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Desigualdades socioeconômicas e geográficas na utilização de

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Desigualdades Regionais e Socioeconômicas da utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos no Brasil segundo os dados da

PNAD 2008

Introdução

A população acima de 65 anos que em 1991 representava 4,8% da população, em 2000 chegou a 5,9%, e no último Censo de 2010 correspondia a 7,4% da população (IBGE,2010a). Essa população possui uma alta prevalência de doenças crônico-degenerativas, sendo que cerca de 75,5% dos idosos referem ter pelo menos uma doença crônica (VERAS & PARAHYBA, 2007).

A saúde dos idosos, como nos demais grupos etários, é também marcada por desigualdades socioeconômicas. As condições socioeconômicas se destacam em diferentes economias como um dos principais determinantes do estado de saúde em nível individual (NORONHA & ANDRADE, 2002). Além disso, as desigualdades regionais surgem como uma dimensão relevante das desigualdades sociais em saúde em virtude da substancial variação regional na oferta de serviço de saúde devido ao financiamento descentralizado (CAMBOTA, 2012).

Observa-se que os grupos menos favorecidos socioeconomicamente têm uma chance aumentada de ter pior autopercepção de saúde e apresentam prevalências maiores de doenças crônico-degenerativas (LIMA-COSTA et al, 2003). Além disso, este grupo apresenta também maiores taxas de mortalidade precoce por doenças cardiovasculares (BASSANESI et al, 2008; ISHITANI et al, 2006).

Por outro lado, aqueles com menor poder socioeconômico são os que consomem menos alguns serviços de saúde, como consulta médica e realização de exames(LIMA-COSTA et al, 2011), corroborando para a lei de Hart(HART, 1971), que diz que os diversos mecanismos que interferem na oferta de serviços fazem com que os recursos sejam distribuídos inversamente às necessidades.

Outro recurso de saúde que também pode apresentar um gradiente socioeconômico e geográfico é a utilização de medicamentos de uso contínuo. Quando utilizados apropriadamente, os medicamentos constituem importantes recursos terapêuticos para prevenir, controlar e curar muitas condições degenerativas (MCISAAC, 1994). Devido a maior prevalência de doenças crônicas, comorbidades e incapacidades permanentes ou temporárias, os idosos apresentam uma demanda aumentada por medicamentos. Nos EUA estima-se que 1/3 de todos

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os medicamentos dispensados sejam destinados ao grupo de indivíduos maiores que 60 anos (Willians, 2002). Além disso, as pesquisas apontam que grande parte dos idosos usa mais de um medicamento (JORGESEN, 2001).

No Brasil, a utilização de medicamentos em idosos é alta, variando de 67 a 91% (BERTOLDI et al, 2004; BERTOLDI et al, 2009; LOYOLA-FILHO et al, 2006; COSTA et al, 2011; FLORES et al, 2005; CARVALHO et al, 2005; FILHO et al, 2004). Entretanto, obstáculos como falta de informação sobre saúde, alto preço, poucos recursos financeiros, e dificuldades nos canais de distribuição dos medicamentos geralmente dificulta o uso de medicamentos, sobretudo nos países em desenvolvimento (MAURER, 2008).

Em nível nacional não foi encontrado até o momento nenhum estudo investigando as desigualdades regionais e socioeconômicas quanto a utilização de medicamentos de uso contínuo. Grande parte das pesquisas sobre utilização de medicamentos se concentra nas regiões Sul e Sudeste (BERTOLDI et al, 2004; BERTOLDI et al, 2009; LOYOLA-FILHO et al, 2006; COSTA et al, 2011; FLORES et

al, 2005) havendo poucos com representatividade nacional(Carvalho et al, 2005) ou nas demais regiões (FILHO et al, 2004). Além disso, nenhum desses estudos avaliou especificamente a desigualdade da utilização de medicamentos.

