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Da Casa para Rua: A Deficiência como questão Política

3. MODELO SOCIAL: A DEFICIÊNCIA COMO UMA QUESTÃO POLÍTICA E

3.5 Da Casa para Rua: A Deficiência como questão Política

A exclusão das pessoas com deficiência pode se manifestar nas mais variadas formas, com maior ou menor grau de opressão, de maneira que o indivíduo deficiente pode ficar recluso em instituições totais, como manicômios, hospitais de reabilitação ou escolas especiais, onde o segregacionismo é mais latente devido o aspecto fechado destes estabelecimentos, caractere que os diferenciavam das instituições públicas comuns, abertas ao público em geral e sem uma maximização da vigilância. Todavia, os deficientes também podem habitar suas residências, casos em que, o domicílio se torna seu alojamento e seu claustro. Costumeiramente as famílias mais abastadas mantinham seus parentes deficientes em casa, seja porque não confiavam na prestação dos serviços estatais, seja porque possuíam renda para tratamento médico particular (ALMEIDA, 2000; MARIA DA FONTE, 2012).

De qualquer modo, em ambas as circunstâncias as pessoas com deficiências eram 80 No Brasil esse entendimento está expresso no art. 5, inciso XXXV da Constituição Federal ao asseverar que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. A discussão remete a uma temática polêmica no Direito brasileiro que é a judicialização das políticas públicas, que seja: o controle de políticas públicas, de competência imediata do Poder Executivo, realizado pelo Poder Judiciário. Cappelletti e Elival Ramos destacam que os direitos sociais e coletivos, vem como, as chamadas “normas programáticas”, dispositivos normativos que necessitam de complementação por parte de outras normas de aplicação – ou nas palavras de José Afonso da Silva, normas de eficácia limitada. Na história legislativa brasileira estas normas programáticas ou normas de eficácia limitada na grande maioria das vezes não são elaboradas pelo Poder Legislativo ou não são efetivadas pelo Poder Executivo, o que acaba por fazer com que as pessoas que tem seus direitos violados, ou pela inércia legislativa ou ineficiência executiva, levem suas demandas ao Judiciário, que deve, segundo o conteúdo da Lei Maior, dar uma resolutividade ao caso concreto. Ademais, existem outros mecanismos de proteção e efetivação dos direitos sociais e coletivos através da Justiça, como o controle de constitucionalidade, especialmente a tipologia de inconstitucionalidade por omissão; mandado de segurança individual e coletivo; mandado de injunção e a ação civil pública.

neutralizadas e apartadas do convívio social. Tratava-se de uma separação entre o espaço “público” e o espaço “particular” dos deficientes; o âmbito doméstico era o “espaço dos excluídos”, dos rejeitados, dos anormais e dos diferentes.

É nesse sentido que Goffman afirma que “a instituição total é um híbrido social, parcialmente comunidade residencial, parcialmente organização formal” (GOFFMAN, 1974, p. 22). Significar dizer que, mesmo as instituições formais – hospitais, escolas e prisões – eram transformadas em um ambiente doméstico, um local particular, restrito a determinados tipos de pessoas, a grupos específicos.

No caso dos deficientes – a “Casa dos desajeitados” – não foi por acaso, que se denominaram os hospitais filantrópicos de Santas Casas de Misericórdia ou Lar dos Cegos e Surdos (SILVA, 1987, p. 309). A finalidade era implantar a ideia de que as instituições totais eram também um ambiente doméstico para os excluídos por suas lesões físicas e mentais. O

domesticus resgata o sentido de família, ou seja, o próximo, o igual ou o semelhante.

Foucault denuncia que essa postura é uma forma de adestrar o sujeito, introjetando-lhe saberes para mais fácil exercer o poder sobre o deficiente (FOUCAULT, 1987). De igual modo, Goffman alude que tais instituições “criam e mantêm um tipo específico de tensão entre o mundo doméstico e o mundo institucional, e usam essa tensão persistente como força estratégica no controle dos homens” (1974, p. 24).

Neste sentido, o movimento que neste trabalho se denomina “Da Casa para Rua” quer significar a abertura da temática da deficiência como um problema político e de esfera pública, rompendo com o pensamento da visão privatística domiciliar ou autocentrada na responsabilidade das instituições totais, que também se apresentavam como “ambiente doméstico”.

