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Desafios do ensino de língua inglesa pensada no viés da escola pública e

1. A ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA

2.3 Desafios do ensino de língua inglesa pensada no viés da escola pública e

Diante do contexto conturbado atual, alguns especialistas cogitam que estamos passando por um momento de crise na educação, um momento em que precisamos focar nossas energias em averiguar os empecilhos e desafios que se criam no contexto escolar. Crise sempre foi um momento de reflexão e de mudança de paradigmas, portanto, nesse momento, pesquisar e buscar entender esse contexto nos possibilita enxergar como as coisas foram construídas, analisa-las para compreendermos o que podemos ampliar ou melhorar. A retomada sócio histórica é uma pesquisa que possibilita um entendimento

riquíssimo da origem dos problemas, e nos instiga a elaborar estratégias diferentes diante desses.

Em uma perspectiva de escola pública e republicana, a escola é direito de todos e é dever da escola garantir o acesso e os meios para que os alunos se constituam conscientes de sua atuação na sociedade. Porém, a escola pública no Brasil se mostrou, muitas vezes frustrante e confusa em seus próprios pontos de vistas sendo incapaz de abraçar à pluralidade da sociedade brasileira, presa em ideologias discriminatórias e preconceituosas que são heranças construídas na própria história do país. Nesse sentido, a escola também se mostra atrasada em relação ao contingente de novas tecnologias, e às demandas que elas trazem consigo, o que tem vindo a revolucionar o nosso cotidiano na sociedade como um todo. Segundo Novoá (2009), a diversidade e novas tecnologias são temas obrigatórios de reflexão e intervenção diante dos desafios que são perceptíveis nas escolas e nas sociedades.

No que diz respeito ao componente curricular de LI, Paiva (2003) coloca que as políticas educacionais brasileiras nunca asseguraram uma inserção de qualidade em nossas escolas no que tange ao ensino dessa, o que podemos observar nos próprios PCNs (1998) quando por um lado a disciplina é reconhecida como imprescindível para que o educando se compreenda como sujeito de papel político, histórico e social e, por outro lado, o documento evidencia que a infraestrutura não é a adequada, e busca artefatos para apenas justificar o porquê disso, ao invés, de instigar mudanças do contexto desfavorável que se encontra a LI, e promover conquistas para que o ensino, seja de fato, assegurado.

Ainda, é possível perceber a herança de tradição colonial muito mais forte no ensino de LI. Moita Lopes (1997, p. 38) reflete sobre atitudes de professores que são consideradas “muito colonizadas”, diante da ingenuidade e alienação que se constituem as práticas nesta disciplina, colocando que é obvio que isso não surgiu simplesmente do nada e que os professores de inglês, não estão sozinhos, pois esta posição parece estar latente no Brasil. Esse é o ponto de conexão inevitável que abrange toda a escola pública e se adentra no ensino de LI, pois como vimos no primeiro capítulo, a escola se construiu apostando em um modelo escolar no qual a formação humana não era prioridade, o que pode ser consequência da imaturidade política e social que vivenciamos hoje. Nesse sentido, Rees (1998, p 66) traz uma perspectiva que relaciona o ensino de LI com a desarticulação do universo cultural brasileiro:

A situação nas escolas públicas demonstra, [...] o problema da fragmentação cultural, pois a adoção de uma língua inglesa resultou da subordinação sem diálogo à cultura dominante. O fato de que nas escolas públicas a língua inglesa existe no currículo como sinal de “progresso” e “desenvolvimento”, mas que na prática do dia-a-dia a situação é imprópria para um ensino adequado, demonstra a desarticulação do universo cultural brasileiro. Para que haja transformação, é preciso problematizar a realidade existente e não somente submeter-se a ela.

Dessa forma, é possível compreender os impactos que a não problematização e conscientização acerca de uma forma simplista e limitada do ensino de LE, podem vir a produzir supervalorizando o que se entende por cultura de LI, e subestimando nossa própria cultura. Esse processo pode vir a acarretar a baixa autoestima e desinteresse por parte dos estudantes em relação ao ensino de língua estrangeira, quando a LI e a cultura são apresentadas como superiores, o que segundo Rajagopalan (2003, p. 68) pode levar muitos alunos a se sentirem envergonhados da sua própria condição linguística, como resultado das ideologias que norteiam determinadas práticas e posturas adotadas em sala de aula, em que alunos menos precavidos se sentiram inferiores diante desse ensino.

Segundo Freitas (2003) não podemos negar que no impasse do ensino de LI, focado exclusivamente em tópicos gramaticais, muitos estudos surgiram mostrando a importância do ensino de língua como prática sociocultural, onde a língua e a cultura são partes iguais no mesmo processo. Porém encontramos visões ingênuas, por parte dos professores, de que ensinar língua e cultura é ensinar estereótipos, valores e ideologias que, há muito vêm sendo impostos por outras sociedades. Assim, o problema se volta à formação de professores de línguas estrangeiras, que acabam por dedicar tanto tempo a discussões sobre métodos, técnicas e abordagens ao ensino de Línguas, deixando de lado questões tão importantes quanto aqueles de cunho político e ideológico. (FREITAS, 2003, p. 103/104).