Conhecer a natureza das desigualdades sociais em saúde é de grande importância para definir as prioridades para a gestão pública (DRACHLER, 2003). Neste contexto, o presente estudo objetiva investigar em nível nacional o padrão de desigualdades geográficas e socioeconômicas na utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos. Além disso, objetiva analisar especificamente as desigualdades de utlização de medicamentos de uso contínuo em idosos que autorreferiram diabetes e hipertensão.

Métodos

Fonte de Dados

A fonte de dados utilizada foi a Pesquisa Nacional por Amostras em Domicílio (PNAD) realizada no ano de 2008, incluindo seu suplemento da saúde. A PNAD é um estudo seccional com abrangência nacional realizado anualmente com intuito de fornecer informações sobre as características gerais da população, como educação, trabalho, rendimento e outras. E ainda, com periodicidade variável, de acordo com

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as necessidades de informação para o País, inclui questões para investigar características sobre migração, fecundidade, saúde, entre outros temas.

Quanto ao plano amostral da PNAD, trata-se de uma amostragem complexa incorporando estratificação das unidades de amostragem, conglomeração (seleção da amostra em vários estágios, com unidades compostas de amostragem), probabilidades desiguais de seleção em um ou mais estágios, e ajuste dos pesos amostrais para calibração com totais populacionais conhecidos. (IBGE, 2009)

População de estudo

Dos 391.868 indivíduos investigados na PNAD de 2008, foram selecionados para compor a população de estudo aqueles com 60 anos ou mais, o que correspondeu a uma amostra de 41.269 indivíduos. Dentre esses, 1.691 não apresentavam informação sobre renda e foram excluídos das análises. A população de estudo foi então de 39.578 indivíduos.

Variáveis analisadas

A variável de desfecho foi utilização de medicamentos de uso contínuo, sendo mensurada pela pergunta “Utiliza medicamentos de uso contínuo?” presente na PNAD. As categorias de resposta eram: Sim e Não.

As variáveis de exposição foram posição socioeconômica e região geográfica (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste).

A variável posição socioeconômica foi construída a partir da renda familiar mensal per capitadisponível no banco de dados da PNAD.

Os pontos de corte para cada classe foram escolhidos de maneira a categorizar três grupos de renda que fossem distintos com proporções estabelecidas As classes socioeconômicas foram definidos da seguinte forma:

- Classe Alta : acima do percentil 90, ie, renda familiar mensal per capita maior que 1.635 reais.

- Classe Baixa: entre o percentil 90 e 50, ie, renda familiar mensal per capita entre 460 e 1.635 reais.

- Classe Média: abaixo do percentil 50, ie, aqueles com renda familiar mensal

per capita menor que 460 reais;

Para fins de controle foram escolhidas algumas variáveis (variáveis indepentes) tomando como modelo téorico o modelo de Andersen (1995), e

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considerando a disponibilidade da PNAD. Os fatores de capacitação foram área de lcoalização do domicílio, plano de saúde, consulta médica nos 12 últimos meses e entrada no sistema de saúde. Os fatores predisponentes foram sexo e faixa etária, e os fatores de necessidade em saúde foi número de morbidades autorreferidas e autopercepção de saúde.

As variáveis independetes foram mensuradas da seguinte forma: faixa etária (60-64; 65-69; 70-74 e ≥75 anos), sexo (Feminino e Masculino), área de localização do domicílio (urbano ou rural), autopercepção do estado de saúde (Bom ou muito bom, Regular, Ruim ou muito ruim), número de morbidades autorreferidas (nenhuma; somente uma; Entre 2 e 3 e Maior que 4), realizou consulta médica nos últimos doze meses (Sim; Não). A variável porta de entrada no sistema de saúde foi mensurada através da pergunta “Costuma procurar sempre o mesmo lugar, médico,

serviço de saúde quando precisa de atendimento” (Sim; Não).

Análise Estatística

Todas as análises estatísticas foram feitas considerando os pesos amostrais e as informações estruturais do plano amostral (conglomerados e estratificação). Nos ajustes foram usados pesos amostrais corrigidos definidos pela razão entre os pesos naturais do desenho e a sua média aritmética, para manter o uso do tamanho de amostra na realização das inferências realizadas.

