• Nenhum resultado encontrado

Uma experiência de mudança na Educação Médica

4.3 O CURRÍCULO INTEGRADO DO CURSO DE

MEDICINA DA UEL15

O Currículo Integrado do Curso de Medicina da UEL sofreu nos últimos anos algumas adequações, motivadas por questões internas e também pela atualização das Diretrizes Curriculares Nacionais da área em 2014. Mas mantém sua essência, construída a muitas mãos naquele período (1991-2005), totalmente alinhada com o paradigma da integralidade, acompanhando as tendências de mudança da Educação Médica, materializada no projeto pedagógico de sua criação, apresentado a seguir.

O Modelo Pedagógico16

O projeto pedagógico do Curso parte da compreensão de que o estudante de hoje deve ser preparado para ser o profissional e o cidadão que participará dos processos de construção do conhecimento. As atividades docente-assistenciais são centradas no estudante, visto como sujeito da aprendizagem e no professor como facilitador do processo de ensino- aprendizagem, enfocando o aprendizado baseado em problemas e orientado para a comunidade.

O modelo pedagógico do Curso está fundamentado nos princípios da proposta pedagógica interativa, de natureza democrática e pluralista, com um eixo metodológico que confere destaque à Aprendizagem Baseada em Problemas. O projeto pedagógico visa à formação de um profissional competente para o atendimento das necessidades de saúde da população em geral, no que diz respeito à promoção e prevenção de doenças, diagnóstico e eficácia de suas ações terapêuticas e reabilitadoras.

Tendo como base as competências, habilidades e conteúdos desenvolvidos a partir das diretrizes curriculares dos cursos de medicina,

15. Projeto Político-Pedagógico do Curso de Medicina da UEL - PPPMed. Colegiado do Curso de Medicina - Centro de Ciências da Saúde – UEL. Londrina, 2004. 16. Manual Geral do Estudante. Colegiado do Curso de Medicina - Centro de Ciências da Saúde – UEL. Londrina, 2005.

121

a proposta pedagógica apresentada tem a avaliação como uma questão central, que está a serviço da aprendizagem, e a interdisciplinaridade como fundamento essencial. Desde o início do curso, o novo currículo valoriza de modo significativo a necessidade da prática integradora, realizada nos mais variados espaços de ensino-aprendizagem favorecendo a integração com os serviços de saúde e a comunidade. Propicia também a vivência multiprofissional com ações integradoras envolvendo as outras carreiras da área da saúde.

O Curso de Medicina da UEL tem como objetivo central promover a formação geral do médico como profissional competente nas suas atribuições técnico-científicas e como cidadão consciente das suas responsabilidades sociais, e para tanto se propõe a:

• Formar um profissional apto a resolver a grande maioria dos principais problemas de saúde encontrados na população;

• Aprimorar a relação médico-paciente, aumentando a responsabilidade acadêmica e o compromisso social;

• Integrar o ciclo básico com o clínico e a teoria com a prática; • Melhorar os sistemas de avaliação do processo de ensino-

aprendizagem e do próprio curso;

• Valorizar a visão bioética e humanista da medicina;

• Estimular a compreensão do paciente como ser biopsicossocial; • Contribuir para o desenvolvimento de práticas multiprofissionais

de ensino, pesquisa e assistência, atuando articuladamente com os demais cursos de graduação do CCS e com os serviços de saúde; • Participar das iniciativas desenvolvidas no campo da educação

médica, em âmbito nacional e internacional;

• Capacitar o estudante para a produção do conhecimento e para a educação permanente em saúde, de forma crítica, contínua e reflexiva.

Muitas são as formas de ensinar na história humana. Mais recentemente, entretanto, tem crescido o consenso de que é mais importante estimular

