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Observa-se nas falas dos entrevistados que a condicionalidade da educação para permanecer no PBF era algo conhecido por todos, inclusive pelos filhos e responsáveis. Cabe ressaltar, que as condicionalidades, referem-se aos compromissos firmados pelas famílias beneficiárias, no que diz respeito às áreas da saúde e da educação (BRANDÃO; PEREIRA; DALT, 2013). A seguir destaca-se uma fala que representa o entendimento de uma beneficiária sobre isso:

Levar para o posto e os meninos tem que está na escola. Eu não deixo os meninos faltarem de jeito nenhum na escola. Todo dia tem que ir porque senão perde o Bolsa Família (Maria - Responsável).

É importante ressaltar que quando os pais e/ou responsáveis pensam nas condicionalidades se referem com mais frequência à ida à escola; por vezes, sequer lembram a ida ao posto de saúde. Esse aspecto foi mencionado durante as entrevistas em um único momento. Mas, repete-se com ênfase em relação à escola. Apesar de o PBF ser constituído de três áreas, é a da Educação que se apresenta com maior ênfase, enquanto preocupação dos beneficiários, visto que o não cumprimento desses critérios pode vir a desligar a família do programa. Foi o que notamos na falas das mães entrevistadas.

Bolsa Família é bom porque os meninos sabe que tem que ir pra escola não pode faltar e a gente tem um dinheiro certo. É pouco, mas serve! (Marta - Responsável).

O participante do PBF precisa cumprir uma série de condicionalidades para continuar a receber o benefício: crianças com menos de seis anos precisam ser imunizadas; mulheres grávidas, lactantes e bebês precisam fazer o acompanhamento médico com todos os exames e visitas programados; e crianças e adolescentes precisam estar matriculados e apresentar frequência na escola de 85% e 75% (BRANDÃO, PEREIRA; DALT, 2013).

Quando perguntado a despeito dos benefícios do programa e sua relação com o rendimento escolar, foram expostas as seguintes falas:

Os meninos tão sabendo ler melhor e já sabem fazer conta. Todo ano eles passam (Refere-se à aprovação) (Marta - Responsável).

Ela sempre foi uma menina estudiosa, mas às vezes ela não queria ir não pra escola. Agora ela sabe que se não estudar [ir à escola] a gente perde o bolsa família. Mas ela quer estudar, ela fala que é pra ter um emprego bom (Luzia - Responsável).

Durante as falas, as entrevistadas demonstraram maior preocupação com relação à frequência escolar. Embora assegurassem que o desempenho escolar melhorou, na nossa compreensão, contudo, o auxílio financeiro tem relação direta com a assiduidade. Mas, percebe-se, nas falas das entrevistadas, que os estudantes que frequentam e se dedicam aos estudos pressupõe a obtenção de rendimento escolar positivo.

Com outra fala, outro ponto de vista, demonstra que a visão em relação ao programa e ao rendimento escolar se diferencia entre os entrevistados.

O programa é um parceiro no rendimento escolar, cooperador no rendimento escolar, através do acompanhamento da frequência escolar, quem é o determinante é a escola, isso é papel da escola (Coordenadora municipal do PBF).

Ainda com relação ao rendimento escolar, Castro et al ( 2010, p.165) ressaltam que: Sinaliza-se, portanto, que o objetivo da permanência na escola está sendo atingido, o que remete à perspectiva objetiva da aprovação, progressão escolar e conclusão dos níveis de ensino. [...] Vislumbra-se que essas crianças podem conseguir um percurso educacional regular, com perspectivas concretas de conclusão do ensino fundamental e ingresso no ensino médio, rompendo com ciclos históricos de exclusão educacional da geração de seus pais.

Além de o auxilio financeiro estimular a frequência a escolar, também é perceptível que os alunos que passaram a se alimentar melhor apresentaram maior disposição para a aprendizagem, causando impacto no rendimento escolar, uma vez que, depois de alimentados, apresentam maior disposição para frequentar a escola. Antes, muitos padeciam com a falta de alimento, quadro que se refletia no aprendizado. Tal lacuna foi preenchida pelo PBF.

Ajuda sim [no desempenho escolar] Todo dia eles vão estudar e já tem comido. Tinha vez que eles iam sem tomar café e comiam na escola. Porque não tinha em casa. Eu não vou mentir, tinha dia que não tinha mesmo. Meu marido só recebia de quinze em quinze da usina (Luzia - Responsável). Neste sentido, o auxilio financeiro tem servido de apoio para a nutrição dos estudantes. Tal fato é constatado por Felicetti (2010, p.135):

[...] o PBF auxilia no desempenho escolar de seus filhos, principalmente, pelo fato de que as famílias passaram a comprar mais alimentos o que de certa forma auxilia na aprendizagem, além de ser um estímulo para a criança. [...] a criança estando bem nutrida tende a prestar mais atenção nas aulas e consequentemente ter um melhor desempenho.

