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4 A CONTROVÉRSIA JURÍDICA ACERCA DA USUCAPIÃO ESPECIAL DE

4.2 ESTUDOS COMPARATIVOS ENTRE A JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE

4.2.2 Posicionamento adotado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Em relação ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul foram analisados 16 (dezesseis) julgados.

Julgada procedente ação de usucapião especial, cujo pedido consistia em declarar a propriedade da autora sobre a área de 99 metros quadrados, inconformado com a decisão, o Município de Novo Hamburgo interpôs recurso de apelação cível de nº 70027915818, alegando preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, uma vez que a área usucapienda é inferior ao módulo mínimo fixado pelo seu plano diretor.

De acordo com o relator Pedro Celso Dal Prá, a lei municipal não pode servir de embaraço para declaração de direito cujos requisitos constitucionais estiverem positivados nos autos (RIO GRANDE DO SUL, 2008).

Ainda, o referido desembargador fundamenta:

Quero dizer com isso que o módulo mínimo fixado em plano diretor municipal não pode ser considerado como requisito para reconhecimento da usucapião especial urbana, sob pena de violação do art. 183 da Carta Magna, que exige apenas a posse qualificada sobre área inferior a 250 m². (RIO GRANDE DO SUL, 2008, grifo do autor).

Ademais, para o referido relator, caso prevalecesse a tese contrária ocorreria a absurda hipótese da impossibilidade jurídica de configuração da usucapião especial urbana em parte do Município de Novo Hamburgo, visto que, segundo informações nos autos do processo, o módulo mínimo para lotes na zona industrial e no setor miscigenado daquele Município seria de 300 m², o que evidentemente, não se pode admitir (RIO GRANDE DO SUL, 2008).

Diante desses argumentos, rejeitou-se por unanimidade a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido.

Na apelação cível n

º

70011746658, os autores insurgem contra a sentença que entendeu que o imóvel usucapiendo com área de 136,50 metros quadrados infringe ao módulo mínimo urbano vigente por possuir metragem inferior a estabelecida no módulo. (RIO GRANDE DO SUL, 2005).

Alegam em suas razões, que ocupam o imóvel por mais de cinco anos de modo pacífico, pagando luz, IPTU, água, e ainda, justificam que a lei que regula a usucapião especial urbana é clara ao estabelecer que somente pode adquirir imóvel cuja metragem seja de até 250 metros quadrados. (RIO GRANDE DO SUL, 2005).

Para o relator Guinther Spode, um dos requisitos para a declaração da aquisição do domínio pela usucapião de bem imóvel urbano é a posse de área urbana de até duzentos e cinquenta metros. E nesse sentido, pondera:

[...] não está entre os requisitos da ação de usucapião constitucional que as áreas a serem usucapidas, ainda que até 250 m², devam obedecer ao módulo mínimo dos municípios. Aliás, com a mais rogada vênia, entendo que a lei municipal desta Capital, por maior esforço interpretativo que faça, não atingiu o status de afastar direitos garantidos pela constituição federal. Em outros termos, a lei municipal de Porto Alegre não pode, e nem deve, afastar a aquisição por usucapião definido na constituição, Diga-se, na Lei Maior (RIO GRANDE DO SUL, 2005).

Neste sentido, o referido relator conclui que o fundamento a ser atendido é aquele previsto na constituição, ou seja, a área deve ser menor que 250 metros quadrados, qualquer que seja o módulo mínimo das cidades em que ajuizadas as ações, decidindo nesse caso pelo provimento do recurso, sendo acompanhado de forma unânime pelos demais desembargadores (RIO GRANDE DO SUL, 2005).

Entretanto o Tribunal do Rio Grande do Sul não possui entendimento unânime quanto à matéria, na apelação nº 70006658702 interposta pelos autores da ação de usucapião julgada improcedente. Em suas razões sustentam ser objeto da ação apenas a extensão na qual exercem a posse, e não a área total do imóvel, possibilitando a declaração da prescrição aquisitiva, na forma do artigo 183 da Constituição Federal, independente de adequação à extensão do módulo mínimo de 360 metros quadrados, previsto em Lei Municipal.

Para o relator José Conrado de Souza Júnior não é possível a configuração da usucapião especial urbano quando houver o fracionamento de área em metragem inferior ao módulo definido pelo Plano Diretor para os lotes urbanos. Neste sentido, argumenta:

Com efeito, é sabido que os municípios podem e devem definir o módulo mínimo de fração dos lotes urbanos em suas respectivas circunscrições territoriais. A questão, então, ao que de arrancada possa parecer, não diz exclusivamente com a propriedade e a proteção dos mais humildes. Vai além, pois dialoga com a urbanização, com a correta e saudável ocupação dos espaços urbanos, de molde a que se viabilize boa insolação às residências, facilidade de acesso das redes de luz, água e esgoto, sem comprometimento do meio ambiente. (RIO GRANDE DO SUL, 2003).

Ainda, discorre em seu voto que o Município de Caxias do Sul possui módulo mínimo de parcelamento do solo urbano de 360 metros quadrados e que esta é a vontade manifestada pela população através da sua Casa Legislativa, a qual está autorizada a dispor sobre a matéria por força do que dispõe o artigo 30, incisos I, II e VIII, da Constituição Federal. (RIO GRANDE DO SUL, 2003).

