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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E CONTEXTO DA PESQUISA

2.5 O marketing de relacionamento na promoção de medicamentos éticos

2.5.1 Práticas e estratégias de relacionamento

2.5.1.3 Criação de valor para o cliente

Segundo Kleinowski (2009), o valor é reconhecido pelos pesquisadores e profissionais de marketing como um dos constructos mais relevantes do relacionamento, tanto no seu estudo individual quanto na relação com outros constructos.

Sirdeshmukh, Singh e Sabol (2002) já observavam que o valor é uma variável mediadora entre a confiança e a lealdade, consistente na percepção dos consumidores da diferença entre os benefícios e os custos de manter-se um relacionamento com um fornecedor.

Assim, um cliente pode permanecer leal a uma empresa se perceber que está recebendo maior valor do que receberia de uma empresa concorrente. Gummesson (2010) corrobora essa assertiva e diz que o ciclo de vida de um relacionamento com um cliente é baseado na crença de que a capacidade do fornecedor de satisfazer suas necessidades e cumprir as promessas determina as chances de manter o cliente.

No entanto, como já foi visto, atrair e reter clientes pode ser uma tarefa bem difícil, já que têm a sua disposição uma gama de ofertas (produtos e serviços) bastante ampla. Para Kotler e Armstrong (2007), um cliente compra de uma empresa que lhe ofereça o mais alto valor por ele percebido - na avaliação da diferença entre todos os benefícios e todos os custos de uma oferta ao mercado - em relação às ofertas do concorrente.

Assim, se os produtos ou serviços de uma empresa atendem às necessidades de um comprador, e esse considera o preço cobrado justo, pode-se dizer que o negócio produziu valor para o comprador, ou seja, a proposição de valor funcionou.

Para gerar valor aos clientes é necessário combinar estes três fatores na oferta de produtos e serviços: o que os clientes valorizam, que tratamento consideram justo e adequado e quanto estão dispostos a pagar por isso. Para Berry e Parasuraman (1995), o valor é a cola

que une a empresa ao cliente, e reflete o benefício total que os clientes recebem pelo custo total em que incorrem. No centro dos benefícios e custos que impressionam os clientes estão a confiança, a sensibilidade, a segurança e a empatia em relação ao serviço.

Segundo Gilbreath (2012), para isso, é preciso determinar o que faz as pessoas se comportarem e pensarem de uma determinada maneira - o que é verdadeiramente importante para elas e o que anseiam.

Levitt (1990, p. 89) ensina que “somente o comprador pode atribuir valor, porque este reside apenas nos benefícios que ele quer ou recebe. Para ele o produto não é apenas a coisa em si, é, na verdade, um aglomerado complexo de satisfação de valor”.

Segundo Stremersch (2008), um dos principais impulsionadores do marketing na área da saúde é a disponibilidade de dados, não só em termos quantitativos, mas também qualitativos. Tais dados levam à informação, base para o estabelecimento e a prática de três níveis de relacionamentos, a saber: com quem contatar, frequência com que os contatos devem acontecer e informações e resultados de cada contato.

Assim, a distinção dos médicos de acordo o com seu potencial de prescrição ou de multiplicação de sua opinião norteia as práticas de relacionamento dentro das empresas farmacêuticas de produtos éticos, definindo quem deve ser contatado (MINADEO, 2010). Quanto maior for o potencial de prescrição de um médico, maior será a frequência de seu contato com a empresa e mais úteis serão as informações repassadas por esses profissionais ao laboratório, notadamente, via propagandista.

No entanto, Jain (2007) alerta para o fato de que a prescrição médica não é uma simples ação técnica, e sim uma interação social complexa com muitos níveis de significado.

Rod, Ashill e Carruthers (2007) não só concordam com esse entendimento como consideram um dos temas mais discutidos na área do marketing farmacêutico o retorno sobre os investimentos feitos em um ambiente tão volátil, de constante mudanças e no qual todos os intervenientes (stakeholders) influenciam ou são influenciados a / ou pela prática do marketing farmacêutico vigente.

