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CAPÍTULO I O CICLO DO CAFÉ NO MÉDIO VALE DO PARAÍBA E EM VALENÇA:

2.2 De 1909 a 1980: auge e declínio da indústria têxtil em Valença

Analisando a literatura aqui acessada, que trata do processo de industrialização de Valença, identificou-se uma divergência no que respeita à discussão sobre a origem dos capitais aplicados na abertura de importantes indústrias, principalmente aquelas pertencentes ao setor têxtil, considerado, entre o início do século XX e o final da década de 1980, o mais importante na cidade de Valença e que, de fato, ganhou projeção em nível nacional e, em partes, inclusive projeção internacional.

De acordo com Coutinho (2008) em Valença, cidade do Médio Vale, houve direcionamento de investimentos para a indústria incipiente originados de diferentes atividades econômicas, geralmente ligadas ao campo: pecuária leiteira, laticínios, derivados e agroindústrias de milho, cana-de-açúcar e alambiques. Um dos empreendimentos de maior

vulto resultou na Cia Industrial Valenciana, que posteriormente passaria a se chamar Cia Têxtil Ferreira Guimarães, inaugurada em 1906, cujo principal fundador foi o coronel e comerciante Benjamim Ferreira Guimarães (COUTINHO, 2008).

Esta empresa era responsável pela fiação, tecelagem e acabamento dos tecidos, bem como sua comercialização, ganhando projeção nacional, além de relativa projeção internacional. A prosperidade econômica alcançada pela Cia Têxtil Ferreira Guimarães possibilitou a aquisição de duas outras unidades industriais, ambas no estado de Minas Gerais: em 1932, foi adquirida a empresa Cia Fiação e Tecelagem Barbacenense; em 1943, a Cia de Fiação e Tecelagem Industrial Mineira.

Outros estudos relativizam a participação de capitais oriundos do café, ou mesmo de outras atividades agrícolas junto ao processo de industrialização que sobrevivem à época áurea desse cultivo apontando a presença de capitais oriundos do comércio, especialmente do sul de Minas Gerais (DOS SANTOS, 2010b). Citando outra pesquisa (FERREIRA, 1985) o autor supracitado discute essa questão a partir da história do coronel Ferreira Guimarães, que se encontra envolvido em episódios relacionados à industrialização em Valença. Segundo Dos Santos (2010b, p. 28):

É muito provável que o Coronel Ferreira Guimarães, homem ligado ao comércio do interior de Minas, dispunha de facilidades de crédito junto a essa rede bancária mineira, o que poderia explicar suas ligações com esse grupo de homens empreendedores de Valença, em pleno início de século XX. Tem sido muito pouco explorada a historiografia econômica essa complementaridade da região do Rio de Janeiro com áreas contíguas de Minas Gerais.

Influente que era, porém não nascido em Valença, Ferreira Guimarães representava, de fato, essa ligação com o capital originado do comércio, além do que, um capital externo ao estado do Rio de Janeiro. Não era o fato de ser um cidadão valenciano, entretanto, a condição sine qua non para determinar o engajamento de determinadas personalidades em seus respectivos negócios. O que, de fato, estava em jogo, eram as possibilidades concretas de realizar um negócio com boas garantias de lucros, contando inclusive com a participação do poder público para reforçar essas garantias.

Ferreira Guimarães aproximou-se de José Siqueira Silva da Fonseca, nascido em Valença, já que este foi casado com uma prima da esposa daquele (DOS SANTOS, 2010b, p. 28). Com relação ao convite que Fonseca fizera a Ferreira Guimarães para este investir na Companhia Industrial de Valença, que posteriormente passaria a se chamar Companhia Têxtil Ferreira Guimarães, fica evidenciado a participação do poder público no que respeita às boas garantias que o negócio teria (idem, p. 29):

… Fonseca convence Guimarães a investir na implantação de uma fábrica de tecidos de algodão em Valença, já que o poder público acenava com algumas vantagens: compra do prédio próximo à estação ferroviária… em terreno cedido em aforamento pela prefeitura, desde 1891; transporte gratuito de todo maquinário e equipamentos pela Estrada de Ferro União Valenciana; abatimento de 50% dos fretes das matérias-primas e produtos manufaturados; contrato com a Câmara dos Vereadores para fornecimento de energia elétrica…

Outra grande indústria têxtil instalada em Valença foi a Companhia e Fiação de Tecidos Santa Rosa S.A, fundada no ano de 1913 pelo comerciante italiano Vito Pentagna, dono de duas importantes fazendas da região: Santa Rosa e Pau D´água, onde o comerciante inclusive construiu uma pequena usina hidrelétrica.

Tal como a Cia Têxtil Ferreira Guimarães, a Companhia e Fiação de Tecidos Santa Rosa também foi importante no mercado nacional, além de também alcançar relativo destaque no mercado internacional, à época, contribuindo de maneira destacada para o desenvolvimento econômico de Valença, gerando inclusive diversos postos de trabalho.

O setor têxtil continuava a expandir-se em Valença na primeira metade do século XX. Em 1913 foi fundada a Tiras Bordadas e Rendas Valencianas, tendo como sócios Henrique Leothold e Antônio Januzzi. A partir de 1932 ocorreria a mudança de nome para Companhia de Rendas e Bordados Dr. Frontin. Posteriormente, foi adquirida pela Cia Nacional de Rendas e Bordados S.A, conhecida no mercado nacional e internacional como Fábricas Unidas.