Estimou-se a prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo segundo posição socioeconômica e região, calculando também os intervalos de confiança (IC) de 95%.

A presença de confundimento na associação entre utilização de medicamentos e classe social e região foi investigada, inicialmente por meio de técnicas de análise estratificada. Posteriormente foram construídos modelos múltiplos de regressão logística bivariada para avaliar a presença de confusão. Analisou-se ainda a presença de interação entre as variáveis grupo socioeconômico e região geográfica.

Utilizando as probabilidades preditas resultantes do modelo de regressão logística múltipla estimou-se as prevalências estimadas por região e classe socioeconômica. Além disso estimou-se as prevalências estimadas por região e classe socioeconômica por 4 diferentes grupos: os que autorreferiram diabetes, mas não autorreferiram hipertensão; os que autorreferiram hipertensão, mas não

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autorreferiram diabetes; os que autorreferiram diabetes e hipertensão e por fim, os que não autorreferiram nem diabetes e hipertensão.

A análise estatística foi realizada usando o Software SPSS for Windows, versão 17.

Resultados

A prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos no Brasil foi de 66,7% (IC95%: 66,1% - 67,3%). As regiões Norte e Nordeste, em geral, apresentaram prevalências menores comparadas com as demais regiões, sendo que as desigualdades entre as regiões foi mais acentuada nas classe baixa, como mostrado na tabela 1.

Tabela 1: Prevalências (%) da utilização de medicamentos de uso contínuo por grupo socioeconômico e região, e seus respectivos intervalos de 95% confiança (IC95%).

Classe Alta Classe Média Classe Baixa Total

% IC95% % IC95% % IC95% % IC95%

Região Norte 65,1 57,1 - 72,2 53,3 49,9 - 57,2 49,5 46,1 - 52,8 51,4 48,8 - 54,0 Nordeste 74,5 70,9 - 77,9 62,1 59,9 - 64,2 55,3 54,0 - 56,6 57,9 56,7 - 59,1 Sudeste 75,1 72,7 - 77,4 70,5 69,1 - 71,7 72,0 70,6 - 73,3 71,7 70,4 - 73,3 Sul 75,3 72,1 - 78,2 71,5 69,7 - 73,2 70,9 68,8 - 73,0 71,7 70,4 - 73,4 Centro-Oeste 70,1 65,4 - 74,4 67,6 65,2 - 70,0 66,1 63,9 - 68,3 67,2 65,6 - 68,8 Total 74,5 72,8 - 76,1 68,5 67,6 - 69,3 63,6 63,8 - 64,5 66,7 66,1 - 67,3

A tabela 2 apresenta a análise estratificada para variáveis de saúde e demográficas. Na maior parte das variáveis analisadas, a utilização de medicamentos de uso contínuo permaneceu menor nas regiões Norte e Nordeste para todos os grupos socioeconômicos. Além disso, em geral em todas as regiões, a classe baixa teve menor utilização de medicamentos.

Quanto à autopercepção do estado de saúde, para aqueles que referiram estado ruim ou muito ruim e residiam na região Norte a classe alta teve a menor prevalência (59,2%), o que foi diferente dos achados para as outras regiões. Na região Nordeste aqueles com autopercepção de saúde ruim ou muito ruim variou de 93,2%na classe baixa a 73,4% na classe alta. Para idosos com autopercepção do estado de saúde como bom, muito bom ou regular em todas as regiões a prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo foi maior para as

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classes mais altas, sendo a diferença entre as classes altas e baixas maiores nas dentro das regiões Norte e Nordeste.

Na análise por número de morbidade autorreferidas a diferença das prevalências de utilização de medicamentos de uso contínuo entre as classes diminuiu com o aumento do número de morbidades autorreferidas. Cabe-se destacar ainda que quanto àqueles que consultaram o médico nos últimos 12 meses as diferenças entre grupos socioeconômicaos e regiões não foram grandes.