Contudo, a assiduidade é mantida em função da obrigatoriedade do cumprimento da frequência escolar; responsabilidade transmitida também ao aluno em troca do benefício.

Ainda explorando a relação do programa com o rendimento escolar, observa-se, a partir da fala abaixo, que:

Cabe à escola fazer as chamadas e saber se está freqüentando [refere-se aos estudantes beneficiários]. A escola tem a responsabilidade de traçar estratégias para os alunos permanecerem estudando para que aconteça a transformação social [através do] rendimento escolar (Coordenadora do PBF).

A relação do PBF com o rendimento escolar é intrínseca em um conjunto de relatividades observadas nas considerações dos entrevistados. Embora as ações cotidianas das famílias e da escola assumam patamares diferentes de responsabilidade, ambas culminam para um processo de parceria, na medida em que assumem e direcionam suas atividades para um único sentido: a aprendizagem do aluno; englobando a educação como suporte estratégico.

Nesse processo, evidenciaram-se lacunas tanto do ponto de vista social quanto educacional. Do ponto de vista social, percebe-se que o interesse das famílias em se manterem em condições de receber o benefício distancia a participação em programa de geração de emprego e renda dos chamados programas complementares, tanto do Governo Federal quanto na esfera municipal.

Em relação às lacunas encontradas na educação, um dos fatos que demonstra fragilidade é a forma como a coleta da frequência escolar é realizada, uma vez que a escola é responsável pelo registro e repasse das informações, que se pressupõe serem passivas de conferência por parte do órgão responsável pelo programa no município.

Em se tratando das ações da escola, visualiza-se que:

No caso da escola pública, reconhece-se que os baixos níveis de escolaridade e renda de sua clientela desestimulam tanto a participação dos pais nas reuniões escolares quanto a adoção de deveres de casa. Agora, porém, o modelo de envolvimento dos pais na escola está sendo assimilado no contexto da atual tendência à descentralização da gestão educacional e melhoria da produtividade e qualidade escolar no sistema de ensino público (CARVALHO, 2000, p.145). Dado o entendimento acerca das mudanças no contexto escolar, a educação ainda é foco de políticas que visam atender às desigualdades que se apresentam. De fato, a educação não pode ser entendida como mercadoria, que pode ser trocada, comprada ou vendida a partir da exploração da miserabilidade da parcela da população vítima de um histórico de exclusão e negação dos seus direitos. Como se faz perceptível, na fala a seguir, quando perguntado sobre o que é feito com o dinheiro recebido através do programa:

Quando eu recebo venho logo pagando a água e a luz. Vou no mercadinho e já compro o que tá faltando de comida e o que sobra eu guardo porque a gente precisa pra comprar um pão e as vez os meninos precisam comprar lápis, borracha caderno e outras coisas pra escola. Acho que [o programa] melhorou [minhas condições financeiras], por que eu até já comprei um fogão e paguei as prestação tudinho. [...] Foi, minha filha, eu guardava todo mês 40 reais pra pagar. Se eu não fizesse isso, tava era cozinhando com carvão e com lenha (Luzia - Responsável).

De fato, em termos econômicos o programa tem tido um impacto significativo do ponto de vista da transformação social em relação à contribuição na melhoria da qualidade de vida. Melhores condições para o preparo dos alimentos pressupõem um avanço social para a família, que sai de uma condição precária para uma situação mais cômoda, em termos de esforço físico.

Consequentemente, o processo de automação dessas famílias fica restrito à quebra do ciclo da pobreza, da independência do recebimento do recurso, que nesta pesquisa, não se evidencia em curto prazo. De acordo com a fala a seguir, na percepção das famílias, a educação é o meio mais provável dessa expectativa se tornar concreta.

Vir para escola é bom. Ela [minha mãe] disse que preciso estudar muito, mas quer que eu estude pra ser alguém na vida. Às vezes [Ela fala do Programa Bolsa Família]. Que se eu faltar na escolar ela perde o Bolsa Família (Edgar - Estudante).

Situando as famílias beneficiárias em relação ao processo educativo, pode-se visualizar que o interesse pela escolarização dos filhos se apresenta em duas situações: pela crença de que é através da escola que se alcança patamares sociais e econômicos melhores e pela necessidade imediata de suprir as necessidades de sobrevivência, garantindo a freqüência escolar.

Outro dado relevante, é que sendo a educação, o caminho visualizado para fins de emancipação humana, a motivação pela qual as famílias beneficiárias inserem seus filhos na escola também está ligada, principalmente, à expectativa de sair da condição de precariedade em que vivem e pretendem que seus filhos exerçam profissões melhores do que as que elas próprias exerceram.

Nessa perspectiva, a garantia do envolvimento das famílias com a escola não está propriamente vinculada à essência da condicionalidade da educação, uma vez dispostas a investir por este viés para atingir a ascensão social, tende a proporcionar aos filhos a educação que elas não tiveram condições de usufruir.