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dejaneiro de 1888: É maravilhoso sentir que se é de alguma utilidade no

No documento A HISTÓRIA DA MINHA VIDA (páginas 161-164)

e Joseph Jefferson em

ESCREVENDO O LIVRO

12 dejaneiro de 1888: É maravilhoso sentir que se é de alguma utilidade no

mundo, que se é necessária a alguém. A dependência de Helen de mim para quase tudo me deixa forte e contente.

A semana do Natal foi muito agitada aqui. Helen foi convidada para todos os divertimentos das crianças e eu a levo a tantos quanto posso. Quero que conheça crianças e esteja com elas o máximo possível. Várias meninas aprenderam a soletrar com os seus dedos e estão muito orgulhosas da realização. Nosso garotinho, de uns sete anos, foi convencido a aprender as letras e soletrou o nome de Helen.

Ela ficou encantada, mostrando sua alegria abraçando-o e beijando-o, para embaraço dele.

No sábado, as crianças da escola tiveram sua árvore e eu levei Helen. Era a primeira árvore de Natal que já vira na vida e ela ficou intrigada, fazendo muitas perguntas.

"Quem fez árvore crescer na casa? Por quê? Quem pôs muitas coisas na árvore?" Ela objetou à miscelânea de frutas na árvore e começou a removê-las, evidentemente pensando que eram todas destinadas a ela. Contudo, não foi difícil fazê-la entender que havia um presente para cada criança e, para seu encantamento, foi-lhe permitido entregar os presentes das crianças. Havia vários presentes para ela. Helen os colocou numa cadeira, resistindo a todas as tentações de ver o que eram até que todas as crianças tivessem recebido os seus. Uma meninazinha recebeu menos presentes que o resto e Helen insistiu em dividir seus presentes com ela. Foi muito doce ver o ávido interesse das crianças em Helen e a facilidade com que se prontificavam a agradá-la. Os exercícios começaram às nove e deu uma hora antes que pudéssemos ir embora. Meus dedos e minha cabeça doíam, mas Helen estava tão viçosa e cheia de animação como quando saímos de casa.

Depois do jantar começou a nevar e tivemos uma animada brincadeira e uma aula interessante sobre a neve. Na manhã de domingo o solo estava coberto e Helen, os filhos da cozinheira e eu brincamos com bolas de neve. Ao meio-dia a neve havia sumido. Foi a primeira neve que vi aqui e isso me fez ter saudade de minha casa. A estação do Natal forneceu muitas aulas e acrescentou um monte de novas palavras ao vocabulário de Helen.

Durante semanas não fizemos nada exceto conversar, ler e contar histórias sobre o Natal uma à outra. Claro que não tento explicar todas as palavras novas, nem Helen entende totalmente as historinhas que lhe conto; mas a repetição constante fixa as palavras e frases em sua mente, e pouco a pouco o significado virá a ela. Não vejo nenhum sentido em conversa "de mentira"para ensinar a linguagem. É estúpido e destituído de vitalidade para aluno e professor. A conversa deve ser natural e ter como objetivo uma troca de idéias. Se não há nada na mente da criança para ser comunicado, dificilmente vale a pena pedir-lhe para escrever no quadro-negro ou soletrar nos dedos frases cortadas ou secas sobre "o gato", "o pássaro", "um cachorro". Desde o início venho tentando falar naturalmente com Helen e ensiná-la a me contar apenas coisas que lhe interessam e perguntar apenas para descobrir o que quer saber. Quando vejo que está ansiosa para me contar algo, mas travada por não conhecer as palavras, eu as forneço, do mesmo modo que as expressões idiomáticas necessárias, e nos damos muito bem assim. A avidez e o interesse da criança a fazem transpor muitos obstáculos que seriam a nossa ruína se parássemos para definir e explicar tudo. O que acha que aconteceria se alguém tentasse medir nossa inteligência pela capacidade de definir as palavras mais comuns que usamos? Temo que, se me fizessem esse teste, eu seria confinada à classe mais elementar numa escola para deficientes mentais.

