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CAPÍTULO I CAMINHOS DA PESQUISA

1.2 DEFINIÇÃO DOS AGENTES DA PESQUISA

Vasconcelos (2011) traça um panorama do uso das noções de ator e agente na história, sociologia e geografia, mostrando a complexidade e a diversidade de contextos em que foram empregados. E, ainda não havendo consenso sobre a utilização de um termo em prejuízo do outro, o autor deixa clara sua preferência pela noção de agente, posto que a noção de ator “[...] remete a papéis de representação, tanto na vida corrente como nas artes (teatro, cinema)” (VASCONCELOS, 2011, p. 76). Escolhemos desenvolver esta pesquisa seguindo esta indicação.

Optamos por ter como amostra intencional agentes culturais em detrimento de movimentos da sociedade civil organizada, porque esta é uma forma de não excluir agentes não institucionalizados, ampliando os horizontes da pesquisa, possibilitando a realização de entrevistas em municípios pequenos e/ou de pouca articulação da sociedade civil. Esta decisão se mostra importante, pois permite que agentes, que não se organizam pela lógica do Território de Identidade, possam ter voz. Doutra sorte, se se opta por ter como prioritários apenas os movimentos da sociedade civil organizada, ficaria limitado o alcance da pesquisa e dificultado o processo de apreensão das contradições e das demais lógicas de organização e experiência das pessoas com sua região. É importante ainda ressaltar que os grupos que não respeitam esta lógica

põem em xeque a regionalização proposta e revelam outras possibilidades de regiões como espaços vividos.

Serpa et al. (2015) mostram que a política de desenvolvimento territorial e cultural atinge de forma distinta os agentes de cultura os quais ela tem como foco. Grupos culturais formados por agentes de maior capital escolar e social conseguem se adequar melhor à política proposta pelo governo do estado da Bahia em detrimento daqueles que são compostos por membros com menor instrução, quando comparados com os primeiros. Ressaltamos que, dentro dos próprios grupos culturais, há agentes de maior e menor capital cultural e escolar8, estando alguns mais bem informados que outros sobre as ferramentas de funcionamento da política cultural do governo (idealização, implantação e efetivação). Ao optarmos por entrevistar representantes do poder público em escala local e regional temos a oportunidade de entrar em contato com aqueles que de alguma forma podem escolher quais manifestações e agentes ganham mais visibilidade nos seus municípios e nos eventos culturais de âmbito regional patrocinados pelos governos municipais. Estes agentes são também responsáveis por influenciar nas representações que passam adiante, pois podem priorizar atividades culturais que estejam de acordo com a sua visão de mundo em lugar de outras que estejam em desacordo. Assim, os agentes de cultura que conseguem mais influência nos municípios são aqueles que estão direta ou indiretamente ligados ao poder local, trazendo mais visibilidade para suas manifestações, não sendo, necessariamente, os detentores de maior capital escolar e econômico, mas os que apresentam forte capital social. Deste modo, estar em contato com os mais diversos agentes de cultura nos permite ter uma visão de processo, de como criam o sertão por meio de suas atividades culturais, possibilitando também identificar quais as representações sobre o sertão são validadas por eles.

Os agentes de cultura, como mencionado acima, por vezes são pessoas de baixo capital escolar e econômico. Mas apesar de não terem tido acesso a conhecimento de caráter acadêmico, eles conhecem a dinâmica, a realidade temporo-espacial a qual pertencem, pela experiência cotidiana. Como ressalta Almeida (1998), a partir das ideias de Levy-Strauss (s/d), o conhecimento popular também tem legitimidade “[...] em razão de sua importância na vida social,

8Bourdieu (2007) ressalta a importância de não considerar o conceito de classe social a partir de uma visão

tradicional e aponta que na constituição das classes e frações de classe diferentes capitais (econômico, social e cultural/escolar) são importantes para compreender os gostos e comportamentos das classes sociais e também para verificar se os agentes estão se movendo de forma ascendente ou descendente na estrutura social. No contexto das políticas culturais da Bahia, ressaltamos que o capital escolar é fundamental para que os grupos se adequem à política de editais, haja vista que alguns projetos e documentos necessários para a contemplação em editais exige conhecimentos técnicos específicos (SERPA, 2011;VAZ, 2013; SERPA et al. 2015).

da clareza que ele traz sobre os processos cognitivos e as interações sociais” (p.34).

Ainda sobre agentes da cultura – que são detentores de informação e capital escolar e econômico – mesmo estes podem não exercer influência em escala local pela ausência de prestígio, pois suas manifestações são postas de lado em favor de agentes mais consagrados. José Walter Pires, sociólogo, advogado, cordelista e membro da Associação Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), por exemplo, evidencia as dificuldades de conseguir apoio do poder público municipal e estadual para publicar seus trabalhos e para tê-los adotados como material paradidático em escolas. Segundo ele, os representantes do poder público e os dirigentes de escola preferem adotar materiais de autores do Sul/Sudeste ao invés dos seus trabalhos sobre o sertão; ele ressalta ainda que nunca foi contemplado em edital e que seus trabalhos na maior parte das vezes são publicados em editoras do Sul/Sudeste (PIRES, 2015). Neste sentido, não consideramos que o autor seja um agente hegemônico no município, pois mesmo sendo reconhecido nacionalmente, seu trabalho é preterido no nível municipal e regional. Portanto, a compreensão da posição de um agente perante o município e outros agentes só é possível quando se relacionam diferentes escalas geográficas.