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Uso social dos Recursos Naturais por Coletividades Locais de Pescadores/Pescadoras Artesanais da Vila de Guarajubal e Vista Alegre, do Município de Marapanim-PA.

O mapa de uso social mostra exatamente os “Territórios de Pesca” de base comunitária onde os pescadores/pescadoras artesanais de Marapanim, em particular, da Vila de Guarajubal e de Vista Alegre realizam suas práticas espaciais coletivas ligadas à cultura e seus gêneros de vida.

Observe na Figura 31 o diagrama que trata do ciclo de reprodução das relações capitalistas de produção da pesca artesanal. Nele está presente cada uma das etapas que compõem a reprodução do capital. Não se trata de uma acumulação primitiva do capital, mas sim de um processo que se manifesta como reprodução da lógica global.

Figura 31: Circuitos Espaciais da Produção Pesqueira em Guarajubal e Vista Alegre

Fonte: Pesquisa de Campo. Elaborado pelo Autor, 2010.

Maciel (2009, p. 104) explica esse processo, tomando por base as ideias de Santos (2002), afirmando que:

Dentro da lógica global, a tendência à compartimentação e fragmentação do espaço faz com que haja, paradoxalmente, um choque e uma associação do movimento da sociedade planetária, com o movimento particular das frações, regional ou local da sociedade nacional.

Nesse sentido, importa dizer que as relações projetadas no mundo das finanças globais mantêm uma estreita relação com aquilo que se reproduz espacialmente nos lugares, na medida em que a lógica que prevalece é a da reprodução do capital em diferentes escalas. Portanto, não há como negar que a atividade pesqueira está inserida nesse processo. Embora,

apresente sua lógica própria, não deixa de ser influenciada por esta que se realiza numa escala mais ampla.

A condição de reprodução da lógica global se baseia na dinâmica espacial do modo capitalista de produção, que é por sua natureza, desigual e combinado. O arranjo econômico e produtivo do território traduz-se, assim, no espaço das verticalidades e horizontalidades. Estes são os novos recortes do território.

Segundo Santos58,

O território, hoje, pode ser formado de lugares contíguos e de lugares em rede. São, todavia, os mesmos lugares que formam as redes e que formam o espaço banal. São os mesmos lugares, os mesmos pontos, mas contendo simultaneamente funcionalizações diferentes, quiçá divergentes ou opostas. (...) A tendência atual é que os lugares se unam verticalmente e tudo é feito para isso, em toda parte. Créditos internacionais são postos à disposição dos países mais pobres para permitir que as redes se estabeleçam ao serviço do grande capital. Mas os lugares também podem unir-se horizontalmente, reconstruindo aquela base de vida comum susceptível de criar normas locais, normas regionais... (SANTOS, 2005, pp. 139; 143).

Assim, é preciso dizer que a natureza das relações sociais que movem as coletividades locais nessa dialética no/do território (SANTOS, 2005, p. 141) permite que se entenda a dimensão humana e territorial da pesca artesanal enquanto fundamentos estruturantes do espaço banal59.

Esta mesma lógica capitalista é também responsável pela alienação60 do trabalho coletivo, no caso trata-se dos pescadores/pescadoras artesanais, uma vez que aceitam passivamente as condições que lhe são impostas nas negociações propostas pelos comerciantes, marreteiros e atravessadores. Todavia, essa relação não substitui a natureza do trabalho familiar e da produção comunitária que é predominante ainda nos lugares, mesmo que não possamos dizer em que medida, grau ou proporção.

58 Santos (2005, p. 142) resgata a noção de espaço banal, elaborada por François Perroux e testada no Brasil por

Jacques Boudeville, ao trabalhar os novos recortes do território (verticalidades e horizontalidades). Explica o autor que “a noção de espaço banal refere-se ao espaço de todos, isto é, o território de todos, frequentemente contido nos limites do trabalho de todos”.

59 Ver explicação no rodapé 58 acima.

60 A alienação do trabalho é explicada por Karl Marx, em sua obra “O Capital” quando trata da reprodução

ampliada do capital a partir da lógica capitalista de produção. Marx se reportando as relações entre empregador- trabalhador segundo o modo de produção capitalista dizia que a relação é sempre desigual e contraditória, pois o empregador ao se apropriar do tempo de trabalho dispensado a mais para executar a tarefa com vistas a aumentar a produção e o lucro domestica o ser humano a trabalhar seguindo o ritmo da produção. Este processo Marx denominou de mais-valia absoluta. Com a intensificação dos processos tecnológicos, a produção aumentou em menor tempo de produção de forma mais acelerada. A esse processo chamou de mais-valia relativa. No bojo dessas relações o homem não se dá conta da exploração do seu trabalho, e em troca recebe um salário, o que o leva a omissão e a complacência. Logo, torna-se um ser alienado, consumando assim, a alienação do trabalho.