Na formação de professores as metodologias e abordagens são prioridades tão grandes que se acaba por não dedicar o tempo necessário ao desenvolvimento de temas tão importantes para o ensino de LE como os de cunho político e social, “ideologia”, “construção de identidade”, “processos identitários”, “práticas discursivas”, “gêneros discursivos” etc. Esses deveriam ser pressupostos durante o processo de formação dos alunos-professores, pelo simples fato de que são questões que não podem ser dissociadas dos conceitos de língua e de cultura. (FREITAS, 2003, p. 107). O que parece é que precisamos focar em resultados concretos e abstratos do ensino, em função das avaliações externas que avaliam o rendimento da escola pública de forma limitada e

simplista, ao invés de se preocupar com a conscientização, criticidade, emancipação e autonomia dos estudantes para que esses também sejam protagonistas em sua aprendizagem.

Entretanto, assim como a escola pública enfrenta problemas relacionados à pobreza de reflexões sociais, políticas e históricas em suas práticas educativas, isso acaba refletindo, consequentemente, também na formação de professores de modo geral, ou seja, talvez o problema seja mais fundo do que imaginamos ou gostaríamos que fosse. É preciso repensarmos a formação de professores atentos ao papel desses na contemporaneidade, e consciente dos desafios da educação com um todo. Novoá (2009) nos traz cinco disposições que, segundo ele, caracterizam um trabalho docente nas sociedades contemporâneas: o conhecimento, a cultura profissional, o tato pedagógico, trabalho em equipe e compromisso social; colocando que a formação de professores deve ocorrer dentro da profissão, enfatizando o trabalho em equipe e consciência de compromisso social da educação para a sociedade. Já Rajagopalan (2004) coloca sobre a importância da pedagogia crítica, a qual podemos considerar de muita importância para todo o contexto educacional acerca da herança e tradição colonial, autoritária, discriminatória em que a escola brasileira se constrói. O autor pensa que

Ao educador critico cabe a tarefa de estimular a visão crítica dos alunos, de implantar uma postura crítica, de constante questionamento, das certezas que, com o passar do tempo, adquirem a aura e a “intocabilidade” dos dogmas. É por esse motivo que o educador crítico atrai, via de regra, a ira daqueles que estão plenamente satisfeitos com o status quo e interpretam qualquer forma de questionamento das regras do jogo estabelecidas como uma grave ameaça a si e à sua situação confortável e privilegiada. (RAJAGOPALAN, 2004, p. 111)

Desse modo, a pedagogia crítica tem muito a contribuir para a educação, possibilitando meios para que os discentes construam seus pontos de vistas diante da realidade brasileira, e possam se tornar sujeitos esclarecidos frente à necessidade de se expressar diante das problemáticas universais atuais. O ensino emancipatório da escola pública não deve ser aquele que simplesmente grita os problemas sociais, políticos e culturais na humanidade, mas assim aquele que proporcione e instigue a criticidade perante eles.

Portanto, no ensino de LI, precisamos incorporar um ensino de acordo com os pressupostos da escola pública, dominando a língua, fazendo com que ela faça parte da

nossa própria personalidade, e jamais permitir que ela nos domine (RAJAGOPALAN, 2004, p. 70), pois segundo Rees (1998, p. 68):

Ao nos engajar, questionando e problematizando a nossa realidade, estaremos pronunciando o mundo, modificando-o e não simplesmente nos submetendo a ela. Ao discutir a fragmentação cultural tão evidente na sociedade brasileira, estaremos ajudando a transformar esta mesma sociedade. Portanto o nosso papel como professores de língua estrangeira-inglês é o de permitir o questionamento, ao problematizar a nossa prática do dia-a-dia nas escolas e nas universidades em que trabalhamos.

A Língua Inglesa se mostra como chave para a globalização, inserção no mercado de trabalho (não podemos negar), acesso às tecnologias e principalmente significa enxergar o mundo através de outros olhos, através do outro, um princípio e alteridade ao qual tem muito a contribuir para a harmonia em sociedade, ao mesmo tempo em que a linguagem toma proporções importantíssimas nas relações de interação globais.

De acordo com Novoá (2009) sabemos o que precisamos melhorar e apesar de saber a direção não encontramos o caminho. Falamos sempre as mesmas coisas, mas parece que cada vez mais acabamos nos distanciando da realidade. Precisamos sair do círculo vicioso, nos despir de discursos prontos e repetitivos e construir, de fato, propostas educativas que contribuam para a educação democrática.

Por esse motivo precisamos concentrar nossas energias em nos libertar de ideologias construídas na tradição colonizada, no regime autoritário, na escola de massas, sem distinção de classes, privilégios e favorecimento de alguns, e promover um ensino emancipatório, humano, contextualizado, significativo ciente das demandas sócias que surgem atreladas às inovações tecnológicas, e que desenvolva consciência da importância do papel da educação para a sociedade como um todo.

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