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Controvérsia acerca da usucapião especial de imóvel urbano frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano

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Academic year: 2021

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GABRIELA HOLTHAUSEN

CONTROVÉRSIA ACERCA DA USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO FRENTE À LEGISLAÇÃO QUE REGE O PARCELAMENTO DO SOLO URBANO

Tubarão 2013

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GABRIELA HOLTHAUSEN

CONTROVÉRSIA ACERCA DA USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO FRENTE À LEGISLAÇÃO QUE REGE O PARCELAMENTO DO SOLO URBANO

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de pesquisa: Justiça e Sociedade.

Orientadora: Amanda Pizzolo, Msc.

Tubarão 2013

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AGRADECIMENTOS

Primeiro gostaria de agradecer aos meus pais, Adriano e Glória, por todo carinho e amor dispendidos ao longo desses vinte e um anos, bem como por todas as abstenções que tiveram que fazer visando acima de tudo a minha educação. Vocês são minha inspiração e razão na busca de me tornar uma pessoa a cada dia melhor.

Agradeço a minha irmã, Clara, que apesar de pequena entendeu o quão importante é essa etapa. Minha pequena, você faz os meus dias melhores.

Também agradeço ao meu namorado, Vitor, por toda a sua compreensão, motivação, carinho e amor despendidos durante a realização desse trabalho. Agradeço muito por ter você sempre ao meu lado.

Estendo os meus agradecimentos aos meus amigos que estiveram sempre ao meu lado, sempre me motivando e incentivando, Fernanda, Gabriela, Gilmara, Júlio e Ramires. Vocês podem contar sempre comigo.

Agradeço também aos meus colegas de trabalho da Vara Previdenciária da Justiça Federal, em especial a Georgea, Marco, Sampaio e Zeli, por toda a compreensão que tiveram para realização desse trabalho monográfico.

Gostaria de registrar também o nobre auxílio que tive da minha orientadora, Amanda Pizzolo, grande mestre, cujos ensinamentos despendidos muito me ajudaram e facilitaram na produção deste trabalho.

Por fim, gostaria de agradecer a Deus por ter conseguido terminar essa etapa da minha vida.

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RESUMO

O presente trabalho monográfico possui como objetivo analisar a controvérsia da usucapião especial urbana frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano, bem como verificar de que forma essa matéria é recepcionada pelos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e do Paraná. Para tanto, foi analisada jurisprudência proferida pelos referidos tribunais entre o período de 2003 a 2013. Para alcançar tal objetivo, foi utilizado como método de abordagem o hipotético-dedutivo que supõe a verificação empírica do problema, no intuito de testar a hipótese proposta neste trabalho científico. Do estudo, constatou-se a existência de uma aparente antinomia jurídica, visto que a mesma Constituição Federal que assegura o direito de adquirir a propriedade por meio da usucapião especial de imóvel urbano, também concede autonomia para os Municípios legislarem sobre o parcelamento do solo urbano, inclusive no que diz respeito à fixação de dimensões mínimas e máximas para os lotes urbanos. Configura-se o conflito quando o Município por meio de seus planos diretores estabelece uma metragem mínima superior à exigida pelo artigo 183 da Constituição Federal para autorização da usucapião especial de imóvel urbana. Diante dessa situação, buscou-se resolver o conflito utilizando-se dos critérios solucionadores de antinomia, não sendo esses instrumentos suficientes, ponderou-se para que o aplicador do direito interpretasse a norma de acordo com o caso concreto, decidindo da forma mais justa. Ainda, com relação ao conflito descrito anteriormente, verificou-se que os Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, na maioria dos julgados decidem pela prevalência da aplicação do artigo 183 da Constituição Federal, visto que constitui função social mais importante que o planejamento urbano, o de assegurar o direito de moradia às pessoas menos favorecidas socialmente, e consequentemente garantir a efetividade do princípio da dignidade da pessoa humana.

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ABSTRACT

This monograph has to analyze the controversy adverse possession urban front to the legislation governing the subdivision of urban land, as well as to verify how this matter is received by the Courts of Justice of Santa Catarina, Rio Grande do Sul and Paraná. Therefore, we analyzed jurisprudence issued by the courts between the period 2003 to 2013. To achieve this goal, it was used as a method of the hypothetical-deductive approach assumes that the empirical verification of the problem in order to test the hypothesis proposed in this scientific work. From the study, it was found that there is an apparent antinomy legal, since the same Constitution that guarantees the right to acquire the property through adverse possession of urban real estate, also grants autonomy to the municipalities legislate on urban land subdivision including as regards the fixing of minimum and maximum dimensions for urban lots. Sets up the conflict when the Municipality through its master plan establishes a minimum footage than that required by Article 183 of the Constitution to permit the urban adverse possession of property. Given this situation, we attempted to resolve the conflict using the criteria solvers antinomy, these instruments are not sufficient, weighed to the investor the right to interpret the standard according to the case, deciding the fairest way. Still, with regard to the conflict described above, it was found that the Courts of Justice of Santa Catarina, Rio Grande do Sul and Paraná, in most decide judged by the prevalence of Article 183 of the Constitution, since it constitutes social function more important to urban planning, to ensure the right to housing the disadvantaged socially, and consequently ensure the effectiveness of the principle of human dignity.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 8

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ... 8

1.2 JUSTIFICATIVA ... 9 1.3 OBJETIVOS ... 10 1.3.1 Geral ... 10 1.3.2 Específicos ... 10 1.4 CONCEITOS OPERACIONAIS ... 11 1.5 HIPOTÉSE ... 12 1.6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 12 1.6.1 Método ... 12 1.6.2 Tipo de pesquisa ... 12

1.6.3 Instrumentos utilizados para coleta de dados ... 13

1.7 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS .. 14

2 O INSTITUTO DA USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO ... 15

2.1 BREVE HISTÓRICO DO DIREITO DE PROPRIEDADE ... 15

2.1.1 Conceito de propriedade ... 18

2.1.2 Função social da propriedade, dignidade da pessoa humana e direito de moradia... 20

2.1.3 Aquisição originária da propriedade por meio da usucapião ... 23

2.2 USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO ... 25

2.2.1 Requisitos da usucapião especial de imóvel urbano... 28

2.2.1.1 Posse ... 29

2.2.1.2 Animus domini ... 33

2.2.1.3 Lapso temporal para aquisição por meio da usucapião especial de imóvel urbano ... 34

2.2.1.4 Utilizar o imóvel para fins de moradia ... 34

2.2.1.5 Tamanho do imóvel ... 35

3 ANTINOMIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS ACERCA DO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO, EM ESPECIAL SOBRE A USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO ... 37

3.1 LEGISLAÇÃO QUE REGE A MATÉRIA DO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO ... 37

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3.2 O APARENTE CONFLITO ENTRE AS NORMAS QUE REGEM O PARCELAMENTO DO SOLO URBANO E A USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL

URBANO ... 44

3.2.1 Antinomia jurídica ... 47

3.2.1.1 Critérios solucionadores das antinomias ... 51

3.2.1.2 Critérios solucionadores das antinomias de segundo grau... 54

4 A CONTROVÉRSIA JURÍDICA ACERCA DA USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO... 57

4.1 RESOLUÇÃO DO CONFLITO SOBRE A MATÉRIA POR MEIO DA APLICAÇÃO DOS CRITÉRIOS SOLUCIONADORES ... 58

4.2 ESTUDOS COMPARATIVOS ENTRE A JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL E DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ ... 61

4.2.1 Posicionamento adotado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina ... 62

4.2.2 Posicionamento adotado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ... 66

4.2.3 Posicionamento adotado pelo Tribunal de Justiça do Paraná ... 69

4.2.4 Comparação dos posicionamentos dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e do Paraná... 74

5 CONCLUSÃO ... 76

REFERÊNCIAS ... 80

APÊNDICE ... 86

APÊNDICE A – INSTRUMENTO UTILIZADO PARA COLETA DE DADOS – EMENTÁRIO ... 87

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico teve por escopo analisar a controvérsia da usucapião especial urbana frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano e demonstrar como a matéria é recepcionada pelos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e do Paraná.

