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4 METODOLOGIA

4.2 Contexto e Corpus da Pesquisa

4.2.4 Extensão e Definição da Amostra

4.2.4.3 Cursos de Letras Espanhol com Habilitação Simples

Feitos os recortes anteriormente descritos, foi realizado por nós um levantamento dos cursos oferecidos pela esfera federal, na região Nordeste, através das universidades públicas brasileiras, com habilitação em Língua Espanhola. Anexamos ao final do trabalho, o levantamento realizado detalhadamente. Cabe, neste ponto, dizer que foram levantados junto ao MEC, no sistema E-MEC, no em sua página da internet35, no qual constam os cursos em todo o Brasil autorizados pelo órgão, dados que depois foram confirmados em cada um dos sítios das universidades, um total de quarenta e oito cursos. Desses, 19 de habilitação dupla, ou seja, nos quais os alunos, ao se formarem, saem habilitados nas Línguas Portuguesa e Espanhola e em suas respectivas literaturas e 29 de habilitação simples, apenas em Língua Espanhola e suas respectivas literaturas.

Neste ponto, propomos um novo recorte no universo de dados disponíveis, para a realização da pesquisa: considerar dentre os 48 cursos, apenas os que oferecem a habilitação simples em Língua Espanhola. Este novo recorte se baseia em dois critérios: 1) a natureza da pesquisa e 2) os objetivos estabelecidos.

Conforme exposto até este ponto, nossa investigação propôs uma interface entre os ECD e a LA, numa articulação com a TRS. Essa combinação nos orienta por um caminho metodológico consonante a essa base teórica, de modo a que se garanta a firmeza científica da investigação. Em outras palavras, a metodologia utilizada para a escolha e análise do objeto escolhido para estudo deve seguir com rigor o norte teórico adotado, de modo que não nos percamos no caminho.

Tal como definida, trata-se uma análise crítica do discurso institucional, documental, de natureza qualitativa e de cunho interpretativista.

Dessa forma, ao levarmos em consideração os cursos com habilitação simples em Língua Espanhola, estabelecemos como critério apreciar aquelas licenciaturas voltadas somente para esta língua, em sua integralidade, de modo exclusivo, sem ter que dividir a tarefa de também formar professores de Língua Portuguesa.

Como nosso foco será a análise documental, os PP de IES que oferecem a habilitação dupla serão construídos inevitavelmente de modo diferente daqueles dos cursos de habilitação simples, sobretudo do ponto de vista examinado, ou seja, o discursivo.

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Considerando os elementos obrigatórios descritos no parecer CNE/CES nº 492, de 3 de abril de 2001, anteriormente citado, teremos modificações em todos os itens que compõem os PP: o perfil dos formandos, as competências gerais e habilidades específicas a serem desenvolvidas durante o período de formação; os conteúdos caracterizadores básicos e os conteúdos caracterizadores de formação profissional, inclusive os conteúdos definidos para a educação básica, no caso das licenciaturas; a estruturação do curso e as formas de avaliação.

Compreendemos, assim, que há uma diferença entre se propor a formação de um professor habilitado a dar aula na Língua Portuguesa, e na Língua Espanhola e a formação de um professor apenas na Língua Espanhola. Esse aspecto por si só define uma diferença que afeta o alcance dos objetivos traçados e modifica a análise dos dados, sobretudo em uma pesquisa desta natureza, ou seja, qualitativa.

Essa ponderação nos leva ao segundo critério estabelecido para o recorte: os objetivos. Ao analisarmos a dimensão ideológica do discurso presente nos documentos e nos PP, definimos que visamos uma análise linguística que nos revele os aspectos ideológicos do discurso.

Um curso que oferece uma licenciatura de professores apenas de Língua Espanhola é diferente daquele que inclui também a Língua Portuguesa.

