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CAPÍTULO 3 POLÍTICAS PÚBLICAS NO NÍVEL MUNICIPAL DE GOVERNO

3.3 Delimitação da pesquisa

Esta é uma pesquisa qualitativa, sem intenção de generalização ou de representação. A pesquisa qualitativa, segundo Vieira (2006), “atribui importância fundamental à descrição detalhada dos fenômenos e dos elementos que o envolvem, aos depoimentos dos atores sociais envolvidos, aos discursos, aos significados e aos contextos” (p. 15). Outra característica deste estudo é o caráter exploratório, por se tratar de tema ainda pouco estudado. Conforme apresentado no item 3.1 deste capítulo, não foram encontrados estudos sobre políticas municipais de leitura ou análises aprofundadas da atual política nacional de leitura. Pesquisas exploratórias, de acordo com Antônio Carlos Gil:

(...) são desenvolvidas com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. Esse tipo de pesquisa é realizado especialmente quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele formular hipóteses precisas e operacionalizáveis (GIL, 1987, p. 45).

A pesquisa baseou-se na revisão da literatura sobre incentivo à leitura e sobre políticas públicas no Brasil desde a década de 1930 até o presente momento, enfatizando o período após a redemocratização, e em dados secundários sobre leitura e alfabetismo (INAF; Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil; INEP/MEC; IBGE). Para a análise sobre a incorporação do tema do incentivo à leitura pelas políticas municipais, recorreu-se à literatura sobre formação de agenda. A identificação dos atores envolvidos, por sua vez, dialoga sobretudo com os estudos sobre redemocratização e redefinição do ciclo de políticas públicas no Brasil pós-88.

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Para se obter uma visão mais detalhada a respeito das práticas locais de promoção da leitura, foi realizado um estudo de caso sobre um município que desenvolveu um conjunto de ações articuladas para o fomento à leitura.

Havia se cogitado a possibilidade de fazer um levantamento de dados por meio de questionários enviados aos municípios cadastrados no Mapa de Ações do PNLL. No entanto, com base nas sugestões da banca de qualificação, optou-se por desenvolver um estudo de caso. Considerou-se que, dentro do tempo disponível para o mestrado, seria mais viável desenvolver a análise de uma experiência de forma mais aprofundada, do que uma pesquisa com um grande número de municípios. Considerou-se, ainda, que o banco de dados do PNLL é um registro voluntário e não exaustivo, que ainda não foi avaliado, nem passou por algum mecanismo de verificação de seu conteúdo.

Por falta de dados sistematizados sobre a ação de governos municipais na área da leitura, optou-se por selecionar o município a ser estudado a partir de entrevistas presenciais semi-estruturadas com especialistas e gestores públicos da área, conforme o quadro 3 a seguir.

Quadro 3 – Especialistas entrevistados9 para seleção do estudo de caso

Nome Atividade Data da Entrevista

Edmir Perrotti Professor de Ciência da Informação da ECA-USP 13/09/2010 Elizabeth D’Angelo Serra

Secretária Geral da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil desde 1989 até o momento e atual Presidente do Conselho Deliberativo do PROLER

29/09/2010 Ira Maciel Coordenadora Nacional do PROLER desde 2009 até o

momento 29/09/2010

Luciana do Vale Assessora Técnica do PNLL desde 2006 até o momento 08/10/2010 Zoara Faila Gerente Executiva de Projetos do Instituto Pró-Livro desde

2007 até o momento 20/09/2010

Fonte: elaborado pela autora.

Tais entrevistas foram importantes, não apenas para a seleção do estudo de caso, mas também para a própria reconstituição das políticas públicas de fomento à leitura promovidas pelo governo federal nos últimos 20 anos.

Como critérios de seleção para o estudo de caso procurou-se selecionar um município de médio porte, onde seria mais fácil perceber o impacto da política e de mapear a rede de atores envolvidos do que em uma cidade com mais de um milhão de habitantes. Procurou-se também um município que tivesse uma política de leitura em andamento há mais

9Agradeço à Profª Eliana Yunes da Cátedra UNESCO de Leitura da PUC-Rio pelas excelentes e fundamentais indicações bibliográficas.

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de quatro anos, para se verificar os efeitos de uma mudança de gestão da administração municipal, e ainda que a política ainda estivesse em funcionamento.

Com base nesses critérios de seleção e nas indicações recebidas dos especialistas entrevistados, foi selecionado o município de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul. Este é um município de porte médio, com cerca de 400 mil habitantes, e foi o único citado por mais de um entrevistado. Foi indicado pela Coordenadora Nacional do PROLER como um dos municípios que participa há mais tempo do programa e um dos mais atuantes. O município também foi destacado pela Assessora Técnica do PNLL como um dos poucos cadastrados em seu banco de dados que efetivamente desenvolve uma política articulada de incentivo à leitura, não apenas projetos isolados. Caxias do Sul também foi citada na entrevista com a Gerente de Projetos do Instituto Pró-Livro. De fato, como será visto mais adiante, a administração municipal de Caxias do Sul vem promovendo a leitura de forma sistemática e articulada desde 2005.