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

A usucapião especial de imóvel urbano constitui uma garantia ao direito de propriedade e moradia, visando à urbanização das cidades e tendo por objetivo a dignidade da pessoa humana que, sozinha ou com sua família, necessita de um teto para se abrigar. Desta forma, dispõe o artigo 183 da Constituição Federal:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural (BRASIL, 1988).

Como visto anteriormente, a extensão da área do imóvel constitui requisito essencial para aquisição da propriedade por meio da usucapião especial urbana, entretanto, existem legislações, que apresentam metragens diferentes das estabelecidas no artigo 183 da Constituição Federal.

Uma das leis que apresentam metragem diferente é a Lei n. 6.766 de 19 de dezembro de 1979. Esta lei dispõe sobre o parcelamento do solo urbano e no seu artigo 4º, II, fixa o tamanho mínimo de lotes de 125 m², embora não haja referência no artigo 183 da Constituição Federal de tamanho mínimo de lotes. E posteriormente com o advento da Lei n. 9.788/99 o § 1º do referido artigo delegou competência aos Municípios para delimitarem as metragens mínimas e máximas das áreas dos lotes urbanos (BRASIL, 1979).

Esta autonomia encontra embasamento nos artigos 30, inciso IX e 182, §§ 1º e 2º. Assim, é constante em muitos planos diretores metragens superiores à estabelecida no artigo 183 da Constituição Federal.

Desta forma, verifica-se que há um aparente conflito, uma vez que a norma constitucional que regulamenta a usucapião especial urbana prevê uma limitação máxima para os lotes urbanos e em contrapartida a própria norma constitucional atribui competência aos Municípios para disciplinarem por meio de seus planos diretores a questão do parcelamento do solo urbano e estes, em regra, estabelecem metragem mínima superior.

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Visando manter a característica de unicidade do ordenamento jurídico, necessário far-se-á resolver esse conflito por meio dos critérios solucionadores, caso seja uma antinomia aparente, ou no caso de uma antinomia real por meio da interpretação do aplicador do direito de acordo com as circunstâncias do caso concreto.

A monografia buscará as respostas para as seguintes questões norteadoras:

Aplicando os critérios solucionadores das antinomias jurídicas, qual norma prevalecerá em relação à usucapião especial urbana, que prevê a metragem máxima de área de 250 m², inferior à mínima estabelecida em diversas legislações municipais para o parcelamento do solo urbano e como a matéria é recepcionada no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, no Tribunal de Justiça do Paraná e no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul?

1.2 JUSTIFICATIVA

A antinomia das normas constitucionais e infraconstitucionais acerca do parcelamento do solo urbano, em especial, no que concerne à metragem dos loteamentos para fins da usucapião especial urbana tem grande relevância para sociedade, principalmente para aqueles que detêm a posse de um imóvel e preenchem os requisitos para aquisição da propriedade do mesmo por meio da usucapião especial urbana, cuja finalidade da norma é assegurar o direito constitucional de propriedade e consequentemente o de moradia.

Esse conflito acaba ocasionando insegurança jurídica às pessoas que pretendem buscar a Justiça, a fim de obter o direito de propriedade assegurado por lei, em essencial pelo risco de improcedência de ações. Diante desta realidade social, faz-se necessário o estudo deste conflito para obtenção de uma solução jurídica, a fim de orientar a melhor interpretação do direito à hipótese, bem como para que sejam assegurados os direitos inerentes aos cidadãos.

Por outro lado, no âmbito administrativo este assunto apresenta extrema relevância, visto que, na medida em que a urbanização avança, há cada vez mais a necessidade de que a organização urbanística das cidades acompanhe este desenvolvimento, a fim de possibilitar o bem estar social da população e evitar uma desorganização da ocupação territorial.

Os administradores públicos prezam para que cada parcelamento do solo urbano seja executado como parte de um todo, de modo a incorporar-se de forma simétrica e ordenada ao pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (moradia, lazer, circulação

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e trabalho), entretanto, em determinados casos a usucapião especial de imóvel urbano constitui um entrave para que ocorra o correto parcelamento do solo.

Desta forma, ao mesmo tempo em que a usucapião especial urbana constitui um entrave, ela também constitui uma solução para as cidades de alto índice populacional que vivem às voltas com excesso de contingente humano, suportando problemas gravíssimos de moradia no que concerne, em especial, às pessoas de baixa renda.

Nesse sentido, a usucapião urbana tem por escopo dar oportunidade de acesso à propriedade urbana, e, consequentemente, à moradia, a essa camada desfavorecida da população das grandes cidades, que muitas vezes vivem na ilegalidade, clandestinidade ou precariedade habitacional.

Ocorrendo, assim, o interesse por parte da autora do presente trabalho monográfico acerca do assunto, tendo em vista a relevância social da matéria, bem como o fato de ter estado de forma direta lidando com estes problemas sociais enquanto estagiava na assessoria da Vara dos Feitos da Fazenda Pública, Acidentes do Trabalho e Registros Públicos do Fórum da Comarca de Tubarão.

1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Geral

Analisar a controvérsia da usucapião especial urbana frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano, bem como comparar como essa matéria é recepcionada pelos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, por meio da análise de acórdãos proferidos entre 2003 e 2013.

1.3.2 Específicos

Descrever uma das formas de aquisição da propriedade, denominada de usucapião especial de imóvel urbano.

Apresentar as legislações que regulam acerca do parcelamento do solo urbano. Identificar a antinomia existente entre as normas constitucionais e infraconstitucionais acerca do parcelamento do solo urbano, em relação à usucapião especial urbana.

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Demonstrar como solucionar a antinomia entre as normas constitucionais e infraconstitucionais que regulamentam o parcelamento do solo urbano, em especial sobre o conteúdo que preceitua sobre o loteamento urbano.

Analisar a controvérsia jurídica existente sobre a usucapião especial urbana. Comparar as decisões judiciais acerca da matéria.

1.4 CONCEITOS OPERACIONAIS

Usucapião especial urbana: A Constituição Federal no seu artigo 183 discorre sobre a usucapião especial urbana, in verbis:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural (BRASIL, 1988).

Antinomia jurídica: “Antinomia é o conflito entre duas normas, dois princípios, ou de uma norma e um principio geral de direito em sua aplicação prática a um caso particular. É uma lacuna de conflito ou colisão de leis.” (DINIZ, 1998, p. 19).

Norma constitucional: A Constituição é um sistema de normas jurídicas. As normas constitucionais, portanto, conservam os atributos essenciais das normas jurídicas, com especial relevo à imperatividade, pelo que, o comando que contém deve ser zelosamente observado pelos seus destinatários. As disposições constitucionais, além dessa necessária carga imperativa, são detentoras de um nítido caráter de superioridade hierárquica .

