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DE JOVENS E ADULTOS

No documento LivroPauloFreireeEducPop-10Mai (páginas 163-169)

Susane Hübner Alves1

INTRODUÇÃO

Esse trabalho é a consolidação de um projeto interdisci- plinar realizado no 1º semestre de 2006, na Escola Municipal Nossa Senhora de Fátima, bairro Bom Jesus, Porto Alegre, para turmas de educação de jovens e adultos. A proposta envolveu alunos das Totalidades Iniciais – T1, T2 e T3, com o intuito de desenvolver a apropriação do espaço vivenciado. As observa- ções e conclusões aqui expostas originam-se, em grande parte, do planejamento interdisciplinar de Geografia e Educação Fí- sica, com a colaboração da professora Neusa Lemos, desen- volvido em um curso com cerca de 35 alunos com encontros semanais. De acordo com Santomé:

“Interdisciplinaridade – segundo nível de associ- ação entre disciplinas, em que a cooperação entre vá- rias disciplinas provoca intercâmbios reais; isto é, exis- te verdadeira reciprocidade nos intercâmbios e, conse- quentemente, enriquecimentos mútuos.” (SANTO- MÉ:1993, p.70)

Também conforme Santos:

“Na verdade, o princípio de interdisciplinaridade é geral a todas as ciências. Foi Jacques Boudeville quem escreveu que toda Ciência se desenvolve nas fronteiras de outras disciplinas e com elas se integra a uma filoso- fia”. (SANTOS:1996, p.102).

O texto que segue trata, em primeiro lugar, de relatar uma experiência didática prática em seu contexto.

O DESAFIO DA ALFABETIZAÇÃO CARTOGRÁFICA E CORPORAL

A proposta representou o desafio de planejar a inclusão e o resgate da auto-estima dos alunos que estão em processo de co- nhecimento e domínio do código escrito. Alunos jovens e adultos na faixa etária de 17 a 58 anos que voltam após muitos anos afas- tados ou até mesmo nunca freqüentaram a escola. Alunos das três turmas trabalharam juntos às sextas-feiras, durante o turno da noite. O planejamento de cada encontro era feito levando-se em conta as necessidades do grupo, a fim de que se consolidasse a aproximação à escola, às professoras, que atuavam somente nas Totalidades Finais, bem como estabelecer trocas entre os alunos das diferentes turmas.

Planejamos ampliar a consciência corporal e espacial utili- zando os conceitos geográficos, lateralidade e orientação, repre- sentação gráfica, visão oblíqua e vertical, imagem bidimensional e tridimensional, estruturação de legenda, proporção, noção de escala e aqueles desenvolvidos pela Educação Física.

De acordo com Castrogiovanni e Costella2 pensamos que

“alfabetizar cartograficamente seja trabalhar mentalmente, atra- vés de desafios e questionamentos que levem os alunos a enten- derem o mundo em uma escala sideral, para melhor compreende- rem os espaços geográficos mais restritos e vividos.”

Outro desafio enfrentado para o planejamento, além daquele proposto pelos autores acima citados, foi que muitos materiais qualificados de alfabetização cartográfica existem, porém poucos poderiam ser aplicados na sua forma original, pois o público alvo são alunos não-alfabetizados.

Igualmente examinamos obras cujo público alvo são alunos das séries iniciais, que traziam na sua proposta e na sua apresenta- ção de modo geral, desenhos e textos excelentes, porém direcio- nados à faixa etária entre 6 a 8 anos, muito distantes, portanto, do interesse e faixa etária do nosso público.

Não era o lúdico presente na maioria das propostas que im- pediam a utilização, mas a abordagem infantilizada que poderiam deixar constrangidos os alunos, além de não tornar atraente a pro- posta de trabalho. Foi necessário criar e adaptar.

A atividade física foi fundamental para a percepção do espa- ço. O movimento era associado a cada atividade, por isto extre- mamente rico o planejamento interdisciplinar com Educação Fí-

sica, pois, para que ocorra orientação no espaço, é necessária a orientação a partir do seu próprio corpo, para tanto consciência corporal.

NOSSAS PRÁTICAS EM CADA ENCONTRO

A dinâmica do curso envolveu planejamento e avaliação de cada aula, mesmo com tempo exíguo que encontramos normalmente no dia-a-dia nas escolas. A turma também fazia sua avaliação no final de cada encontro, do que havia gostado mais, daquilo que poderia ser diferente. A partir das sugestões e críticas, fazíamos as retomadas necessárias e (re)planejamentos. Entre os materiais mais utilizados destacamos: o globo terrestre, imagens de satélite, cordões, bússola, giz para desenhos no chão da sala e pátio, fita métrica, bola de vôlei, maquetas, espelhos, papéis com tamanho grande, objetos de forma- tos e dimensões distintas... uma gama bastante variada para ativida- des que visaram a desenvolver no grupo relações e (re)leitura do es- paço geográfico. Visualização de atividade com intuito de trabalhar os hemisférios do corpo na figura 1.

