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CAPÍTULO I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1. Gestão interdisciplinar do currículo

1.1. Currículo e gestão curricular

O currículo, sendo um conceito polissémico tem evoluido ao longo dos tempos. Tendo por referência três fatores: a evolução da sociedade, a evolução do conhecimento científico e a evolução económica. Significa isto que a evolução do currículo depende da forma como estes três fatores se articulam e influenciam (Pombo, 1993).

Consultando literatura especializada, são várias e contraditórias as definições de currículo. Como sublinha Abrantes (1994), o termo currículo pode referir apenas os nomes e a sequência das disciplinas que constituem um curso e também os assuntos que são leccionados nelas ou, num sentido mais alargado, significar o leque de acções educativas que a escola planeia com uma dada intenção, incluindo as desenvolvidas fora das aulas habituais. Pode, ainda, assumir um outro significado quando se identifica com tudo o que os alunos aprendem,

quer o que resulta do ensino formal (com a ajuda de professores) quer o que advém de processos informais e não previstos. O termo currículo tem sido usado com diferentes significados.

A ambiguidade do conceito de currículo é reconhecida por Ribeiro (1995) ao defender que existe uma diversidade de definições e de conceitos, em função das perspetivas que se adotam, e que se traduz, por vezes, numa imprecisão acerca da natureza e âmbito do currículo. Este autor identifica a definição de currículo segundo duas perspetivas distintas: a mais comum considera o currículo como elenco e sequências de matérias ou disciplinas, isto é, um plano de estudos que inclui a organização dos temas de ensino e respetivas cargas horárias, referentes a um ciclo de estudos, nível de ensino ou curso e a outra que traduz currículo como uma listagem, esquema ou sumário de temas e tópicos para uma disciplina ou área disciplinar, podendo integrar orientações metodológicas para tratar os conteúdos programáticos. Também Pacheco (1996), apresenta duas perspectivas. Na primeira, o currículo é identificado como um plano estruturado e organizado de acordo com determinados objectivos, conteúdos e actividades consoante a natureza das disciplinas, cuja elaboração segue duas regras fundamentais: a previsão e a precisão de resultados. O currículo corresponde, assim, a um plano geral que se pretende que seja posteriormente implementado respeitando as suas intenções iniciais. Na segunda perspectiva, o currículo representa o conjunto de experiências educativas vividas pelos alunos, possuindo, por isso, um elevado grau de indeterminação, identificando-se com a ideia de projeto, de edifício em permanente construção e reformulação. Deste modo, o currículo, embora inclua um plano de acção pedagógica previamente definido, permanece em aberto e dependente das condições da sua aplicação, não correspondendo a uma estrutura determinada.

Ponte, Matos & Abrantes (1998) propõem outro tipo de abordagem ao conceito, considerando diversos níveis de abrangência. Num sentido mais restrito, o currículo corresponde ao leque e sequência de disciplinas que compõem um determinado curso, podendo incluir também os programas disciplinares. Num sentido um pouco mais amplo, o currículo incluirá também as atividades que a escola planifica, de forma deliberada, para oferecer aos seus alunos, que podem ou não ser contempladas pelos programas disciplinares. Num sentido ainda mais amplo, o currículo pode ser identificado como o conjunto global das aprendizagens dos alunos, seja em consequência do ensino formal ou em virtude de processos informais e não previstos. Roldão (1999) define currículo como “o conjunto de

aprendizagens que, por se considerarem socialmente necessárias num dado tempo e contexto, cabe à escola garantir e organizar (p.24)”. Alonso (2000) partilha da visão de currículo

como processo dinâmico, ao considerar que este se vai transformando, enriquecendo, reconstruindo e, por vezes, deteriorando e desvirtuando. Para Canavarro (2003), o currículo “tanto pode significar o programa estruturado de conteúdos disciplinares prescrito por

alguém, como o conjunto de todas as experiências que o aluno realmente vive na escola (p. 112) “. No primeiro caso, o foco é sobre o que o professor deve ensinar sobre um conteúdo

específico; no segundo, é sobre o que os alunos realmente aprendem, independentemente do conteúdo a que se refere. Serrazina & Oliveira (2005) defendem que o que transforma um conjunto de aprendizagens em currículo é a sua finalização, intencionalidade, estruturação coerente e sequência organizadora. Mais recentemente, e tendo em conta o ênfase colocado nas múltiplas conceções de currículo, Gaspar & Roldão (2007) apresentam uma síntese em torno de quatro características para a construção do seu conceito. Assim, o conceito de currículo aparece centrado nos resultados da aprendizagem, nos conteúdos a ensinar, nos processos de aprendizagem e nos meios ou materiais para a aprendizagem.