Entendido esse processo, passamos agora para a materialização das relações econômicas e comerciais que se dão no interior das coletividades locais de pescadores/pescadoras de Guarajubal e Vista Alegre.

Para fins de análise dessa questão elaboramos uma tabela onde estão discriminados os atores sociais responsáveis pelo funcionamento da dinâmica comercial da produção da pesca artesanal nas respectivas comunidades.

Tabela 13: Rede de Comercialização da Produção da Pesca Artesanal na Vila de Guarajubal e Vista Alegre, Marapanim-PA

PESCADOR ARTESANAL MARRETEIRO ATRAVESSADOR

PA 1 M1 AT 1

PA 2 M2 AT 2

PA 3 _________________ AT 3

PA 4 _________________ _________________

PA - Pescador Artesanal; M – Marreteiro AT - Atravessador

Fonte: Pesquisa de Campo, 2010.

O processo de comercialização da pesca artesanal nas respectivas comunidades se realiza a partir das condições materiais existentes sobre o território. De acordo com as potencialidades naturais dispostas sobre a superfície terrestre e aquática associada ao capital social do lugar é possível antever as possibilidades de realização da produção.

Em geral, a rede de comercialização da produção não difere muito daquela que é praticada no conjunto dos municípios da “zona do salgado”, particularmente, a rede comercial que envolve a produção artesanal para consumo local e para fins comerciais, a qual se realiza mediante acordos que são apalavrados de forma improvisada e destituída quase sempre de uma documentação que possa comprovar a venda ou comercialização do produto.

A relação econômica estabelecida entre os pescadores e seus compradores é, quase sempre, determinada pela quantidade e o tipo de pescado capturado. Quando, não raro, é determinada por seus compradores em função do fornecimento ou a troca de produtos ou mercadorias, até mesmo empréstimos financeiros com quantias que variam em valor e tempo de pagamento, equivalentes a certos valores quantitativos que deverão ser compensados pela pescaria, pelo fato de que muitos pescadores artesanais não dispõem dos meios necessários para praticar a pescaria.

Por exemplo: para realizar uma boa pesca61, no mínimo, um pescador necessita de 30 litros de gasolina, 02 sacas de gelo, geladeira de isopor e o rancho contendo um pacote de bolacha, café preto na garrafa térmica, um kg de farinha, além de acessórios como lanterna, linhas de anzóis de reserva, etc.

A realização do processo de comercialização do pescado e do Caranguejo-Uçá (Ucides

Cordatus) em ambas as comunidades se dá a partir do momento em que o pescador/pescadora artesanal se movimenta em direção as áreas de produção. No caso do pescado são áreas de praia (pesqueiros) e os pontos de pesca (canais de maré, furos, rios). Na extração e coleta de caranguejo, são as áreas de manguezais que concentram toda a produção. Nesse caso, é possível observar no mapa de uso dos recursos naturais a riqueza natural disponível nos ecossistemas que fazem parte da vida cotidiana das coletividades locais de pescadores/pescadoras em Marapanim.

Devemos considerar a contento os calendários de pesca, os quais são de suma importância na realização do processo de comercialização. Os calendários de pesca são adotados pelos pescadores/pescadoras de Guarajubal e Vista Alegre como parte integrante de suas atividades cotidianas, os quais se relacionam aos ciclos da maré e da lua, pois a prática da pesca é literalmente influenciada por esses ciclos naturais.

No período de safra e do pescado e do Caranguejo-Uçá (Ucides Cordatus), os pescadores seguem a risca esses instrumentos, pois sem eles o resultado nunca acontece como se espera. Podem ocorrer perdas irreparáveis em suas formas de viver e de trabalhar.

Observando o Mapa 6, de fluxo da pesca artesanal em Marapanim é possível dimensionar a territorialidade da pesca e de pescadores/pescadoras artesanais da Vila de Guarajubal e Vista Alegre.

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Depoimento do pescador Vandiquinho – Morador da vila de Vista Alegre.