Comecemos pela carga horária atualmente proposta pelo MEC para ambos os cursos. No caso das licenciaturas simples, a carga horária definida pela Resolução nº 02 CNE/2015, define 3.200 (três mil e duzentas horas) mínimas para o curso. Se a licenciatura for dupla, deverá adicionar mais 800 (oitocentas) horas ao programa. Isso porque o aluno sai duplamente habilitado para dar aula em ambas línguas e suas respectivas literaturas. Ao aumentar a carga horária, indica-se que há mais conteúdo a ser estudado.

Outro ponto é que haverá, com relação aos conteúdos, áreas que fazem parte de um núcleo comum de formação e outras que se diferem. Um exemplo é a Didática. Em um curso de habilitação simples os alunos deverão estudar a geral e da língua estrangeira. Já na dupla, haverão de contemplar também a de Língua Materna, além de contrasta-las. Isso vai acontecer com fonética e fonologia, teoria da literatura, teorias de ensino de línguas materna e estrangeira, estágios.

No caso da licenciatura somente em Língua Materna, fica ainda mais evidente a diferença. Um curso no qual se formam professores de português com suas respectivas literaturas, por exemplo, diferirá em muitos aspectos de um apenas de Língua Espanhola.

É preciso deixar claro, contudo, que a separação aqui proposta não se dá porque sejam os dois tipos de formação opostos ou inconciliáveis, uma vez que há cursos de licenciatura dupla, mas tão somente porque se distinguem. Essa assunção aqui feita não é aleatória, mas baseada além do que se discutiu nos parágrafos anteriores, também na prática de ensino que nos indica que os propósitos comunicativos e de uso de uma língua materna e de uma língua estrangeira, são diversos (embora haja coincidências e interseções) e nas definições científicas da LA sobre ambas. Desse modo, ponderamos que a formação de professores deverá ser, igualmente, diversa.

Aqui, cabe, portanto, que expliquemos esses dois conceitos, o último deles amplamente empregado em nosso estudo. Spinassé (2006) nos apresenta sua definição de Língua Materna (doravante, LM):

A Língua Materna, ou a Primeira Língua (L1) não é, necessariamente, a língua da mãe, nem a primeira língua que se aprende. Tão pouco se trata de apenas uma língua. Normalmente é a língua que aprendemos primeiro e em casa, através dos pais, e também é frequentemente a língua da comunidade. Entretanto, muitos outros aspectos linguísticos e não-linguísticos estão ligados à definição. A língua dos pais pode não ser a língua da comunidade, e, ao aprender as duas, o indivíduo passa a ter mais de uma L1 (caso de bilinguismo). Uma criança pode, portanto, adquirir uma língua que não é faladas em casa, e ambas valem como L1 (p. 5).

Assim, entende-se a LM como a primeira ou as primeiras línguas aprendidas pela criança, e usada(s) em sua comunidade falante. Cabe destacar, contudo, que essa concepção pode ser rebatida por aqueles que entendem como Língua dois (doravante L2) essa segunda língua em uso, adquirida após a materna. Consideramos, no entanto, a definição de Spinassé (2006) válida, no sentido que a L2 será aquela adquirida pelo falante quando ele muda de comunidade de interação e é obrigado a usa-la no dia-a-dia, na interação e dentro de um processo de socialização. A língua materna, embora sendo no plural, conforme o delineado pela autora, tem sua aquisição concomitante ou paralela, no caso do bilinguismo, cumprindo o mesmo fim comunicacional.

Já o conceito de Língua Estrangeira (doravante, LE), recorrendo à mesma fonte, diferencia-se do da L2, pois o aprendizado dessa baseia-se fundamentalmente no já citado papel ou função da L2 na cultura do falante. A principal diferença é que a LE não serve necessariamente à comunicação na comunidade em que o usuário vive, mas, em certas situações de interação, e, a partir disso, não é fundamental para a integração social dentro da

comunidade em que o sujeito está inserido, seu uso é esporádico, não perene, enquanto a LM desempenha um papel até mesmo vital numa sociedade (SPINASSÉ, 2006)36.

