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Desenvolvimento capitalista e espaço agrário brasileiro

I. (RE)LEITURA DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

I.3. Desenvolvimento capitalista e espaço agrário brasileiro

O fato do capital ter se desenvolvido provoca repensar a afirmação feita por Smith (1983) acerca do Capital e Agricultura. Ao ressaltar que “a natureza da agricultura não comporta tantas subdivisões do trabalho, nem a diferenciação tão grande de uma atividade para outra, quanto ocorre nas manufaturas”, Smith (1983; v.1: 42) chamava atenção para a dificuldade que o capital encontraria ao penetrar no campo, como fez noutros espaços. Tal afirmação, até caberia à época do autor, mas, atualmente, sem necessariamente depender das especificidades da divisão do trabalho o capital se apropria do espaço agrário determinando as relações sociais e de produção.

Nesse aspecto, há concordância com a teoria apresentada por WOOD (2000) sobre “as origens agrárias do capitalismo”. De maneira notável, a autora chama atenção para a relação entre o aumento da produtividade, da lucratividade e a propriedade individual plena já existir antes mesmo da proletarização da força de trabalho na Inglaterra, inclusive sendo a responsável pelo surgimento da proletarização. O formato exclusivo e excludente de produzir expropriou os camponeses, gerando um contingente de sem-terra, os quais foram sujeitados aos imperativos do mercado.

Wood (2000) faz a seguinte afirmação quanto à origem do capitalismo.

[...] o capitalismo, com todo seu impulso específico de acumular e de buscar o lucro máximo, nasceu não na cidade, mas no campo, num lugar muito específico, e tardiamente na história humana. Ele requer não uma simples extensão ou expansão do escambo e da troca, mas uma transformação completa nas práticas e relações humanas mais fundamentais, uma ruptura nos antigos

padrões de interação com natureza na produção das necessidades vitais básicas (WOOD, 2000: 13).

Para a referida autora, a origem do capital está no momento em que as relações comerciais realizadas passam a ser determinadas e reguladas pelo mercado. Camponeses- proprietários, senhores de terra e funcionários se apropriavam da produção dos outros sem depender diretamente do mercado. Quando isso acontece, o mercado começa a mediar a relação entre os sujeitos e passa a existir o imperativo do capital.

Os proprietários e arrendatários ao se preocuparem com o chamado melhoramento, ou seja, com o aumento da produtividade da terra com a meta de obter lucro adotaram novas formas de concepção de propriedade, a qual previa concentração da terra, buscando eliminar as práticas tradicionais que inviabilizavam a ampliação da produção nas mesmas.

Os cercamentos, prática usada para redefinição dos direitos de propriedade como estratégia de melhorar os ganhos com a terra, significaram a retirada dos direitos de uso de pessoas que dependiam dos campos para produzirem o seu sustento. O movimento de „melhoramento‟ transformou as relações sociais estabelecidas no campo, sobretudo nas trocas do homem com a natureza, o que fez impulsionar a expansão capitalista (WOOD, 2000: 27).

Retoma-se a história e a teoria da origem agrária do capitalismo para afirmar que o desenvolvimento capitalista e a interferência que impõe no agrário não constituem uma relação da contemporaneidade ou ainda como resultado da modernização.

Carvalho (1984: 44) afirma, ao analisar o caso brasileiro, que “a relação de subordinação ao capital das relações sociais de produção no campo, não tem seu começo no período recente quando se assiste ao processo de modernização da agricultura”. Para o autor a subordinação se dá através da própria dinâmica do capital, quando constituído como relação social dominante, estabelecem sua dominação concreta às demais relações de produção pré- existentes.

A ação do capital não determina um “novo padrão agrícola” (KAGEYAMA e SILVA: 1990) como muitos pensadores acreditaram que aconteceria por meio da modernização. Pelo contrário, vivenciou na trajetória do país a manutenção de estruturas antigas ao mesmo tempo em que foi imposta uma lógica desconectada e incompatível em grande medida com a realidade concreta do país.

No caso brasileiro, o capitalismo na sua expansão histórica não só vem redefinindo antigas relações de produção subordinando-as ao processo global de

reprodução do capital, como também, às vezes, tem engendrado relações de produção não tipicamente capitalistas, contraditórias, mas necessárias à acumulação ampliada do capital (CARVALHO, 1984: 88).

