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3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.9. Desastres Naturais

As inundações, escorregamentos, secas, furacões, entre outros, são fenômenos naturais severos, fortemente influenciados pelas características regionais, tais como, rochas, solo, topografia, vegetação, condições meteorológicas e tipos de povoamento e estão diretamente relacionados à produção dos espaços geográficos. São considerados desastres naturais à medida que estes fenômenos ocorrem de forma intensa onde existe a presença de seres humanos, ocorrendo danos tanto materiais e humanos como prejuízos sócio-econômicos (KOBIYAMA et al., 2006).

O desastre seca é considerado um fenômeno social, caracterizando uma crise de agravamento de uma situação endêmica de pauperismo e estagnação econômica, sob o impacto do fenômeno meteorológico adverso. A estiagem enquanto desastre relaciona-se com a queda intensificada das reservas hídricas de superfície e de subsuperfície e com as conseqüências dessa queda sobre o fluxo dos rios e sobre a produtividade agropecuária (MI, 2007).

A carência de água nas ocasiões de estiagem na região semiárida, aumenta os riscos de desastres secundários de natureza humana relacionados às convulsões sociais, como a fome e desnutrição, desemprego generalizado e migrações intensivas e descontroladas. Provocam, ainda, desastres humanos de natureza biológica decorrentes da redução da resistência imunológica causada pela fome (MI, 2004).

Segundo MARCELINO et al. (2006), os principais fatores responsáveis pelo aumento dos desastres naturais no mundo estão relacionados com: o crescimento populacional, a segregação sócio-espacial (aumento das favelas e bolsões de pobreza), a acumulação de capital em áreas de risco (ocupação da zona costeira), o avanço das telecomunicações e as mudanças climáticas globais. O impacto dos desastres pode ser reduzido ou minimizado através de medidas preventivas classificadas como estruturais ou não estruturais. Estas quando combinadas, diminuem com eficiência as vulnerabilidades aos terremotos, à desertificação, aos deslizamentos de terra, às secas e às inundações (BRASIL, 1994).

MASKREY (1989) afirma que geralmente se considera como desastre natural a coincidência entre um fenômeno natural perigoso (inundação, terremoto, seca, ciclone, etc.) e determinadas condições vulneráveis. Existe o risco de ocorrer um desastre quando um ou mais perigos naturais se manifestam em um contexto vulnerável. Para BRASIL (2008) a

intensidade dos desastres não depende apenas da magnitude do fenômeno adverso, mas, principalmente do grau de vulnerabilidades do cenário do desastre e do grupo social atingido.

Os desastres são medidos em função da intensidade dos danos e dos prejuízos econômicos e sociais, assim, é possível que a seca do Semiárido nordestino, em longo prazo, se caracterize como um desastre muito mais importante que numerosos terremotos, erupções vulcânicas e ciclones, freqüentes em outros países. Dentre os desastres mistos relacionados com a geomorfologia, o intemperismo e a erosão se destacam a desertificação e a salinização do solo, sendo sua ocorrência por causas naturais, mas, também por pressões antrópicas (BRASIL, 2008).

BARBOSA et al. (2005) enfatizam que os desastres são determinados pelos riscos e pelas vulnerabilidades (Fórmula 1), desta forma não se pode falar em vulnerabilidades sem antes ter um entendimento do que sejam riscos e desastres.

(Desastre é igual a risco versus vulnerabilidade – quanto maior a vulnerabilidade, maiores são as chances de configuração de um desastre).

Reforçando esta tese, a UNICEF/FLACSO/LA RED (1999) enfatiza que as definições de desastres corretamente aceitas estão construídas sobre um mesmo projeto lógico: a relação entre um ―agressor‖ (o evento causador) e uma vítima (a população afetada). A definição acima é proveniente desta lógica, na qual o evento agressor potencial é denominado ameaça (A), e a susceptibilidade da população a sofrer seu impacto é identificada com o termo vulnerabilidade (V). Assim, A e V são entendidas como ―forças sinérgicas‖, que atuam em uma mesma direção. Assim:

Os riscos são construídos a partir das condições de vulnerabilidades de um indivíduo ou de uma coletividade, frente a uma ameaça. A vulnerabilidade pode ser cumulativa e crescente. Este cenário define a construção do risco como histórica e social. Assim, se define desastre como o resultado da ação de um fenômeno natural (ou de eventos deste) ou provocado pelo homem, sobre um ecossistema vulnerável, causando danos humanos, materiais e ambientais com conseqüentes prejuízos econômicos e sociais. MASKREY (1993) afirma que o risco de um desastre depende não somente da magnitude da ameaça natural, mas também, da vulnerabilidade da sociedade exposta à ameaça.

