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Para a realização da pesquisa, destaca-se que inicialmente foram contatadas as instituições pesquisadas para apresentação da proposta do estudo, bem como para que os coordenadores assinassem uma carta de autorização para a coleta de dados. A partir dessa autorização, o projeto de pesquisa foi encaminhado para avaliação junto à Comissão Científica da Faculdade de Serviço Social e posteriormente ao Comitê de Ética da PUCRS sendo aprovado sob o número do parecer 147.622.

Considerando que a pesquisa contou com a participação e colaboração de diversas pessoas, foi formulado um Termo de Consentimento Informado, Livre e Esclarecimento para os profissionais (ver apêndice 02) e também um Termo de Assentimento Informado para Adolescente (ver apêndice 01), onde constam todos os objetivos da pesquisa bem como a metodologia adotada. Estes termos foram lidos e assinados pelos sujeitos que participaram da pesquisa.

Por fim, antes de socializar os resultados obtidos através da pesquisa realizada nos municípios de São Borja e Itaqui, ressalta-se mais uma vez que pesquisar é exercício sistemático de indagação da realidade observada, buscando conhecimento que ultrapasse o entendimento imediato, com um fim determinado e que fundamenta e instrumentaliza o profissional a desenvolver práticas comprometidas com mudanças significativas, no contexto em que se insere e em relação à qualidade de vida do cidadão (GATTI, 2002).

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5 A EXPLORAÇÃO SEXUAL DE ADOLESCENTES NOS MUNICÍPIOS

PESQUISADOS

A exploração sexual é uma problemática presente na realidade de todo o país, assumindo particularidades, similaridades e diferenças nas diferentes regiões, Estados e municípios. “Aparece tanto em cidades grandes, como em longínquos e pequenos municípios” (ROSÁRIO, 2004, p. 24).

No Norte e no Centro-Oeste, predomina o tráfico de escravas nas áreas do garimpo. No Nordeste destaca-se o turismo sexual. No Sudeste, a prostituição Infanto-Juvenil decorre da vivência na rua e do turismo sexual. No Sul, crianças e adolescentes do interior, e seus pais, são aliciados com informações falsas (DIAS; RIBEIRO, 2009, p. 466).

Com relação ao estudo aqui proposto buscar-se-á evidenciar as características e particularidades que essa expressão da violência sexual assume nos municípios de São Borja e Itaqui. Ambos os municípios ficam localizados na fronteira sul do Brasil (extremo oeste do Estado do Rio Grande do Sul), às margens do rio Uruguai, fazendo divisa com a Argentina. Também pertencem a Associação dos Municípios da Fronteira Oeste – RS (AMFRO)48

São Borja é uma cidade histórica, possuindo atualmente 331 anos. Foi fundada em 10 de outubro de 1682 pelo jesuíta Francisco Garcia como o primeiro dos Sete Povos das Missões. Constitui-se como ponto estratégico na Guerra do Paraguai e ganhou dimensão nacional principalmente por ter sido o berço e por abrigar os túmulos de dois ex- presidentes, Getúlio Vargas e João Goulart (AMFRO, 2013). Sua população é de 64.869 habitantes (IBGE, 2010) e possui uma área de 3.616 km².

Em termos populacionais, Itaqui é menor que São Borja, possuindo 39.770 habitantes (IBGE, 2010). No entanto, considerando a área territorial são muito

48“A Associação dos Municípios da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, ou seja: a Associação dos

municípios gaúchos de: Alegrete, Barra do Quarai, Itaqui, Maçambará, Manoel Viana, Quarai, Rosário do Sul, Santa Margarida do Sul, São Borja, Sant‟Ana do Livramento, São Gabriel e Uruguaiana e, de acordo com seus Estatutos, é uma instituição que visa ampliar e fortalecer a capacidade administrativa dos municípios associados, pela integração econômica e social destes aos quais deve prestar assistência técnica relacionada aos seus interesses” (AMFRO, 2013, s/p).