O desenvolvimento capitalista não elimina imediatamente as formas não capitalistas. Em determinadas condições mantém essas relações e as adaptam a seus interesses para garantir a apropriação do excedente gerado, subordinando direta e indiretamente o processo de produção. No Brasil, grupos econômicos apoiados em políticas governamentais operacionalizaram a investida do capital no campo com o objetivo de dinamizar as relações internacionais via mercado, fazendo uso da modernização.

Essa relação de dependência, o vínculo gerado com os países desenvolvidos, contribuiu sobremaneira para perpetuar as desigualdades ao estabelecer novas relações de dominação do capital no agrário brasileiro, seja em função do atrelamento dos produtores ao capital por meio do endividamento junto aos bancos, nos casos em que compulsoriamente adquiriram implementos e equipamentos ou em função da expropriação e/ou espoliação dos produtores de suas áreas, forçados a incorporar a dinâmica dos trabalhadores rurais ou aos centros urbanos se tornando força de trabalho barato.

Szmrecsányi e Ramos (1993), afirmam que há uma unanimidade entre os autores das diferentes matizes sobre as políticas agrícolas postas em ação desde 1965 e destacam que:

O crédito rural subsidiado foi o mais importante instrumento de que lançou mão o Estado brasileiro da época para promover a chamada modernização de nossas atividades agropecuárias. Da mesma forma, já foi devidamente enfatizado que tal crédito beneficiou de maneira bastante desproporcional os grandes proprietários, constituindo-se numa das faces mais visíveis da estratégia de modernização conservadora (SZMRECSÁNYI & RAMOS 1993: 238).

Notadamente, após as políticas governamentais adotadas para “dinamizar” o agropecuário passa a ter no país recorrentes problemas atrelados à condição agrária e agrícola, sobretudo pelo aprofundamento das desigualdades geradas. Cabendo a reflexão feita por Silva (1989) ao propor discutir as políticas para a agricultura moderna brasileira, na qual pondera acerca da heterogeneidade aguçada entre as estruturas de produção no país, afirmando que:

[...] não se pode mais compreender a estrutura e a dinâmica da agricultura brasileira sem levar em conta a estrutura e a dinâmica dos setores industriais com ela interrelacionados, bem como as formas e as características próprias das ligações que se estabelecem entre eles. Também é insuficiente tratá-las de forma abrangente, substituindo a agricultura por um pretenso CAI genérico. A heterogeneidade da situação é tal que somente a partir de casos concretos e

específicos é possível compreender de fato a dinâmica da produção e das mudanças estruturais nas atividades agrícolas (SILVA, 1989: 319).

À medida que a penetração do capital avança no agrário, por meio da modernização, são determinadas transformações nas estruturas socioeconômicas, sobremaneira nas conexões com o setor urbano-industrial. São desencadeados processos que culminam na modernização de determinados ramos da agropecuária e até mesmo na reorganização socioeconômica de unidades produtivas, como destacou Lacerda (1985).

Ocorre na agricultura uma ampla e complexa modernização de suas técnicas de produção e de distribuição. Em consequência, efetua-se uma espécie de aproximação (ou, o mais correto, uma reunificação) desse setor em relação ao restante dos mercados de insumos e de produtos, como também através de trabalho, de terra e financeiro. Ao mesmo tempo, que diz respeito à própria organização socioeconômica interna das unidades produtivas, verificam-se complexas alterações nas relações de trabalho e de propriedade vigentes no campo (LACERDA, 1985: 19).

Ao mesmo tempo em que o setor agropecuário moderniza suas técnicas de produção e distribuição proporciona ao setor primário formas irregulares e discriminatórias. Nas palavras de Silva (1989: 324) “o desenvolvimento capitalista é por si mesmo contraditório: cria e destrói; gera riqueza de um lado e miséria de outro”. Consequentemente, as interferências e respostas são diferenciadas gerando em determinados casos a real integração da agropecuária à indústria, no entanto, em outros se perpetua a simbiose que ocorria entre as demais atividades econômicas e a agropecuária.

O Brasil sofre transformações significativas nos modos e na dinâmica da produção agropecuária em função da modernização. No entanto, não significam mudanças nas condições históricas das relações entre trabalhadores e patrões. Em verdade, ocorre a preservação das perversas características de relações arcaicas de trabalho e práticas convencionais no trato das lavouras e criações, demudando e complexificando as relações no agrário brasileiro.