Face à complexidade que caracteriza o conceito de currículo sobressai a ideia de currículo como projeto dinâmico partilhado por toda a comunidade educativa, um processo de construção de conhecimento, aberto e flexível, influenciado pelos conteúdos que se quer fazer aprender e características dos participantes desse projeto. Esta é a conceção de currículo que orienta este estudo.

A forma como o professor olha o currículo oficial e o valor que o professor reconhece às orientações curriculares marca decisivamente a forma como o vai, ou não, pôr em prática junto dos seus alunos.

Mas, independentemente do grau de identificação com as propostas curriculares, em qualquer prática educativa escolar está sempre presente um determinado modo de concretizar, uma opção de gestão curricular, uma opção sobre o que se ensina, como se organiza a aprendizagem e como se avaliam os seus resultados (Roldão, 1999).

O conceito de gestão curricular surge muitas vezes associado ao de flexibilização curricular. Segundo Roldão (1999), flexibilizar significa deslocar e diversificar os centros de decisão curricular. Para Abrantes (2001), flexibilizar o currículo está relacionado com diferenciar e adequar o currículo. Diferenciar significa que é necessário procurar caminhos, que são necessariamente diversos, para que todos e cada aluno tenha sucesso, no sentido de

incluírem tipos e sequências de atividades e a articulação dos saberes em função da diversidade de cada população escolar. Adequar significa procurar maneiras ajustadas para que todos os alunos aprendam, isto é, o professor adequa as suas opções às características pessoais dos alunos, tendo como referentes as aprendizagens que todos devem alcançar (Roldão,1999). Promover a adequação curricular acentua o papel do professor como gestor do currículo, ao assegurar uma equidade de aprendizagens para todos os alunos, independentemente das situações de partida.

Para Ponte (2005), a gestão curricular tem a ver com o modo como o professor interpreta e (re) constrói o currículo, tendo em conta as características dos seus alunos e as suas condições de trabalho. Esta gestão curricular assenta em dois elementos: um deles é a seleção e/ou (re) criação e sequenciação de tarefas que permitam que as aprendizagens dos alunos sejam mais significativas e o outro é a estratégia posta em prática pelo professor (id).

A relação com as outras disciplinas ou áreas disciplinares é outro aspeto que o professor deve ter em atenção quando desenvolve o currículo, não apenas a nível macro (quando planifica o ano letivo, um período ou unidade didática) mas também a um nível micro (quando planifica uma aula).

A publicação do Currículo Nacional do Ensino Básico, CNEB. (ME – DEB, 2001) fez emergir, na comunidade educativa um novo entendimento sobre o conceito de currículo, introduzindo a noção de diferenciação e construção do currículo em função dos alunos. No quadro de autonomia concedida às escolas, este diploma define os princípios orientadores da organização e da gestão curricular e estabelece que as estratégias de desenvolvimento do currículo nacional, visando adequá-lo ao contexto de cada escola, deverão ser objeto de um projeto curricular de escola, desenvolvido em função do contexto de cada turma, num projeto curricular de turma.

Foram realizados estudos em Portugal em torno do currículo e da gestão curricular. Costa et al. (2002) conduziu um estudo que pretendia investigar a implementação do Projeto de Gestão Flexível do Currículo numa escola básica com segundo e terceiro ciclos; Martins (2005) desenvolveu um estudo que pretendia avaliar a forma como os professores se apropriaram da abordagem curricular perspetivada no desenvolvimento de competências, particularmente para as Ciências Físicas e Naturais do terceiro ciclo. Concluiram que continua a predominar uma cultura curricular pouco autónoma, marcada pela preocupação do cumprimento formal do que é preconizado no programa e no manual, bem como algumas

dificuldades de operacionalização no que concerne ao projeto curricular de turma. Apesar de se verificarem melhorias em termos de colaboração docente, não se verificam mudanças significativas nas práticas pedagógicas ao nível da articulação curricular.