Norma infraconstitucional: É a norma, lei que está hierarquicamente abaixo da Constituição Federal. A Constituição Federal é considera a Lei Maior do Estado, e as demais normas jurídicas são consideradas infraconstitucionais, pois são inferiores às regras previstas na Constituição.

Parcelamento do solo urbano: O parcelamento do solo pode ocorrer sob as formas de loteamento e desmembramento, os quais são operações realizadas em áreas urbanas ou de expansão urbana pelo Estado ou por particulares, sendo estas divisões implantadas segundo projeto aprovado pelo Município, ou pelo Distrito Federal (conforme o caso).

Loteamento urbano: O loteamento urbano consiste na divisão voluntária do solo em unidades (lotes) com abertura de vias e logradouros públicos, na forma da legislação pertinente.

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1.5 HIPOTÉSE

A antinomia acerca do assunto é recepcionada nos Tribunais, prevalecendo a interpretação favorável da aplicação do artigo 183 da Constituição Federal frente à legislação infraconstitucional que regem o parcelamento do solo urbano. Entretanto, a não observância dos preceitos da política urbanística expressa por meio de planos diretores nos Municípios, principalmente no que diz respeito ao parcelamento do solo urbano, poderá implicar na desorganização territorial das cidades, devido ao alto índice populacional.

1.6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para realização de uma pesquisa é necessário o planejamento do estudo, demonstrando o caminho que o pesquisador deverá seguir, bem como o procedimento que deverá adotar para poder chegar ao resultado almejado, estas etapas fazem parte do delineamento da pesquisa.

Segundo Leonel e Motta, (2011, p. 175) “neste momento, o investigador estabelece os meios técnicos da investigação, prevendo os instrumentos e os procedimentos utilizados para a coleta de dados”.

1.6.1 Método

O método de abordagem utilizado no presente trabalho é o método hipotético-dedutivo com o objetivo de testar a hipótese proposta neste trabalho científico, verificando a controvérsia jurídica acerca da usucapião especial urbana em frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano, com base em um estudo comparativo das jurisprudências dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e do Paraná.

Desta forma, a pesquisa tratou de constatar a interpretação feita pelos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná acerca do assunto.

Quanto ao método de procedimento adotou-se o comparativo, pois será realizado um estudo comparativo entre as jurisprudências dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná.

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Para Leonel e Motta (2011, p. 100), “Pesquisa é um processo de investigação que se interessa em descobrir as relações existentes entre os aspectos que envolvem os fatos, fenômenos, situações ou coisas”. As pesquisas podem ser classificadas quanto ao nível de profundidade do estudo, quanto ao procedimento utilizado na coleta de dados e quanto a sua abordagem (LEONEL; MOTTA, 2011, p. 100).

Baseado neste conceito, no que diz respeito ao nível de profundidade optou -se pela pesquisa exploratória, visto que ainda não se tem conhecimento e a compreensão do objeto que está sendo estudado. Para Leonel e Motta (2011, p.100) a pesquisa exploratória tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, através de levantamentos documentais e bibliográficos.

Quanto à abordagem, a pesquisa é qualiquantitativa, pois enquanto que será analisado um número certo de jurisprudências dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e do Paraná, verificando de que forma elas se repetem, também serão analisados o teor destes decisórios, a interpretação e fundamentação utilizada, visando identificar as controvérsias existentes com relação ao objeto de estudo deste trabalho.

Com relação ao procedimento, adotou-se, principalmente a pesquisa documental, porquanto o estudo será baseado em fonte primária para a coleta de dados, qual seja, as jurisprudências dos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Acessoriamente, será adotada a pesquisa bibliográfica, tendo em vista que também serão realizadas consultas em livros e leis, para o desenvolvimento do trabalho científico.

1.6.3 Instrumentos utilizados para coleta de dados

O instrumento utilizado para a coleta de dados foi análise de ementário, conforme modelo constante no apêndice. Foram analisadas as jurisprudências coletadas do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná proferidas entre 2003 a 2012, a fim de levantar dados numéricos sobre a quantidade de julgamentos destes tribunais sobre a controvérsia acerca da usucapião especial de imóvel urbano frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano, bem como qual o entendimento adotado pelos desembargadores.

A análise qualitativa da jurisprudência será realizada a partir do estudo das justificativas e dos fundamentos adotados pelos desembargadores dos referidos Tribunais, sendo que estas variáveis serão organizadas em diferentes categorias.

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computadas as repetições dos entendimentos adotados pelos tribunais estudados, acerca do conflito normativo existente entre a legislação que rege a usucapião especial de imóvel urbano e à legislação que rege o parcelamento do solo urbano.

1.7 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS

Com a finalidade de alcançar os objetivos propostos neste trabalho, o estudo realizado será dividido em três capítulos.

Após a introdução, o segundo capítulo tem como escopo apresentar um breve histórico do direito de propriedade, a conceituação acerca deste instituto, bem como descrever uma das formas de aquisição da propriedade, denominada de usucapião especial de imóvel urbano e quais os requisitos necessários desse instituto.

O terceiro capítulo tratará de demonstrar a legislação que rege o parcelamento do solo urbano e a usucapião especial de imóvel urbano, bem como analisar a aparente antinomia entre normas constitucionais e infraconstitucionais acerca do parcelamento do solo urbano, em especial sobre a usucapião especial de imóvel urbano. Buscar-se-á também, estudar o instituto da antinomia e quais as suas soluções, para, assim, poder resolver a referida aparente antinomia.

No quarto e último capítulo far-se-á uma análise do conflito e demonstrar-se-á como resolver o conflito por meio da aplicação dos critérios solucionadores. Neste capítulo será feita também uma análise de acórdãos proferidos pelos Tribunais de Justiça de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, a fim de verificar como a matéria é recepcionada e de que forma o conflito é solucionado nos referidos Tribunais.

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2 O INSTITUTO DA USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO

Uma das soluções encontradas para o problema de moradia nas cidades foi a criação de uma nova modalidade de usucapião especial, denominada de usucapião urbana. Para Ribeiro apud Viana (2012, p. 1002):

A usucapião urbana teria por escopo dar oportunidade de acesso à propriedade urbana e, consequentemente à moradia, a essa camada desfavorecida da população das grandes cidades, que está obrigada a manter-se em uma posição de ilegalidade, clandestinidade e precariedade habitacional.

O legislador inseriu a usucapião urbana no texto da Constituição Federal de 1988, dentro do capítulo que trata da política urbana, disciplinando no artigo 183 da Carta Magna:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. (BRASIL, 1988). Para alcançar o objetivo deste trabalho, que é analisar a controvérsia da usucapião especial de imóvel urbano frente à legislação que rege o parcelamento do solo urbano é necessário abordar antes sobre: a origem do direito de propriedade; a função social da propriedade; a função social da propriedade urbana e a aquisição da propriedade por meio da usucapião, para que se consiga entender melhor sobre o instituto da usucapião especial de imóvel urbano e, por fim, sua melhor interpretação no ordenamento jurídico brasileiro.

2.1 BREVE HISTÓRICO DO DIREITO DE PROPRIEDADE

A história da propriedade reflete as realidades econômica, política e social de cada período histórico, ajustando-se aos contornos da organização social. Nas entranhas do Direito Romano já se encontrava o direito de propriedade firmemente estabelecido, com características de exclusividade e de perpetualidade e com tanta consistência que até se tem dito que dessa antiga concepção emanou o caráter de absoluto que mais tarde se tentou emprestar-lhe (MOREIRA, 1986, p. 37).