Assim, desastre é qualquer perda de vidas humanas, bens materiais e/ou ambientais causada por um evento perigoso, de origem natural ou humana, que pode ter uma escala pessoal, familiar, comunal, regional, nacional ou internacional e, por sua vez, têm a ver com alteração ou interrupção, por meios próprios, pois os impactos destrutivos excedem a capacidade de adaptação e ajustamento, em termos de resposta para absorver o efeito produzido (CARDONA, 1993; GONZALÉZ et al., 2002).

R = A x V

DESASTRES = RISCOS x VULNERABILIDADE (1)

Onde: R = Risco; A = Ameaça;

V = Vulnerabilidade

(Risco é igual a ameaça versus vulnerabilidade – quanto maior a vulnerabilidade, maior será o risco construído).

Com relação à magnitude de um desastre, LAVELL (1996) enfatiza que esta é considerada como função da severidade, magnitude e intensidade do evento ou fenômeno físico. Quando se refere ao enfoque social considera que o elemento ativo é a vulnerabilidade e os processos e estruturas socioeconômicas e políticas que a moldam, é a vulnerabilidade que determina o caráter dos desastres.

O Brasil, devido as suas dimensões territoriais, as condições climáticas e fisiográficas e ao grau de desenvolvimento, está sujeito, diariamente, a um número elevado de desastres e situações de emergência, que provocam muitas mortes, feridos, incapacidades físicas, temporárias e definitivas, além de causar muitos danos às propriedades, bens, serviços, à produção agrícola, à pecuária e também, de forma muito clara, profundos efeitos e conseqüências desastrosas ao meio ambiente (MI, 2007). Para KOBIYAMA et al. (2006) no Brasil os municípios mais atingidos por desastres naturais estão localizados nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina, Paraná, Bahia, Pernambuco, Sergipe, Paraíba e Ceará.

Um desastre que chamou a atenção do Brasil foi o ciclone Catarina, ocorrido entre os dias 27 e 28 de março de 2004, atingindo os Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Figura 10). Segundo o INPE, os ventos atingiram até 180 km/h, houve a destruição de aproximadamente 1.500 casas e mais de 40 mil ficaram danificadas. Em termos econômicos, o prejuízo calculado foi de mais de R$ 1 bilhão. Tratando-se de vidas humanas, três pessoas morreram e outras ficaram desaparecidas.

Figura 10. Ciclone Catarina. Imagem GOES – (a) Visível – Ch1 – (b) Imagem Realçada - Ch4

Fonte: INPE.

No município de Alagoa Grande-PB em 2004, o rompimento da barragem de Camará (Figura 11) em função de falhas na construção, foi considerado uma das maiores tragédias do município, trazendo diversos impactos negativos, como: perda de bens materiais, imóveis, patrimônio público, da reserva hídrica, morte de animais e de seres humanos, desequilíbrios emocionais, econômicos e agrícolas (SILVA et al., 2006).

Com relação aos escorregamentos ou deslizamentos ocorridos no Brasil, com inúmeras vítimas fatais e grandes prejuízos materiais, foram os ocorridos no Rio de Janeiro, nas encostas dos morros de Santa Tereza, Corcovado, Jardim Botânico, Cantagalo, Gávea, Alto da Boa Vista e Serra das Araras; nas cidades serranas de Petrópolis, Teresópolis e Friburgo, quando da ocorrência de intensas e prolongadas chuvas na região. No Brasil, a distribuição geográfica de escorregamentos de encostas é verificada nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco (MI, 2007).

Diante de tantos desastres naturais ocorridos nos últimos anos no Brasil, sobretudo, os mais evidentes (Figura 12): enchentes nos Estados do Nordeste, a exemplo, dos ocorridos no Maranhão, Alagoas e Pernambuco, dentre outros de grandes proporções, escorregamentos de terra no Rio de Janeiro, secas/estiagens ocorridos com freqüência no Nordeste, ciclone, tornados e chuvas de granizo, principalmente no Estado de Santa Catarina, raios no Nordeste (a exemplo, de Fortaleza-CE), incêndios (como o ocorrido na Chapada Diamantina), entre outros, têm provocado a perda de centenas de vidas e/ou prejuízos na agricultura, mas afinal fica a pergunta: tudo isto são reflexos das mudanças climáticas ou são fenômenos naturais ou reações às ações humanas?

Figura 11. Desastre ambiental, provocado por falhas na construção da Barragem de Camará, município de Alagoa Grande-PB.

Na história do Nordeste a seca gerou uma situação de grandes catástrofes, com a morte de milhares de pessoas de fome e de sede. A ocorrência periódica das secas coloca um fator de risco sobre a atividade agrícola (MAGALHÃES, 2009). Conclui-se que os desastres relativos à seca no Nordeste já duram séculos, o que de certa forma tem despertado o interesse de muitos estudos sobre a região, tanto em nível nacional como internacional.