Alguns elementos foram fundamentais para deflagrar esta mobilidade discursiva, destacando-se a organização e militância política das pessoas com deficiência e a luta pela representatividade como expressão de participação plena e exercício de cidadania (HONNETH, 2003).

Dessarte, o movimento de saída da deficiência como “problema” familiar para questão de debate público nasceu da já citada crítica à marginalização do deficiente. Deste modo, é importante também saber, como descreve Müller (2005), que a exclusão é um problema político. Por este motivo, os teóricos do modelo social defendem que o novo paradigma

resulta da politização da deficiência. Política ou politizar, neste sentido, é compreendido como o potencial de decidir o próprio destino, a elaboração das escolhas de uma sociedade organizada, por meio do Estado ou não. Política como potência e representação, parafraseando Schopenhauer (1818). Nesse sentido, de modo perspicaz afirma Müller:

A exclusão desenvolve uma dinâmica fatal. Já em 1821, Hegel, ao analisar a sociedade capitalista nos seus primórdios, estabeleceu, em Princípios da Filosofia do Direito, que a pauperização econômica acarretaria enormes desvantagens em termos de educação, formação profissionalizante, cultura, grau de informação, sentimento de justiça e autoestima. Resta acrescentar que um padrão de vida excessivamente baixo, o empobrecimento da família e o estigma do bairro residencial errado; a comunicação, pela gerência do banco, do encerramento da conta corrente; a exclusão crescente da vida social, cultural e política; enfim, o enfraquecimento do sentimento de valor próprio, a falta de “reconhecimento”, tem como um de seus efeitos mais perversos a paralisação, enquanto seres políticos, das pessoas afetadas. O descenso econômico leva rapidamente à privação sócio-cultural e à apatia política – o que, quase sempre, satisfaz aos desígnios das esferas dominantes da sociedade. O “desfavorecimento”, mesmo em apenas uma área parcial, produz uma “reação em cadeia de exclusão” que resulta, não em último lugar, na “pobreza política” (original sem negrito) (MÜLLER, 2005, p. 2).

Politizar a deficiência significa, em termos simples, conceder às pessoas com deficiência a participação na organização, administração e tomada de decisões do Estado e na sociedade civil (HABERMAS, 2002).

O elemento da representatividade está estritamente relacionado com a garantia e o respeito de direitos. O Direito adentra esta esfera de modo fundamental, seja como vetor operacional ou como essência na revisão da compreensão do sujeito. Explica-se: o Direito manifesta-se como instrumento81 do qual as pessoas com deficiência podem utilizar-se para

auferir visibilidade ou para combater as formas explícitas e implícitas de discriminação. Porém, quando as pessoas deficientes se reconhecem como “sujeitos de direitos”, isto é, albergadas pelas normas produzidas no seio de uma sociedade, tem-se aí uma percepção em que o Direito adentra a “essência” do sujeito. Direito e pessoa são elementos indissociáveis (CHAI, 2007). Política, nesse sentido, será exercida através do Direito, quando as pretensões e os posicionamentos dos deficientes alcançam procedimentalização no mundo da vida (HABERMAS, 1997, p. 113).

Pois bem, pensa-se o movimento “Da Casa para Rua” a partir do conceito de Jürgen Habermas de esfera pública, conceito este fundamental para compreensão das sociedades 81 A visão que se passa aqui não é de “instrumento” operacional, isto é, vazio, mas como, nas palavras de

modernas pós-convencionais82.

A esfera pública é uma “rede comunicacional” na busca pelo entendimento. Existe uma trajetória particular deste conceito em Habermas, visto que o autor escreveu sobre esse conceito em dois momentos: antes e depois de sua obra basilar, a Teoria do Agir Comunicativo (2012).

Ocorre que o autor já criticava a redução do significado no seio das democracias liberais, que se direcionavam sempre ao controle do Estado ou intermediando este com a sociedade civil organizada.

Após o giro linguístico da supracitada obra, o sociólogo alemão define como esfera pública:

A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos, tomadas de posições e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. […]. A esfera pública constitui principalmente a uma estrutura comunicacional do agir orientado pelo entendimento, a qual tem a ver com espaço social gerado no agir comunicativo, não com as funções nem com os conteúdos da comunicação cotidiana (HABERMAS, 1997, p. 92).