A Indústria Têxtil Valenciana conheceu seu auge na década de 1980, período em que havia sete fábricas têxteis de grande porte: Companhia Têxtil Ferreira Guimarães 1 e 2;

Companhia Fiação e Tecidos Santa Rosa S.A 1, 2 e 3; Fábricas Unidas de Tecidos, Rendas e Bordados S.A; e Fiação e Tecelagem Ultra Moderna Chueke S.A.

Essa expansão de unidades têxteis em Valença pode ser comprovada também a partir da ampliação da quantidade de funcionários nelas empregados, inclusive, podendo-se observar que, do ponto de vista do gênero, a participação feminina no período apontado foi majoritária, conforme pode ser observado na tabela a seguir:

TABELA 1 - Unidades Têxteis de Valença: Número de operários e produção anual

ANO HOMENS MULHERES TOTAL PRODUÇÃO

ANUAL (METROS) 1930 407 589 996 6.260,4 1935 493 653 1.143 8.701,3 1940 552 619 1.171 7.520,1 1945 675 664 1.339 8.809,5 1951 471 621 1.092 8.162,1

Fonte: DOS SANTOS, Jorge S. Desenvolvimento e industrialização no interior do estado do Rio de Janeiro. Adaptado de IÓRIO, Leoni Valença de ontem e de hoje (subsídios para a história de Valença 1789 - 1952), Valença, Associação Comercial, 1953, 212 p.

Os investimentos industriais em Valença contaram em grande parte com a presença do capital privado apoiado pelo poder público, diferentemente do que houve em Volta Redonda. Entretanto, Dos Santos (2010a, p. 169) aponta que “uma das mais importantes características do desenvolvimento econômico do estado do Rio de Janeiro foi historicamente a alta dependência do investimento do setor público estatal, a ponto deste redefinir o mapa industrial do estado”

Para demonstrar a importância da participação do poder público no processo de instalação de indústrias na região, é fundamental observar que, embora a instalação da primeira indústria em Valença tenha ocorrido no ano de 1909, em 1891 a Câmara Municipal de Valença já havia discutido e definido a concessão de uma área para a instalação de uma indústria na cidade. No entanto, esta não foi instalada na época por conta da crise do Encilhamento (FERRAZ, 2006).

Diversos benefícios foram concedidos pelo poder público para a instalação das indústrias têxteis na região, dentre os quais Dos Santos (2010a, 2010b) destaca a compra do prédio próximo à estação ferroviária, concedido pela Câmara no ano de 1891, o transporte gratuito de todo o maquinário e equipamentos pela Estrada de Ferro União Valenciana, abatimento de fretes de matéria-prima e produtos manufaturados, além de fornecimento de energia e isenção de impostos.

Imagem 1 – Aspecto de antiga fábrica de tecidos em Valença (RJ)

Imagem 2 – Aspecto de antiga fábrica de tecidos em Valença (RJ)

Fevereiro/2014, foto da autora

Essas iniciativas fizeram surtir algum efeito durante o (curto) período em que houve uma expansão da atividade industrial em Valença. Porém, a década de 1940 já apresentava a influência da instalação Cia Siderúrgica Nacional em Volta Redonda, cuja inauguração ocorreria no ano de 1941. A tabela 2 apresenta o valor da transformação industrial em diferentes cidades - tanto do estado de São Paulo quanto do Rio de Janeiro - mostrando que, mesmo após a expansão alcançada pela indústria têxtil, o município de Valença apresenta um valor da transformação industrial inferior em relação a diferentes municípios do Vale do Paraíba.

Tabela 2 - Valor da transformação industrial do Vale do Paraíba do Sul - Principais municípios: 1940 (em %)

Municípios Valor da transformação industrial

Barra do Piraí (RJ) 11,47 Barra Mansa (RJ) 10,85 Guaratinguetá (SP) 6,43 São José dos Campos (SP) 9,55

Taubaté (SP) 13,78 Três Rios (RJ) 11,26 Valença (RJ) 6,87 Subtotal 70,21 Outros municípios 29,29 Total 100,00

Fonte: DOS SANTOS, Jorge S. Desenvolvimento e industrialização no interior do estado do Rio de Janeiro… adaptado de Rodrigues et al (1992, p. 65) a partir do IBGE - Censo Industrial 1940..

Os dados da tabela acima mostram que outros municípios da região do Vale do Paraíba já ganhavam importante projeção no setor industrial, como Taubaté e São José dos Campos, em São Paulo. Do lado do Rio de Janeiro, Barra do Piraí e Barra Mansa apresentaram também importante desempenho. Isso não significa que os percentuais alcançados por Valença, nessa época, sejam desprezíveis, até porque a tabela aponta que os outros municípios, a exceção destes acima apresentados, responderam, no conjunto, por 29,29%.

Conforme será visto a partir do próximo item, que analisa o impacto causado na atividade industrial na região do Médio Vale a partir da inauguração da CSN - Cia Siderúrgica Nacional, a atividade industrial em Valença ainda conseguiu manter-se em patamares relativamente razoáveis, ainda apoiando-se principalmente no setor de maior destaque: a indústria têxtil. Passará também a ganhar destaque, nesse município, a indústria química.

No entanto, houve pouca influência direta da CSN no que respeita à diversificação do parque industrial de Valença. Décadas mais tarde, a reestruturação produtiva, dada em escala

mundial, afetará negativamente os setores industriais localizados em Valença que, até então, conseguiam manter-se gozando, inclusive, de relativo destaque.

2.3 O papel de Valença no contexto da construção da CSN (Companhia Siderúrgica