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parecidos, visto que esta compreende 3.404 km². A instalação do município ocorreu em 1858 e em maio de 1879 foi elevado à categoria de cidade (AMFRO, 2013). Como São Borja, suas terras foram campo de lutas durante a Guerra do Paraguai e durante a Revolução Farroupilha.

O fato de serem dois municípios gaúchos e fronteiriços, com forte expressão histórica e política, remete a determinadas particularidades em relação às formas de socialização de homens e mulheres, mais especificamente no que diz respeito às relações de gênero. As particularidades das relações de gênero nesta região possuem relevância no desvendamento da exploração sexual de crianças e adolescentes. No entanto, não são suficientes para explicar sua ocorrência, pois esta forma de manifestação da violência possui outras determinações mais universais, que podem ser reconhecidas em outras regiões do país.

A obra de Érico Veríssimo, “O tempo e o vento” que apresenta acontecimentos históricos do processo de formação do estado do Rio Grande do Sul, retrata a imagem do homem gaúcho forte, bravo e destemido, características que se afirmam nas vestimentas e na personalidade.

O personagem Rodrigo Cambará que exalta estas características também retrata a figura do homem viril, que tem legitimado na sociedade (pelo próprio machismo) o fato de poder se relacionar não apenas com sua esposa, mas com outras mulheres, buscando a satisfação de seus desejos e prazeres. Em contrapartida, às mulheres caberá a preocupação com a procriação, a educação dos filhos, o cuidado da casa e que aguardará ansiosa o retorno do companheiro ao lar.

Outra diferença percebida na socialização de homens e mulheres diz respeito à participação dos homens na vida social e política (TAVARES, 2012). A situação vivida pela personagem Ana Terra, de subordinação a relações sociais ditadas pelo machismo, não parece de um todo estranha ao que se pode observar nos casos de exploração sexuais pesquisados e que serão posteriormente apresentados. Não raro, encontramos adolescentes que estão subordinadas a relações análogas ao que descrevemos na história de Ana Terra. Persiste a realidade em que meninas, diante da manifestação de sua sexualidade, sofrem violência física dos pais e até mesmo são expulsas de casa. Fatos estes que geram uma cadeia de outras situações que permanecem muitas vezes, relacionadas à violência e a desigualdade de gênero.

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Outra obra que retrata as desigualdades existentes nas relações de gênero e que põe em destaque a figura da mulher gaúcha é A Casa das Sete Mulheres, de Letícia Wierzchowski. A obra também evidencia o movimento de resistência realizado por algumas mulheres, diante da ordem patriarcal, questionando os papéis atribuídos à mulher. Como refere Macedo (2013, s/p) “o romance revela perfis femininos que ora internalizam os estereótipos de gênero, ora se rebelam contra os papeis tradicionais direcionados à mulher”. Essa dialética de internalização e de resistência aos valores que permeiam as formas de socialização da mulher se reproduz atualmente, cada vez mais mediada pelos requisitos da reprodução ampliada do capital. Por um lado, novas legislações reconhecem a mulher como cidadã, com uma gama de direitos assegurados pela legislação. Por outro, no mercado de consumo de massas, no mercado de trabalho e/ou na vida social, verifica-se inúmeras formas de violação de direitos explícitas ou disfarçadas pelas relações sociais.

Após esta breve caracterização dos municípios de São Borja e Itaqui e da exposição de alguns elementos históricos e culturais que evidenciam alguns traços da desigualdade de gênero na região pesquisada, serão apresentados a seguir os resultados da pesquisa realizada nos CREAS dos municípios supracitados.

Considerando que a etapa de coleta de dados nos dois municípios assumiu características particulares, conforme será evidenciado a seguir, algumas informações e problematizações serão apresentadas com a identificação do CREAS ao qual se estará referindo e outras não. Nesta perspectiva, o primeiro item deste capítulo fará uma breve contextualização de como ocorreu o processo de coleta de dados nos municípios já referidos, evidenciando algumas dificuldades e/ou limites que se fizeram presentes. Os itens posteriores apresentarão a análise dos dados coletados, as discussões e reflexões desenvolvidas, visando assim contribuir com subsídios para qualificar as políticas públicas de enfrentamento a exploração sexual de crianças e adolescentes.

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