A utilização das terras nos primeiros tempos de Roma se dá, primeiro, pela comunhão agrária, em que a utilização do solo ou promove-se por exploração comum, com divisão dos frutos, ou o cultivo faz-se por famílias, em lotes. Entretanto, nesse período, os

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indivíduos têm apenas o direito de gozo, visto que as terras pertenciam à tribo eram inalienáveis (MOREIRA, 1986, p. 37).

Mais tarde, a propriedade é considerada familial. Neste caso, o chefe da família cultiva por tempo vitalício a terra que recebe e passa-a, por sucessão mortis causa, aos filhos homens, entretanto, não pode fazer alienação inter vivos, nem por testamento, porque o bem não lhe pertence pessoalmente, senão à família (MOREIRA, 1986, p. 37).

Mais tarde, sob o regime da propriedade individual, o proprietário pode, livremente, dispor de seu bem. A característica de individualismo da propriedade, segundo Mário apud Moreira (1986, p. 38): “Pode perfeitamente ser definido no conceito da propriedade ex jure quiritium, condicionada à natureza do objeto e sua situação no solo itálico, à nacionalidade do titular e ao modo formalista de sua transmissão”.

Dessa forma, o conceito unitário de propriedade, que veio prevalecer entre os romanos após longo processo de individualização, é o que se denomina como individualista. A qualificação de individualista confere exclusividade sobre a coisa a apenas um dono. (MOREIRA, 1986, p. 38).

A propriedade medieval teve papel preponderante durante o período do feudalismo, visto que ela se caracteriza pela quebra do conceito unitário do Direito Romano, já que, sobre o mesmo bem, há concorrência de proprietários. De acordo com Chalhub (2003, p. 42):

[...] no feudalismo, numa concepção fragmentária pela qual se desdobrava o domínio num dominium directum ou eminente, pertencente ao senhor, e num dominium utile pertencente ao vassalo; nessa estruturação, o senhor não tem contato direto com a terra, não a cultiva, mas tem o poder de exigir prestações ou serviços do vassalo; este último é que tem contato com a terra, usa-a e a explora economicamente. Com o decorrer do tempo a propriedade sobre os feudos passou a ser perpétua e transmissível apenas pela linha masculina. O desenvolvimento do comércio e o crescimento da classe burguesa exigiam uma nova adequação do regime jurídico da propriedade, na medida em que o sistema de encargos, privilégios e prestações do senhor sobre a terra, próprio do regime feudal, constituía obstáculo ao desenvolvimento do comércio (CHALHUB, 2003, p. 42).

A Revolução Francesa ocorreu em 1789 e afastou os obstáculos anteriormente mencionados, resgatando a concepção unitária do direito romano clássico, visto que este atendia melhor as estruturas econômica e social. Dessa forma, a partir da Revolução Francesa e com o advento do Código de Napoleão, passou a atribuir-se à propriedade privada o caráter individual, de direito absoluto e inviolável (CHALHUB, 2003, p. 42).

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que não fosse de forma contrária às leis vigentes, o que significava dizer que, todo exercício de direito condicionava-se à vigência de normas que compatibilizassem o gozo desses direitos (RIBEIRO, 2012, p. 1040).

Com a Revolução Industrial difundiu-se o liberalismo econômico, no sentido de afastar qualquer intervenção do Estado nas atividades privadas, que é sempre prejudicial no domínio econômico. A iniciativa privada expandiu-se com a mais ampla liberdade na aquisição da propriedade e como consequência ficou enraizada em todos os sistemas legais e políticos dos países ocidentais (RIZZARDO, 2006, p. 175).

Portanto, no período liberal fez-se a distinção entre Estado, sociedade e indivíduo, materializando a liberdade por meio da contemplação dos direitos individuais e da abstenção do poder estatal. Entretanto, em contraposição a essa filosofia econômica, surgiu o comunismo de Karl Marx. (RIZZARDO, 2006, p. 175).

O marxismo visou à socialização da propriedade e dispôs que para conseguir alcança-la é preciso abolir a sociedade privada das forças produtivas. Nesse sentido, Gomes apud Rizzardo (2006, p.176) demonstra:

Sustenta o marxismo que essas forças produtivas, desencadeadas no regime capitalista, não comportam mais as formas de propriedade dentro das quais se movimentam. Para libertá-las, é preciso abolir a propriedade privada. Necessário, assim, que novas formas de propriedades sejam adotadas, eliminando-se as que se convertem em obstáculos ao desenvolvimento da vida econômica e social. A propriedade privada dos meios de produção tornou-se incompatível com o processo produtivo, porque a produção, passando a ser coletiva, a apropriação no regime capitalista, continua a ser individual. Para eliminar esta contradição, deve-se socializar a propriedade.

Esse período chega ao fim com a queda da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, levando à plena autonomia das Repúblicas, e introduzindo o sistema particular da propriedade (RIZZARDO, 2006, p. 176).

A partir desse período houve um avanço na interpretação doutrinária, jurisprudencial e nas leis infraconstitucionais, como o Estatuto da Terra, no que diz respeito ao direito de propriedade.

No Brasil, o Código Civil de 1916 disciplinou sobre o direito de propriedade no seu artigo 524 e estabeleceu que: “[...] a lei assegura ao proprietário do direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer, injustamente, os possua.” (BRASIL, 1916).

Posteriormente com a Constituição de 1934 disciplinou-se que o direito de propriedade não podia ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinasse. Após sobreveio a Constituição de 1946 em que se ratificou a ideia de que o uso

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da propriedade seria condicionado ao bem estar-social. E na Constituição de 1967 a função da propriedade destacou-se em meio aos outros princípios (RIBEIRO, 2012, p. 1040-1041).

A Constituição de 1988 assegurou no artigo 5º, XXII, o direito de propriedade, que deverá atender à sua função social, de acordo com o artigo 5º, XXIII. Além do artigo 5º que garante a propriedade como instituição, existem outras disposições no texto constitucional que asseguram tipos especiais de propriedade, como a propriedade urbana, previstas nos artigos 182, § 2º e 183 (SILVA, 2005, p. 270).

Na elaboração do Código Civil de 2002 prevaleceu o princípio da socialidade, conforme disposto na exposição de motivos que o próprio legislador elaborou, sendo o sentido social uma das características mais marcantes do projeto. Os princípios que nortearam o Código Civil, no concernente à propriedade, levaram em conta a função social (RIBEIRO, 2012, p. 1026).

Nesse sentido, dispõe o artigo 1228 do Código Civil vigente:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. [...] (BRASIL, 2002).

Conforme visto, o significado de propriedade variou com o decorrer dos anos, acompanhando a evolução da sociedade. Alguns doutrinadores, como Orlando Gomes, tentam conceituar o direito de propriedade, encontrando dificuldade justamente porque o conceito de propriedade evolui de acordo com o período histórico e social.

No tópico seguinte busca-se demonstrar alguns conceitos de propriedade utilizados por doutrinadores e pela legislação brasileira.

2.1.1 Conceito de propriedade

A propriedade é um direito real por excelência, previsto na Constituição Federal de 1988 como um direito e uma garantia fundamental. Para Gomes (2001, p. 97) a definição de propriedade

[...] pode ser feita à luz de três critérios: o sintético, o analítico e o descritivo. Sinteticamente, é de se defini-lo, com Windscheid, como a submissão de uma coisa, em todas as suas relações, a uma pessoa. Analiticamente, o direito de usar, fruir e dispor de um bem, e de reavê-lo de quem injustamente o possua. Descritivamente, o direito complexo, absoluto, perpétuo e exclusivo, pelo qual uma coisa fica submetida à vontade de uma pessoa, com as limitações da lei.

