarem. Atualmente, sem essa classe especifica, os processos da Haia são classificados genericamente como Busca e Apreensão, o que envolve vários outros processos cíveis, com objetivos diferentes, como, por exemplo, busca e apreensão de documentos e de bens, em regra utilizados apenas para garantir a realização da prova processual ou da execução.

2) Criação de banco de dados nacional, de modo a tornar possível a identificação de todas as ações que estiverem tramitando tanto na Justiça Estadual como na Federal. Esse procedimento possibilitará à Autoridade Central brasileira, ao receber um pedido de cooperação internacional com base na Convenção de 1980, imediatamente verificar a existência de eventual ação de guarda do menor em curso na Justiça Estadual. Permitirá ainda aos juízes, tanto federal como estadual, ficarem

informados sobre a ocorrência de ação paralela, na outra jurisdição, e assim tomar as medidas que forem adequadas.

3) Elaboração de projeto de lei disciplinando a aplicação da convenção, inclusive com regulamentação do procedimento judicial.

Além da criação do GPECH em 2006, muitas outras medidas foram adotadas pelo Brasil com o objetivo de dar mais efetividade ao Decreto nº 4.413/2.000. Destacam-se, dentre elas, a criação da Comissão Permanente sobre Subtração Internacional de Crianças em 2014 e o estabelecimento de juízes de enlace 17 entre Haia e o Brasil.

Dessa forma, é visível os esforços do ordenamento brasileiro para chegar à verdadeira efetividade da CH80. E, como resultado desses, já houveram, como foi apontado anteriormente, diversos avanços na estrutura do país. Porém, como será demonstrado no próximo capítulo, as críticas feitas pela comunidade internacional tornam-se evidentes ao contemplar-se as resoluções de casos práticos.

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Juízes de enlace atuam facilitando a comunicação entre os membros da própria jurisdição e juízes pertencentes a outros Estados signatários da CH80. Eles são contatados nos casos em que há excessiva demora ou em situações mais complicadas, em que a respectiva ACAF solicita auxílio.