Bem certo que ocorreram mudanças e modernização na trajetória do meio rural. Agora, até que ponto se estabeleceu um novo padrão no meio rural brasileiro? Este questionamento se justifica por entender que mesmo dada essa “evolução” no setor, problemas estruturais permaneceram e ainda foram aprofundados devido aos desequilíbrios nas dinâmicas produtivas entre as regiões do país, tendo seu agravamento com tentativas inadequadas de mecanismos de promoção do “desenvolvimento” (HERRERA e OLIVEIRA, 2008: 6).

A difusão do progresso técnico atinge fundamentalmente a agropecuária do Brasil no Centro-Sul, acentuando as desigualdades estruturais interregionais ao proporcionar alterações no

perfil produtivo das unidades regionais atingidas pela modernização e mantendo o arcaísmo da produção noutras áreas do país.

Para Delgado (1985), o processo de modernização se faz perante a diferenciação e com exclusão de grupos sociais e regiões, não se tornando um processo homogeneizador do espectro social e tecnológico da agricultura brasileira. Ao fazer esta afirmação, o autor menciona que deve ser ressaltado que o projeto modernizante abrange basicamente os Estados do Centro- Sul e que as demais regiões do país não são incorporadas no processo de modernização, passando, então, a cumprir papéis periféricos na agricultura brasileira. Seguindo o raciocínio do conservadorismo da modernização o mesmo afirma:

Quanto às regiões não atingidas de maneira predominantemente pela modernização – o Nordeste, de agricultura geralmente arcaica, e as regiões novas (fronteira agrícola) – prevalecem processos produtivos grandemente heterogêneos e uma estrutura agrária dominada pela grande propriedade. A valorização no setor agrícola não se dá aí, de forma necessária, por intermédio do CAI, mas pelo controle da propriedade fundiária. Esse é, pois, o lado conservador do projeto de modernização agrícola, que passa pela mediação política de acordo com complexas e instáveis alianças (DELGADO, 1985: 42- 43).

Santos (1991), no mesmo sentido, afirma que entre 1965 e 1984, já se tinha no país um espaço agrário muito mais complexo do que os períodos anteriores, o autor atrela esta situação como consequência da modernização que se deu de maneira desigual e excludente na agropecuária. Para Santos:

Houve, naqueles anos de modernização autoritária, uma diversificação da burguesia agrária, com a formação dos complexos agroindustriais, uma reconversão de proprietários territoriais em empreendedores capitalistas, e a formação de novas frações da classe dominante – os granjeiros da soja e do trigo e os empresários familiares (SANTOS, 1991: 258-259).

Na verdade, o que se constrói é uma trajetória agropecuária no país permeada pelas diferentes formas de produção agropecuária, bem como enfatizou Szmrecsányi (1991: 83) ao referir-se à produção brasileira como altamente diferenciada, principalmente em termos regionais, técnicos e sociais.

As diferentes formas de produção constituídas no agrário brasileiro engendram contradições, por exemplo: por umas terem sofrido o processo de modernização; outras estimuladas ou condicionadas a se industrializar; por muitas terem mantido a tradição na forma

de produzir; e além daquelas que transpuseram as especificidades da agropecuária e se consolidaram como complexos agroindustriais.

Souza (1982: 3) destaca que a condição histórica do desenvolvimento capitalista em geral se caracteriza pela reprodução de contradições no interior do próprio processo de acumulação. Dessa forma entende-se a expansão do capitalismo no campo através da penetração do capital, concomitantemente, destruindo e/ou reproduzindo relações não capitalistas de produção.

As formas de produção no Brasil não são eliminadas ao longo da história, mas sim condicionadas pelo time e interesse do capital que seguindo suas próprias necessidades repulsa ou estabelece novas relações. A heterogeneidade é condição prévia para a reprodução do capital no agropecuário brasileiro, interferindo com condições e intensidades distintas nas diferentes formas produtivas.