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Os aspectos do critério descritivo esclarecem melhor o conteúdo do conceito de propriedade. É a propriedade um direito complexo, pois assegura ao titular a faculdade de disposição, ou seja, à pessoa autoriza-se a dispor da forma que entender da coisa (RIZZARDO, 2006, p. 170).

No que diz respeito ao caráter de direito absoluto, este decorre da oponibilidade erga omnes, impondo a todos o dever de respeitá-la, desta forma exerce o titular o poder de dominação da coisa, mesmo que deva submeter-se a certas limitações. A propriedade é perpétua, durando ilimitadamente, não se perdendo pela falta de uso. E, por fim, considera-se exclusiva, quando os terceiros ficam proibidos de exercer sobre a coisa qualquer dominação (RIZZARDO, 2006, p. 170).

O Código Civil de 2002 não traz uma definição de propriedade, preferindo enunciar os poderes do proprietário no artigo 1.228, caput: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.” (BRASIL, 2002).

O direito de usar, ius utendi, corresponde à faculdade de se pôr o bem a serviço do proprietário, sem modificar a sua substância. É este poder empregado em benefício do titular do bem, que aproveita a serventia que apresenta, como quando habita uma casa, ou permite que um terceiro tire a utilidade. (RIZZARDO, 2006, p. 212)

Já o direito de gozar, jus fruendi, diz respeito ao direito de explorar economicamente a coisa e perceber seus frutos, sejam aqueles qu e ela produz naturalmente, ou os frutos civis. Consiste, portanto, na faculdade que tem o titular de explorar todo o potencial econômico da coisa, como e quando lhe convier, apropriando-se dos seus produtos naturais ou das rendas que sua exploração possa propiciar (CHALHUB, 2003, p.43).

No que diz respeito ao direito de dispor este consiste no poder do proprietário de consumir o bem, de aliená-lo ou gravá-lo, ou de submetê-lo ao serviço de terceira pessoa, ou de desfrutá-lo (RIZZARDO, 2006, p. 213).

Por fim o direito de reaver, rei vindicatio, “[...] assegura ao proprietário o direito de reaver os seus bens de quem injustamente os possua. Funda-se no direito de sequela, armando o titular do domínio de meios para buscar o bem em mãos alheias, retomá -lo do possuidor e recuperá-lo do detentor” (RIZZARDO, 2006, p. 213).

O direito de reaver a propriedade, ou seja, a proteção específica ao direito de propriedade concretiza-se por meio da ação reivindicatória.

Nesse sentido, Venosa pondera acerca do meio de defesa acima exposto (2012, v. 5, p. 225):

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Ação reivindicatória é a ação petitória por excelência. É o direito elementar e fundamental do proprietário a sequela; ir buscar a coisa onde se encontra e em poder de quem se encontra. Deflui daí a faculdade de o proprietário recuperar a coisa. Escuda-se no direito de propriedade para reivindicar a coisa do possuidor não proprietário, que a detém indevidamente. É a ação real que compete ao titular do domínio para retomar a coisa do poder de terceiro detentor ou possuidor indevido. [...] Possuir injustamente é ter sem o direito de possuir.

Como visto anteriormente a propriedade possui o caráter de direito absoluto, entretanto existem limitações a este direito. Uma dessas limitações diz respeito à função social da propriedade que será abordada no tópico seguinte.

2.1.2 Função social da propriedade, dignidade da pessoa humana e direito de moradia

A partir do momento em que o ordenamento jurídico reconheceu que o exercício dos poderes do proprietário não deveria ser protegido exclusivamente para satisfação do seu interesse, a função da propriedade tornou-se social (GOMES, 2001, p. 107).

A função social da propriedade constitui um direito e uma garantia fundamental, que encontra-se disciplinada no artigo 5º, inciso XXIII, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]

XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; [...] (BRASIL, 1988).

O legislador constitucional considerou por bem reafirmar a instituição da propriedade privada e a sua função social como princípios da ordem econômica, dispondo no artigo 170, incisos II e III, da Carta Magna: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] II – a propriedade privada; III - função social da propriedade; [...]” (BRASIL, 1988).

Nesse sentido Nery Junior e Nery (2009, p. 641) dispõem:

A propriedade privada e sua função social são princípios da ordem econômica (CF 170 II e III). A propriedade privada é um direito fundamental do cidadão desde que manifeste sua função social. A propriedade não pode ser exercida levando-se em conta apenas a vontade do próprio dominus, mas também deverá estar harmonizada com o interesse coletivo, sendo a função social a capacidade de impor um poder-dever ao proprietário sancionável pela ordem jurídica.

A função social, portanto, é princípio básico que incide no próprio conteúdo do direito de propriedade, somando-se às quatro faculdades conhecidas (usar, gozar, dispor e reivindicar), conforme dispõe o § 1º do artigo 1.228 do Código Civil.

Todo e qualquer ato de uso, gozo e disposição da coisa será submetido ao exame de finalidade, bem como eventual pretensão reivindicatória poderá ser paralisada, se o

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proprietário não conceder destinação relevante ao bem, apesar de ostentar a titularidade formal (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 318).

Traçadas essas considerações sobre a função social da propriedade, é necessário o estudo específico sobre a função social da propriedade urbana, visto que o instituto da usucapião especial de imóvel urbano surgiu como uma solução aos problemas sociais das cidades.

Dessa forma, cabe ressaltar que, o legislador constitucional, ao tratar da política urbana, regulamentou uma das situações em que a propriedade cumpre a sua função social no artigo 182, § 2º, in verbis: “a propriedade cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor” (BRASIL, 1988).

O referido artigo foi, posteriormente, regulamentado pela Lei nº 10.257/2001 que, no parágrafo único de seu artigo 1

º,

autodenomina-se Estatuto da Cidade e estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade em prol do bem coletivo, da segurança e do bem estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 323).

Nessa toada, o artigo 39 do Estatuto da Cidade ratifica o já disposto no artigo 182, § 2º da Constituição Federal:

A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento, das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2º desta Lei. (BRASIL, 2001).

Para Saule Junior apud Medauar e Almeida (2004, p. 238-239) a propriedade urbana atenderia a sua função social ao respeitar os seguintes requisitos:

[...] a) democratizar o uso, ocupação e a posse do solo urbano, de modo a conferir oportunidade de acesso ao solo urbano e à moradia; b) promover a justa distribuição dos ônus e encargos decorrentes de obras e serviços de infraestrutura urbana; c) recuperar para a coletividade a valorização imobiliária decorrente da ação do Poder Público; d) gerar recursos para o atendimento da demanda da infraestrutura e de serviços públicos provocada pelo adensamento decorrente da verticalização das edificações e para implantação da infraestrutura em áreas não servidas; e) promover o adequado aproveitamento dos vazios urbanos ou terrenos subutilizados ou ociosos, sancionando a sua retenção especulativa de modo a coibir o uso especulativo da terra como reserva de valor.

O Estatuto da Cidade apresenta uma série de inovações no tratamento do homem com o meio em que ele se desenvolve, numa perspectiva ampla de urbanismo, ou seja, apresenta novos institutos para o ramo do direito que reúne as normas reguladoras da atividade do Poder Público destinada a ordenar os espaços habitáveis (MEDAUAR E ALMEIDA, 2004, p 121-1220).