Ressalta Habermas que “a esfera pública não pode ser entendida como uma instituição, nem como uma organização” (HABERMAS, 1997, p. 92). Apesar de não ser uma instituição, ela pode ser institucionalizada, como no caso dos partidos políticos, entidades de classe, organizações não governamentais, associações comunitárias etc. Os produtos da esfera pública são as formações das opiniões e das vontades políticas (HABERMAS, 1989). É preciso que as pessoas sejam livres e iguais em um espaço social comunicativo para fazerem suas denúncias e proporem demandas, bem como para compreenderem as necessidades do outro (CARVALHO NETTO, 2005).

Assim, contextualizando na questão da deficiência, nas realidades das instituições totais e do enclausuramento domiciliar não é possível criar este espaço comunicacional, mesmo porque estas realidades são resultados de exclusão, o que é totalmente contrário ao princípio do discurso e interação pela comunicação. Grosso modo, defender que a deficiência 82 Um importante conceito Habermasiano em que descreve como as sociedades contemporâneas romperam certos tradicionalismos e convenções sociais da modernidade, não mais adequados. Menelick de Carvalho Netto assim descreve esse contexto “É no quadro desse processo de diluição dos fundamentos absolutos e unitários das sociedades tradicionais e de afirmação do pluralismo religioso, político e social que se dá a invenção do indivíduo”(CARVALHO NETTO, 2005, p. 72)

é um problema da esfera pública significa dizer que se trata de um fenômeno social que precisa ser levado ao debate e deve ouvir aqueles que estão diretamente relacionados com a

práxis da deficiência, de modo que possam contribuir para construção das opiniões e vontades

políticas (MAUS, 2009).

Nesta acepção, Beatriz Martínez Ríos argumenta que a necessidade de representatividade das demandas dos “deficientes pelos deficientes” surgem no seio das reivindicações das teorias do empoderamento (2013, p. 19). Essas teorias pregam o fortalecimento de uma consciência cívica e política dos grupos excluídos do sistema neoliberal – dentre eles os deficientes – de reivindicar através das instituições estatais, organizações não governamentais ou agrupamentos da sociedade civil o direito de participar da construção da realidade através da possibilidade de tomar decisões e transformar as estruturas em que vivem. “A teoria do empoderamento pode se aplicada aos processos de desenvolvimento baseados na autodeterminação das pessoas com deficiência” (MARTÍNEZ RÍOS, 2013, p. 20) 83.

A representatividade está estritamente ligada à perspectiva de Direitos Humanos, vez que concebe o deficiente não como paciente, mas como sujeito capaz, desse modo:

Do ponto de vista dos direitos humanos, desenvolvimento de pessoas com deficiência envolve auto-representação. O crescimento de um movimento da deficiência democrático e representativo é uma forma de garantir que as respostas do Governo sejam adequadas para atender às necessidades e atender aos direitos das pessoas com deficiência. Há que certificar-se de que os grupos que são alvo de políticas estão envolvidos no planejamento, execução e acompanhamento de todo o trabalho de desenvolvimento, assim como habilitados a tomar medidas para eliminar as barreiras à participação e combater práticas, políticas, atitudes e ambientes discriminatórios (MARTÍNEZ RÍOS, 2013, p. 20)84.

A representatividade diz respeito à fruição de três elementos centrais: os direitos políticos; a cidadania como participação; e o significado e alcance da democracia (MÜLLER, 2003, p. 40). Pode-se elencar ainda um quarto elemento crucial: o constitucionalismo. São 83 Texto original: “ La teoría del empoderamiento puede aplicarse a los procesos de desarrollo baseados em la

autodeterminación de las personas com discapacidad”.

84 Texto original: “Desde el enfoque de los derechos humanos, el desarrollo de las personas con discapacidad implica la autorrepresentación. El crecimiento de un movimiento de la discapacidad democrático y representativo es una forma de garantizar que las respuestas del Gobierno sean adecuadas para cubrir las necesidades y responder a los derechos de las personas con discapacidad. Hay que asegurarse de que los grupos a los que van dirigidas las políticas están implicados en la planificación, implementación y monitorización de todo el trabajo de desarrollo, así como tomar medidas para eliminar barreras para la participación, y combatir las prácticas, políticas, actitudes y ambientes discriminatorios”.

tópicos salutares para se compreender os direitos das pessoas com deficiência no paradigma social, pois todos convergem para o que os estudiosos chamam de “modelo dos direitos humanos dos deficientes” (PALACIOS, 2007; 2008; OSPINA RAMIREZ, 2010, p. 151).