Nesse sentido, o referido relator conclui que a área que o autor pretende ver declarada, não só para efeitos de usucapião especial, não é considerada jurídica e legislativamente terreno ou lote. E no caso se fosse decidido pela procedência da ação, estaria

desrespeitando o conceito jurídico de função social da propriedade. (RIO GRANDE DO SUL, 2003).

Por fim, nesse mesmo julgado o Desembargador José Conrado de Souza Júnior ressalta que:

Assim sendo, conquanto reconheça-se que vivemos momentos onde soluções judiciais práticas e corajosas urgem, pois a superpopulação das cidades estão na mesma proporção das demandas para regulamentação das aquisições imobiliárias, o artigo 183 da Constituição Federal não se oferece como apanágio para todos os males. (RIO GRANDE DO SUL, 2003).

E diante desses argumentos, o relator negou provimento ao recurso, sendo acompanhado em seu voto pelos demais desembargadores.

Em sede de apelação cível nº 70020439485, interposta pelo o Município de Cotiporã por não concordar com sentença que acolheu o pedido da inicial em ação de usucapia especial, esse argumenta em suas razões que deve ser observado o disposto no artigo 182 da Constituição Federal, na Lei n. 10.257/01 e na Lei n. 6.766/79 (art. 4º, II).

Ainda, afirma que a metragem linear do terreno pretendido usucapir não atende a exigência da Lei Municipal. Em contrapartida a apelada assevera que a sua posse é de mais de 60 (sessenta) anos e que não existia a legislação invocada na época em que iniciou a posse do imóvel usucapiendo. Ainda, discorre que o Município, há anos, tributa o lote em questão para fins de IPTU, o que consolida o reconhecimento da posse em favor da autora. (RIO GRANDE DO SUL, 2007).

Sobre este argumento, o relator Mário José Gomes Pereira assim fundamentou: Rejeitar-se o pedido de usucapião pelo motivo de que a área é inferior a 125 m² (ou 360 m², como módulo da região, consoante lei municipal) parece-nos, no caso, demasiado formalismo e certa insensibilidade ao quadro concreto. [...] Não seria, exagero, outrossim, dizer-se que é exatamente porque se cuida de área tão reduzida que se mostra imperativa a usucapião, que por essência visa a socorrer os mais necessitados e corrigir distorções de cunho fundiário (RIO GRANDE DO SUL, 2007).

E nesse sentido, votaram de forma unânime para desprover o recurso de apelação do Município.

Já na apelação de nº 70052725017, os apelantes inconformados com a sentença de improcedência na ação de usucapião especial constitucional urbano, apresentaram as suas razões nos seguintes termos:

[...] alegam que são possuidores do referido imóvel há mais de sete anos, ocupando- se desde então de forma mansa e pacífica e ininterrupta, com ânimo de donos. Referem que, inclusive, empregaram benfeitorias ao imóvel. Afirmam que necessitam da regulação fática do domínio do bem, através de título único com matrícula individualizada e separada do todo. Sustentam que a regularidade ou não do parcelamento do solo não obsta o acionamento, pelo adquirente de boa-fé, de via usucapienda, para obtenção de domínio de modo originário, considerando que nenhum imóvel lindeiro ou mesmo os entes públicos apresentam qualquer oposição

a isso. Salientam que o objeto da demanda é a usucapião de 250 m² de área da qual os apelantes têm o domínio por tempo suficiente, e que o imóvel em questão possui área de 242, 08 m². (RIO GRANDE DO SUL, 2012).

O relator Carlos Cini Marchionatti, junto dos demais desembargadores, acordou no sentido de negar provimento ao recurso de apelação, visto que não estão observados no caso os requisitos atinentes a usucapião especial urbano.

Para o referido relator, resta demonstrado que a pretensão dos demandantes é de destacar a área dentro do limite constitucional para que possa lhe ser conferido o direito de usucapir, o que é incabível, uma vez que configuraria fracionamento com a intenção de burla ao teto constitucional. (RIO GRANDE DO SUL, 2012).

Portanto, com o estudo foi possível verificar que a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não é unânime nos casos em que o plano diretor do município fixa um módulo mínimo para os lotes urbanos, cuja metragem geralmente é superior à área de 250 metros quadrados, sendo essa a máxima exigida para configurar a usucapião especial de imóvel urbano.

Nesses casos, há uma divergência de entendimento por parte dos desembargadores. Dos 16 (dezesseis) acórdãos analisados, apenas 4 (quatro) deles foram favoráveis a aplicação do artigo 183 da Constituição Federal.

Os outros 12 (doze) acórdãos não foram favoráveis, tendo em vista outros aspectos que não a delimitação da área por meio do plano diretor. Utilizou-se como argumentos o fato de ser inviável a pretensão de fracionar imóvel em que se exerce a posse sobre área total, buscando usucapir somente parte da área, para fins de que seja reconhecida posse sobre área inferior e assim atingir o limite estabelecido constitucionalmente.