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Um desses institutos é o plano diretor, o qual consiste no “[...] instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana” (BRASIL, 1988).

Nesse sentido, Jorge Luiz Bernardi (2006) explica quando da elaboração de sua dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná:

O Plano Diretor, como norma constitucional (parágrafo 1º art. 182 CF), regulamentada pelo Estatuto da Cidade (Art. 4º, III, a), apresenta-se como o instrumento básico de planejamento municipal. É o primeiro instrumento determinado pela Constituição para que o poder público municipal promova a política de desenvolvimento e de expansão urbana, objetivando ordenar as funções sociais da cidade e garantir o bem-estar dos moradores da cidade.

Portanto, será por meio deste instrumento normativo municipal, que poderá ser delimitado o crescimento ordenado das cidades, evidenciando a importância do controle do uso e ocupação do solo urbano.

Logo, embora a propriedade urbana seja um bem particular, o direito do proprietário de usar, gozar e dispor é limitado pelo interesse social. A lei assegura o direito de propriedade, mas para que este direito seja protegido, a propriedade deverá exercer uma função social no ambiente urbano.

Desta forma, a Carta Magna visando disciplinar a função social da propriedade concede autonomia aos Municípios para que por meio de instrumentos urbanísticos, como os planos diretores ou as leis orgânicas locais das cidades, possam dar a devida finalidade social à propriedade urbana em prol do coletivo.

Cabe salientar também, neste tópico, que o cumprimento da função social do direito de propriedade relaciona-se diretamente com a efetivação do direito à moradia, visto que este visa garantir a todos um teto para abrigar-se com suas famílias de modo permanente. (SILVA, 2005, p. 314).

O direito à moradia encontra-se previsto no artigo 6º da Constituição Federal, o qual dispõe que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” (BRASIL, 1988).

Esse direito consiste em ocupar um lugar como residência, ocupar uma casa, apartamento, para nele habitar. O conteúdo do direito à moradia envolve não só a faculdade de ocupar uma habitação. Exige-se que seja uma habitação de dimensões adequadas, em condições de higiene e conforto, que preserve a intimidade pessoal e privacidade familiar. (SILVA, 2005, p. 314).

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O referido direito consiste em pressuposto para a dignidade da pessoa humana, a qual representa um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. A dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem. (JACINTHO, 2006, p. 139).

De acordo com Rangel (2011), o direito à moradia é um direito complexo, rico em atribuições, que vai além do direito de ter uma casa própria, embora este seja um complemento indispensável para a efetivação desse direito. Não possui apenas a conotação de habitação, mas envolve diretamente a qualidade de vida.

Ainda, discorre que uma pessoa não pode ser privada de uma moradia nem impedida de conseguir uma, cabendo ao Estado promover tanto a defesa desse direito quanto a sua garantia e efetivação em relação àqueles que não a têm. O direito de ter uma moradia digna tem o mesmo grau de importância dos direitos à vida e à saúde, pois certamente não se pode conceber dignidade em um ser humano vagando nas ruas sem moradia digna. (RANGEL, 2011).

Portanto, o direito de propriedade cumpre a sua função social quando garante o direito à moradia para aqueles que não possuem onde morar, proporcionando assim condições mínimas para viver com dignidade.

2.1.3 Aquisição originária da propriedade por meio da usucapião

A aquisição da propriedade tem como pressupostos fundamentais a capacidade das partes, a coisa objeto da aquisição e o meio de aquisição (PEREIRA, 1977, p. 127).

Cada sistema jurídico orienta-se por princípios próprios quanto ao modo de aquisição da propriedade. O direito brasileiro adotou os princípios do sistema romano, no qual a aquisição da propriedade efetiva-se mediante um título de aquisição, que compreende o elemento que ensejou a transmissão, e um outro ato, que é o modo de aquisição, que envolve a tradição da coisa com a intenção de transferir a propriedade (CHALHUB, 2003, p. 69-70).

Quanto à origem a aquisição poderá ser originária ou derivada; na primeira a aquisição nasce sem qualquer vinculação com o passado, neste caso não se constata uma relação jurídica entre o adquirente e o antecessor sujeito titular da propriedade. O adquirente torna a coisa como sua, passando a exercer o domínio sobre ela sem que de outra pessoa tenha havido transmissão (RIZZARDO, 2006, p.244).

Será derivada quando a aquisição ocorrer por meio de transmissão. A propriedade passa para um novo titular em razão de um contrato, transferindo-se de uma pessoa para a

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outra pela tradição ou transmissão imobiliária (RIZZARDO, 2006, p. 244).

Acerca dos modos de aquisição originário e derivado, Farias e Rosenvald (2012, p. 398) pontuam:

A importância da distinção entre modos originário e derivado reside nos efeitos que se produzem. Se a propriedade é adquirida por modo originário, não há vínculo entre a propriedade atual e a anterior, incorporando-se o bem ao patrimônio do novo titular em toda a sua plenitude, livre de todos os vícios que a relação jurídica pregressa apresentava. Todavia, se adquirida a propriedade por modo derivado, isto é, pelo registro no ofício imobiliário do título representativo de negócio jurídico ou sucessão, transfere-se a coisa com os mesmos atributos e restrições (ônus reais e gravames) que possuía no patrimônio do transmitente.

Com relação ao aspecto quantitativo e individualizado ou não dos bens a aquisição será a título singular ou a título universal. Segundo Rizzardo (2006, p. 245) a aquisição: “Será a título singular sempre que o objeto abranja um ou vários bens individualizados” e será a título universal quando: “[...] a transmissão envolve bens que constituem o patrimônio”; neste último caso adquire-se a totalidade dos bens, ou seja, móveis, imóveis, créditos, dívidas, dentre outros.

Por fim, quanto à categoria de bens, a classificação segue a distinção fundamental entre os bens móveis e imóveis, existindo meios de aquisição próprios para estes.

Os modos de aquisição dos bens móveis são: ocupação, especificação, confusão, comistão, adjunção, usucapião e tradição (CHALHUB, 2003, p. 70).

No caso da aquisição de bens imóveis, os modos peculiares de aquisição do direito de propriedade são: transcrição do título de transferência no registro do imóvel, acessão, usucapião e direito hereditário (PEREIRA, 2008, p. 99-100).

Como mencionada anteriormente, a aquisição do bem imóvel poderá ocorrer por meio da usucapião. Segundo Gomes (2001, p. 163), a usucapião é um modo de aquisição da propriedade, por via do qual o possuidor torna-se proprietário e inclui-se entre os modos originários, visto que, a despeito de acarretar a extinção do direito de propriedade do antigo titular, não se estabelece qualquer vínculo entre ele e o possuidor que o adquire.

Nesta toada, Rizzardo (2006, p. 248) conceitua o instituto da usucapião:

Assim, como se percebe, cuida-se de um modo originário de aquisição, pelo qual a pessoa que exerce a posse em um imóvel, por certo prazo previsto em lei, adquire-lhe o domínio, desde que sua posse tenha satisfeito certos requisitos, ou seja, revele que sempre foi pacífica, mansa e ininterrupta, sem oposição alguma do titular do domínio e com o animus domini.

