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3 ANTINOMIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E

3.1 LEGISLAÇÃO QUE REGE A MATÉRIA DO PARCELAMENTO DO SOLO

3.2.1 Antinomia jurídica

3.2.1.1 Critérios solucionadores das antinomias

Conforme visto anteriormente, a antinomia jurídica é algo inerente ao sistema jurídico, devido às constantes mudanças da sociedade, que a legislação nem sempre consegue acompanhar. Porém esta contradição deve ser suprimida, visto que o princípio da unidade do sistema jurídico formula a ideia teórica da coerência, ou seja, o antagonismo entre as normas deste sistema deve ser solucionado (BOAVENTURA, 2005).

A antinomia é um fenômeno muito comum entre nós ante a incrível multiplicação das leis, Diniz (2001, p. 15) disciplina sobre este problema afirmando que

É um problema que se situa ao nível da estrutura do sistema jurídico (criado pelo jurista), que, submetido ao princípio da não-contradição, deverá ser coerente. A coerência lógica do sistema é exigência fundamental, como já dissemos, do princípio da unidade do sistema jurídico. Por conseguinte, a ciência do direito deve procurar purgar o sistema de qualquer contradição, indicando os critérios para solução dos conflitos normativos e tentando harmonizar os textos legais.

Os critérios solucionadores das antinomias jurídicas são pressupostos implícitos colocados pelo legislador no ordenamento jurídico para a manutenção da coerência tendencial do sistema, da necessidade social de uniformidade das decisões e também como uma via de saída para o aplicador e interprete das normas. Os critérios também conhecidos como regras fundamentais para solução de antinomia são de três tipos: cronológico, hierárquico e da especialidade (BOAVENTURA, 2005).

A necessidade social de uniformidade das decisões é tratada por Machado apud Boaventura (2005):

Se fôssemos a atender aqui aos critérios de justiça material do sistema, não poderíamos escapar à consideração de que as normas incompatíveis como que mutuamente se anulam, deixando uma lacuna em aberto: uma lacuna de colisão. Ora, para o preenchimento desta lacuna, teria necessariamente de recorrer-se a valorações altamente subjetivas (a subsistência da antinomia normativa vem afinal a traduzir uma antinomia de valores ou de princípios no sistema positivo), e é precisamente isso que se pretende evitar através dos referidos critérios tradicionais de resolução das antinomias. (grifo do autor)

Logo a objetividade assegura a segurança jurídica aos que buscam a justiça, afastando a subjetividade capaz de criar soluções diversas para uma mesma antinomia de acordo com o caso concreto.

Os critérios cronológico e hierárquico são de natureza formal, pois ignoram como método de solução a natureza material das normas antinômicas. Já o critério da especialidade levaria em consideração a natureza material das normas e por isso seria um critério interpretativo.

O cronológico é aquele com base no qual, entre duas normas incompatíveis, prevalece a norma posterior: lex posterior derogat priori. Nesse caso, existe uma regra geral no direito em que a vontade posterior revoga a precedente, ou seja, de dois atos de vontade da mesma pessoa vale o último no tempo. (BOBBIO, 1999, p. 92 -93)

Bobbio (1999, p. 93), ainda, explica esse critério como expressão da vontade do legislador e ensina que a regra contrária obstaria o progresso jurídico, a adaptação gradual do Direito as exigências sociais. Além disso, presume-se que o legislador não queria fazer coisa inútil e sem finalidade, visto que se devesse prevalecer a norma precedente, a lei sucessiva seria um ato inútil e sem finalidade.

A esse critério, apresenta-se uma ressalva, com relação à irretroatividade relativa da norma:

Não se pode aceitar a retroatividade e a irretroatividade como princípios absolutos. O ideal seria que a lei nova retroagisse em alguns casos e em outros não. Foi o que o direito pátrio no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, e no art. 6º, §§§ 1º, 2º e 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil (§ 3º com a redação da Lei n. 3.238/57, ao prescrever que a nova norma em vigor tem efeito imediato e geral, respeitando

sempre o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.). Logo, sob a égide da lei nova, cairiam os efeitos presentes e futuros de situações preteridas, com exceção do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada, pois a nova norma, salvo situações anormais de prepotência e ditadura, não pode e não deve retroagir atingindo fatos e feitos já consumados sob o império da antiga lei. (DINIZ, 2008, p. 80)

O segundo dos critérios é o hierárquico e este ocorre quando, entre duas normas incompatíveis, prevalece a hierarquicamente superior: lex superior derogat inferior. As normas de um ordenamento jurídico são colocadas em planos diferentes, em uma ordem hierárquica (BOBBIO, 1999, p. 93).

Para Bobbio (1999, p. 93) uma das consequências da hierarquia normativa é justamente esta: as normas superiores podem revogar as inferiores, mas as inferiores não podem revogar as superiores. A inferioridade de uma norma em relação à outra consiste na menor força de seu poder normativo, essa menor força manifesta-se justamente na incapacidade de estabelecer uma regulamentação que esteja em oposição à regulamentação de uma norma hierarquicamente superior.

De acordo com Boaventura (2005) o poder normativo da Constituição é mais abrangente, e por isso é superior a uma lei ordinária, assim como o poder normativo de uma lei é superior ao poder normativo de um ato normativo.

O terceiro critério, o da especialidade, ocorre entre duas normas incompatíveis, uma geral e uma especial prevalecem à segunda: lex specialis derogat generali. A lei especial é aquela que anula uma lei mais geral, ou que subtrai de uma norma parte de uma matéria para submetê-la a uma regulamentação diferente (contrária ou contraditória) (BOBBIO, 1999, p. 96).

Boaventura (2005) disciplina que a norma é considerada especial, em seu sentido de especificidade, quando possuir todos os elementos típicos da norma geral e ainda acrescentar outros, tanto de natureza objetiva quanto subjetiva. Estes elementos acrescidos pela norma especial são denominados, pela doutrina, de especializantes. Os elementos especializantes trazidos pela norma especial aprofundam-se na situação fática evidenciada pela norma geral.

De acordo com Capel Filho (2004) dentre os critérios mencionados anteriormente, é o hierárquico o mais sólido, porém nem sempre por ser o mais potente pode ser tido como o mais justo.

No caso de um conflito de normas em que há possibilidade de aplicação de alguns dos critérios para soluciona-lo, entende-se que o aplicador do direito não estaria em frente a uma situação insustentável, visto que teria uma saída para solucionar a antinomia. Dessa

forma, Bobbio (1999, p. 92) entende tratar-se de antinomia aparente, se a solução for possível através dos referidos critérios. Somente configuraria antinomia real se houvesse conflito entre os critérios.

Portanto quando se estiver diante de uma antinomia jurídica aparente deverão ser aplicados os seguintes critérios solucionadores: hierárquico, cronológico e da especialidade. Entretanto quando não couber a aplicação de algum dos critérios ou couber a aplicação de mais de um dos critérios no mesmo conflito, proporcionando uma situação de indecidibilidade para o aplicador do direito, estar-se-á diante de uma antinomia real.