A heterogeneidade aprofundada no agrário brasileiro pela expansão do capital pode ser compreendida textualmente nas palavras de Sorj (1980), que destaca:

O processo de penetração do capital na base do processo produtivo agrícola determina uma transformação e diferenciação constante das características dos diferentes tipos de empresas agrícolas. Grande parte dos latifúndios se transformam em modernas empresas capitalistas, diferenciando-se cada vez mais dos antigos latifúndios tradicionais assestados na exploração da renda dos pequenos produtores. A pequena produção por sua vez ou é marginalizada ou se integra ao complexo agroindustrial, gerando uma camada de pequenos produtores capitalizados (SORJ, 1980: 12).

Tem-se a acepção de que ocorre em parte, a soldagem do capital nacional, capital estatal e capital internacional19 com o objetivo de expandir o capitalismo oligopólico pelo país. Mais do que tentar reorganizar o agrário, a meta era responder aos interesses dos subsetores industriais que tinham a agropecuária como mercados compradores.

Müller (1989) percebendo que não era possível ter a homogeneização do sistema produtivo agropecuário integrado à indústria, afirma, “o regional que se obtém a partir do domínio da agricultura dinâmica é um regional distinto daquele que não pressupõe esse quadro de referência” (MÜLLER, 1989: 23).

Assumindo postura parecida, os autores Kageyama e Silva (1990: 185) reconhecem que mesmo considerando os movimentos de modernização e industrialização da agricultura terem

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sidos intensos, “não significava a homogeneização das formas de produzir na agricultura e nem a integração intersetorial completa em todos os tipos de atividades”.

Desse modo, considera que não se pode interpretar o agrário brasileiro como único e homogêneo. A ação do capital ocorre devido às especificidades que se faz de modo desigual e combinado no agrário, gerando movimentos diversos, propagando uma vasta desigualdade social e produtiva pelo país. Como bem chamou atenção Brandão (2010: 43), “o sistema capitalista é por natureza polimórfico”.

Comparando a produção agropecuária com outras atividades produtivas, aquela apresenta especificidades que são essenciais na compreensão de seu funcionamento e resultados obtidos. Segundo Ramos (2007), um dos principais aspectos é o fato da produção agropecuária depender diretamente da terra20 como fator essencial de produção, “seja quanto à sua fertilidade, seja quanto à sua localização, o que faz dela um bem que pode ser apropriado por um grupo restrito de pessoas” (RAMOS, 2007: 19).

Para Szmrecsányi (1979) no que se refere à produção:

O setor agropecuário distingue-se dos demais conjuntos de atividades econômicas pela modalidade de uso do solo, o qual ele se acha vinculado, não apenas do ponto de vista espacial, mas principalmente em termo físicos. Com efeito, é este recurso natural renovável que constitui, pelo menos por enquanto, a base material da maioria das atividades agropecuárias, entre as quais se incluem o cultivo de plantas anuais e perenes, e a criação de animais domésticos (SZMRECSÁNYI, 1979: 20-21).

A atenção dada à produção agropecuária está no fato de ser influenciada pelas condições naturais, havendo sazonalidade na produção, logo, não possui um fluxo contínuo de bens durante o ano. Além da baixa elasticidade preço da demanda e renda da demanda, mesmo entre os produtos processados.

Acrescenta-se, ainda, na condição de trabalho preponderantemente informal, além de suas funções, tipicamente do setor primário, como: a provisão de alimentos e matérias primas; a geração de divisas com as exportações; a transferência de capital para outros setores; a ampliação do mercado interno para outras atividades relacionadas; e suprimento de mão-de-obra para outras atividades (RAMOS, 2007: 27-28).

Destacando as especificidades e o papel do agropecuário dentro de um sistema socioeconômico moderno, Szmrecsányi (1979), considera ser setor básico para o

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LACERDA (1985: 48) afirma que a propriedade privada da terra é o principal traço de distinção entre a agricultura e a indústria, posto que a terra constitui um bem único, não sendo passível de reprodução, nem constituindo um produto do trabalho.

desenvolvimento econômico e social. O autor afirma que “a relevância, entretanto, nem sempre é devidamente enfatizada por causa dos procedimentos analíticos usualmente adotados no estudo do processo de desenvolvimento” (SZMRECSÁNYI, 1979: 21).

O fulcro está em compreender o agrário com sua complexidade e diversidade produtiva, principalmente, dependendo da região e contexto que se desenvolve. Essa interpretação passa por entendê-lo como um conjunto de fatos e fenômenos, com um sistema de diferentes meios e processos que se complementam e concorrem entre si como partes indissociáveis.

