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Critérios de contabilização dos dados do teste oral de produção semi-

3 METODOLOGIA

3.3 Teste oral de produção semi-espontânea

3.3.3 Critérios de contabilização dos dados do teste oral de produção semi-

É fundamental, antes do início do capítulo de resultados e análise, discriminar quais foram nossos critérios para contabilizar as ocorrências de verbos na fala semi-espontânea. Para isso, na presente subseção, pretendemos explicitar que tipo de ocorrências consideramos na análise de nossos resultados, assim como dar exemplos de ocorrências que não incluímos em nossos resultados.

Primeiramente, ressaltamos que só contabilizamos para análise os verbos de estado presentes nas classificações de Duarte & Brito (2003) e Halliday & Mathiessen (2004), conforme já mencionamos no capítulo 2. Consideramos todas as ocorrências dos verbos de estado classificados por esses autores que estivessem veiculando o aspecto imperfectivo contínuo independentemente da morfologia utilizada.

Para a análise dos dados da fala semi-espontânea, portanto, consideramos todos os verbos listados como verbos de estado por Duarte & Brito (2003) e Halliday & Mathiessen (2004) e suas respectivas traduções, ou seja, se Halliday & Mathiessen (2004) classificam um determinado verbo como de estado no inglês e Duarte & Brito (2003) não incluem esse mesmo verbo como de estado no português, optamos por incluí-lo ainda assim na análise dos dados do PB, utilizando todos os mesmos verbos que possam vir a aparecer nos dados nas duas línguas para fins de comparação. Como exemplo, podemos citar o caso do verbo “to

enjoy”, incluído na classificação de Halliday & Mathiessen (2004). A tradução desse verbo

para o português, “curtir”, não foi incluído na classificação de verbos de estado de Duarte & Brito (2003). No entanto, uma vez que esse verbo em inglês encontra-se na classificação de Halliday & Mathiessen (2004), optamos por incluir a sua tradução em português na nossa análise para fins de comparação entre as duas línguas.

No entanto, não consideramos como dados hesitações de fala dos informantes, tampouco expressões cristalizadas que apresentassem verbos classificados por Duarte & Brito (2003) e por Halliday & Mathiessen (2004) como sendo verbos de estado, como, por exemplo, as expressões cristalizadas em português “sei lá”, “tá?”52

e “sabe?” e em inglês “you

know”, “you see” e “who knows”, utilizadas, majoritariamente, como marcadores discursivos,

como podemos ver nos exemplos abaixo, em (23), retirados de nossas transcrições:

52 O verbo estar em sua forma contraída “tá” quando encontrado ao fim da sentença com um tom de pergunta é usado para confirmar o que foi falado anteriormente ou para pedir aprovação sobre alguma coisa. É um uso que tem valor semântico similar às expressões “tá certo?”, “está tudo bem?” e “ok?”.

23. (a) “[Ele] fica distratando as pessoas. Isso não tá certo, sabe?” (b) “Então, não lembro muito bem de você. Desculpa, tá?”

(c) “É esse tipo de amizade que você acha que a gente tem? Sei lá, pode ser pra você, mas isso não é amizade pra mim não.”

(d) “You know, this movie is so good. I’m really enjoying it!”

(e) “You see, I just have a bad memory and (…) I cannot remember your name.” (f) “It’s September 29. Maybe it’s a birthday, who knows.”

A ambiguidade na interpretação aspectual da ocorrência também foi um critério para descarte de ocorrência. Desse modo, descartamos também as ocorrências em que era inviável saber se, de fato, a morfologia utilizada pelo informante realmente veiculava o aspecto imperfectivo contínuo. Vejamos dois exemplos, em (24), de ocorrências dessa natureza nas duas línguas:

24. (a) “Essa música tá ruim, esse pessoal eu não gosto. Eu queria estar em casa!” (b) “Oh my God, it is so annoying. My neighbors decided to throw a big party.” Como podemos ver nos verbos em destaque em (24), tanto em (a) quanto em (b), não podemos confirmar se o aspecto veiculado pela morfologia de presente simples é o aspecto imperfectivo contínuo ou o habitual. No caso de (24a), não podemos afirmar se o informante não está gostando do pessoal que o cerca naquele momento e naquela ocasião específica ou se, normalmente, ele não gosta daquelas pessoas nas ocasiões em que encontra com elas. No caso de (24b), não podemos afirmar se o informante quer dizer se o fato de haver uma festa na casa dos vizinhos naquela ocasião específica está (sendo) algo irritante e desagradável ou se, normalmente, o fato de haver uma festa no vizinho é algo irritante e desagradável. Sendo assim, nessas e nas outras sentenças em que não conseguimos precisar o valor de aspecto gramatical que os verbos veiculavam, optamos por descartar tais ocorrências.