O médico escolhe o tratamento mais eficaz e seguro para o paciente com base em seu conhecimento acadêmico e na sua experiência ou na de seus pares, e ainda em informações adquiridas em congressos, revistas especializadas ou redes de contatos individuais (FIUZA; LISBOA, 2001).

Assim, em um mercado tão competitivo como o de produtos éticos, que reúne uma oferta considerável de produtos de marca, genéricos e similares que atendem às necessidades básicas dos pacientes, o médico optará por aquele que lhe inspira mais

segurança, mais confiança, enfim, pelos produtos daquela empresa com quem mantém vínculos sociais mais profundos. Para isso, Gilbreath (2012) sugere ser necessário descobrir quais necessidades dos clientes não foram atendidas – não apenas no segmento no qual a empresa atua, mas no âmbito mais amplo da vida -, que o autor chama de “necessidades de alto nível”.

Como já exposto, para um médico, a prescrição do remédio certo é uma forma de outorgar o seu prestígio e reforçar o seu poder sobre os pacientes. Segundo Oliveira, S. e Oliveira, J. (2004), o prestígio seria um dos principais motivos para uma organização, num canal de marketing, querer identificar-se publicamente com outra.

Nesse sentido, o poder de referência de um grande laboratório seria mais do que suficiente para perpetuar relacionamentos rentáveis com os clientes médicos, principalmente em razão de sua habilidade de agir mediante intermediários e de ter um nome que serve como marca para consolidação frente aos usuários do produto.

No entanto, não é o que se percebe. Para Barros (1995), por mais que tais empresas desejem passar a imagem de que o alvo de suas atividades é a saúde e o bem-estar da sociedade, a prática evidencia uma orientação marcadamente dirigida para o retorno econômico, alimentada a partir de seu poder de recompensa.

Para Kotler (2000) o poder de recompensa se evidencia quando o fabricante oferece aos intermediários benefícios adicionais para a realização de ações ou funções específicas. Submetem-se, dessa forma, às vontades do fabricante, não por perceberem-na como a melhor estratégia, mas devido ao benefício externo proporcionado por ele.

Entre as atividades de promoção farmacêutica, amplamente debatidas, a estratégia de persuasão médica mediante recompensas é bastante criticada, pois, conforme Wazana (2012), é responsável pela influência das prescrições médicas, pelo aumento de custos (repassado aos pacientes) e por resultados negativos de saúde.

Lobo (1979, p. 91) afirma que “a pressão publicitária farmacêutica não é apenas grande como também diversificada. O instrumento publicitário típico deste setor é o propagandista, identificado por vários estudos como a origem de gastos totais com promoção de venda, provavelmente, em todos os países”.

A indústria farmacêutica se utiliza desse vetor para desenvolver e direcionar o momento de aprendizado do médico para os interesses comerciais dos laboratórios. Desde os tempos de faculdade, os estudantes de medicina são frequentemente seduzidos pelos grandes laboratórios com treinamentos (que podem ser incluídos em seus currículos), ofertas de almoço, jantares e lanches e manipulação das amostras das drogas, destinados ao

desenvolvimento de um relacionamento cordial entre a empresa e os futuros clientes médicos (WAZANA, 2012).

Segundo Jain (2007), a reduzida disponibilidade de fundos do governo para a educação tem elevado substancialmente o apoio comercial a atividades educacionais por parte da indústria farmacêutica, resultando em conflitos entre essa e a academia.

Em sua defesa, os laboratórios alegam que a promoção de produtos farmacêuticos constitui um importante veículo de informação, agregando valor ao relacionamento entre as empresas e os médicos. Consideram, portanto, que longe de levar à prescrição de medicamentos desnecessários, ou de custos elevados, a prática promocional tem o efeito de ajudar os médicos a descobrirem medicamentos certos para seus pacientes (LABRIE, 2011).