Reportando-se à questão da seca, WEBB (1979) realizou uma ampla pesquisa no Nordeste e entre tantos levantamentos feitos, cita que provavelmente a seca ocorrida entre os anos de 1877-79 no Ceará como a mais cruel, com uma estimativa que neste período morreram entre 200 e 500 mil pessoas. Este autor argumenta sobre os desmandos dos governos e da ação de bandidos e criminosos que agiam livremente, sobre o sofrimento dos flagelados, o êxodo para regiões distantes, a exemplo, a Amazônia. Também relata os desmandos ocorridos na seca de 1932.

A seca de 1932, descrita por Orris Barbosa, mostra o descaminho de recursos e os sérios males sociais e econômicos que contribuíram para a penúria humana. Importante relato que faz referências às histórias da população relacionadas à ajuda do governo imperial ou provincial que nunca chegava. Aqui se abre um parêntese que esse método em determinados momentos, ainda continua sendo aplicado em alguns Estados da federação. Para este autor, cada seca ―é como uma forja na qual os fracos são eliminados e somente os vigorosos sobrevivem‖. Em outro ponto afirma, a seca é ―um fiel aliado do grande latifundiário‖ (WEBB, 1979).

Diante esse contexto, é que se instalou o Desastre Seca no semiárido nordestino. Um desastre de mais de 300 anos, extremo, lento e complexo. Em conflito com o meio ambiente -

Figura 12. Desastre natural - enchentes nos Estados do Maranhão; Pernambuco e Alagoas; incêndio na Chapada Diamantina, entre outros.

clima e o bioma caatinga – o homem ao longo deste tempo vem construindo os riscos, por não empregar técnicas adequadas de manejo das terras e da caatinga (erosão, desmatamentos, degradação/desertificação das terras); por falta de infraestruturas adequadas para a convivência com o semiárido; por falta de políticas públicas para um desenvolvimento sustentável, acarretando o empobrecimento da grande maioria da população rural. Desta forma, se tem um ciclo vicioso: aumenta a vulnerabilidade, aumenta o risco e a cada período de seca climática, seja ele normal ou prolongado, o desastre seca avança (BARBOSA et al. 2005).

Procurando entender esta questão, ACOSTA (1997) chama a atenção para o fato de que faz parte do imaginário brasileiro associar a região Nordeste com a calamidade da seca, onde o clima, como fenômeno natural, seria o responsável pela situação de miséria e penúria da população nos períodos de estiagem. A seca como fenômeno natural tem sido usada como razão para esconder a condição real de vulnerabilidade da população, afetada periodicamente por catástrofe provocada pelas secas.

Desta forma, há séculos que o quadro repassado pela mídia, em todos os níveis, reflete uma imagem muito distorcida do Nordeste. Exploram-se imagens de fundo de açudes ressecados, de crianças famintas, de êxodo rural, da mortandade de animais no período de seca, entre outras mazelas, no entanto, uma política pública voltada para minimizar o sofrimento do homem do campo no sentido de uma adequada convivência com a questão das secas periódicas que assolam essa região é implantada.

Assim, no Brasil a existência de sistemas de alerta confiáveis e de mapas de risco é uma realidade ainda distante. Encontra-se em fase de construção o sistema nacional de prevenção e alerta de desastre naturais, segundo o Instituto de Pesquisa Espaciais (INPE).

Os desastres naturais têm tido uma recorrência e impactos cada vez mais intensos, o que os cientistas sugerem já ser resultado das mudanças climáticas globais. As inundações que ultrapassaram e romperam diques e barragens em New Orleans, por ocasião do Furacão Katrina em 2005, nos Estados Unidos e o terremoto de Kobe no Japão em 1995 (causou aproximadamente 6.000 mortes), com milhares de vítimas e pessoas afetadas (TOMINAGA et al., 2009).

Em 2011, o terremoto e o tsunami que devastaram o Japão, conforme o Banco Mundial pode ter custado até US$ 235 bilhões para o país. O número de mortos por tremor e tsunami passa de 7.100 no Japão, deixando 12 mil desabrigados e ainda gerou crises nuclear, energética e humanitária (GLOBO.COM, 2011). Conforme a ONU a ocorrência dos desastres naturais está cada vez mais devastadora e relaciona-se com alguns dos efeitos das mudanças climáticas, com o aumento de tormentas e eventos climáticos extremos. Em 2008 o número de vítimas foi um dos mais altos da história. Em torno de 2 milhões de pessoas foram afetadas pelos desastres, principalmente pelas chuvas (CHADE, 2009).

De acordo com LAVELL (1994), os desastres prejudicam, sobretudo, porque pobreza e desastres se reforçam mutuamente, enfraquecem os incentivos para o desenvolvimento e, em especial deploram o setor informal. De maneira geral, os países desenvolvidos fazem mais opção pela prevenção do desastre do que pela recuperação. E assim o autor faz o seguinte questionamento - quais são as opções que têm os governos dos países em desenvolvimento propensos aos desastres, quando adotam programas para desenvolvimento econômico e

social, e ao mesmo tempo intentam controlar perdas e dor causados por desastres naturais? Assim, é importante entender a vinculação entre desastre e desenvolvimento.