122

o estudante a aprender por si próprio, fornecendo-lhe meios e ambientes facilitadores, do que ensinar da maneira tradicional, transmitindo conhecimentos. A transferência do centro das ações de aprendizagem para o estudante é um marco da pedagogia atual e um dos pressupostos da metodologia PBL (sigla de Problem Based Learning, que significa Aprendizagem Baseada em Problemas). O Curso de Medicina da UEL adota a ABP (ou PBL) como principal método de ensino-aprendizagem. No método da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) trabalha-se com o objetivo de resolver um problema e, nesse sentido, é um processo muito parecido com a metodologia de pesquisa científica. O método guarda a mesma lógica: a partir de um problema, busca-se compreendê-lo, fundamentá-lo e analisá- lo. São elaboradas hipóteses de solução, que devem ser comprovadas e validadas, estimulando o raciocínio, as habilidades intelectuais e a aquisição de conhecimentos. Este modelo pedagógico vinha sendo desenvolvido fora do país há mais de 40 anos, primeiro pelas Universidades de MacMaster (Canadá) e de Maastricht (Holanda) e depois por um número muito grande de escolas médicas e outras escolas profissionais ao redor do mundo.

A aprendizagem baseada em problemas tem sido considerada como um método adequado ao aprendizado de adultos e é recomendado pela Associação Brasileira de Escolas Médicas (ABEM), pela Associação Européia de Escolas Médicas (AMEE) e em encontros internacionais de ensino médico. A adoção do método pela Universidade de Harvard (The New Pathway) na década de 90, possibilitou ao mesmo uma projeção importante nos círculos pedagógicos ligados à Medicina.

(...) O método da aprendizagem baseada em problemas tem como ponto de partida um problema bem formulado e pretende chegar a um resultado. Nesse percurso o aluno pesquisa, discute com seus colegas, com seu professor/tutor e outros profissionais, participa de palestras, de conferências, de aulas práticas, formula suas hipóteses diagnósticas e de solução. O método da aprendizagem baseada em problemas estimula o raciocínio, as habilidades intelectuais e a aquisição de conhecimentos. (COLEGIADO, 2004:11)

123

O Curso de Medicina da Universidade Estadual de Londrina, ao optar por este modelo pedagógico, em 1998, deu um passo importante em direção à formação geral do médico, preparado para atuar no Sistema Único de Saúde - SUS e capaz de utilizar seus conhecimentos e buscar outros para compreender as necessidades de saúde da população.

Apresenta-se as principais características da ABP:

1. O estudante é responsável por seu aprendizado, o que inclui a organização de seu tempo e a busca de oportunidades para aprender; 2. O currículo é integrado e integrador, com uma linha condutora geral, no intuito de facilitar e estimular o aprendizado. Esta linha se traduz nos módulos temáticos do currículo e nos problemas, que deverão ser discutidos e resolvidos nos grupos tutoriais;

3. A escola oferece uma grande variedade de oportunidades de aprendizado através de laboratórios, ambulatórios, experiências e estágios hospitalares e comunitários, bibliotecas tradicionais e acesso a meios eletrônicos (internet);

4. O estudante é precocemente inserido em atividades de saúde, fundamental para sua vida profissional;

5. O conteúdo curricular contempla os problemas mais frequentes e relevantes a serem enfrentados na vida profissional de um médico com formação geral;

6. O estudante é constantemente avaliado em relação ao seu conhecimento cognitivo e ao desenvolvimento de habilidades e atividades necessárias à profissão;

7. O currículo é flexível e pode ser modificado;

8. O trabalho em grupo e a cooperação interdisciplinar e multiprofissional são estimulados;

9. A assistência ao estudante é individualizada, de modo a possibilitar que ele discuta suas dificuldades com profissionais envolvidos com o gerenciamento do currículo e outros, quando necessário.

A abordagem da aprendizagem baseada em problemas origina-se de vários princípios de aprendizagem que foram articulados durante as últimas

124

décadas do século passado (por exemplo, Bransford e cols. 1999). O PBL pode ser considerado um exemplo de ambiente de ensino que incentiva a aprendizagem ativa, construtiva, contextual, cooperativa e direcionada a objetivos. Os princípios de aprendizagem tais como a necessidade de ativação do conhecimento prévio, a importância da elaboração cognitiva, aprendizagem em contexto apropriado, propriedades de itens de aprendizagem, estruturação e reestruturação de informações, promoção da motivação intrínseca e estimulação da aprendizagem colaborativa, têm um lugar de destaque na ABP. (MOUST et al, 2005)

As metodologias de ensino-aprendizagem utilizadas no curso estão centradas no estudante, baseadas em pequenos grupos e o professor atuando como facilitador do processo de ensino-aprendizagem. Os módulos temáticos interdisciplinares utilizam a Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP ou PBL), como metodologia de ensino-aprendizagem; os módulos de interação ensino-serviço-comunidade (PINs) empregam a problematização; os módulos de habilidades clínicas e atitudes a de treinamento e o internato médico a modalidade da aprendizagem em serviço.