Outros municípios considerados para a pesquisa de campo foram, por exemplo, Ribeirão Preto (SP), pois foi o primeiro município brasileiro a criar uma lei do livro. No entanto, a política municipal de leitura havia sido descontinuada com a saída do Secretário Municipal de Cultura. Curitiba (PR) e Recife (PE) não foram selecionadas por serem cidades grandes e por encontrarem problemas de descontinuidade da política. Já o município de São Bernardo do Campo (SP) possui excelente sistema de bibliotecas, mas poucas ações de incentivo à leitura em outros espaços da cidade.

Em Caxias do Sul, as entrevistas semi-estruturadas foram realizadas pessoalmente com os principais agentes envolvidos com a formulação e a implementação da política municipal de leitura, em duas visitas nos meses de novembro e dezembro de 2010. Os sete entrevistados e suas funções são descritos no quadro 4.

Quadro 4 – Entrevistados em Caxias do Sul

Nome Atividade Data da Entrevista

Antônio Roque Feldmann Atual Secretário Municipal da Cultura 9/11/2010 e 16/12/2010 José Clemente Pozenato

Secretário Municipal da Cultura em 2005/2006, responsável pela criação do Programa Permanente de Estímulo à Leitura

11/11/2010 Lisana Bertussi Professora do Mestrado em Letras, Cultura e

Regionalidade da Universidade de Caxias do Sul 9/11/2010 Luiza Helena Darsie da

Motta

Diretora do Programa Permanente de Estímulo à Leitura

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Maria Cristina Tiburi Pisoni Diretora Administrativa e Cultural da Biblioteca Pública Dr.

Demétrio Niederauer de 2007 até o momento 15/12/2010 Michele Gindre Fontanella Atual Coordenadora do Programa Primeira Infância

Melhor em Caxias do Sul 10/11/2010

Sandra Andreola Atual Coordenadora da Biblioteca da Secretaria Municipal

de Educação 10/11/2010

Fonte: elaborado pela autora.

A pesquisa também se apoiou na análise documental de leis, projetos e outros documentos relacionados ao município estudado.

A ação pública municipal de Caxias do Sul foi investigada a partir das teorias de políticas públicas sobre formação da agenda governamental apresentadas no Capítulo 2, e tomando como referência os parâmetros do PNLL para a elaboração de planos municipais de leitura. O quadro 5 apresenta as principais questões investigadas no estudo de caso.

Quadro 5 - Variáveis e indicadores para análise das políticas municipais de leitura

Variável Indicador

Formação da agenda governamental

Fluxo de problemas

- problemas que estavam sendo considerados na área de educação e cultura no ano em que o município decidiu desenvolver ações de incentivo à leitura;

- indicadores de educação e cultura (especialmente sobre leitura);

- existência de algum tipo de diagnóstico da realidade local ou pesquisa em outras regiões;

- arenas onde o problema foi discutido; - existência de eventos-foco;

- feedback de ações já realizadas ou em andamento.

Fluxo da política pública

- argumentos apresentados para justificar a atenção para o incentivo à leitura ao invés de outras questões relacionadas a educação e cultura;

- alternativas consideradas;

- espaços públicos onde o problema social foi debatido;

- menção das discussões sobre o problema em artigos de jornais e revistas locais; - existência de arcabouço legal dispondo sobre os programas e projetos de leitura. Fluxo político - proximidade ou não das eleições teve influência no tratamento do problema;

- existência de forças políticas organizadas ou mudanças de governo. Participantes

- atores responsáveis pela formulação dos projetos de leitura ou chamaram a atenção para o problema;

- participação de universidades e de algum movimento ou organização da sociedade civil da área da leitura/educação.

Parâmetros do PNLL para os planos municipais Continuidade - sobrevivência do programa à troca de administração;

Participação da sociedade civil

- realização de consulta à população em alguma etapa do processo (ex. formulação, implementação, avaliação);

- existência de parcerias com organizações comunitárias ou não governamentais em alguma etapa do processo (ex. formulação, implementação, avaliação);

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Articulação intersetorial

- participação de mais de um órgão governamental; - estruturas administrativas envolvidas;

Articulação

intergovernamental

- participação nos programas federais como PROLER e PNLL; - participação em programas estaduais de leitura.

CAPÍTULO 4 - A POLÍTICA DE FOMENTO À LEITURA DO MUNICÍPIO