Quanto as variáveis demográficas, na análise por faixa etária, sexo e área de localização do domicílio, as prevalências de utilização de medicamentos de uso contínuo também permaneceram maiores nas classes socioeconômicas mais altas em todas as regiões. E ainda, entre as regiões, aquelas mais desenvolvidas (Sul e Sudeste) apresentaram as maiores prevalências.

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Tabela 2: Análise estratificada da prevalência (%) medicamentos de uso contínuo por região e grupo socioeconômico segundo variáveis demográficas e de

saúde.

Região

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro Oeste

Classe socioeconômica Classes socioeconômica Classes socioeconômicas Classes socioeconômicas Classes socioeconômicas

Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa

Faixa Etária 60-64 anos 56,8 46,9 41,6 67,9 56,3 46,5 67,0 63,5 65,9 67,2 64,5 63,7 59,5 62,0 59,2 65-69 anos 55,8 49,7 50,4 71,1 58,4 54,0 72,2 67,9 68,9 73,7 69,3 70,9 66,1 62,6 65,2 70-74 anos 84,7 50,4 49,8 79,9 63,7 59,7 81,2 72,4 76,2 75,1 72,8 72,0 86,6 74,5 70,0 75 anos 76,2 67,6 60,0 81,4 71,5 62,5 83,4 80,4 77,9 88,5 82,7 78,5 82,7 76,4 72,4 Sexo Masculino 55,9 45,5 41,7 70,0 50,7 45,8 70,0 61,2 65,1 66,6 59,8 62,0 62,0 57,5 57,1 Feminino 73,8 60,3 56,7 77,8 70,4 63,0 79,1 77,5 76,9 82,4 80,1 78,6 78,2 76,7 74,1 Área do domicílio Urbano 67,1 57,1 52,0 74,3 64,7 59,3 75,4 71,0 72,7 75,6 73,6 71,8 70,2 69,4 68,3 Rural 47,5 39,0 42,1 77,8 52,8 47,9 64,0 62,6 66,3 69,0 62,9 68,4 69,1 58,7 55,0 Plano de saúde Sim 70,3 65,7 68,1 76,3 71,9 71,6 76,9 75,8 80,3 77,5 75,0 81,3 73,4 73,1 77,1 Não 50,2 49,0 48,4 64,4 57,8 54,4 64,9 66,6 70,3 68,6 69,3 69,4 58,9 64,5 64,3

Consulta médica nos

últimos 12 meses Sim 71,1 62,9 60,1 77,5 70,9 66,1 79,4 76,9 79,9 79,5 78,0 79,2 75,0 74,0 74,6 Não 35,5 24,2 17,9 44,6 27,4 23,3 41,1 36,1 34,5 50,4 39,6 37,8 39,1 37,6 34,9 Porta de entrada no sistema de saúde Sim 71,6 56,3 53,5 78,5 65,4 59,4 77,7 73,3 74,4 78,1 73,7 73,7 74,6 71,7 69,4 Não 44,6 46,1 39,6 69,7 54,5 45,5 64,3 59,7 62,2 65,7 61,5 58,5 58,0 58,1 57,3

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Tabela 2 (Cont.): Análise estratificada da prevalência (%) medicamentos de uso contínuo por região e grupo socioeconômico segundo variáveis

demográficas e de saúde.

Região

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro Oeste

Classe socioeconômica Classes socioeconômica Classes socioeconômicas Classes socioeconômicas Classes socioeconômicas

Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa

Autopercepção do estado de saúde Bom ou muito bom 59,2 38,6 30,8 63,5 46,4 36,3 67,6 56,9 53,9 69,9 57,8 53,1 58,7 54,4 48,2 Regular 76,2 59,6 55,9 89,7 71,6 61,1 91 84 80,8 85 82,8 77,5 89 74,9 74,1 Ruim ou muito ruim 57,4 76,2 67,2 92,1 82,1 73,4 93,6 92,4 89,9 96,3 91,5 88,8 96,2 91,2 78,8 Número de morbidades autorreferidas Nenhuma 16,7 8,4 9,5 29,1 15,1 12,7 36,1 21,7 19,2 37,9 25,5 24,6 29,1 19,1 14,3 Somente uma 73,6 51 46,8 80,1 63,1 57,8 79,7 71,8 70,9 77,4 69,9 67,2 72,2 70,4 62,7 2 – 3 82,8 75,6 70,4 90,7 82,3 76,9 93,6 89,9 90,1 91,8 85,9 85,3 91,1 81,5 84,7 ≥ 4 100 81,5 85 99 95,2 92,1 97,9 97,1 95,1 97,8 95,9 95,2 94,7 96,5 93,5

