• Nenhum resultado encontrado

Utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos no Brasil segundo

33

Utilização de medicamentos de uso contínuo por idosos no Brasil segundo os dados da PNAD 2008

O Brasil tem experimentado um rápido crescimento da população idosa desde a década de 1960. A população acima de 65 anos que em 1991 representava 4,8% da população, em 2000 chegou a 5,9%, e no último Censo de 2010 correspondia a 7,4% da população (IBGE,2010a). O aumento da longevidade dos brasileiros é um dado positivo por ser um indicador das melhorias de condições sociais. Entretanto, o Brasil, como outros países em desenvolvimento, tem experimentado a dificuldade de conciliar a garantia de proteção social e o rápido crescimento da população idosa (CAMARANO & PASINATO, 2007; SIMÕES, 1997).

Na área de saúde, preocupa a grande demanda por recursos de saúde nesse grupo. Com o aumento da idade, as doenças crônico-degenerativas tornam-se mais prevalentes. Estima-se que 75,5% dos idosos brasileiros relatam ter pelo menos uma doença crônica, sendo que deste grupo, cerca de dois terços relatam ter duas ou mais doenças crônicas (VERA & PARAHYBA, 2007). Como consequência, os medicamentos, sobretudo os medicamentos de uso contínuo, como é o caso dos utilizados em doenças cardiovasculares, reumáticas e diabetes, se tornam um recurso terapêutico ainda mais importante. Nos EUA, estima-se que 1/3 de todos os medicamentos dispensados sejam destinados ao grupo de indivíduos com 60 anos de idade ou mais (WILLIANS, 2002).

A utilização de medicamentos envolve uma complexa rede de fatores, que relaciona questões epidemiológicas, econômicas, políticas e sociais do país (BENNET, 1997). A utilização de medicamentos não é dependente apenas da necessidade individual, podendo ocorrer juntamente ou de forma subsequente ao acesso (CARVALHO et al, 2003). Adicionalmente, pode estar associada com sexo, idade, renda, escolaridade, variáveis de saúde e comportamento (BARDEL et al, 2000; BERTOLDI et al, 2004).

No Brasil, a maior parte das investigações sobre utilização de medicamentos concentra-se nas regiões Sul e Sudeste (BERTOLDI et al, 2009; LOYOLA-FILHO et

al, 2006; COSTA et al, 2011; FLORES & MENGUE, 2005) , podendo não

representar, entretanto, a utilização de medicamentos para o Brasil todo. Somente um estudo de base populacional com representatividade nacional foi realizado em

34

2003 pela OMS (CARVALHO et al, 2005), não analisando, entretanto, especificamente os medicamentos de uso contínuo em idosos.

Estudos investigando utilização de medicamentos são úteis para suportar o planejamento das políticas de Assistência Farmacêutica, regulação sanitária e promoção do uso racional de medicamentos (ROZENFELD & VALENTE, 2004). O objetivo deste estudo é determinar a prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos no Brasil e investigar os possíveis fatores associados.

Métodos

Fonte de Dados

A fonte de dados utilizada foi a Pesquisa Nacional por Amostras em Domicílio (PNAD) realizada no ano de 2008, incluindo seu suplemento da saúde. A PNAD é um estudo seccional com abrangência nacional realizado anualmente com intuito de fornecer informações sobre as características gerais da população, como educação, trabalho, rendimento e outras. E ainda, com periodicidade variável, de acordo com as necessidades de informação para o País, inclui questões para investigar características sobre migração, fecundidade, saúde, entre outros temas.

Quanto ao plano amostral da PNAD, trata-se de uma amostragem complexa incorporando estratificação das unidades de amostragem, conglomeração (seleção da amostra em vários estágios, com unidades compostas de amostragem), probabilidades desiguais de seleção em um ou mais estágios, e ajuste dos pesos amostrais para calibração com totais populacionais conhecidos. (IBGE, 2009)

População de estudo

Dos 391.868 indivíduos investigados na PNAD de 2008, foram selecionados para compor a população do presente estudo aqueles com idade ≥60 anos, o que correspondendo a uma amostra de 41.269 indivíduos.