Ao dispor em sua obra sobre o conceito da usucapião, Chalhub (2003, p. 73) explica que, embora não prevalente, existe uma corrente doutrinária que diverge quanto à usucapião ser uma forma de aquisição originária da propriedade, classificando-a como um modo de aquisição derivada.

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Desta forma, Chalhub (2003, p. 73) dispõe:

A usucapião é modo originário de aquisição, pois independe de qualquer relação jurídica entre o proprietário que perde esse direito e o possuidor que o adquire, muito embora esse modo de aquisição importe na extinção do direito de propriedade do antigo titular. Essa classificação, entretanto, não é pacífica, havendo corrente doutrinária que o classifica como modo de aquisição derivada, sob o argumento de que essa aquisição está relacionada com outra pessoa, que já era titular do bem [...]. No direito brasileiro, existem quatro espécies básicas de usucapião de imóveis: a usucapião ordinária, a usucapião extraordinária, a usucapião especial rural e a usucapião especial de imóvel urbano.

A primeira espécie está disciplinada no artigo 1.242 do Código Civil vigente e é aquela em que o possuidor dispõe de justo título e boa-fé. O prazo aquisitivo é de dez anos, mas se reduz pela metade se o possuidor houver estabelecido no imóvel sua moradia ou se tiver realizado no imóvel investimentos de interesse social e/ou econômico (CHALHUB, 2003, p. 76).

A usucapião extraordinária encontra-se prevista no artigo 1.238 do Código Civil de 2002, o qual dispõe que

Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.” (BRASIL, 2002).

A possibilidade de usucapião especial rural está descrita no artigo 191 da Constituição Federal e no artigo 1.239 do Código Civil vigente. Configura-se a usucapião especial rural quando preenche os seguintes requisitos:

Aquele que não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possuir como sua, ininterruptamente e sem oposição, por cinco anos, área de terra em zona rural não superior a cinquenta hectares e torná-la produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe a propriedade. (BRASIL, 1988).

A última modalidade, a usucapião especial de imóvel urbano, veio introduzida pelo artigo 183 da Constituição Federal, encontrando-se contemplada no Código Civil atual e tendo sido regulamentada pela Lei nº 10.257/01, denominada de Estatuto da Cidade, sendo objeto da delimitação do tema do presente trabalho, o qual será estudado no tópico seguinte.

2.2 USUCAPIÃO ESPECIAL DE IMÓVEL URBANO

Desde o descobrimento do Brasil sempre houve constante preocupação no sentido de que o povoador viesse a morar na cidade, recebendo para isto terra suficiente para construir

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casa e quintal, onde pudesse fazer sua horta a fim de garantir a sua subsistência. O recebimento dessa terra representava quase uma doação, aproveitando aos herdeiros e sucessores, embora não implicasse domínio e não se considerasse o tempo de ocupação para efeito de aquisição prescricional (RIBEIRO, 2012, p. 1001).

Com o passar do tempo e a transferência da propriedade ao particular oriunda de compra ou doação em sesmaria, foi sedimentada a aquisição em face da ocorrência de prazo prescricional (usucapião), contudo, até então não era feita distinção no tocante a imóveis situados em zona urbana ou rural, para fins de aquisição dominial (RIBEIRO, 2012, p.1001).

Essa distinção começou a ocorrer no ordenamento jurídico brasileiro quando regulamentou-se uma nova modalidade de usucapião, referente a imóveis rurais em 1934, vindo o legislador somente em 1988 a disciplinar no artigo 183 da Constituição Federal sobre a denominada usucapião especial de imóvel urbano.

A usucapião especial urbana direciona-se àquele que não conta com moradia e que não tem outro imóvel, visto que as cidades de alto índice populacional vivem com excesso de contingente humano, o que acaba ocasionando problemas de moradia, em especial para as pessoas de baixa renda (RIBEIRO, 2012, p. 1002).

De acordo com Farias e Rosenvald (2012, p. 435), a usucapião especial urbana Trata-se de mais uma maneira de promover o direito fundamental à moradia, assegurando-se um patrimônio mínimo à entidade familiar, na linha de tutela ao princípio da dignidade da pessoa humana. De fato, a utilização racional da propriedade sobre áreas urbanas estéreis e ociosas, ou mesmo as ocupadas irregularmente, demonstra que o Estado não quer apenas garantir direitos, mas fornecer os meios para seu exercício.

Portanto, com a elevação em nível constitucional do princípio de que a propriedade subordina-se à função social da propriedade e a valorização do direito à moradia, o legislador atentou às áreas urbanas não utilizadas devido ao elevado número de pessoas sem qualquer lugar para morar.

Nesse sentido, Ribeiro (2012, p. 1002) explica que a forma encontrada para solucionar o problema de moradia das cidades foi uma nova modalidade de usucapião especial, denominada por alguns de usucapião de solo urbano e por outros usucapião pro misero, pro morare, pro casa ou pro moradia.

Logo, a usucapião especial de imóvel urbano constitui uma garantia ao direito de propriedade e moradia, visando à urbanização das cidades e tendo por objetivo a dignidade humana do indivíduo ou de sua família, os quais necessitam de um teto para se abrigar.

Assim, sendo a usucapião especial de imóvel urbano um tipo de aquisição de propriedade, com requisitos específicos e peculiares, em particular, com prazo bem menor de

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tempo prescricional, convém assinalar a sua existência a partir da promulgação da Constituição Federal vigente.

Dessa forma, a Constituição Federal dispõe no artigo 183 sobre o instituto da usucapião especial:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião (BRASIL, 1988). A Lei n. 10.257 de 10 de julho de 2001, denominada de Estatuto da Cidade, foi criada para regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, objetivando “[...] estabelecer normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (BRASIL, 2001).

No intuito de regular a propriedade em prol do bem coletivo, o Estatuto da Cidade traz instrumentos de efetivação da política urbanística, entre eles está a chamada usucapião especial de imóvel urbano, disciplinada no artigo 9º da referida legislação, in verbis:

Art. 9o Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (BRASIL, 2001).

O artigo 9º do Estatuto da Cidade manteve em quase sua totalidade a redação do artigo 183 da Constituição, inovando apenas ao possibilitar a usucapião de edificações, mediante alteração no caput, e ao acrescentar o § 3º, no qual se regulamentou a sucessio possessionis (FARIAS e ROSENVALD, 2012, p. 438-439).

O Código Civil de 2002 também regulamentou no seu artigo 1.240 sobre a usucapião especial de imóvel urbano, utilizando inclusive a mesma redação do artigo 183 da Constituição Federal.

Quanto à legitimidade para usucapir, estabelece a Constituição Federal no artigo 183 quando utiliza a expressão “aquele que possuir”, que este será o beneficiário da aquisição da propriedade pela usucapião urbana (RIBEIRO, 2012, p. 1007, grifo do autor).

Tanto o brasileiro como estrangeiro podem ser beneficiados, entretanto existem restrições quanto ao estrangeiro. O brasileiro nato e o naturalizado podem usucapir, já o estrangeiro poderá fazê-lo tão só o residente no País (RIBEIRO, 2012, p. 1007).

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conceito de família, não possui, portanto, legitimidade para valer-se da prescrição aquisitiva. Além disto, a lei exige que o imóvel seja utilizado para fins de moradia ou de sua família (RIBEIRO, 2012, p. 1007).

O legislador constitucional, ao referir-se no caput do artigo 183 que o imóvel deverá ser utilizado para sua moradia ou de sua família, não restringiu a nenhum modelo de família específica. Sendo importante ressaltar que o conceito de família é abrangente, tendo em vista que se entende por família toda forma de entidade familiar inserida no artigo 226 da Constituição Federal (RIBEIRO, 2012, p. 1007).

