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2 PROPEDÊUTICA: INFLUÊNCIA ENTRE O DEVER MORAL E O DEVER

2.6 Definição de norma jurídica

Entendido que o objeto-formal será estudado a partir de sua face jurídica e o sistema de referência será a formação da norma jurídica através da linguagem, necessário definir o que seria norma jurídica.

Norma seria gênero em que as normas jurídicas são espécies. Há normas de conduta, da moral, de etiqueta em que todas possuem como afinidade a prescrição, ou seja, todas possuem um deve-ser que caso não obedecido haverá uma sanção. A diferença entre essas normas seria que a sanção jurídica poderia ser imposta através de coação física pelo Estado.

Como modelos de adaptação social, as normas jurídicas seriam proposições contendo um comando que deverá ser cumprido pelos indivíduos, cujo descumprimento possibilita a aplicação de uma sanção. Por isso, a norma jurídica conteria não só comando destinado a regulação de condutas, mas também o ato de a coação a ser realizado em caso de

59 IVO, Gabriel. Norma jurídica... Op. cit., p. XXXIV.

60 CARDOSO, Alessandro Mendes. O dever fundamental de recolher tributos: no estado democrático de

descumprimento. A norma conteria além da situação fática e sua consequência, a sansão pelo seu descumprimento.

Para Hans Kelsen, o fato tal como está na natureza não é, por si só, objeto do conhecimento jurídico. O sentido jurídico do fato seria dado por intermédio de uma norma, que se refere àquele conteúdo. “A norma funciona como esquema de interpretação. Por outras palavras: o juízo em que se enuncia que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico (ou antijurídico) é o resultado de uma interpretação específica, a saber, de uma interpretação normativa”. O que faria, por exemplo, com que a execução de uma sentença, a qual condenou alguém à morte, seja diferente de um homicídio seria exatamente essa operação mental – conjugando o Código Penal e o Código de Processo Penal – pois na natureza não há como distinguir essas duas qualidades.61

Por isso do uso da Teoria dos Signos ou Semiótica, pois, ela definiria a estrutura linguística do conhecimento, através de um suporte físico (dado material), que se associará com o significado (relação do signo com objeto, originado na mente), causando no interprete uma significação (relação dos signos com que representa)62.

No direito, o sujeito cognoscente tem contato com o que está prescrito na lei (suporte físico), obtém o significado por meio da interpretação, gerando a norma jurídica como significação. Para se compreender a norma jurídica, portanto, o ponto de partida seria uniforme: textos legislativos, cujo alcance estaria disponível a qualquer um que pretende estudá-las. As divergências ocorreriam na interpretação e nas posições díspares encontradas sobre objeto estudado63.

Dentro do campo de condutas, o direito se propõe criar uma realidade jurídica através de uma linguagem artificial própria, emitida pelos órgãos habilitados64. Só através do estudo linguístico que o jurista poderia encontrar a norma jurídica muitas vezes confundida com textos (veículos introdutores de normas), documentos normativos, entre outros65 . A Constituição, as leis, decretos e outros textos seriam veículos normativos formados por enunciados prescritivos, os quais geram proposições, porém estas nem sempre são normas jurídicas.

61 In: Teoria pura do direito. Tradução João Batista Machado. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 4.

62 ESTEVES, Maria do Rosário. Normas gerais de direito tributário. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 20

63 BARRETO, Paulo Ayres. Contribuições: regime jurídico, destinação e controle. São Paulo: Noeses, 2006, p.

3.

64 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2008, p. 172.

Apesar da interpretação se apresentar de forma inesgotável, não significa a possibilidade de desconstrução ou negação do texto. Também não significa a busca pela intenção do legislador, pois esse seria momento pré-jurídico. A atividade do intérprete seria a atribuição de sentido ao texto, limitado a construção da conduta a ser seguida naquele caso tratado. A existência prévia do texto construído seria o diferenciador entre o legislador e aplicador que atribui sentido as palavras66.

Dada a amplitude de significados da linguagem natural, a construção da norma jurídica através de uma linguagem artificial no direito possibilitaria diversos sentidos. Isto é, partindo dos enunciados normativos (texto) seria possível encontrar diversos comandos, diversas normas. Contudo seria trabalho do intérprete definir quais sentidos seriam compatíveis com sistema jurídico e quais interpretações não se compatibilizam com as leis postas. A linguagem natural pode criar interpretações que não estão dentro do contexto legislativo, possibilitando taxar certos sentidos como inconstitucionais, por não ter guarida pela Constituição Federal, e/ou ilegal por não possuir lei que a fundamente.

A ciência jurídica estudaria a norma jurídica através de um método. Para o presente trabalho utilizará a análise da linguagem que compõe o direito para se construir a norma jurídica referente ao dever fundamental de pagar impostos.

A formalização da estrutura lógica específica da norma jurídica será estudada no item 7, dedicado a proposta de construção da norma jurídica do dever fundamental de pagar imposto. Por hora, define-se a norma jurídica como um comando regulador de condutas, cujo descumprimento possibilita a imposição de sanção através de atos coativos, retirado através da interpretação dos textos legislativos.

Pela complexidade, é comum a construção da norma jurídica através da interpretação de textos diversos para se encontrar a integralidade de sua significação67. Por isso, a necessidade de consultar diversos textos, no caso diversos artigos da Constituição Federal para se configurar o dever fundamental de pagar impostos.

Antes de se formar a norma jurídica relativo ao tema, alguns entendimentos prévios são cogentes. Definir o que seria dever fundamental bem como os fundamentos jurídicos do dever fundamental fiscal possui relevância para identificar e melhor compreender a norma jurídica a partir do ordenamento jurídico brasileiro. Assim no próximos capítulos, o estudo servirá de base para a análise dogmática do tema proposto.

66 IVO, Gabriel. Op. cit., 2006, p. XL.