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CAPÍTULO 3 - COMPROMISSO SIGNIFICATIVO

3.1. INSUFICIÊNCIA DA ATUAL PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

3.1.2. DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E DIÁLOGO INSTITUCIONAL

última palavra, é importante que a Justiça, ciente de suas limitações, busque primeiramente fomentar uma deliberação continuada e comprometida.201

Torna-se, portanto, imprescindível a conexão da sociedade com a Administração Pública também pela via judicial. Dessa forma, nas palavras de Anashri Pillay, na tentativa de reconciliar a proteção judicial dos direitos com a legitimidade democrática, muitos estudiosos estão se voltando para formas dialógicas, ou de conversas sociais, de revisão judicial – as quais veem o Judiciário como um ator num diálogo contínuo com outros ramos do governo, assim como com a sociedade civil, a respeito de como proteger melhor os direitos.202

O Poder Judiciário, nessa lógica, seria um dos atores no imprescindível diálogo contínuo entre o Poder Executivo e a sociedade que o mesmo representa. Ademais, há até quem defenda que a participação pública na tomada de decisões do governo é indispensável para o alcance da justiça social. Oliver Fuo defende essa posição ao afirmar que a participação pública no governo local é um requisito indispensável para a perseguição da justiça social pelas autoridades locais.203

Como será melhor estudado mais adiante, mas que já se pode antecipar, o compromisso significativo é uma manifestação do modelo deliberativo que se espera da Justiça.204 Essa fórmula inclusive tem sido aplicada na África do Sul com relativo sucesso.

Vale lembrar que ao mesmo tempo em que a democracia participativa faz com que a sociedade seja ouvida e respeitada, faz também com que a sociedade se torne corresponsável pelas decisões tomadas.

Para Pillay, a linguagem da democracia participativa (de onde o compromisso significativo deriva) carrega a sugestão de que os indivíduos afetados não são apenas participantes na obtenção de soluções viáveis para a entrega de direitos sociais e econômicos, mas também, principalmente, responsáveis pelas falhas na implementação dos projetos sociais e econômicos.205

201 PARDO, David Wilson de Abreu. Judiciário e políticas públicas ambientais: uma proposta de atuação baseada no “compromisso significativo”. Revista de Direito Ambiental, vol. 72/2013, p. 161-210 , Out-Dez/2013, DTR\2013\9303.

202 PILLAY, Anashri. Toward effective social and economic rights adjudication: The role of meaningful engagement. Int'l J. Const. L., vol. 10, n. 3, 732-755, 2012, p. 736.

203 FUO, Oliver Njuh. Public participation in decentralised governments in Africa: Making ambitious constitutional guarantees more responsive. African Human Rights Law Journal, 15, 2015, 167-191, p. 169.

204 PILLAY, Anashri. Toward effective social and economic rights adjudication: The role of meaningful engagement. Int'l J. Const. L., vol. 10, n. 3, 732-755, 2012, p. 749.

205 PILLAY, Anashri. Toward effective social and economic rights adjudication: The role of meaningful engagement. Int'l J. Const. L., vol. 10, n. 3, 732-755, 2012, p. 751.

Daí a importância da necessidade de balizamento pelo Judiciário para o alcance final pretendido, qual seja: a máxima efetivação possível dos direitos fundamentais individuais e coletivos.

Se por um lado a Justiça se contém de decidir diretamente sobre o direito pretendido, por outro lado passa a exercer um poder diferenciado de aproximar as partes e demandar alternativas de conciliação ou, ao menos, aproximação. Pillay afirma que, num entendimento dialógico, espera-se das Cortes o exercício tanto dos poderes comunicativos como coercitivos.206

Liebenberg afirma que um modelo de democracia deliberativa vem a ser o mais promissor para conciliar a tensão entre as normas de direitos humanos universais amplamente formuladas e o valor da participação democrática na resolução das lides.207 Mais adiante arremata que a democracia deliberativa enriquece e aprofunda a democracia representativa, expandindo as oportunidades de participação ativa de pessoas numa ampla gama de processos de tomada de decisão.208

Vê-se, portanto, que o diálogo institucional tem a capacidade de resolver diversos problemas de uma só vez, superando os entraves argumentativos da separação dos poderes, assim como retirando a Administração Pública da inércia. Ademais, acredita-se que a aproximação das instituições já representa um grande avanço, permitindo o diálogo e a convergência de objetivos.