A adoção de novas práticas e técnicas na produção, buscando melhores resultados e maior participação dos produtos na exportação, faz constituir no país expressivos arranjos com o setor industrial. Isto não significa que a mudança tenha se expressado a ponto de subordinar todo o sistema a um modelo único de produção. Pelo contrário, estabeleceu no país, um agrário detentor de vasta “heterogeneidade estrutural e social de produção, impregnada por tipos de organização diferenciados e com especificidades próprias nas distintas regiões” (LACERDA, 1985: 21).

Não ocorre no Brasil o que Müller (1982: 49) definiu como a “revolução agrária em curso no país”, ou seja, não se promoveu a alteração nas estruturas fundiárias existentes, no máximo registrou-se a influência da industrialização em determinados grupos capitalizados que participavam da produção agropecuária.

No contexto dos investimentos internacionais, por meio da industrialização do país, a agropecuária se tornou um grande nicho para os produtos industrializados. De acordo com Müller (1983: 149) “houve um processo de modernização na indústria da agricultura por força da presença no país de um setor de bens de produção para indústria”. Tal fato, não significou a modernização generalizada do setor pelo país.

No caso brasileiro [...], as políticas de estímulo à modernização não atingiram as pequenas unidades agrícolas, especialmente as que se dedicam à produção de gêneros alimentícios de primeira necessidade (SILVA, 1982: 30).

As políticas, para estimular a modernização, atreladas ao fato de que as diferenças materiais e as relações sociais estabelecidas no interior do agropecuário que, naturalmente, geram condições e objetivos de produções desiguais proporcionaram no país o aprofundamento das diferenças socioeconômicas e produtivas. Sorj & Wilkinson (1983) afirmam que o desenvolvimento da agropecuária brasileira se fez depurando as relações capitalistas nas grandes

empresas agrícolas, fortalecendo os produtores familiares capitalizados, gerando uma massa de pequenos produtores familiares pauperizados marginalizados pela baixa produtividade.

Para ratificar a ideia desenvolvida se valida da contribuição feita por Romeiro (1998) ao escrever sobre o meio ambiente e a dinâmica da inovação na agricultura, em que o autor, citando Bravemam (1974) afirma que “dentro dos limites históricos do capitalismo, a tecnologia, em vez de simplesmente produzir relações sociais, é produzida também pelas relações sociais representadas pelo capital” (ROMEIRO, 1998: 157). O mesmo continua enfatizando, que no modo de produção capitalista, a técnica, não é um simples meio de trabalho, mas passa a ser caracterizada como suporte da extração de sobretrabalho, seja na elevação da produtividade (mais-valia relativa) e/ou mediante o aumento de intensidade do trabalho (mais-valia absoluta).

Neste sentido, o processo de valorização do capital exerce um primado sobre o processo de trabalho, isto é, a lógica da busca do maior lucro determina não somente o timing de introdução das técnicas (podendo, por exemplo, retardar a introdução de uma técnica que seria socialmente útil, mas ainda não suficientemente rentável), como também as próprias características físicas destas como os valores de uso (ROMEIRO, 1998: 158).

A reflexão feita acerca da evolução do capital no agrário corrobora a assertiva de que ao mesmo tempo em que formas de produção evoluem, na perspectiva do capital, para maior integração à indústria, outras formas são mantidas nas condições em que se encontram para servirem a manutenção e à reprodução do capital.

Portanto, o agrário brasileiro se consolida, historicamente, perpetuando e aprofundando a heterogeneidade, com o capital assumindo a postura de interferir na dinâmica social e produtiva com formas diferentes à medida que valoriza a si mesmo buscando maneiras de ampliar a acumulação.

A diversidade do agrário brasileiro se fez com imposição e favorecimento de minorias, uma vez que foi forçada à modificação do perfil técnico e econômico da agricultura. Nesse contexto, as pequenas propriedades e os agricultores familiares ficaram à margem do processo que aumentou a concentração da renda e da terra, além de reduzir o nível de emprego e de renda dos produtores rurais familiares.

Notadamente, há no país uma disputa no e pelo espaço agrário entre lógicas de produção que se distanciam por seus objetivos e incentivos a elas direcionados ao longo dos anos,