De acordo com Teori Zavascki, direitos políticos ou “direitos de cidadania” são conjuntos de direitos atribuídos aos cidadãos, que por meio do voto e do exercício em cargos públicos, permitem a participação nas atividades governamentais (ZAVASCKI, 1995). Já nas palavras de José Afonso da Silva “o direito democrático de participação do povo no governo, por seus representantes, acaba exigindo a formação de um conjunto de normas legais permanentes, que recebera a denominação de direitos políticos” (SILVA, 2005, p. 344). Nesta mesma linha, aparece Gilmar Mendes, que primeiro afirma que direitos políticos se referem “aos direitos de participação no processo político como um todo”, porém, em seu Curso de Direito Constitucional, reduz os direitos políticos “ao direito ao sufrágio universal e ao voto periódico, livre, direto, secreto e igual, à autonomia e organização do sistema partidário, à igualdade de oportunidades dos partidos” (MENDES, 2014, p. 645). Em síntese: direitos políticos e cidadania são tidos como termos sinonímicos e restritos ao âmbito das eleições.

Embora se perceba um esforço dos juristas do Direito Público em dar uma visão ampla ao conceito de cidadania, suas tentativas demonstram-se falhas, especialmente por barrarem numa tentativa de objetificar o conceito de direitos políticos. Com isso não vão muito além da conceituação destes como prática de direito eleitoral, isto é, o direito de votar (capacidade eleitoral ativa) e ser votado (capacidade eleitoral passiva). Isso reduz o sujeito político a mero eleitor.

No bojo desta imprecisão metodológica, surgem as problemáticas entre os termos “direitos políticos”, “direito eleitoral” e “cidadania”, de modo que a tendência entre os constitucionalistas brasileiros é de igualar esses conceitos. José Afonso da Silva, por exemplo, afirma que “os direitos de cidadania adquirem-se mediante alistamento eleitoral na forma da lei” e conclui no sentido de que “pode-se dizer, então, que a cidadania se adquire com a obtenção da qualidade de eleitor (...) o eleitor é cidadão, é titular de cidadania” (SILVA, 2005, p. 346-347). Por sua vez, Gilmar Mendes relata que “o termo cidadania […] significa exercício de direito de participação da vontade política do Estado e o controle da Administração, por meio, sobretudo, do voto, da ação popular e do direito de petição” (MENDES, 2014, p. 822).

Nota-se que os publicistas brasileiros supracitados estão no que Habermas denomina de concepção liberal de democracia (HABERMAS, 1991, p 40). Aliás, os ensinamentos do sociólogo alemão são interessantes para esta elucubração, pois este concebe que existem relações distintas de conceituar cidadania a partir de diferentes paradigmas de democracia. Significa dizer que a semântica da cidadania altera-se conforme a ideia de democracia, consequentemente alterando o papel desempenhado pelos direitos políticos e do próprio Direito (HABERMAS, 1991).

Habermas entende por concepção liberal de democracia aquela que tem como função principal programar o Estado no interesse da sociedade. Nesta seara, a sociedade estrutura-se por meio da economia, das relações de mercado e da divisão social do trabalho.

Na concepção republicana, antagônica a anterior, “a política é entendida como uma forma de reflexão de um complexo de vida ético” (HABERMAS, 1991, p. 40). Ela percebe os indivíduos como portadores de direitos livres e iguais, dotados de consciência e reconhecimento recíproco.

Acontece que a forma como se contempla a democracia altera substancialmente o modo como se constroem a figura do cidadão e da cidadania, bem como a fruição dos direitos subjetivos e políticos.

Na democracia liberal, direitos subjetivos e políticos são prestações negativas para o Estado com relação ao indivíduo, permitindo a este fazer suas escolhas no mercado ou na esfera política. Isto é:

Eles dão ao cidadão a possibilidade de fazer valer seus interesses privados, ao permitir que esses interesses possam agregar-se (por meio das eleições e da composição do Parlamento e do governo) com outros interesses privados até que se forme uma vontade política capaz de exercer uma efetiva influência sobre a Administração (HABERMAS, 1991, p. 41).