Outro ponto importante que devemos mencionar aqui é o critério que utilizamos para a classificação do verbo “estar”. No PB, o verbo “estar” tanto pode ser classificado como um verbo copulativo, uma vez que esteja acompanhado de um predicativo do sujeito, quanto pode ser classificado como um verbo locativo, uma vez que esteja acompanhado de uma expressão locativa, como, por exemplo, o advérbio “aqui”. No entanto, em (25), destacamos algumas sentenças que nos chamaram atenção pelo fato de o verbo “estar” não vir acompanhando de predicativo ou expressão locativa.

25. (a) Ele tá com raiva.

(b) Eu não tô com paciência pra você. (c) Tu tá de sacanagem comigo?

As sentenças encontradas em (25), apesar de não apresentarem o verbo “estar” acompanhado de um predicativo, foram classificadas, em nossos dados como sentenças com

verbos copulativos. Em (25a), podemos entender que “estar com raiva” é o mesmo que “estar furioso, raivoso”. Em (25b) “estar com paciência” é o mesmo que “estar paciente ou disposto”. Em (25c), “estar de sacanagem” é o mesmo que “estar sendo sacana”. Desse modo, ainda que nenhuma das sentenças em (25) apresentem um predicativo do sujeito, nossa interpretação nos levou a considerar todos esses exemplos do verbo “estar” como verbos copulativos. Nas sentenças com o verbo “to be” em inglês, no entanto, não tivemos nenhum caso como os expostos em (25). Desse modo, não foi necessário o uso desse critério de interpretação.

Todas as sentenças que foram consideradas na análise de nossos resultados estão disponíveis nos anexos desta dissertação. No anexo A, estão disponíveis as sentenças produzidas pelos informantes do PB e, no anexo B, as sentenças produzidas pelos informantes do IEUA.

Depois de esclarecidos os detalhes em relação à nossa seleção de informantes, aos nossos recursos metodológicos e aos nossos critérios de contabilização de dados, a seguir, trataremos, no próximo capítulo, dos dados coletados. No quarto capítulo, portanto, apresentaremos nossos resultados e proporemos a análise desses dados.

4. RESULTADOS E ANÁLISE

“Se ninguém resiste a uma análise profunda, quanto mais eu [...] O amor é síntese: é uma integração dos dados. Não há que tirar nem pôr...”.

Mário Quintana

Neste capítulo, temos como objetivo apresentar nossos dados, obtidos a partir da metodologia desenvolvida para este estudo e apresentada no capítulo anterior, assim como nossa análise, proposta à luz do arcabouço teórico apresentado nos dois primeiros capítulos desta dissertação. Dedicamo-nos, neste capítulo, a contribuir para o entendimento do que caracteriza verbos de estado, sendo esse o objetivo geral deste trabalho. Mais especificamente, investigamos como verbos tipicamente classificados como verbos de estado veiculando o aspecto imperfectivo contínuo são realizados morfologicamente no PB e no IEUA. Além disso, fazemos uma análise comparativa entre as realizações morfológicas desses verbos nas duas línguas investigadas.

Para tanto, apresentaremos, separadamente, nas duas primeiras seções deste capítulo, os resultados de cada um dos métodos de coleta de dados para cada uma das duas línguas investigadas. Em seguida, na última seção deste capítulo, faremos uma análise comparativa entre os resultados obtidos nas duas línguas. Proporemos uma interpretação dos nossos resultados buscando argumentar em favor da proposta de Comrie (1976) de que verbos tipicamente classificados como verbos de estado, quando combinados à morfologia de progressivo, não devem ser considerados verbos de estado legítimos.

Dividimos este capítulo da seguinte forma: na primeira seção, 4.1, apresentaremos os resultados obtidos do PB; na segunda seção, 4.2, apresentaremos os resultados obtidos do IEUA e, na terceira e última seção, 4.3, faremos uma análise comparativa entre as realizações dessas duas línguas.

4.1 Resultados do PB

O primeiro objetivo específico deste trabalho é investigar como verbos tipicamente classificados como verbos de estado veiculando o aspecto imperfectivo contínuo são realizados morfologicamente no PB, para que pudéssemos aferir se os verbos classificados como de estado o são verdadeiramente. Em relação a esse objetivo, nossa hipótese, inspirada na definição de progressividade de Comrie (1976) e nas classificações propostas na literatura, é de que para realizar verbos classificados como verbos de estado veiculando o aspecto

imperfectivo contínuo, falantes nativos do PB se utilizam exclusivamente da morfologia de não progressivo.

Nesta seção, apresentaremos os resultados obtidos através da coleta de dados do PB por meio da realização do teste de preenchimento de lacuna e do teste oral de produção semi- espontânea, respectivamente, visando, ao final desta seção, retomar os nossos objetivo e hipótese referentes ao PB.