De acordo com o § 1º do artigo 183, “O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.”, nesse caso, a Lei Maior teve objetivo de esclarecer que ambos os sexos, feminino e masculino, mesmo que não sejam casados, poderão figurar no polo ativo da ação de usucapião (BRASIL, 1988).

No caso da usucapião especial urbana nega-se o conhecimento do direito mais de uma vez à mesma pessoa, conforme estabelece o § 2º do artigo 183, não se reconhece o direito ao mesmo possuidor por mais de uma vez. (BRASIL, 1988).

Ainda, dispõe o artigo 183, § 3o, da Magna Carta, que “Os imóveis públicos não serão adquiridos pela usucapião”. (BRASIL, 1988).

A fim de que não exista qualquer divergência sobre os imóveis públicos, o constituinte disciplinou de forma expressa tal vedação.

Conforme visto, o artigo 183 da Constituição Federal elenca requisitos necessários e específicos para a aquisição da propriedade por meio da usucapião especial de imóvel urbano e estes requisitos serão analisados a seguir.

2.2.1 Requisitos da usucapião especial de imóvel urbano

O legislador constitucional disciplinou no artigo 183, a necessidade dos seguintes requisitos para poder usucapir um imóvel: duração da posse pelo prazo de cinco anos; posse ininterrupta e sem oposição, com ânimo de dono; a área deve estar localizada em zona urbana; a extensão superficial do imóvel em até duzentos e cinquenta metros quadrados; a sua utilização deve ser para moradia própria do possuidor ou da família e não ser proprietário de imóvel urbano ou rural (BRASIL, 1988).

Dessa forma, faz-se necessária a análise individual destes requisitos para melhor compreensão sobre o tema.

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2.2.1.1 Posse

A posse constitui um dos requisitos de fundamental importância para a caracterização do instituto da usucapião tratado na delimitação do presente trabalho monográfico. De acordo com Ribeiro (2012, p. 728), “desde o primevo direito romano afirmava-se que não pode haver usucapião sem a posse”.

De acordo com Farias e Rosenvald (2012, p. 60), a origem da posse é historicamente justificada no poder físico sobre as coisas e na necessidade do homem de apropriar-se de bens.

A caracterização da posse é um dos temas mais controvertidos no mundo jurídico, a começar pela etimologia, em que ora diz-se que o vocábulo vem de possessio, possidere (posse, possuir), ora de pedes ponere (“pôr os pés”, fixar-se), ora de sedes ponere, sedium positivo (posição de assento) (CHALHUB, 2003, p. 15, grifo do autor).

Para Ribas apud Rizzardo (2006, p. 15) “A posse é, pois, o império natural ou material que os homens exercem sobre as coisas, abstração feita do direito que possam, ou não, ter para exercê-lo”.

Para Pereira (1977, p. 29-30) a posse “Consiste no poder de dispor fisicamente da coisa, com a intenção de dono e de defendê-la contra as agressões de terceiros”.

Desta forma, Chalhub (2003, p. 16) estabelece o que é posse:

Trata-se de situação de fato na qual uma pessoa exerce sobre uma coisa poderes de apropriação, conservação e defesa, explorando seu potencial econômico. O proprietário de uma coisa, que a mantém em seu poder, exerce a posse; exerce a posse, também, a pessoa que, mesmo não sendo proprietária, usa a coisa ou extrai os frutos dela, como, por exemplo o inquilino de um apartamento, o arrendatário de um imóvel rural, o arrendatário num contrato de leasing ou o fiduciante num contrato de alienação fiduciária; o credor, num contrato de alienação fiduciária; o credor num contrato de penhor comum, quando fica com a coisa, também exerce a posse, assim como o mutuário no contrato de mútuo, que , recebendo a coisa, deve conservá-la e devolvê-la no prazo fixado.

Ainda, no Código Civil vigente, o conceito de posse aparece implicitamente no artigo 1.196, ao considerar possuidor “[...] todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.” (BRASIL, 2002).

Entre as teorias construídas sobre a posse, as duas que apresentam maiores destaques controvertem-se entre a concepção subjetiva (Savigny) e a concepção objetiva da posse (Ihering). (CHALHUB, 2003, p. 17).

Segundo a teoria subjetiva definida por Savigny, a posse configura-se pela reunião dos elementos corpus e animus. O corpus corresponde ao poder físico da pessoa sobre a coisa, a apreensão da coisa, e a ele está articulado o animus, que é a intenção de ter a coisa como

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própria; o animus não corresponde a uma convicção de ser dono, mas sim a vontade de tê-la como sua (CHALHUB, 2003, p. 17).

A teoria de Savigny é considerada subjetiva, pois ele somente reconhece a posse onde há animus domini. Ao exigir o animus domini como requisito indispensável para configuração da posse, a doutrina subjetiva considera detentores o locatário, o comodatário, o depositário, o mandatário (GOMES, 2001, p. 19).

Contrapondo a teoria subjetiva tem-se a teoria objetiva de Ihering, que sustenta a existência do elemento material – o corpus – o qual caracteriza a posse, dispensado o elemento psicológico, pois este estaria compreendido no poder físico que a pessoa exerce sobre a coisa. O animus é tão somente a vontade de proceder como procede habitualmente o proprietário – affectio tenendi – independente de querer ser dono, daí porque será possuidor aquele que se comporta em relação à coisa com aparência de dono (CHALHUB, 2003, p. 17).

Nesse sentido, é considerado possuidor aquele que, na teoria de Savigny, era considerado apenas detentor. São possuidores, portanto, o usufrutuário, o locatário, o comodatário, o depositário, o mandatário, o transportador, o administrador, o testamenteiro, entre outras pessoas que utilizam coisas alheias por força de um direito ou de uma obrigação (RIZZARDO, 2006, p. 25).

Ihering inicia sua teoria afirmando que posse é um direito e não apenas um fato. Sendo um direito, e tendo como objeto imediato a própria coisa possuída, deve a posse figurar no elenco das relações jurídicas sobre a coisa, isto é, no elenco dos direitos reais. Tem Ihering a posse como um meio de manifestação da propriedade (RIZZARDO, 2006, p. 22).

Nesse sentido, Gomes (2001, p. 27) explica:

Ensina Ihering que a posse é um direito. [...] Para ele, direito é o interesse juridicamente protegido. Admitida essa definição, não pode haver dúvida de que a posse seja um direito. Nela se reúnem os dois elementos – substancial e formal – que se exigem para a existência de um direito. A posse o corporifica, porque constitui a condição para utilização econômica da coisa. Como simples relação de fato, oferece, pois, interesse. A esse elemento substancial, o Direito acrescenta, na posse, um elemento formal: a proteção jurídica. Reveste, portanto, o caráter da relação jurídica, o que equivale a direito.

Entretanto, existem correntes que dizem que a posse é um fato e outras que disciplinam que é um fato e um direito.

A primeira corrente Beviláqua (1984, p. 967) assim explica:

Embora revista os caracteres exteriores do domínio, a posse é um mero fato. Se o direito a protege, concedendo-lhe garantias especiais, é porque a perturbação e o esbulho são violências contra a pessoa do possuidor e o Estado deve, sempre, defender os indivíduos contra as vias de fato ilícitas. As ações possessórias são, portanto, pessoais, e delitos os atos que as provocam.

Referências

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