Variáveis analisadas

A variável de desfecho (variável dependente) foi utilização de medicamentos de uso contínuo, sendo mensurada pela pergunta “Utiliza medicamentos de uso

35

Para fins de controle foram escolhidas algumas variáveis (variáveis indepentes) tomando como modelo téorico o modelo de Andersen (1995), e considerando a disponibilidade da PNAD. Os fatores de capacitação foram região, área de localização do domicílio, plano de saúde, consulta médica nos 12 últimos meses, entrada no sistema de saúde, e grupo socioeconômico. Os fatores predisponentes foram sexo e faixa etária, e os fatores de necessidade em saúde foi número de morbidades autorreferidas e autopercepção de saúde.

As variáveis independentes foram mensuradas da seguinte forma: região de localização do domicílio (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste); faixa etária (60-64; 65-69; 70-74 e ≥75 anos), sexo (Feminino e Masculino), área de localização do domicílio (urbano ou rural), autopercepção do estado de saúde (Bom ou muito bom, Regular, Ruim ou muito ruim), número de morbidades autorreferidas (nenhuma; somente uma; Entre 2 e 3 e Maior que 4), realizou consulta médica nos últimos doze meses (Sim; Não). A variável porta de entrada no sistema de saúde foi mensurada através da pergunta “Costuma procurar sempre o mesmo lugar, médico,

serviço de saúde quando precisa de atendimento” (Sim; Não).

Quanto aos grupos socioeconômicos esses foram avaliados utilizando a renda familiar mensal per capita. Os pontos de corte para definir os grupos socioeconômicos foram escolhidos de maneira a categorizar três grupos de renda que sejam distintos com proporções estabelecidas. Os grupos foram definidos da seguinte forma:

- Grupo 1 : acima do percentil 90, ie, renda familiar mensal per capita maior que 1.635.

- Grupo 2: entre o percentil 90 e 50, ie, renda familiar mensal per capita entre 460 e 1.635.

- Grupo 3: abaixo do percentil 50, ie, aqueles com renda familiar mensal per

capita menor que 460;

Análise Estatística

Todas as análises foram feitas considerando os pesos amostrais e as informações estruturais do plano amostral (conglomerados e estratificação). Nos ajustes foram usados pesos amostrais corrigidos definidos pela razão entre os pesos

36

naturais do desenho e a sua média aritmética.Os pesos corrigidos apresentam as vantagens de manter o tamanho amostral e a precisão dos estimadores (LEE & FORTHOFER, 2006).

Estimou-se a prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo global e segundo as variáveis independentes calculando também os intervalos de confiança (IC) de 95%. Avaliou-se ainda a utilização de medicamentos de acordo com a autorreferência de diagnóstico das 12 morbidades avaliadas na PAND: Diabetes, Hipertensão arterial, artrite ou reumatismo, tendinite ou tenossinovite, bronquite ou asma, doença do coração, insuficiência renal crônica, depressão, tuberculose, cirrose e câncer.

Foi usado o teste de qui-quadrado para verificar a associação estatística entre a variável dependente e independente. Desenvolveu-se ainda um modelo múltiplo de regressão logística bivariada para ajuste das variáveis de controle. Foram introduzidas no modelo as variáveis que mostraram associação com a variável dependente no nível de significância de 5% (p<0,05) na análise bivariada.

Testou-se a interação entre as variáveis demográficas e socioeconômicas, sendo essas escolhidas por serem consideradas variáveis mais distais no modelo teórico.

Toda a análise estatística foi realizada usando o Software SPSS for Windows, versão 17.

Resultados

A prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos foi de 66,8% (IC95%: 66,2% - 67,4%). A tabela 1 apresenta o número de indivíduos na amostra por variáveis socioeconômicas, de saúde e demográficas e também aponta as prevalências de utilização de medicamentos de uso contínuo em cada subgrupo dessas variáveis. As menores prevalências de utilização de medicamentos de uso contínuo foram observadas para aqueles que não referiram morbidade dentre as 12 investigadas na PNAD (19,9%) e dentre aqueles que referiram não ter consultado o médico nos últimos 12 meses. Já os grupos que apresentaram as maiores prevalências de utilização de medicamentos de uso contínuo foram aqueles que autorreferiram mais de 4 morbidades (95,2%), os que referiram diagnóstico de duas

37

e três morbidades (85,7%), e aqueles com autopercepção de estado de saúde ruim ou muito ruim (84,2%).

