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“Litoral de Rias” – Nordeste Paraense Possui a maior faixa contínua de manguezais do mundo 12

Fonte: Base de Dados SIPAM (Sistema de Proteção da Amazônia), 2007. Adaptado por Abreu, 2010. A influência das correntes oceânicas de superfície e do sistema de dispersão do Amazonas (figura 2) favorece a ocorrência de processos atmosféricos e hidrodinâmicos que contribuem para o desenvolvimento de ecossistemas complexos, como são os manguezais encontrados ao longo de toda a linha de costa. Em nível mundial, “(...) o Brasil é o segundo país em extensão de áreas de manguezal com 13.400 Km², ficando atrás apenas da Indonésia com 42.550 km²”. (SPALDING et. al., Apud PROST et. al., 2005, p. 7).

Prost et. al. (2005, p. 7) nos esclarece que o sistema de dispersão da carga hidro- sedimentar do rio Amazonas e de seus mecanismos de funcionamento atua

(...) como o grande elemento divisor, onde, de um lado tem-se o litoral paraense (e parte do maranhense) caracterizado por uma linha de costa extremamente recortada com estuários e restingas e, de outro, as costas do Amapá, Guiana Francesa e Suriname, que têm uma dinâmica costeira totalmente diferente.

12 Ver MENEZES, M. P. M. de; Mehlig, U. Manguezais: As florestas da Amazônia costeira. Ciência Hoje.

Vol. 44. Nº 264. Outubro de 2009.

Os autores delimitaram, a título para melhor compreensão desse processo expresso na figura 2, os macrocenários geomorfológicos da costa amazônica.

Figura 2: Macrocenários geomorfológicos da costa amazônica: a leste da foz do rio Amazonas, o sistema de reentrâncias paraense-maranhense; a oeste, a costa do Amapá, sob forte influência do sistema de dispersão do rio Amazonas, representado pela imensa pluma túrbida (em marrom).

Crédito: Jacques Descloitres, MODIS Land Rapid Response Team, - NASA/ GSFC - Data de Aquisição - 06/10/2002.

Fonte: Prost et. al., 2005. p. 8.

O estuário do rio Marapanim, localizado nessa porção da costa nordeste do litoral paraense, é diretamente influenciado pelas condições físicas acima descritas por apresentar sua foz em livre conexão com o mar aberto. Essas condições físicas ou naturais permitem que se desenvolvam inúmeras espécies de animais e vegetais que se reproduzem em quantidades suficientes para a manutenção e funcionamento dos ecossistemas como os manguezais.

Os manguezais da costa litorânea paraense ocupam uma área que corresponde a 2.177Km2e se estendem por uma longa faixa contínua e adentram os estuários, como é o caso do estuário do rio Marapanim. Configurados espacialmente ao longo da linha de costa desde o estado do Amapá até o Maranhão, “(...) perfazem um dos maiores, se não o maior, conjunto de manguezais do planeta, o que denota a este espaço litorâneo uma riqueza significativa em recursos naturais” (SOUZA FILHO Apud PROST et. al., 2005, p. 8). Esta é uma razão

fundamental que serve para explicar o potencial da pesca artesanal nas regiões de águas interiores conhecidas como flúvio-estuarinas.

Prost et. al. (2005, p. 80) mostraram, através de cenas de satélite em seus estudos sobre os manguezais e estuários da costa paraense em Marapanim, o estado atual de conservação e de seu comportamento natural, cuja área de abrangência mede cerca de 130 Km² aproximadamente, os quais “(...) são bem desenvolvidos e densos no funil estuarino e setor misto do estuário, estreitando-se à montante da localidade de São Vicente, passando a manguezais senis, até serem sucedidos por vegetação de várzea”.

A cidade-sede de Marapanim é toda cercada por florestas de manguezais. A presença da vegetação original de mangue vermelho (Rizophora mangle) é entrecortada por pequenos canais que dão acesso a pequenos portos localizados ao fundo das residências. O mangue siriúba (Avicennia s.p) forma uma segunda linha atrás do mangue A figura 3 ilustra a presença de vegetação de mangue no quintal das residências na cidade-sede.

Figura 3: Fotos (A), (B), (C), (D) e (E) – Vista horizontal de uma área com a presença da vegetação original de mangue vermelho (Rizophora mangle) e mangue siriúba (Avicennia s.p) no período de enchente pela manhã (10:45 h) e de maré alta à tarde (14:30h).

(A) (B) (C)

(D) (E)

Foto: Walber Abreu (2003).

Segundo o ex-Secretário de Saúde Municipal Sr. Raimundo Rosenildo França da Silva, a cidade de Marapanim é cercada por “braços” do rio Marapanim, bem como pelo próprio rio. Possui áreas de manguezais em potencial, especialmente nos trechos onde correm os “braços” do rio Marapanim denominados Igarapé do Arco (originalmente chamado de Furo do Pajé) e Furo do Seco, onde muitas famílias residem às proximidades.