É nesta lógica suscitada por Habermas que José Afonso, Teori Zavascki e Gilmar Mendes pensam os direitos políticos e o exercício da cidadania: na aglutinação dos interesses privados formando uma vontade comum superior. O que corresponde às palavras de Eduardo Giannetti como “vícios privados, benefícios públicos” (1993). Acontece que existe um pano de fundo para a democracia liberal, que enseja críticas ao sentido de “poder do povo”, trata-se do utilitarismo (HABERMAS, 2003). Neste sentido, grupos minoritários teriam seus direitos subjetivos, e principalmente políticos, anulados. Explica-se: existe uma relação entre o

utilitarismo e a política do privilégio da maioria, entendida como fonte de todo poder da democracia liberal (HABERMAS, 2002). O pensar utilitarista preocupa-se com a potencialização do bem-estar do “particular”, no raciocínio de Bentham: “maior felicidade para o maior número”. Porém, os recursos são escassos e as oportunidades limitadas. Nesse sentido, as minorias, contextualizadamente a dos deficientes, não teriam como intervir na democracia de modo efetivo, pois, mesmo que seus direitos subjetivos fossem declarados85,

seus direitos políticos eram esterilizados, haja vista a impossibilidade de formar “uma vontade política capaz de exercer efetiva influência sobre a administração” (HABERMAS, 1991, p. 41). Por este ângulo, cabe a crítica de Beatríz Martínez Ríos:

O utilitarismo sacrifica o bem da minoria e, neste caso, das pessoas com deficiência, pela tirania da maioria. Com base nos pressupostos do utilitarismo, defender-se a normalização sem ter em conta as necessidades específicas das pessoas com deficiência e, portanto, sem prever o custo adicional das adaptações específicas para um tipo de deficiência, uma vez que o uso de recursos a este respeito não beneficiaria a maioria. Por exemplo, não seria justificável a fabricação de ônibus com rampas, que envolvem o uso de mais recursos, uma vez que eles serão utilizados por uma pequena porcentagem da população representada por pessoas que usam cadeiras de rodas ou carrinhos de bebê, entre outros, que teriam seu direito a mobilidade violado (MARTÍNEZ RÍOS, 2013, p. 22) 86.

Conforme Habermas, o contraponto desta visão é a concepção republicana de democracia, em que “espera-se dos cidadãos republicanos muito mais do que meramente orientarem-se por seus interesses privados” (HABERMAS, 1991, p. 41). A ideia de amálgama de particularismos é substituída por autodeterminação dos cidadãos, ou seja, não se quer juntar interesses, mas construir-se politicamente. Obviamente, para que esta autodeterminação seja possível, ou ao menos, idealizável, precisa-se ter alguns pressupostos como reconhecimento recíproco, liberdades públicas e instituições acessíveis. Trata-se de um 85 É importante aqui deixar a crítica no sentido de que os direitos subjetivos na democracia liberal muitas vezes não passavam de declarações, dada a insuficiência da realização destes direitos. A abstinência estatal deixava a desejar em relação a muitos outros direitos dos homens, como a alimentação, da propriedade privada, da moradia. Assim, hoje, já se entende que existe uma imprescindibilidade entre direitos individuais, sociais e políticos.

86 Texto original: “El utilitarismo sacrifica el bien de la minoría y, en este caso, el de las personas con discapacidad, por la tiranía de la mayoría. Bajo los supuestos del utilitarismo, se defendería la normalización sin tener en cuenta las necesidades concretas de las personas con discapacidad y, por lo tanto, sin prever el coste adicional que supondría las adaptaciones específicas para un tipo de discapacidad, puesto que el empleo de recursos en este sentido no estaría beneficiando a la mayoría. Por ejemplo, no sería justificable la fabricación de autobuses con rampas, que suponen el empleo de más recursos, puesto que éstas sólo van a ser utilizadas por un porcentaje menor de la población, representada por personas usuarias de sillas de ruedas o carritos de bebés, entre otras, que verían vulnerado su derecho a la movilidad”.

conceito de cidadania mais complexo e até mesmo “fabuloso”. Assim descreve o autor:

Os direitos de cidadania, entre os quais se sobressaem os direitos de participação e de comunicação política, são melhor entendidos como liberdades positivas, Eles não