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Segundo Pickett e Cadenasso (2002), a abordagem ecológica de ecossistemas utilizada na sua dimensão de definição, envolve a descrição de seus fatores

bióticos, de seus fatores abióticos e das interações entre os mesmos. A definição implica uma estrutura aninhada hierárquica e a percepção que um ecossistema pode ter qualquer tamanho, desde que comporte organismos, ambiente físico e as interações entre os mesmos. Já as instâncias de ecossistemas têm uma extensão espacial definida que deve ser especificada em termos de suas fronteiras.

Partindo da aprendizagem centrada no aprendiz, segundo a qual envolve-se menos a aquisição de informações e mais a criação de opiniões sobre o mundo e a troca de idéias com outros, esta é alcançada por meio da exploração e interação que desencadeiam o processo construtivo do conhecimento (PIAGET, 1972; PAPERT, 1986; VYGOSTKY, 1978; ACKERMANN, 2001). Portanto, a aprendizagem ocorre quando o aluno interage com o objeto de estudo e com os outros: seus pares, seus professores e tutores. Detalhamos a seguir uma proposta de definição de ecossistema digital de aprendizagem.

Similarmente a ecossistemas biológicos, um Ecossistema Digital de Aprendizagem consiste de espécies, populações e comunidades que interagem entre si e com o meio ambiente. É o conjunto de relações entre fatores bióticos, e entre estes e os fatores abióticos.

4.1.1 Fatores bióticos

Os fatores bióticos de um Ecossistema Digital de Aprendizagem pertencem a duas espécies: a espécie humana (os atores) e a espécie digital (os conteúdos). Nesta visão, os conteúdos são considerados seres biológicos, podendo evoluir, efetuar trocas com outros seres biológicos e com o meio, reproduzirem-se, sofrer mutação e até mesmo desaparecer.

Apesar de não se parecerem com seres biológicos, conteúdos digitais seguem um processo similar de seleção natural e evolução. As necessidades humanas, as experiências e os talentos levam à criação de diversos conteúdos. Alguns destes

conteúdos são mais úteis ou mais ajustados (fit) que outros e sobrevivem, enquanto outros desaparecem. Novas demandas impulsionam a criação de novos conteúdos, os quais são adequados ao momento e que são, muitas vezes, baseados em conteúdos existentes (mutação). Novamente, alguns novos conteúdos serão considerados mais ajustados e sobreviverão (seleção natural) enquanto outros, menos ajustados, desaparecerão.

Neste sentido, consideramos que um indivíduo da espécie humana nasce no ecossistema ao começar a interagir com seus pares ou com indivíduos da espécie digital, e morre quando deixa de interagir com os mesmos.

4.1.2 Fatores abióticos

Entendemos por fatores abióticos as tecnologias por meio das quais ocorrem as interações entre espécies. Tecnologias pervasivas de hardware, de software, de rede e bancos de dados compõem o meio ambiente junto com paradigmas educacionais. As espécies interagem com o meio (as tecnologias) e entre si com o suporte do ambiente (as tecnologias), sem o qual as interações não seriam possíveis.

4.1.3 Interações

Existem diferentes formas de interações inter-espécies. Estas ocorrem quando a espécie humana interage com a espécie digital, quando indivíduos humanos criam indivíduos da espécie digital e quando a espécie digital é exibida à espécie humana.

Interações intra-espécie ocorrem quando indivíduos da espécie humana colaboram entre si (interagem com objetivo comum) e quando indivíduos da espécie digital cooperam entre si (operam em conjunto).

4.1.4 Relações de dependência

Como em sistemas ecológicos, em um ecossistema digital há relações de dependência entre espécies e o ambiente, assim como relações de dependência inter-espécies.

As interações são possíveis, pois as tecnologias que formam o ambiente apóiam a ocorrência das mesmas. Isto cria uma relação de dependência das espécies com o ambiente, pois sem interações não há ecossistema, e sem tecnologias no ambiente não há interações.

Quanto à relação inter-espécies, a humana tem tanto uma relação de consumidor quanto de produtor com a espécie digital. O consumo ocorre quando indivíduos da espécie humana interagem com a espécie digital e alteram o estado do conteúdo digital, ou quando o conteúdo digital é exibido ao indivíduo da espécie humana. Já a produção se dá quando a espécie humana cria indivíduos da espécie digital.

4.1.5 Estrutura aninhada hierárquica

Um Ecossistema Digital de Aprendizagem pode ter qualquer tamanho, desde que comporte organismos humanos (atores), organismos digitais (conteúdos), um ambiente físico (as tecnologias) e as interações entre os mesmos.

Já as instâncias de ecossistemas digitais de aprendizagem têm uma extensão espacial definida que deve ser especificada em termos de suas fronteiras, sejam elas fronteiras físicas ou fronteiras lógicas.

Devido à sua complexidade, um ecossistema digital pode conter outros ecossistemas formando uma estrutura aninhada hierárquica. Esta característica permite escolher um nível de abstração e determinar o foco quando estudar ferramentas digitais no seu contexto de uso.

Um exemplo de estrutura aninhada hierárquica (ilustrado na Figura 13) é o ecossistema digital de todas as escolas do município de São Paulo, no qual há ecossistemas individuais de cada escola (na figura há o exemplo da escola Ernani). Cada qual contém os ecossistemas formados pelas classes, que por sua vez contém os ecossistemas da classe utilizadores de uma ferramenta digital específica (no exemplo o ecossistema da classe 2a C utilizando a ferramenta EduMusical). Assim, o ecossistema pode abranger desde um conjunto de escolas de um município até uma classe utilizando uma ferramenta educacional específica. Desta forma, a definição de ecossistema digital permite estudar espécies e interações em diferentes esferas. No exemplo, há quatro níveis de abstração: as esferas do município, da escola, da classe ou da ferramenta.

Ecossistema Escolas Municipais São Paulo

Ecossistema Ernani Ecossistema 2a C Ecossistema EduMusical Município Escola Classe Ferramenta Ecossistema X Ecossistema Y Ecossistema 1a A Ecossistema Logo

4.1.6 Herança e polimorfismo

As propriedades de herança e polimorfismo, emprestadas da modelagem orientada a objetos (BOOCH et al., 1998; JACOBSON et al., 1999) são aplicadas aos Ecossistemas Digitais de Aprendizagem. Neste sentido, um ecossistema herda características do ecossistema pai. No exemplo ilustrado na Figura 13, uma propriedade do ecossistema de escolas municipais de São Paulo é ter laboratórios de informática com conexão de banda larga à Internet. O ecossistema da escola Ernani herda esta propriedade do ecossistema pai.

E, caso um filho não tenha uma propriedade do pai (uma escola não tem conexão de banda larga, por exemplo) aplica-se o polimorfismo para definir as condições do filho (lembrando que há laboratórios de informática com conexão discada). O objetivo da definição aqui proposta é enfatizar uma visão holística de espécies (humana e digital) interagindo no seu contexto de uso, para a qual o conjunto não é apenas a soma de todas as partes, mas sim as partes compõem o conjunto, sendo este que determina o comportamento das partes, como na definição original de Ecologia de Odum (1985).

No entanto, o potencial desta definição só pode ser capturado se há uma forma de organizar a enorme quantidade de casos e abordagens. Por isto, surge a segunda dimensão: a dimensão do modelo (PICKETT; CADENASSO, 2002), que é detalhado na Seção 4.3.