Se, por um lado, a LM é aprendida desde a infância e usada em comunidade para a comunicação e até a sobrevivência do usuário, para que esteja integrado ao meio onde vive; por outro, a LE é aprendida muitas vezes num contexto simulado, e é usada em situações diferentes, ainda que também comunicativas e muitas vezes de sobrevivência e integração do sujeito em atividades sociais, mas tanto em intensidade como em situações de uso diversas. De tal modo que, o ensino de LM e de LE são distintos em diversos aspectos: objetivos, enfoques, metodologias, materiais, etc.

Cabe destacar que haverá pontos em comum na formação de professores de LM e LE. Por exemplo, os aspectos transversais de formação de docentes tais como conhecimentos gerais de educação, conhecimentos dos sistemas educacionais, teorias gerais da área da Linguística e da Linguística Aplicada; princípios de Psicologia da Aprendizagem.

Se pensarmos, porém, em questões como: os princípios de aquisição; as teorias de ensino e aprendizagem; as abordagens e metodologia de ensino e aprendizagem; os parâmetros de elaboração e avaliação de material didático; a produção cultural e linguística; as manifestações de variedades das línguas; os processos e estratégias discursivas e pragmáticas de e para a composição de significados de textos/discursos circulantes; entre outros aspectos que diferem entre LM e LE, perceberemos que a formação de professores de cada uma inclui a discussão de aspectos diversos e que uma licenciatura que forma professores de uma e de outra língua ou de ambas é diferente.

Foi, portanto, por compreender que existe essa diferença que influencia no modo de configurar e pensar um curso, que baseamos a decisão de realizar o corte no corpus aqui explicado.

Neste trabalho, portanto, e neste ponto do recorte que estamos sugerindo, propusemos considerar exclusivamente a formação dedicada à Língua Espanhola.

Finalmente, levando em consideração o levantamento feito e os critérios de recorte descritos anteriormente, procedemos ao exame de nove projetos pedagógicos, oferecidos no ano de 2015, pelas seguintes universidades federais, da região Nordeste do Brasil, dispostas em ordem alfabética:

36Do original: “Im Gegensatz zur Fremdsprache ist eine Zweitsprache unmittelbar kommunikativ relevant und spielt bei der Erlangung, ufrechterhaltung oder Veränderung der Identität der Sprecher eine Rolle”.

1. Universidade Federal de Alagoas (UFAL) 2. Universidade Federal da Bahia (UFBA) 3. Universidade Federal do Ceará (UFC) 4. Universidade Federal do Maranhão (UFMA) 5. Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

6. Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) 7. Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

8. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) 9. Universidade Federal de Sergipe (UFS)

Ainda sobre os PP, cabe destacar que, em uma análise prévia empreendida por nós, identificamos a heterogeneidade no que foi encontrado. Embora existam os aspectos citados anteriormente, definidos pelo MEC e que devem constar nos PP, muito optam por nomenclaturas diferentes para a definição de suas partes. Da mesma forma, a disponibilização dos PP dos cursos nas páginas institucionais das IES é diversa. Quando discutirmos os dados e as análises nos próximos capítulos, isso será objeto, igualmente, de algumas considerações de nossa parte, uma vez que essa discrepância nos permite chegar a algumas inferências. O fato é que encontramos desde as resoluções dos conselhos superiores das universidades, até resumos e recortes dos PP. De tal modo que, não há uniformidade ou padronização na apresentação dos PP por parte das IES.

Durante esta análise preliminar, observamos, ainda, que a maioria oferece uma seção de justificativa, quando alguns não a apresentam. O histórico dos cursos também é uma parte bastante comum, mas não unânime. Em alguns sítios de universidades são disponibilizados apenas as resoluções oficiais dos conselhos universitários, conforme já explicitado, com a descrição mais sumarizada dos cursos. Desse modo, entramos em contato com todas as IES que não disponibilizavam os PP completos ou que apresentavam suas versões resumidas. Nesse levantamento, houve resposta de algumas e de outras não.