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Os resultados da regressão logística multivariada mostraram que mesmo após ajuste pelas variáveis de controle, a chance de utilizar medicamentos de uso contínuo permaneceu desigual para as regiões geográficas. Entre os grupos socioeconômicos, não houve diferença entre as classes média e baixa. Por outro lado, a chance de utilizar medicamentos de uso contínuo para a classe alta foi 1,7 vezes maior quando comparado com a classe baixa (Tabela 3). Incluiu-se no modelo de regressão logística o termo de interação entre região geográfica e grupo socioeconômico, porém este não foi estatisticamente significativo e, então não foi incluído no modelo final (Tabela 3).

Tabela 3: Razões de chance bruta e ajustada de utilização de medicamento de uso contínuo segundo as regiões geográficas e grupos socioeconômicos

Variáveis de exposição

Análise bruta Análise Ajustada*

OR IC (95%) OR aj* IC (95%) Região geográfica Norte 1 - 1 Nordeste 1,30 1,16 - 1,46 1,50 1,31 – 1,72 Sudeste 2,39 2,13 - 2,67 2,23 2,23 –2,91 Sul 2,39 2,11 - 2,70 2,52 2,16 – 2,94 Centro-Oeste 1,93 1,70 - 2,20 1,98 1,70 – 2,32 Classes socioeconômicas Classe Alta 1,67 1,52 - 1,83 1,60 1,41 - 1,82 Classe Média 1,24 1,18 - 1,31 1,09 1,02 – 1,17 Classe Baixa 1 1

*Análise ajustada por auto-percepção do estado de saúde, sexo, faixa etária, número de morbidades autorreferifas, localização do domicílio, possui plano de saúde, realizou consulta médica nos 12 últimos meses.

A partir dos resultados de regressão logística estimou-se a prevalência da utilização de medicamentos com base no modelo de regressão, como evidenciado na tabela 4. A prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo permaneceu maior para a classe alta e para as regiões mais desenvolvidas.

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Tabela 4: Prevalência esperada (%) de utilização de medicamentos de uso contínuo por região e classe socioeconômica. Região Geográfica Classe Socioeconômica Total Classe alta Classe Média Classe Baixa Norte 61,6 53,6 50,7 52,2 Nordeste 71,9 61,7 56,8 59,1 Sudeste 76,2 70,9 71,3 71,8 Sul 75,3 72,3 71,2 72,3 Centro- Oeste 70,3 67,3 66,2 67,2 Brasil 73,7 67,6 62,6 66,7

A tabela 5 apresenta as prevalências estimadas por região e classe socioeconômica em quatro diferentes grupos: i) autorreferiram diabetes, mas não autorreferiram hipertensão; ii) autorreferiram hipertensão, mas não autorreferiram diabetes; iii) autorreferiram diabetes e hipertensão; e iv) não autorreferiram nem diabetes e nem hipertensão.

Nota-se que mesmo nos grupos com morbidade autorreferida, ie, autorreferiram diabetes, hipertensão ou ambas, a prevalência de uso de medicamentos se manteve menor para as regiões Norte e Nordeste e para a classe socioeconômica baixa.

Em uma mesma região, as maiores diferenças entre as classes socioeconômicas, desfavorecendo as classes mais baixas, foram observadas nas regiões Norte e Nordeste, tanto nos que autorreferiram diabetes quanto hipertensão. Entre aqueles que autorreferiram diabetes e hipertensão, de igual forma as maiores diferenças de prevalência estimada entre as classes também foram nas regiões Norte e Nordeste, porém essa diferença entre as classes diminuiu. Por outro lado, entre os que não autorreferiram nem diabetes nem hipertensão, as regiões Nordeste e Sudeste apresentaram as maiores diferenças entre as classes.