Essas metodologias permitem: a) a aprendizagem colaborativa por meio do trabalho em pequenos grupos; b) a aprendizagem significativa, pois os problemas são baseados na realidade de saúde da população, além de vivenciarem essa realidade; e, c) o contato precoce com a realidade de saúde, desde a primeira série.

Todas as atividades educativas obrigatórias dos módulos são planejadas, baseando-se no currículo nuclear que visa à formação geral do médico. Os temas dos problemas são baseados no perfil demográfico, epidemiológico e social da realidade da população e são trabalhados de forma interdisciplinar e multidisciplinar. As habilidades clínicas e atitudes substituem o ensino tradicional da semiologia, incluindo as habilidades em informática, comunicação e procedimentos laboratoriais, utilizando diversos recursos didático-pedagógicos para alcançar os objetivos propostos. Existe um sistema de monitoramento do curso que analisa se as atividades estão de acordo com o currículo nuclear, desta forma verificando se há coerência entre o que é oferecido no curso com o perfil do profissional a ser graduado. Além disso, existe o desenvolvimento das habilidades para

125

trabalhar em grupo e em equipe multiprofissional, por meio dos grupos tutoriais (somente com os estudantes de medicina) e nos PINs (estudantes de medicina e enfermagem), atividades estas desenvolvidas em cenários intramuros e extramuros na área urbana, do município de Londrina. (COLEGIADO, 2005b)

Organização Curricular e Gestão Acadêmico-Administrativa do Curso

O currículo integrado do curso tem uma organização acadêmico- administrativa relativamente complexa, se organizando a partir das seguintes diretrizes:

1. Estruturação modular, viabilizando a interdisciplinaridade; 2. Ensino centrado nas necessidades de aprendizagem dos estudantes; 3. Currículo nuclear comum a todos os estudantes e a oportunidade

de módulos e práticas eletivas, cuja função é permitir uma certa individualização do currículo;

4. Ensino baseado na pedagogia da interação, com os conteúdos das ciências básicas e clínicas desenvolvidas de forma integrada com os problemas prioritários de saúde da população;

5. Garantia de contato do estudante de medicina com as realidades de saúde e socioeconômicas da comunidade desde o primeiro ano do curso;

6. Adoção da avaliação formativa; 7. Terminalidade do curso em 6 anos.

Os Módulos são unidades de ensino que resultam do cruzamento matricial das áreas de conhecimento existentes nas disciplinas/ departamentos e das diretrizes pedagógicas emanadas do colegiado do curso. O Curso é composto de duas fases: o ciclo básico/clínico da primeira à quarta séries e o internato médico nas duas últimas. A integração entre o básico e o clínico é um avanço em relação ao sistema tradicional dos

126

cursos de medicina. Para efetivar essa integração, o Curso é estruturado por módulos temáticos interdisciplinares, módulos de habilidades clínicas e atitudes e módulos de interação ensino-serviço-comunidade nas primeiras quatro séries.

Esta estrutura curricular é flexível e permite introduzir as modificações necessárias para o aprimoramento do Curso. A análise do Curso é feita de forma horizontal, buscando coerência entre os módulos da mesma série e de forma vertical, coerência dos módulos entre as séries, sempre tendo por referencial o perfil do médico a ser graduado e as diretrizes curriculares. As comissões de avaliação e de acompanhamento curricular fazem o monitoramento e acompanhamento do Curso retroalimentando a tomada de decisões.

Cabe ressaltar, que apesar do avanço obtido com o currículo integrado nas primeiras quatro séries do Curso, o internato médico não foi modificado em 1998, e os estágios se mantiveram estruturados por especialidades médicas, tendo como cenário de ensino-aprendizagem, o hospital universitário e a maternidade municipal.