Nossa prática teve por objetivo fazer a apreensão e compreen- são do espaço geográfico a partir da consciência corporal. Para tan- to trabalhamos com a lateralidade e orientação, representação grá- fica, visão oblíqua e vertical, estruturação de legenda, proporção,

noção de escala e construção de maquetas, utilizando atividades práticas vivenciadas pela Educação Física e Geografia.

Vivência com o globo terrestre e seus hemisférios, na figura 2.

“Brincar de Terra”, manusear o globo, ver imagens do nosso planeta do espaço, descobrir o que é uma nuvem, relacionar a gra- vidade com nosso corpo, trabalhar a lateralidade com bolas, desco-  brir onde está Porto Alegre, onde está nossa vila, observar a Lua

cheia, ver uma bússola de perto e o que significa o “ponteirinho”, desenhar objetos a partir de diferentes ângulos, desenhar croquis da casa onde mora e da sua rua, o que é o longe e o que é o perto, trajetos diários, caça ao tesouro com pontos cardeais, movimentos usando a dança para consciência corporal e do grupo, medições diversas (corporais e de objetos), nosso primeiro mapa construído: “a sala de aula”, criação de símbolos para os desenhos, planeja- mento para construção de maqueta, as “medidas tem que combi- nar”; foram diversas as práticas ao longo do curso. Todas almeja- ram a apropriação e desenvolvimento dos conceitos referentes à alfabetização cartográfica e corporal.

Na figura 3, podemos observar parte do processo de monta- gem da maqueta da escola.

CONCLUSÃO

A afetividade dos alunos e a cooperação entre pessoas com diferentes níveis de alfabetização, idades, experiências de vida, fi- zeram este desafio valer como incentivo para cada planejamento, cada encontro. Não é sempre que nós educadores ouvimos o se- guinte depoimento:

“Professora, não posso perder a aula de sexta-fei ra, é a nossa aula-terapia”.

Daniela Alves da Silva, 27 anos – T3.

Esse curso tornou-se ainda mais satisfatório à medida que os alunos participaram ativamente, vibraram com determinadas atividades e superaram dificuldades tangentes ao seu nível de co- nhecimento da língua escrita, fazendo da parceria e solidariedade uma constante. Através das dinâmicas propostas, os alunos perce-  beram o espaço geográfico de forma dinâmica e interativa. A cons-

ciência corporal e a (re)leitura do espaço foram trabalhadas, a fim de construir os conceitos fundamentais relacionados à alfabetiza- ção cartográfica, trabalhando, portanto, com a inclusão nas suas diferentes linguagens.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CASTROGIOVANNI, Antonio (Org.) Ensino de Geografia Práticas 

e Textualizações no Cotidiano. Porto Alegre: Editora Mediação, 2000.

CASTROGIOVANNI, A.; COSTELLA, R. Brincar e Cartografar 

com os diferentes mundos geográficos: a alfabetização espacial. Porto

Alegre: Editora PUCRS, 2006.

HASLAM, A.; TAYLOR, B.  Mapas: a Geografia na prática. São Paulo: Editora Scipione, 1999.

JENNER, Bernard.  Atlas Geográfico Ilustrado. 3ª ed. São Paulo: Editora Scipione, 1997.

JONES, B.; WATSON, C. O Espaço. São Paulo, SP, Ed. Scipione, 1993.

SCHÄFFER, N.; KAERCHER, N.; GOULART,L.; CASTROGI- OVANNI, A. Um Globo em suas Mãos Práticas em Sala de Aula.

Porto. Alegre: Editora UFRGS, 2003.

SIMIELLI, Maria Elena Primeiros Mapas: Como Entender e Construir.

vol. 1 ao 4, São Paulo: Editora Ática, 1993.

SANTOMÉ, Jurjo T. Globalização e Interdisciplinaridade. Porto Ale- gre: Ed. Artes Médicas, 1993.

SANTOS, Milton Por uma Geografia Nova. São Paulo: Editora Hu- citec, 1996.

SOUSA, Marina. Estudos Sociais. 3ª ed. São Paulo: Editora Ática, 1995.

1Profa. de Geografia na EMEF Nossa Senhora de Fátima, junto à Educação de Jovens e

Adultos, em Porto Alegre RS. Endereço eletrônico: susanehubner@hotmail.com

2CASTROGIOVANNI, A.; COSTELLA, R. Brincar e Cartografar com os Diferentes Mun-

SE CADA UM DIZ O QUE PENSA,

No documento LivroPauloFreireeEducPop-10Mai (páginas 163-169)