Dissertando sobre o assunto, David Pardo enuncia que

Pelas teorias do diálogo, não deve haver competição ou conflito pela última palavra, mas um diálogo permanente e cooperativo entre as instituições que, por meio de suas singulares expertises e contextos decisórios, são parceiros na busca pelo melhor significado constitucional, estabelecendo uma cadeia de contribuições que ajudam a refinar, com a passagem do tempo, as boas respostas aos dilemas coletivos. Nisso, a separação de poderes envolve circularidade e complementaridade infinitas. O desafio é, então, desenhar um diálogo que maximize a capacidade da democracia de produzir as respostas melhores aos direitos fundamentais, levar a sério o potencial epistêmico da pretendida deliberação interinstitucional, sem desconsiderar a necessidade do estado de direito por decisões estáveis, ainda que provisórias.209

206 PILLAY, Anashri. Toward effective social and economic rights adjudication: The role of meaningful engagement. Int'l J. Const. L., vol. 10, n. 3, 732-755, 2012, p. 737.

207 LIEBENBERG, Sandra. Engaging the paradoxes of the universal and particular in human rights adjudication: The possibilities and pitfalls of 'meaningful engagement'. African Human Rights Law Journal, 12, 1-29, 2012, p. 7.

208 LIEBENBERG, Sandra. Engaging the paradoxes of the universal and particular in human rights adjudication: The possibilities and pitfalls of 'meaningful engagement'. African Human Rights Law Journal, 12, 1-29, 2012, p. 10.

209 PARDO, David Wilson de Abreu. Judiciário e políticas públicas ambientais: uma proposta de atuação baseada no “compromisso significativo”. Revista de Direito Ambiental, vol. 72/2013, p. 161-210 , Out-Dez/2013, DTR\2013\9303.

Importante sempre lembrar que a Força Normativa da Constituição deve conduzir as ações dos Poderes Públicos e que a Vontade de Constituição deve prevalecer sobre as dificuldades ora apresentadas pela Administração.

Muitas vezes o Poder Executivo se mantém inerte sem maiores motivos, devendo ser instado a se movimentar. A sociedade também, com suas demandas infinitas, parece não compreender os limites do Estado.

Assim, nesse cabo de guerra, a corda não deve arrebentar. As exigências pautadas pelos direitos previstos na Constituição não podem se afastar da realidade factível. E o Judiciário, ciente dos limites de ambas as partes, precisa estar consciente da realidade para, daí, conscientizar os litigantes a encontrarem um denominador comum.

Nesse trabalho se busca justamente defender que a intervenção judicial deve estimular a deliberação democrática ao invés de atrapalhá-la. A teoria do direito e a prática da realidade devem andar juntas.

Renato Bernardi e Ana Paula Meda sintetizam bem a questão:

Aprendendo com os próprios erros, as cortes judiciais brasileiras estão descobrindo que não podem resolver o quadro atuando isoladamente, e que de nada adiantará proferirem decisões impossíveis de serem cumpridas. Cortes devem adotar ordens flexíveis e monitorar a sua execução, ao invés de adotar ordens rígidas e se afastar da fase de implementação das medidas. Fica de lado a vetusta ideia de supremacia judicial; as cortes devem abrir e manter o diálogo com as demais instituições em torno das melhores soluções. O ativismo judicial é estrutural, mas pode e deve ser dialógico. A opção de partir para o diálogo institucional promove vantagens democráticas e ganho de efetividade prática de suas decisões, contribuindo realmente para melhoria da situação.210

Assim, a democracia participativa e o diálogo institucional parecem encontrar no compromisso significativo um instituto estruturado capaz de mudar a lógica das decisões, bem como de alterar a realidade da efetivação dos direitos fundamentais – o que leva, ainda, a um outro ponto de assaz importância, qual seja: o novo papel de mediador do Poder Judiciário.

3.2. A NECESSIDADE DE CONCILIAÇÃO E DE ELABORAÇÃO DE UMA NOVA