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Denúncia para habitação do senhorio

No documento Arrendamento: direito substantivo e processual (páginas 158-161)

Capítulo IV – EXTINÇÃO DA RELAÇÃO DE ARRENDAMENTO

67. Denúncia para habitação do senhorio

P. LIMA - A. VARELA, anot. arts. 1096.º-1099.º; P. SOUSA, 85-116; P. FURTADO, 435-464.

Nos termos do art. 1098.º CC, o direito de denúncia para habitação do senhorio depende, em relação a ele, da verificação dos requisitos ex- pressos nas als. a), b) e c) do mesmo artigo.

É preciso, em primeiro lugar, que senhorio seja proprietário, com-

proprietário298 ou usufrutuário do prédio arrendado há mais de 5 anos,

excepto se o prédio tiver sido adquirido por sucessão299. Trata-se de uma exigência fundamental, a qual, dissuadindo eventuais compradores de uma aquisição que só lhes permitiria denunciar o contrato de arrenda- mento decorridos 5 anos, impedirá, na ideia da lei, que o direito de de- núncia para habitação seja exercido com demasiada frequência.

Em segundo lugar, torna-se necessário que o senhorio não tenha,

há mais de um ano, casa própria300 ou tomada de arrendamento na res-

pectiva localidade (ou, em Lisboa e Porto, na área da comarca e suas limítrofes)301, devendo a fórmula da al. b) do n.º 1 do art. 1098.º ser en- tendida nestes termos302. A exigência do decurso do prazo de um ano

298 Parece que o comproprietário que pretenda exercer do direito de denúncia terá

de obter o assentimento dos outros, tanto mais que a faculdade do art. 1096.º, n.º 1, al. a) só pode ser usada pelo senhorio uma vez (art. 1098.º, n.º 1, al. c)). Mas a questão é con- trovertida na doutrina. Em sentido diferente, A. VARELA, anot. ac. S. T. J. de 11.7.1967, Rev.

Leg. Jur., 101, pp. 167, ss.

299 Note-se que a excepção não vale para a doação que pode ter sido feita, justa-

mente, para permitir ao donatário a denúncia do contrato.

300 Ou seja (segundo parece): casa sobre a qual o senhorio tem um direito real (de

propriedade, usufruto, etc.) que lhe dê a possibilidade de utilizar a casa para sua habita- ção. Segundo P. LIMA - A. VARELA, cit., p. 377, a exigência do prazo de um ano respeita apenas à casa arrendada e não à casa própria, mas a letra do preceito é equívoca e a razão da lei (infra, no texto) parece valer igualmente para os dois casos.

301 A diferença de regime tem a sua explicação, naturalmente, nas maiores facilida-

des de transportes existentes na área das duas cidades.

302 É manifesto que a expressão “há mais de um ano” está deslocada, devendo inse-

rir-se no início do texto, a seguir a “não ter”. Um entendimento literal da disposição conduzi- ria ao absurdo do senhorio poder denunciar o contrato, embora tivesse casa arrendada na localidade, desde que o arrendamento durasse há menos de um ano.

também funcionará aqui como elemento dissuasor do senhorio, que tal- vez assim não se disponha a vender o prédio próprio ou a denunciar o contrato do prédio que tomara de arrendamento, sabendo que, caso o fizesse, teria de aguardar um ano para denunciar o contrato do prédio que dera de arrendamento, com fundamento em necessidade do prédio para sua habitação303.

Por último, a al. c) do art. 1098.º requer que o senhorio não tenha

usado ainda da faculdade que o art. 1096.º, al. a) lhe concede304.

Tendo o senhorio diversos prédios arrendados, só poderá denun- ciar o contrato relativamente àquele que, satisfazendo as necessidades de habitação própria e da família, esteja arrendado há menos tempo (art. 1098.º, n.º 2).

Trata-se, quanto a todos os requisitos mencionados, de factos cons-

titutivos do direito de denúncia do senhorio, sendo a este que incumbe,

portanto, o onus probandi dos vários factos referidos nas três alíneas do n.º 1 do art. 1098.º (art. 342.º, n.º 1). Conforme a jurisprudência tem en- tendido, deverá o senhorio, todavia, alegar e provar ainda, e até antes de mais nada (art. 1096.º, al. a)), que necessita do prédio para sua habita- ção305, cumprindo avaliar desta necessidade em face das circunstâncias do caso306. A exigência, que a jurisprudência vem a fazer, de alegação e prova autónomas da necessidade da casa parece-nos plenamente jus- tificada. Não pode pretender-se que a prova da necessidade resulte, im- plicitamente, da prova dos requisitos expressos nas três alíneas do n.º 1

303 Note-se que as hipóteses visadas no texto caem agora, de alguma maneira, no

âmbito do art. 4.º da Lei n.º 55/79, que não permite a denúncia do contrato ao senhorio que tenha criado intencionalmente os requisitos do art. 1098.º CC.