Quando comparadas as regiões, as regiões Norte e Nordeste apresentaram as menores prevalências estimadas de utilização de medicamentos de uso contínuo. Nos que autorreferiram diabetes a prevalência estimada de utilização de medicamentos de uso contínuo variou de 69,3% no Norte a 82,2% no Sudeste. Para hipertensão, a diferença entre as regiões Norte e Sudeste foi ainda maior variando de 67,3% a 84,6%.

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Tabela 5: Prevalência estimada de utilização de medicamentos de uso contínuo por classe socioeconômica e região por morbidade autorreferida.

Morbidade(s) autorreferida Região Geográfica Classe Alta Classe Média Classe Baixa Total Norte 79,2 71,2 67,1 69,3 Nordeste 83,3 73,3 71,7 72,9 Sudeste 89,1 80,9 81,3 82,1 Sul 80,4 82,9 81,6 82,2 Centro- Oeste 82,3 78,1 79,9 79,6 Brasil 85,0 79,4 76,9 79,0 Norte 76,2 68,5 65,9 67,3 Nordeste 83,9 75,8 72,5 73,9 Sudeste 89,1 84,5 83,3 84,6 Sul 87,1 84,4 83,5 84,3 Centro- Oeste 87,4 80,7 79,7 80,9 Brasil 87,6 82,3 78,2 80,7 Norte 89,6 81,3 80,8 81,4 Nordeste 91,0 87,6 85,6 86,4 Sudeste 94,5 92,1 91,7 92,2 Sul 94,6 92,4 92,3 92,5 Centro- Oeste 92,4 89,8 89,5 89,9 Brasil 93,8 91,1 89,2 90,4 Norte 35,5 32,8 30,2 31,3 Nordeste 55,5 39,2 34,3 36,4 Sudeste 59,2 49,5 47,5 50,2 Sul 58,5 52,5 50,2 52,3 Centro- Oeste 50,5 46,0 43,6 45,4 Total 57,5 47,4 407,0 45,3 Diabetes e Hipertensão Hipertensão Diabetes Classe Socioeconômica

Nem diabetes e nem hipertensão

Discussão

Este artigo contribui para estimar as desigualdades regionais e socioeconômicas na utilização de medicamentos em idosos no Brasil. Mesmo quando controlado por outras variáveis, como sexo e idade, a prevalência de

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utilização de medicamentos continuou apresentando diferenças entre as regiões e classes.

Em outros países também têm sido encontradas desigualdades de utilização de medicamentos quanto à região(CHEN et al, 2001)e condições socioeconômicas (MAURER, 2008; HANLEY et al, 2011). No Brasil, um estudo na cidade de São Paulo(Barros et al 2011)não encontrou considerável diferença quanto a renda entre os idosos acerca de uso de medicamentos, diferente dos achados dessa pesquisa. Esse fato pode ser devido a cidade de São Paulo ser a mais desenvolvida do país e ter um serviço público de saúde que funcionam melhor que muitas outras regiões do país, conseguindo atender as necessidades básicas de saúde da população.

Sabe-se que a utilização de medicamentos é dependente também da necessidade individual de uso dos mesmos(CARVALHO et al, 2005). Dessa forma, parte das desigualdades regionais poderia ser explicada pelas diferenças de prevalência de doenças crônicas, uma vez que as regiões Norte e Nordeste apresentaram menores prevalências de doença crônica autorreferida (BARROS et

al, 2011). Entretanto, as diferenças entre as regiões, sobretudo para os indivíduos

pertencentes a classe sociocoeconômica baixa, se mantiveram mesmo quando a utilização de medicamentos foi avaliada para os que referiram diabetes, hipertensão ou diabetes e hipertensão. Ademais, outra pesquisa também apontou para diferenças de acesso a medicamentos de uso contínuo para idosos entre as regiões Sul e Nordeste(PANIZ et al, 2008).

