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Desenho do teste de preenchimento de lacuna

3 METODOLOGIA

3.2 Teste de preenchimento de lacuna

3.2.1 Desenho do teste de preenchimento de lacuna

Uma vez que este estudo investiga a realização morfológica de verbos de estado veiculando o aspecto imperfectivo contínuo no PB e no IEUA, decidimos elaborar um teste de preenchimento de lacuna que pudesse ser aplicado a falantes nativos dessas línguas. Trata-se do mesmo teste com duas versões, portanto: uma versão em português e outra em inglês. Vale a pena destacarmos que o texto das duas versões do teste é original, tendo criado pela própria pesquisadora.

O teste de preenchimento de lacuna é composto por dez parágrafos que conta a história de um jovem que conheceu a sua futura esposa no fatídico dia 11 de setembro de 2001. O texto apresenta dezoito lacunas a serem preenchidas. As lacunas foram distribuídas de maneira que os oito primeiros parágrafos apresentassem, em cada um deles, duas lacunas a serem preenchidas e os dois últimos parágrafos – o nono e o décimo – apresentassem, em cada um deles, uma lacuna a ser preenchida. Para cada uma das dezoito lacunas desse teste havia três opções de resposta. Desse modo, o informante teria que selecionar aquela opção que julgasse a melhor para completar a lacuna.

Dois terços das dezoito lacunas – ou seja, doze lacunas – eram consideradas distratoras. Portanto, apenas um terço das dezoito lacunas – ou seja, seis lacunas – eram consideradas alvo, devendo somente essas ser preenchidas por um verbo de estado. Então, é válido esclarecer que optamos por elaborar um teste com seis lacunas alvo porque decidimos trabalhar com uma classificação que conta com seis diferentes subclasses de verbo de estado. Utilizamos, no nosso teste, um verbo de cada uma das subclasses de verbo de estado propostas por Duarte & Brito (2003), como vemos no quadro (9) a seguir.

Quadro 9: Verbos utilizados para a feitura do teste de preenchimento de lacuna em português e em inglês.

Desse modo, nosso teste de preenchimento de lacuna possui seis lacunas-alvo, ou seja, lacunas contendo como opções de resposta verbos de estado com diferentes morfologias para descrever uma situação contínua. Em relação às sentenças nas quais esses seis verbos se encontram, há três verbos – os dos tipos copulativo, locativo e perceptivo – que se encontram na forma afirmativa e três – os dos tipos epistêmico, existencial e psicológico – se encontram na forma negativa.

As doze sentenças restantes são lacunas-distratoras, postas no teste com o intuito de realmente distrair os informantes e fazer com que eles não percebam o fenômeno que está sendo investigado. A estratégia de incluir distratoras em nosso teste tem como objetivo, portanto, evitar possíveis alterações de resposta nas sentenças-alvo, devido a um monitoramento consciente da realização linguística do fenômeno investigado. No nosso teste, as sentenças distratoras dizem respeito à escolha lexical de itens como verbos45, advérbios, substantivos, preposições e conjunções.

Como se trata de um teste de múltipla escolha, cada lacuna deve ser preenchida com uma das três opções oferecidas. Dentre as três opções dadas, somente duas opções mantêm a gramaticalidade46 ou a plausibilidade semântica da sentença. Sendo assim, sempre há uma opção de resposta que torna a sentença agramatical ou semanticamente estranha, e, por essa

44 Apesar de Duarte & Brito (2003) não exemplificarem os verbos copulativos com o verbo de estado “ficar”, Halliday & Mathiessen (2004) classificam o verbo “to become”, uma tradução possível para o verbo “ficar”, como um verbo relacional, o qual está sendo entendido como verbo de estado copulativo neste trabalho, conforme tratado na seção 2.4. Além disso, levamos em conta o fato de que Bittencourt (2015), em seu trabalho sobre o PB, classifica o verbo “ficar” como um verbo de estado copulativo, como em “O trabalho está ficando bom” (BITTENCOURT, 2015, p.51).

45 Vale ressaltar que os verbos utilizados em nossas lacunas-distratoras não se tratam de verbos de estado. Utilizamos, por exemplo, os verbos “contar”, “dizer”, “planejar” e “combinar” em português, bem como os verbos “to tell”, “to say”, “to plan” e “to schedule” em inglês.