Em depoimento expresso no documento13 expedido pelo Setor de Saneamento, é destacada a importância dos manguezais nas áreas adjacentes da cidade-sede municipal na vida dos moradores, que não raro dependem dos recursos naturais existentes.

Muitos moradores de Marapanim se beneficiam das áreas de manguezais, de onde capturam caranguejos e outros mariscos, bem como de peixes que são pescados nessas áreas. Nas proximidades dos manguezais residem 129 famílias (algumas em prédios com palafitas) com uma população de aproximadamente 710 pessoas. (...). Obviamente, que a maioria das casas não possui instalações sanitárias adequadas, com isso, fazem suas necessidades fisiológicas na mesma área em que se encontram colocando em sérios riscos a saúde dos próprios moradores, visto que nas enchentes a água é afetada (ou contaminada) pelos resíduos fecais, os quais se espalham por todo o trecho do manguezal, o que gera doenças ou epidemias como o cólera, determinados tipos de parasitoses, infecção intestinal e outros problemas sérios de saúde (SESMA-MARAPANIM, O Ofício Nº 575/02).

A pesca artesanal, por sua vez, é uma das atividades econômicas mais tradicionais da Amazônia, que se destaca no litoral mesorregional do Nordeste Paraense, e desempenha um importante papel socioeconômico na vida de várias comunidades locais na oferta de alimento, ocupação de mão-de-obra e geração de renda.

Todavia, na microrregião do Salgado Paraense, esta atividade não tem sido notada por sua tradição, nem tampouco por sua valoração – no sentido amplo do termo – pelos planejadores do Estado que, insistentemente, ao desenvolverem suas ações e programas, não leva em consideração a realidade de diferentes sujeitos em sua infinita relação com o meio aquático e seus recursos, que se reproduzem em diferentes escalas geográficas. Sua importância, em nosso entendimento, implica considerar a pesca artesanal a partir da compreensão da noção de território e de sua dimensão espacial – gestão do território – segundo a perspectiva geográfica adotada neste trabalho apontada por Haesbaert (2007).

Essa abordagem territorial, como já exposto anteriormente, permite dimensionar a gestão da pesca em coletividades locais a partir das múltiplas territorialidades existentes e dos múltiplos usos do território. Isto revela uma possibilidade concreta de se pensar o ordenamento territorial da pesca artesanal no Brasil como política pública de estado tendo por base a gestão compartilhada, participativa e descentralizada junto às coletividades locais de pescadores/pescadoras artesanais no processo de sua construção.

13 O Ofício Nº 575/02/SESMA foi encaminhado pela Secretaria de Saúde Municipal em 10.12.2002 com o

objetivo de informar as condições de vida das populações tradicionais que sobrevivem das áreas de manguezais na sede municipal de Marapanim, cujos resultados da pesquisa foram elaborados pelo responsável do setor de Saneamento, Sr. João de Jesus Raiol Barata (em anexo).

Assim, a escolha do tema proposto se deu a partir da necessidade de por em evidência a pesca artesanal praticada por diferentes sujeitos ou coletividades de pescadores/pescadoras no Nordeste Paraense, em particular, no município de Marapanim e dos arranjos coletivos por eles produzidos na constituição de suas territorialidades, sendo responsáveis pela gestão da pesca em sua dimensão territorial. Por outro lado, mostrar que a forma de tratamento dispensada no âmbito do sistema de governança adotado pelo Estado junto a essas coletividades locais, ainda não mostraram devidamente a que se propõe realizar de acordo com a pactuação do princípio federativo.

Portanto, o presente trabalho compreende a necessidade de se estudar o território e a gestão da pesca em coletividades locais de pescadores/pescadoras artesanais no Nordeste Paraense: estudo de caso no município de Marapanim-PA numa perspectiva geográfica relacional e integrada da abordagem territorial.

1.4 APRESENTANDO A ÁREA DE ESTUDO

O município de Marapanim-PA está localizado na mesorregião do Nordeste Paraense (Mapa 2) compondo, juntamente com outros municípios, a microrregião do Salgado. Esta compreende a porção litorânea do Pará, sendo uma área banhada por águas salobras que se estende da baía do Marajó à foz do Rio Gurupi (CARDOSO Apud BRITO; QUEIROZ, 2004, p. 23). Apresenta um conjunto de municípios ligados tradicionalmente a atividade da pesca artesanal. No caso particular, do município de Marapanim, tal atividade carrega uma forte tradição de base familiar e intergeracional14.

14 Termo empregado por Torres (2002) ao se referir ao modo de vida das comunidades pesqueiras que constroem

as redes sociais a partir da inter- relação que há entre as famílias de pescadores, a exemplo da vila de Abade em Curuçá- PA.

Mapa 2: Localização geográfica do município de Marapanim-PA na microrregião do Salgado –