304 O preceito já tem sido objecto de interpretação restritiva no sentido que só proi-

biria ao senhorio usar uma segunda vez da faculdade do art. 1096.º, al. a) relativamente ao mesmo prédio ou na mesma localidade, mas não parece muito claro que semelhantes restrições à letra da lei correspondam ao seu espírito.

305 A necessidade da casa é do próprio senhorio e não dos seus familiares (cfr. art.

1096.º, n.º 1, al. a)),mas não pode deixar de se atender a que aquela necessidade depen- de, naturalmente, do agregado familiar do senhorio que viva em economia comum com ele. O art. 1098.º, n.º 2, segundo o qual a casa há-de satisfazer “às necessidades de habitação própria e da família”, é muito explícito a este respeito.

306 Note-se que, como resulta do art. 1098.º, n.º 2, a necessidade não supõe que

o senhorio não tenha casa: pode o senhorio ter na localidade casa própria ou tomada de arrendamento e, todavia necessitar da casa que deu de arrendamento, dada a manifesta

insuficiência daquela para alojar o seu agregado familiar. Por outro lado, a necessidade

do art. 1098.º, pois é fácil imaginar hipóteses em que estejam verificados esses requisitos mas o senhorio não tenha necessidade do prédio ar- rendado, não se justificando, por isso, que a lei lhe permita recorrer ao remédio excepcional da al. a) do n.º 1 do art. 1096.º CC. Nem se diga que a imposição ao senhorio das obrigações do art. 1099.º, n.º 2 torna dispensável a prova autónoma da necessidade da casa, pois um tal con- trolo a posteriori da necessidade não satisfaria os objectivos da lei. Com- preende-se que a lei organize aqui um controle preventivo, só permitindo a denúncia do contrato quando a efectiva necessidade da casa estiver provada no processo.

Pode o arrendatário, todavia, impedir o exercício do direito de de- núncia do senhorio mediante a alegação e prova de algum dos factos referidos nos arts. 1.º, 2.º e 4.º da Lei n.º 55/79, de 15 de Setembro.

Assim, o senhorio não poderá denunciar o contrato se o arrendatá- rio provar: a) que, tratando-se de fracção autónoma de imóvel constituído em propriedade horizontal, a respectiva escritura foi posterior ao contrato de arrendamento (art. 1.º); b) que tem 65 anos ou mais, ou, independen- temente da idade, está na situação de reforma antecipada por motivo de doença ou invalidez absoluta ou, não beneficiando de pensão de refor- ma, se encontra incapacitado para o trabalho por invalidez (art. 2.º, n.º 1, al. a), na redacção que lhe deu o art. 41.º da Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro); c) que se mantém na unidade predial, há 20 anos ou mais307, na qualidade de arrendatário (art. 2.º, n.º l, al. b))308; d) que a necessidade de habitação invocada pelo senhorio, ou algum dos requisitos previstos no art. 1098.º, n.º 1, foram criados intencionalmente por ele (art. 4.º). Tra- ta-se agora, claro está, de factos impeditivos ou extintivos do direito de denúncia do senhorio e cuja prova pertencerá por isso ao arrendatário (art. 342.º, n.º 2).

A lei impõe ao senhorio denunciante as obrigações expressas no art. 1099.º, n.º 2: o senhorio deverá ir habitar o prédio nos 60 dias seguin-

307 Note-se que, no caso de transmissão do direito de arrendamento ao cônjuge,

por morte ou divórcio, conta-se a seu favor, para efeitos cômputo no prazo de 20 anos, o decurso de tempo de que o transmitente já beneficiasse (art. 2.º, n.º 2).

308 As excepções previstas no art. 2.º, n.º 1 da Lei n.º 55/79 não poderão ser invoca-

das, todavia, perante o senhorio que, sendo já proprietário, comproprietário ou usufrutuário da unidade predial à data de arrendamento, pretenda regressar ou tenha regressado há menos de um ano ao país, depois de ter estado emigrado durante pelo menos dez anos (art. 3.º).

tes à desocupação, não há-de tê-lo devoluto durante mais de 1 ano sem motivo de força maior, e deverá permanecer nele durante pelo menos 3 anos.

O arrendatário tem direito a indemnização correspondente a dois anos e meio de renda (art. 1099.º, n.º 1); caso o senhorio não cumpra as obrigações do n.º 2 do artigo, tem direito a exigir ainda a importância correspondente a dois anos de renda e poderá reocupar o prédio, salva a ocorrência de morte ou deslocação forçada do senhorio não prevista à data do despejo.

68. Denúncia para ampliação do prédio ou construção de novo

No documento Arrendamento: direito substantivo e processual (páginas 158-161)