A diferença de diagnóstico de morbidades crônicas parece também não explicar as diferenças de prevalência de utilização de medicamentos entre os grupos socioeconômicos. Pois, outras pesquisas apontam que aqueles que pertencem ao grupo de menor renda apresentam maiores prevalências de doenças crônicas (BARROS et al, 2011), têmpiores condições de saúde, pior função física e pior qualidade de vida relacionada à saúde em comparação aos de maior renda (NORONHA & ANDRADE, 2002). Os resultados encontrados nesta pesquisa, entretanto, evidenciam maiores prevalências de utilização de medicamentos de uso contínuo para a classe socieoconômica alta comparado com a classes socioeconômica baixa, similar ao encontrado sobre utilização de medicamentos em outros estudos (BERTOLDI et al, 2004; COSTA et al, 2011).

A região foi um fator determinante para utilização de medicamentos com maior força de associação que classe socioeconômica. É possível que as maiores

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distâncias geográficas das fontes de produção de medicamentos para essas regiões levem a dificuldades na distribuição. Uma outra hipótese é que questões culturais quanto a percepção de medicamentos associadas à falta de informação também podem estar influenciando para as diferenças regionais.

Além disso, os resultados mostraram que as desigualdades entre as classes socioeconômicas dentro de uma mesma região foram mais acentuadas nas regiões Norte e Nordeste. Esses achados indicam que possivelmente as políticas públicas de assistência farmacêutica implementadas pelo governo podem estar apresentando resultados diferentes de acordo com as regiões do país, sendo os piores resultados nas regiões Norte e Nordeste. Outras pesquisas mostraram também diferenças para essas regiões no funcionamento do programa de farmácia básica (COSENDEY, 2000) e programa farmácia popular (SANTOS-PINTO, 2011).

Problemas como polifarmácia, uso abusivo de medicamentos, automedicação devido à dificuldade de acesso aos serviços de saúde e subutilização de medicamentos podem estar sendo refletidos nas diferenças socioeconômicas e regionais encontradas. Por limitação dos dados, não é possível associar as diferenças encontradas a cada um desses problemas. Todavia, os resultados indicam para uma possível subutilização de medicamentos, uma vez que uma parcela de indivíduos que provavelmente necessitariam utilizar medicamentos regularmente, como aqueles que autorreferiram diabetes, hipertensão ou diabetes e hipertensão, não faziam uso regular de medicamentos. Esses dados são preocupantes, uma vez que o não uso correto dos medicamentos para tratamento de doenças crônicas pode levar a complicações das doenças, piora da qualidade de vida dos indivíduos e aumento dos gastos em saúde (ROCHON & GURWIRTZ, 1999).

A literatura define como iniquidade as desigualdades decorrentes de causas injustas, que podem ser evitáveis e são consideradas desnecessárias (WHITEHEAD, 1992). As evidências encontradas mostram que embora o sistema público de saúde brasileiro tenha buscado a equidade através de programas e políticas de assistência farmacêutica(BRASIL, 2011), a iniquidade na utilização de medicamentos de uso crônico parece permanecer como um desafio a ser enfrentado.

Este estudo apresentou algumas limitações como a ausência de métodos de validação da autorreferência de medicamentos de uso contínuo, como por exemplo,

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apresentação da prescrição médica ou caixa de medicamentos (BERTOLDI et al, 2008). Além disso, pode-se apontar também potenciais fragilidades da definição de classe socioeconômica. A renda tem sido apontada como um dos melhores indicadores únicos de padrões de vida em investigações epidemiológicas (GALOBARDES et al,2006). Entretanto, por não haver uma definição clara sobre o melhor ponto de corte para a divisão dos grupos socioeconômicos no Brasil, o ponto de corte adotado foi escolhido de maneira a categorizar os três grupos de renda que sejam distintos com proporções estabelecidas. Porém, este pode não estar

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