Portanto, mesmo havendo uma definição por parte do MEC sobre as informações indispensáveis para a formatação dos projetos, algumas IES não disponibilizam os dados totais, além de haver certa resistência na sua divulgação, quando contatadas.

A única informação disponível nos sítios e projetos nas suas mais diversas versões é o perfil do formando. Desse modo, há uma dificuldade de estabelecer uma padronização dos

elementos a serem analisados dos PP, pois são, conforme explicamos, construídos de forma diferente.

Dada a necessidade de uma definição de quais partes dos textos consideraríamos para a análise do discurso, utilizamos a proposta do MEC, exposta no parecer anteriormente citado, no qual estabelecem quais são os elementos que devem compor os PP dos cursos. Assim, os elementos analisados foram, quando disponíveis, a saber:

a) o perfil dos formandos;

b) as competências gerais e habilidades específicas a serem desenvolvidas durante o período de formação;

c) os conteúdos caracterizadores básicos e os conteúdos caracterizadores de formação profissional, inclusive os conteúdos definidos para a educação básica, no caso das licenciaturas;

d) a estruturação do curso; e) as formas de avaliação.

Destes, porém, não levamos em consideração o item ‘d’, que trata dos aspectos físicos e estruturais dos cursos, ou seja, de suas instalações físicas, recursos materiais, corpo docente, etc., uma vez que a descrição desse item é uma descrição dos aspectos físicos e estrutura dos cursos e, desse modo, não se volta para aspectos ideológicos do discurso, que é o nosso interesse neste trabalho.

Com relação ao item ‘e’, é necessário que se esclareça que não nos aprofundamos nos

aspectos da avaliação em si, por se tratar de objeto diverso do que aqui propusemos estudar. As questões em torno da avaliação são uma área bastante profícua na Educação e, mais recentemente, na Linguística37. Desse modo, a análise dos elementos dos PP voltados a esse item será feita do ponto de vista que aqui se propõe: da revelação da ideologia em torno da FPLE, a partir da identificação das RS emergentes dos discursos presentes nos documentos analisados, bem como do que se evidencia nos temas desse discurso.

37 Sobre isso recomendamos a leitura de Nascimento (2012), tese de doutorado em Linguística orientada também pela professora Lívia Batista e já citada anteriormente por nós.

Cabe então dizer que, como os PP levantados não apresentam homogeneidade em seus formatos, analisaremos o disposto nos documentos, separando esses dados, conforme os itens elencados. Caso, portanto, o PP não apresente a descrição do item a ou b, mas apresente a parte c, faremos a análise dos dados que estejam disponíveis no documento.

O objetivo principal de nossa investigação foi analisar as ideologias e as RS emergentes do discurso institucional sobre a FPLE, tendo em vista o disposto nas Diretrizes Curriculares do Governo Federal do Brasil para as Licenciaturas em Língua Espanhola e nos PP dos Cursos de Letras das universidades públicas federais, do Nordeste do Brasil.

Por fim, é necessário, também, explicar que, além dos aspectos mencionados sobre a heterogeneidade de composição dos PP, nem todos os PP dos cursos estavam disponíveis nos sites das respectivas instituições de ensino. Dos nove projetos analisados, cinco não constam nos sítios eletrônicos das universidades. Assim, foi necessário entrar em contato com professores dessas IES que nos deram autorização para que usássemos as informações neles contidas para a realização desta pesquisa.

Por conta disso, embora os documentos sejam públicos, optamos, por uma questão ética, preservar as IES e os profissionais que nelas atuam e substituímos, no momento das análises, os nomes das universidades por Universidade 1, 2, 3, 4 e assim por diante. A decisão leva em consideração a proteção de e o respeito às pessoas, pois, ainda que, insistimos, essa pesquisa seja de caráter documental, os projetos aqui analisados representam não apenas as posições institucionais das universidades, como de algum modo dos professores que nelas atuam ou que colaboraram com a composição dos projetos.