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CAPÍTULO 2: O ORDENAMENTO TERRITORIAL COMO INSTRUMENTO VOLTADO À GESTÃO DOS RECURSOS PESQUEIROS NO ESTADO DO PARÁ

2.1 DEFININDO O ORDENAMENTO TERRITORIAL PARA A GESTÃO DOS RECURSOS PESQUEIROS

A ciência geográfica vem desempenhando um papel crucial com relação ao estudo do ordenamento territorial, em particular, no desenvolvimento dos instrumentos de gestão e planejamento da organização do território, relacionados às políticas públicas promovidas pelo Estado brasileiro desde a década de 1930, assim como, as diferentes formas de uso do território por vários segmentos sociais que fazem parte da dinâmica socioespacial em dada formação econômico-social. Todavia, sua relevância se deu por intermédio da compreensão das noções de território e de empoderamento das coletividades locais nos processos decisórios de gestão política dos territórios no Brasil.

A princípio, o ordenamento territorial pressupõe um arranjo espacial de natureza jurídica e política cuja centralidade é o território. O território, nesse contexto, constitui uma categoria central de análise, pois assumiu um caráter mais político nas últimas décadas, por se tratar de um recorte espacial que reflete um modo reservado de apropriação de parcelas do espaço onde estão presentes diversos atores com suas relações de identidade e de pertencimento, compreendendo assim, diferentes territorialidades impregnadas de relações de poder.

Convém esclarecer, nesse sentido, que o ordenamento territorial pressupõe dois vieses de entendimento: de um lado temos a estruturação de políticas de planejamento correspondente à ação pública do Estado. De outro, a convergência dos interesses coletivos. Dessa forma, Silva (2007, p. 297) define ordenamento territorial como:

(...) uma forma singular de uso do território que representa um arranjo de objetos sociais, naturais e culturais historicamente estabelecidos. Mas esse ordenamento não é apenas condição social de reprodução da ordem capitalista. É também reflexo de sua significação funcional e simbólica na totalidade social capitalista.

Depreende-se do exposto acima, que o ordenamento territorial constitui, por assim dizer, numa prática social, jurídica e política que envolve um conjunto de ações e de objetos que configuram um arranjo espacial e se reproduzem no conjunto da totalidade social

capitalista e se manifestam em níveis escalares distintos. Logo, infere Silva (2007, p. 297- 298):

(...) O ordenamento territorial resulta do avanço do processo de homogeneização (globalização) extensiva do capitalismo e de fragmentação (diferenciação) de parcelas do espaço geográfico em arranjos de objetos e de ações articulados em rede. (...) No entanto, o ordenamento é mais do que uma organização espacial, uma “forma”, mas um sistema dinâmico formado por objetos e ações que articulam lugares contíguos ou não em rede. Assim, o ordenamento territorial em rede é uma trama de relações conflitantes e complementares que integra o lugar, a formação socioespacial e o mundo, conforme assinala Santos (2000). Logo, o ordenamento anuncia a sociedade capitalista global e as significações particulares próprias do uso do território.

Segundo Almeida e Soares (2009), até meados dos anos de 1980 não havia um instrumento jurídico voltado para a ordenação do território brasileiro. Isto, sobremaneira, condicionou a prática governamental em desenvolver políticas de ocupação do território sem que houvesse uma preocupação com os arranjos sociais, políticos, econômicos e culturais contribuindo, assim, para uma (des) ordem territorial e ambiental.

A partir do ano de 1988, afirma Almeida (2007, p. 350), que passou a tramitar na Câmara dos Deputados uma emenda parlamentar, cujo objetivo era introduzir, entre as competências da União, a de elaborar e executar planos nacionais de ordenação do território. Essa emenda (2POI256-6) justifica-se pelos seguintes argumentos:

As constituições brasileiras, até hoje, padecem de uma aguda carência de disposições relativas ao espaço territorial e às condições concretas de organização da vida nacional – distribuição de recursos naturais e equipamentos instalados no país. A própria expressão “ordenação do território” revela preocupação com a distribuição da população e de suas atividades, com a observância de uma criteriosa e racional utilização dos recursos naturais decorrentes de uma política de Estado que objetiva harmonizar o desenvolvimento econômico com a ocupação do território, abrangendo uma variada gama de fatores urbanos, rurais, de localização industrial, reforma agrária, conservação e proteção do meio ambiente, entre outros.

Essa prerrogativa constitucional obriga o conjunto da Federação brasileira envolvendo a União, os Estados e Municípios a promover o ordenamento territorial na organização do território nacional tendo como foco principal a gestão ambiental e manejo dos recursos naturais.

Segundo Coelho e Cunha (2008) no Brasil, as pressões internacionais do movimento ambientalista refletirão o caráter contraditório das políticas modernizantes e de integração nacional em virtude do acelerado processo de exploração e degradação dos recursos naturais.

Assim, surgirá no bojo das transformações econômicas e sociais, a criação de um arcabouço institucional27 destinado a tratar da temática ambiental de modo a reorientar as ações do próprio Estado, bem como, da sociedade. É nesses termos que surge o modelo de gestão participativa, compartilhada e descentralizada.

A política neoliberal instaurada na América Latina, em particular, no Brasil na década de 1990, consolidará um novo modelo de Estado que implicará em mudanças substanciais no seu papel e forma de atuação no que se refere à gestão do território.

Esse processo teve como culminância na gestão do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, em sua primeira gestão (2002-2006), a implantação de políticas de governo que se transformaram em políticas de estado e continuaram durante a segunda gestão (2006-2010). Dentro desse contexto, no que se refere à política territorial de desenvolvimento rural no Brasil, vários programas foram implantados. Dentre estes, temos o Programa Territórios da Cidadania, sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), e a Política de Desenvolvimento Territorial de Pesca e Aquicultura, sob a responsabilidade do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), os quais se encontram em processo de consolidação.

Por ora, iremos tratar da Política de Desenvolvimento Territorial da Pesca e Aquicultura no Brasil como forma de analisar seus fundamentos que embasam certamente a Política de Desenvolvimento Territorial de Pesca e Aquicultura no estado do Pará sob a responsabilidade da Secretaria Estadual de Pesca e Aquicultura. Em seguida, também nos deteremos na análise da política estadual e relacionar com a gestão da pesca das coletividades locais de pescadores/pescadoras artesanais do Nordeste Paraense, com ênfase nas comunidades pesqueiras trabalhadas nesta pesquisa.

27 Ver PARÁ, G. E. do. Zoneamento Ecológico-Econômico das Zonas Leste e Calha Norte do Estado do Pará:

Belém, Núcleo de Gerenciamento do Programa Pará Rural, 2010. 3v. p. 61-75. Neste documento consta uma tabela intitulada Resumo da Legislação Ambiental e Territorial no Brasil e Normas correlatas.

2.2 A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL DA PESCA E