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5.2 Agrotóxicos no Brasil

5.2.4 Danos ao meio ambiente e à saúde pública

Uma vez liberados no meio ambiente, os agrotóxicos contaminam o solo e a água, e atingem os animais. Agrotóxicos tendem a possuir fortes substâncias tóxicas, as quais podem ser móveis no solo, no ar e na água, vindo a se depositar na biota, podendo chegar a águas superficiais e subterrâneas via escoamento e contaminando a cadeia alimentar.

A utilização em demasia pode acarretar problemas para saúde humana através da contaminação de alimentos ou exposição direta de trabalhadores aos mesmos, além da própria contaminação ambiental. As substâncias químicas presentes nos agrotóxicos representam a terceira maior causa de intoxicação no Brasil. Os trabalhadores rurais são as maiores vítimas. Segundo estudo desenvolvido pelo Programa de Vigilância da Saúde das Populações Expostas a Agrotóxicos, da Universidade de Campinas (MENCK, 2016), 1,5 milhão de trabalhadores rurais estão intoxicados no campo. Conforme o estudo, os trabalhadores do campo estão desamparados em relação à fiscalização e capacitação no emprego desses produtos.

A procura por informação é de alta importância para todos que de alguma forma lidam com agrotóxicos. Bulas, informações apresentadas nos rótulos e cartilhas sobre agrotóxicos são indispensáveis para quem utiliza defensivos agrícolas, assim evitando os principais tipos de contaminação (Tabela 2). Na maioria dos acidentes os primeiros sinais são pouco específicos, além de alguns casos, de doenças mais graves, serem causados por exposição cumulativa aos produtos (ANVISA, 2011).

Tabela 2: Principais meios de contaminação humana por agrotóxicos e seus sintomas.

Meio de contaminação Sintomas

Absorçãodérmica Irritação: ardência, brotoejas, inchaço, pele quente, dolorida e avermelhada; Desidratação: pele escamosa ou seca, podendo apresentar infecções, dor e pus; Alergia tópica: coceira e brotoejas.

Irritação da boca e garganta; Absorção oral Dor de estômago;

Náuseas; Vômitos; Diarreia.

Absorção por via respiratória Ardência do nariz e da boca; Tosse;

Corrimento de nariz; Dor no peito;

Dificuldade de respirar.

Outros efeitos gerais vão surgindo após contaminação prolongada, e são bem diversificados, dores de cabeça, transpiração anormal, fraqueza, câimbras, tremores, irritabilidade, dificuldade para dormir, dificuldade de aprendizado, esquecimento, aborto, impotência, depressão, entre outros.

Em casos de intoxicação crônica, os mais complexos e perigosos, pois se manifestam após repetidas contaminações pequenas, por um longo período de tempo, os problemas podem ser ainda mais graves, uma vez que a demora em identificar as causa dos problemas é muito grande, culminando em alteração do funcionamento dos rins e do fígado, anomalias na produção de hormônios da próstata, ovários e tireoide, incapacidade de ter filhos, problemas respiratórios graves, câncer, dentre outros (ANVISA, 2011).

A intoxicação por agrotóxico também pode estar relacionada a condições sindrômicas de origem genética, como autismo e síndrome de Down. Uma recente revisão de estudos, conduzida por Pelch e colaboradores (2019), encontrou correlação entre desordens

neurológicas e contaminantes ambientais, por exemplo, revelando que aproximadamente um terço das mulheres grávidas, que participaram do estudo, viviam a menos de 1,5 km de áreas de aplicação de pesticidas. A proximidade de organofosfatos, em algum momento da gravidez, foi associada a 60% de aumento de risco de desenvolvimento de autismo pelo bebê (SHELTON, 2014).

A síndrome de Down é uma alteração genética que constitui na presença de um cromossomo a mais no par 21. Segundo o Dossiê sobre agrotóxicos, segurança alimentares nutricional e saúde, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO (CARNEIRO, 2015), o triclorfom, agrotóxico inseticida, gera efeitos sobre a reprodução humana e provoca a não disjunção cromossômica em diversos tipos de célula. Em um vilarejo na Hungria, onde mulheres grávidas foram expostas ao triclorfom através da ingestão de peixes contaminados, foram observados diversos casos de anomalias congênitas e síndrome de Down.

Os números relacionados à contaminação são bastante alarmantes. De acordo com Rigotto e colaboradores (2014), os resultados das análises de resíduos de pesticidas em alimentos desenvolvido pela ANVISA em 2011 mostram que apenas 22% das 1628 amostras analisadas estão livres de contaminantes. Chama a atenção para a presença de pelo menos dois pesticidas que nunca foram registrados no Brasil, o azaconazole e tebufenpyrad, o que sugere o contrabando e falta de controle das políticas públicas.

Segundo o Dossiê ABRASCO (CARNEIRO, 2015),64% dos alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos. Desses, 28% estariam contaminados por substâncias não autorizadas. Adiciona-se a esse dado inúmeros alimentos processados, feitos a partir de grãos geneticamente modificados e com presença dessas substâncias químicas.Esse mesmo documento revela que mais da metade dos agrotóxicos usados no Brasil hoje são banidos em países da União Europeia e nos Estados Unidos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre os países em desenvolvimento, os agrotóxicos causam, anualmente, 70.000 intoxicações agudas e crônicas.

Um estudo divulgado pela Organização Mundial da Saúde - OMS, juntamente com o Inca e a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer - IARC (GUYTON et al, 2015), classifica o ingrediente mais vendido atualmente (Figura 5), o glifosato, como “provavelmente carcinogênico a humanos”. Devido à gravidade do problema, o Ministério Público Federal enviou um documento à ANVISA, recomendando que seja concluída com urgência a reavaliação toxicológica da substância e que a agência determine o banimento desse herbicida no mercado nacional.

O volume de glifosato vendido no Brasil corresponde à mais da metade de todos ingredientes ativos. Seu uso se intensificou à medida em que ficaram populares e lucrativas as culturas de semestres transgênicas, muitas delas resistentes ao herbicida (BOMBARDI, 2017)

Figura 5: Vendas de glifosato no Brasil em toneladas/ano de 2009 a 2014. Fonte: Ibama (2017)

O que a justiça pede é que os ingredientes que estejam sendo revistos tenham o seu uso e comércio suspensos até que os estudos sejam concluídos. Porém o apelo econômico ainda não permitiu que isso acontecesse, a exemplo do 2.4D, um dos ingredientes do chamado 'agente laranja', pulverizado pelos Estados Unidos durante a Guerra do Vietnã, e que ainda hoje deixa sequelas na população atingida. Essa substância ainda tem seu uso permitido no Brasil e está sendo reavaliada pela ANVISA desde 2006, ou seja, há mais de treze anos.

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