O novo currículo é essencialmente um currículo integrado. Integrado em termos de aproveitamento de várias técnicas de ensino-aprendizagem, com predominância das metodologias ativas. Integrado em termos de eliminação de barreiras que existiam entre ciclos básico, pré-clínico e clínico. Integrado em termos de eliminação da dicotomia entre teoria e prática. Integrado em termos de superação das distâncias entre o ensino, a pesquisa e a assistência. Integrado em termos de aproximação entre os ambientes e os sujeitos da academia, dos serviços de saúde e da comunidade. Enfim, a imagem-objetivo da proposta é a de um currículo integrado que vem sendo construído no dia-a-dia das atividades do curso desde 1998 e que vai muito além da adoção de uma única metodologia de ensino-aprendizagem. (COLEGIADO, 2004: 3)

O Curso é ofertado de forma seriada anual e as atividades acadêmicas são distribuídas nas seguintes categorias:

127

1ª a 4ª Séries

1. Módulos temáticos interdisciplinares, desenvolvidos por meio de atividades pedagógicas: a) Seção tutorial; b) Prática de laboratório e discussão de casos clínicos; c) Palestras ou conferências; d) Estudo orientado; e) Avaliação;

2. Módulos de habilidades clínicas e atitudes;

3. Módulos de interação entre ensino, serviços de saúde e comunidade; 4. Módulos de atualização;

5ª e 6ª Séries

1.Estágios do Internato.

Considerando a complexidade do novo currículo, as tradicionais estruturas gerenciais universitárias não são suficientes. Para uma eficiente gestão de qualidade há a necessidade de comissões de apoio ao colegiado, que realizam tarefas específicas, como nas comissões criadas desde 1999:

1. Comissão de avaliação: é responsável pelo acompanhamento e aprimoramento do sistema de avaliação, compreendendo a avaliação dos processos de ensino-aprendizagem dos estudantes e a avaliação institucional do curso;

2. Comissão de acompanhamento: acompanha a implementação e o desenvolvimento dos conteúdos modulares e dos estágios do internato, revisando anualmente os tópicos, de forma a assegurar que o conteúdo nuclear necessário para a formação geral do médico esteja contemplado;

3. Comissão de educação permanente: tem como função o desenvolvimento das atividades de sensibilização, treinamento e capacitação nas metodologias ativas de aprendizagem utilizadas no curso, em especial a Aprendizagem Baseada em Problemas; 4. Comissão de apoio psicopedagógico discente e docente: tem

128

no que diz respeito às suas necessidades acadêmicas e ou emocionais e também assessorar os professores no enfrentamento de dificuldades no trabalho com estudantes com algum tipo de problema.

Com essa estrutura gerencial interna, o curso implantou o novo currículo e acompanhou seu desenvolvimento, e até aquele momento, sempre apoiado em um processo permanente de avaliação e nos processos externos de mudança da educação médica.

Quanto ao desempenho nas avaliações nacionais, o Curso de Graduação em Medicina da UEL participou do Exame Nacional de Cursos (ENC/INEP/MEC), que como já apresentado avaliava produtos e não processos, obtendo os seguintes conceitos: “A”, “B”, “B”, e “B” nos anos de 1999, 2000, 2001 e 2002, respectivamente. No ano de 2003 a avaliação ficou comprometida, atribuindo-se a expressão SC (Sem Conceito), devido à impossibilidade de aplicação de provas pelo INEP.

Em 2000 o Curso recebeu a visita de avaliadores externos para a Avaliação das Condições de Ensino (ACE/INEP/MEC), tendo obtido o seguinte desempenho: condições muito boas para o corpo docente, para a organização didático-pedagógica, e para as instalações. Em 2004, obteve o conceito “5” no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE/INEP/MEC), como será detalhado na sequência.

Em 2005, juntamente com outras duas escolas médicas do Brasil, foi escolhido para participar do processo de Acreditação de Cursos de Graduação do Mecanismo Experimental de Credenciamento – MEXA – dos Cursos de Medicina, no âmbito do Setor Educacional do Mercosul, coordenado pelo Ministério da Educação, recebendo parecer favorável.

Firmemente comprometidos com essa história, os professores e estudantes do curso de Medicina da UEL vinham criando as condições para o desenvolvimento de uma educação médica de qualidade e com responsabilidade social, sempre subsidiados por um amplo processo de avaliação do curso nos âmbitos interno e externo.

129

C A PÍT U L O V

A avaliação do Curso de