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CAPÍTULO III – ASPECTOS PROCEDIMENTAIS RELEVANTES E

4. Da resposta do autor do fato

Antes de mais nada, devemos alertar que a proposta formulada pelo órgão acusador deve ser clara e precisa, referindo-se aos fatos do termo circunstanciado (ou inquérito), bem como necessariamente especificando a espécie e a duração da pena restritiva de direitos ou o valor da multa, a fim de que permita-se uma perfeita apreciação ao beneficiário e seu defensor.

Após essa apreciação da proposta, restará ao autuado duas opções: recusá- la, abrindo-se então oportunidade ao Ministério Público para oferecer a denúncia desde logo ou em momento posterior, ou aceitá-la, caso em que o acordo será submetido ao juiz.

A resposta do agente deverá ser expressa e assistida, necessariamente, pelo seu defensor. Nos dizeres de Ada Pellegrini Grinover e seus colaboradores25, “a

manifestação de vontade do autor do fato é personalíssima, voluntária, absoluta, formal, vinculante e tecnicamente assistida” e, conforme já vimos, a sua aceitação não traduz, de modo algum, o reconhecimento da culpabilidade penal, nem da responsabilidade civil, apenas concorda para evitar a tramitação de um processo ou outra razão qualquer.

Lembra-se que existe na controvérsia doutrinária sobre qual posição deva prevalecer quando houver conflito nas vontades expressas entre pelo autor do fato e por seu defensor. É óbvio que, nessa situação, cabe ao magistrado fazer todos os

esclarecimentos possíveis sobre o ato e suas conseqüências, na tentativa de que se chegue a um consenso. Contudo, o que fazer se a discordância persistir?

Uma diminuta corrente doutrinária defende que, havendo divergência, deverá prevalecer a posição do advogado do autuado, por tratar-se de defesa técnica, pois apenas esta tem condições de avaliar corretamente a viabilidade da vitória do autor do fato frente ao eventual processo instaurado a ser instaurado. Vejamos o que diz Humberto Dalla Bernardina de Pinho26:

De certa forma encontramos aqui a mesma controvérsia, já conhecida de todos, relativa a discordância entre defesa leiga e defesa técnica quanto ao desejo de apelar da sentença condenatória proferida em ação penal.

Nesse sentido o Professor Sérgio Demoro Hamilton.

Ousamos discordar categoricamente desse entendimento, pois, mesmo admitindo que a defesa técnica realmente possua a melhor noção acerca da possibilidade de se obter a decretação da inocência do autor do fato, é este, porém, quem poderá avaliar, no âmbito de suas condições psicológicas, econômicas e sociais, a conveniência (ou não) de suportar a instauração de processo penal.

Alguns, inclusive, elencam como requisito para a homologação do acordo a exigência de advogado constituído, não sendo suficiente a presença do defensor público ou dativo. Lembramos, por oportuno, a tese sustentada por Cezar Roberto Bitencourt no trecho de sua obra que transcrevemos quando abordamos, no primeiro capítulo, o tema das características da Transação Penal.

O pensamento majoritário, contudo, afirma que, havendo dissenso entre o interessado e o seu defensor acerca da aceitação da proposta de Transação Penal, prevalecerá a vontade daquele, após devidamente esclarecido das conseqüências de seu ato, pois entendem os defensores desta tese, tratar-se de ato personalíssimo. É assim para Ada Pellegrini Grinover, Antônio Magalhães Gomes Filho, Antônio Scarance Fernandes e Luiz Flávio Gomes, bem como para Damásio Evangelista de Jesus, Fernando Tourinho Filho e Cezar Roberto Bitencourt.

26 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. A Introdução do Instituto da Transação Penal no Direito

Outros doutrinadores, entretanto, sustentam que a discordância entre o interessado e seu defensor representa óbice fatal à homologação do acordo, pois, do contrário, se estaria ferindo o princípio da ampla defesa. É como retrata Mirabete27:

Dispõe o art. 76, § 3º, que a proposta de transação deve ser aceita pelo autor do fato e seu defensor. Assim, discordando com a devida vênia de opiniões em contrário, de que prevalecerá sempre a vontade do autuado, ou de seu advogado, não é possível a homologação de transação quando um ou outro dela discordar. A necessidade da dupla aceitação do fato é decorrência do princípio da ampla defesa, tendo optado a lei pela conclusão de que não há prevalência da vontade do autor do fato ou do advogado, como se tem interpretado quanto à legislação comum com relação à propositura de recurso ou sua desistência na ausência de dispositivo expresso. [...] Assim, se a assistência do advogado é indispensável, obrigatória é também sua concordância com a transação. Havendo discordância entre autor do fato e seu advogado, não se permite a transação, devendo a audiência prosseguir com a manifestação do Ministério Público pelo arquivamento ou oferecimento da denúncia. Pode o agente, porém, discordando do advogado, dispensá-lo, quando se trata de defensor constituído, e substituí-lo por outro que ampare sua decisão, ou, não o fazendo, aguardar a nomeação de defensor público pelo juiz.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça, manifestando-se sobre questão análoga, acerca do ato de manifestação do interessado na proposta de suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da mesma Lei 9.099/95, proferiu o seguinte entendimento:

HABEAS CORPUS. ART. 89 DA LEI Nº 9.099/95. PROPOSTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. DISCORDÂNCIA DO ADVOGADO CONSTITUÍDO. FALTA DE INTIMAÇÃO DO DENUNCIADO. NULIDADE ABSOLUTA.

ATO VOLUNTÁRIO E PERSONALÍSSIMO. NECESSIDADE DE SUA MANIFESTAÇÃO.

1. A falta de intimação do denunciado para se manifestar sobre a proposta de suspensão condicional do processo caracteriza nulidade absoluta, e não apenas relativa, podendo, pois, ser argüida a qualquer tempo, prescindindo da demonstração do prejuízo.

2. O alegado constrangimento é evidente e manifesto, pois a aceitação ou não da proposta de suspensão condicional do processo é ato a ser praticado pessoalmente pelo denunciado. Não há como admitir que o advogado, mesmo com poderes especiais, delibere unilateralmente sobre a proposta oferecida pelo Ministério Público, não aceitando, como no caso, se a Lei nº 9.099/95 exige em seu art. 89, § 1º, a manifestação tanto do interessado como de seu defensor, prevendo, aliás, que, em caso de divergência entre eles, prevalecerá a vontade do indiciado (art. 89, § 7º).

3. Habeas corpus parcialmente concedido para anular o processo a partir da audiência de conciliação, inclusive.

(STJ - HC 17.165/SP, Rel. Ministro VICENTE LEAL, Rel. p/ Acórdão Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 02/12/2003, DJ 05/04/2004 p. 328)

Como se vê, tal Corte Superior parece filiar-se ao pensamento majoritário que entende, tratando-se de ato personalíssimo, cabe ao autor do fato a palavra final acerca da aceitação ou não da proposta de Transação Penal.

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