46 Segundo Chomsky (1957), é a partir do seu conhecimento linguístico intuitivo que um falante nativo é capaz de julgar, em sua língua materna, sentenças como gramaticais, ou seja, aquelas que apresentam padrões estruturais aceitáveis, ou como agramaticais, ou seja, aquelas que apresentam padrões estruturais inaceitáveis.

SUBCLASSES DE VERBOS DE ESTADO

VERBOS ESCOLHIDOS NÚMERO DA

LACUNA NO TEXTO

PB INGLÊS

Verbos existenciais Existir to exist

Verbos locativos Morar to live 14ª

Verbos epistêmicos Entender to understand

Verbos perceptivos Ver to see 12ª

Verbos psicológicos Gostar to like 17ª

razão, é esperado que um informante atento ao teste não marque essa opção, a qual denominamos “opção distratora”.

Em relação às opções distratoras da versão do teste em português, por sermos nativos dessa língua, e, portanto, capazes de julgar aquilo que seria agramatical ou semanticamente estranho como opção de resposta, decidimos, por conta própria, quais seriam essas opções distratoras na versão do teste em português. Já as opções distratoras da versão do teste em inglês foram concebidas como agramaticais ou semanticamente estranhas mediante a consulta e ajuda de uma falante nativa do IEUA47.

A presença de uma opção agramatical ou semanticamente estranha, a opção distratora, é uma medida para que avaliemos o grau de atenção do informante à tarefa. De acordo com Harris & Wexler (1996), erros em até 14% do total de tarefas de um teste linguístico podem ser considerados erros de desempenho, portanto, erros que podem ser aceitos como naturais durante a feitura de um teste. Desse modo, um informante que cometesse um número de erros que fosse maior do que 14% do total de lacunas seria eliminado dos nossos resultados, pois é muito possível que esse indivíduo não estivesse fazendo a tarefa com a devida atenção. No caso do nosso teste, essa porcentagem representava três lacunas. Logo, um informante que selecionasse mais do que três opções distratoras dentre as lacunas do teste seria eliminado da nossa análise.

No caso das lacunas distratoras, as duas opções semanticamente plausíveis são sempre itens sinônimos, portanto, é possível substituir uma opção pela outra no texto. A opção distratora presente nessas lacunas é sempre um item semanticamente esdrúxulo no texto, por exemplo, a opção distratora pode ser o antônimo das opções plausíveis. Na 16ª lacuna do texto, por exemplo, as duas opções de respostas plausíveis são os substantivos “alegria” / “joy” e “felicidade” / “happiness”, nas versões em português e em inglês, respectivamente. A opção distratora, no entanto, é um antônimo deles, o substantivo “tristeza” / “sadness”.

No caso específico das lacunas-alvo, as duas opções gramaticais variam em relação à morfologia verbal, sendo assim, são sempre oferecidas uma opção com o verbo de estado combinado à morfologia de progressivo e outra opção com o mesmo verbo combinado à morfologia de não progressivo48. A opção distratora presente nessas lacunas é sempre uma

47 Vale ressaltar que essa falante nativa do IEUA, proveniente do estado de Wisconsin (região centro-norte dos EUA), é não bilíngue e, na época em que nos ajudou com a revisão do teste, tinha vinte e seis anos de idade, cursava mestrado em Linguística na Faculdade de Letras da UFRJ e não falava português fluentemente.

48 Nos capítulos anteriores a este, apresentamos que, tanto no inglês quanto no português, podemos utilizar morfologias de progressivo e de não progressivo em outros tempos verbais que não só o presente, por exemplo, podemos utilizar essas mesmas morfologias no passado. No entanto, optamos, neste teste, por utilizar essas morfologias apenas no tempo presente.

morfologia incompatível com a descrição de uma situação contínua no presente – tempo verbal em que se passa a história –, por exemplo, o verbo de estado sendo usado no tempo futuro. Na 12ª lacuna do texto, por exemplo, as duas opções gramaticais são “estou vendo”/ “am seeing” e “vejo”/ “see”, ambas descrevendo uma situação contínua por meio da morfologia de progressivo e não progressivo, respetivamente. A opção distratora, por outro lado, é “verei”/ “will see”, com o verbo de estado sendo usado com uma morfologia de tempo futuro.

O teste completo, em suas duas versões, encontra-se disponível no apêndice B desta dissertação.