Foi tocante e lindo ver Helen usufruir de seu primeiro Natal. Ela pendurou sua meia - duas, é claro, para o caso de Papai Noel esquecer uma - e ficou acordada por muito tempo, levantando duas ou três vezes para ver se algo tinha acontecido. Quando eu lhe disse que Papai Noel só viria quando ela estivesse dormindo, fechou os olhos e disse: "Ele vai pensar que menina está dormindo". Ela acordou de manhã assim que pôde e correu para a lareira à procura da meia; quando descobriu que Papai Noel enchera as duas, dançou por um minuto e então ficou muito quieta e veio me perguntar se eu achava que Papai Noel tinha cometido um engano pensando que havia duas meninas, e se voltaria para levar de volta os presentes quando descobrisse seu engano. O anel que você lhe enviou estava no dedo da meia, e quando eu lhe disse que você o dera para Papai Noel lhe entregar, ela disse: "Adoro a sra. Hopkins". Ela ganhou um baú com roupas para Nancy e seu comentário foi: "Agora Nancy vai à festa". Quando viu a lousa de braile e papel, disse: "Vou escrever muitas cartas e agradecer Papai Noel muito". Era evidente que todos, especialmente o capitão Keller e

a sra. Keller, estavam profundamente comovidos ante a idéia da diferença entre este animado Natal e o Natal passado, quando a filhinha deles não participou conscientemente das festas natalinas. Quando descemos, a sra. Keller me disse com lágrimas nos olhos: "Srta. Annie, agradeço a Deus todos os dias de minha vida por enviá-la; mas nunca percebi até esta manhã que bênção a senhorita tem sido para nós". O capitão Keller pegou minha mão, mas não conseguiu falar.

Seu silêncio porém foi mais eloqüente do que as palavras. Meu coração também estava cheio de gratidão e solene alegria.

No outro dia, Helen deparou-se com a palavra avô numa historiazinha e perguntou à mãe: "Onde está avô?", referindo-se a seu avô. A sra. Keller respondeu: "Ele morreu".

"Papai atirou nele?", perguntou Helen e acrescentou: "Eu vou comer avô no jantar". Até então, seu único conhecimento da morte estava vinculado a coisas para comer. Ela sabe que o pai atira em perdizes, cervos e outras caças.

Esta manhã ela me perguntou o significado de "carpinteiro" e a pergunta forneceu o texto para a aula do dia.

Após falar sobre as várias coisas que os carpinteiros fazem, ela perguntou: "Carpinteiro me fez?", e antes que eu pudesse responder, ela soletrou rapidamente: "Não, não, fotógrafo me fez em Sheffield".

Uma grande fornalha de ferro foi construída em Sheffield e fomos até lá na outra noite para vê-la dar uma "rodada". Helen sentiu o calor e perguntou: "O sol caiu?".

9 de janeiro de 1888: O relatório chegou na noite passada. Agradeço as palavras amáveis do sr. Anagnos sobre Helen e eu, mas seu modo extravagante de dizê-las me atinge do modo errado.

Os simples fatos seriam muito mais convincentes! Por exemplo, por que ele se dá ao trabalho de me atribuir motivos com os quais nunca sonhei? Você sabe, ele sabe, e eu sei que meu motivo em vir para cá não foi de modo nenhum filantrópico. Como é ridículo dizer que eu tinha bebido tão copiosamente do nobre espírito do dr. Howe, que fui tomada pelo desejo de resgatar da escuridão e obscuridade a garotinha do Alabama! Vim para cá simplesmente porque as circunstâncias tornaram necessário

que eu ganhasse a vida e peguei a primeira oportunidade que se ofereceu, embora eu não suspeitasse, nem ele, que eu tivesse qualquer habilidade especial para o trabalho.

No documento A HISTÓRIA DA MINHA VIDA (páginas 161-164)