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1.5 LISTA DE SIGLAS E DEFINIÇÃO DE TERMOS

2.1.3 Administração pública brasileira

2.1.3.4 A crise da administração pública

2.1.3.4.1 A crise do Estado de bem-estar social

A crise do Estado de bem-estar pode ser entendida por meio das afirmações de Drucker (1972). Para esse autor há uma crescente evidência de que o governo é antes grande, do que forte; que é gordo e flácido e não poderoso; que custa muito caro e não consegue muito. Há uma evidência cada vez maior, também, de que o cidadão acredita cada vez menos no governo e de que está cada vez mais desapontado com ele. Observa-se que o desapontamento com o governo ultrapassa as fronteiras nacionais e as linhas ideológicas: Prevalece tanto nas sociedades comunistas quanto nas democráticas. Percebe-se essa evidência quando a maioria das pessoas denota que transferir uma área para as mãos do governo cria conflitos, direitos adquiridos e complica decisões. Esta constatação reforça a sensação de que o governo não está funcionando.

O maior desânimo é o Estado do bem estar social, [...] o melhor que dele conseguimos é a mediocridade competente (DRUCKER, 1972, p. 248). O governo é um administrador fraco. Preocupa-se, é claro, com os processos, pois também é necessariamente grande e desajeitado. O governo está perfeitamente consciente do fato de que ele administra fundos públicos e de que é obrigado a prestar contas de cada centavo. Não tem outra escolha que não a de ser “burocrático” no sentido mais comum do termo (DRUCKER, op.cit., p. 260).

Reportando-se à realidade brasileira, Castor e França (1986) salientam que os fundamentos teóricos e operacionais do atual sistema administrativo brasileiro remontam à década de trinta e que em todos os setores cresce a convicção de que a administração pública brasileira está reagindo lenta e insatisfatoriamente às mudanças econômicas e sociais que se processam a sua volta.

Observa-se concordância desta afirmação em autores como Teixeira e Santana (1994) ao salientarem que, a partir dos anos 30 a administração pública brasileira, associada a um modelo de industrialização fortemente induzido pelo Estado, centrou-se nas questões de integração nacional, estendendo a todo o território redes de comunicação, transportes e infra-estrutura básica, instituições e

mecanismos de administração voltados para o fortalecimento do mercado interno e a constituição de um aparelho central de governo. Com base nele, desencadeou-se o processo de substituição de importações do qual o Estado brasileiro foi-se tornando o principal investidor na economia, assumindo progressivamente o papel de um Estado produtor.

Segundo estes autores (op. cit.) com o fim do período de substituição de importações nos anos 60 e o início da internacionalização da produção do país, acontece uma modernização de certos setores de administração governamental. As agências estatais de desenvolvimento passam a coexistir com a administração tradicional, não envolvida com o Estado produtor. Estabelecem-se, assim, grandes disparidades organizacionais entre os organismos do próprio Estado.

Teixeira e Santana (1994) salientam, ainda, que a década de 70 - marcada pelo fortalecimento da estrutura estatal autoritária que se instalara em 1964 - registrou um novo avanço do papel do Estado como principal investidor na economia, acarretando uma expansão da máquina estatal e uma da fragmentação dentro da própria administração governamental. É desta época o decreto-lei 200 que estabeleceu uma reforma administrativa e institucionalizou uma maior autonomia para os órgãos da administração indireta e limitou os órgãos da administração direta às funções normativas e de supervisão. Só que, na prática, a inexistência de uma articulação mais sistemática entre a administração direta e indireta, aliada ao crescente esvaziamento técnico dos órgãos da administração direta, termina por comprometer a atuação do Estado em sua função de coordenação central e regulamentação equilibrada.

De fato, os anos 70 foram marcados por uma fase de crescimento, ofuscando os limites do frágil modelo de gestão pública vigente, fragilidade essa que veio minar as estreitas bases do modelo com a crise econômica em que o País mergulhou nos anos 80 (TEIXEIRA; SANTANA, 1994). O aparelho público degrada- se em todas as áreas de atuação direta e indireta do Estado. Nada foi poupado: a escola pública faliu, a saúde pública regrediu a padrões incompatíveis com o mundo civilizado, a corrupção atingiu níveis altíssimos e os órgãos de segurança cederam espaço a grupos de extermínio.

Somaram-se à exaustão do modelo de Estado - condutor do processo econômico e social, acima referido -, a inflação crescente, o desequilíbrio

orçamentário crônico que erodiu a capacidade do Estado de prestar serviços e as sequelas do clientelismo, do corporativismo, do populismo e da corrupção que encheram de maneira desordenada os quadros do Estado. A partir daí, criaram-se privilégios injustificáveis a alguns extratos de funcionários estatais à custa do contribuinte; foram aposentadas precocemente milhões de pessoas, graças às leis de favorecimento; em todos os níveis disseminou-se uma relação espúria entre o Estado contratador e o Estado comprador de um lado, e seus fornecedores e empreiteiros de outro. A soma dessas patologias encareceu brutalmente o custeio estatal, sem contribuir para a ampliação dos serviços essenciais (CASTOR, 1995).

Castor e França (1986) apontam outras causas que podem ser vistas como causadoras das disfuncionalidades que se desenvolveram nas estruturas e na operação do aparato estatal brasileiro. Essas causas podem ser sumarizadas em quatro fascínios que se acham empregados à administração pública:

a) fascínio pela eficiência econômica setorial: na medida em que o aparato regulador e produtivo estatal se consolidou no país, cada um de seus segmentos passou a definir critérios de eficiência econômica com resultados desastrosos, pois os setores de maior prestígio institucional e poder financeiro passaram a impor critérios particulares e setoriais ao total no conjunto nacional, o que o levou a uma sub-otimização na alocação de recursos em termos globais;

b) fascínio pela uniformidade e pelo controle do ambiente: consiste na crença de que quanto mais uniformes e monolíticas forem as ações políticas, mais eficiente será a atuação do governo. Instalou-se a crença de que as organizações governamentais deveriam controlar no maior grau possível o ambiente em que operam, e evitar a todo custo a intrusão de leigos e estranhos;

c) fascínio pela grande escala: em geral os formuladores de decisões públicas parecem presumir que existe uma correlação positiva, inquestionável e automática entre tamanho e eficiência e uma correlação inversa entre tamanho e custo. A partir desta suposição, eles concluem que a adoção de soluções produtivas e organizacionais de grande porte é a opção mais econômica para a implementação de projetos e políticas públicas;

d) fascínio pela modernidade: a modernidade é uma categoria sociológica de enorme influência em todo mundo. Ela desenvolve um senso de competência quando o homem começa a pensar que pode entender a natureza e a sociedade para seu próprio propósito. Coerente com isto, o desenvolvimento passa a ser entendido com um processo histórico de modernização. A modernidade exerce um verdadeiro fascínio à máquina estatal brasileira quando cultua as soluções consagradas em outros países e despreza as inspiradas na cultura popular, a despeito de seus custos sociais, energéticos e ambientais.