Tabela 1: Tamanho Amostral e Prevalência (%) de idosos que utilizam medicamentos de uso contínuo por variáveis socioeconêmicas, geográficas e de saúde

Amosta Prevalência (%) de utilização de medicamentos de uso contínuo n (%) % IC 95% Faixa Etária 60-64 anos 12.763 (30,9) 59,9 58,8 - 60,8 65-69 anos 10.119 (24,5) 64,3 63,3 - 65,4 70-74 anos 7.541 (18,3) 70,2 69,1 - 71,2 75 anos 10.846 (26,3) 75 74,0 - 76,0 Sexo Masculino 18.075 (43,8) 57,9 57,1 - 58,7 Feminino 23.194 (56,2) 73,8 73,1 - 74,4 Região Norte 2.124 (5,1) 51,6 49,0 - 54,2 Nordeste 10.673 (25,9) 57,8 56,7 -59,0 Sudeste 19.462 (47,2) 71,8 70,9 - 72,6 Sul 6.537 (18,8) 71,6 70,3 - 72,9 Centro-Oeste 2.473 (6,0) 67,2 65,6 - 68,7 Área do domicílio Urbano 34.420 (83,4) 69,1 68,5 - 69,7 Rural 6.849 (16,6) 55,2 53,6 - 56,9 Classes socioeconômicas Alta 3.943 (9,6) 74,5 72,8 - 76,1 Média 16.425 (39,8) 68,5 67,6 - 69,3 Baixa 1.913 (46,4) 63,6 62,8 - 64,5 Plano de saúde Sim 12.539 (30,4) 76 75,1 - 76,9 Não 28.730 (69,6) 62,8 62,1 - 63,5

Consulta médica nos últimos 12 meses

Sim 33.563 (81,3) 74,9 74,3 - 75,4

38

Tabela 1 (Cont.): Tamanho Amostraa e Prevalência (%) de idosos que utilizam medicamentos de uso contínuo por variáveis socioeconêmicas, geográficas e de saúde

Amosta Prevalência (%) de utilização de medicamentos de uso contínuo n (%) % IC 95% Porta de entrada no sistema de saúde Sim 31.622 (76,6) 70,2 69,6 – 70,9 Não 9.647 (23,4) 55,6 54,4 – 56,8 Autopercepção do estado de saúde Bom ou muito bom 18.564 (45,0) 53,5 52,6 - 54,4 Regular 17.089 (41,4) 75,6 74,9 - 76,4 Ruim ou muito ruim 5.616 (13,6) 84,2 82,9 - 85,3 Número de morbidades autorreferidas Nenhuma 9.322 (22,6) 19,9 19,0 - 20,9 Somente uma 11.692 (28,3) 67,5 66,5 - 68,5 2 – 3 15.229 (36,9) 85,7 85,0 - 86,3 ≥ 4 5.026 (12,2) 95,2 94,5 - 95,8 *Tamanho da amostra(n) considerando o peso amostral

A tabela 2 evidencia a prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo naqueles que referiram cada uma das 12 morbidades avaliadas na PNAD. As maiores prevalência de utilização de medicamentos foram observadas naqueles que autorreferiram doença do coração (93,7%), diabetes (92,7%) e hipertensão (92,1%).

39

Tabela 2: Prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos de acordo com autorreferência das 12 morbidades investigadas pela PNAD.

População de estudo Prevalência de utilização de medicamentos Morbidade autorreferida n (%) % IC (95%) Doença da coluna ou costas 14.486 (35,1) 75,6 74,8 - 76,4 Artrite ou reumatismo 10.001 (24,2) 80 79,1 - 81,0 Câncer 1.038 (2,5) 81,3 78,5 - 83,9 Diabetes 6.628 (16,1) 92,7 91,9 - 93,4 Bronquite ou asma 2.431 (5,9) 81,6 79,8 - 83,2 Hipertensão 21.983 (53,3) 92,1 91,6 - 92,6 Doença do Coração 7.156 (17,3) 93,7 93,0 - 94,3 Insuficiência Renal Crônica 1.357 (3,3) 84,5 82,3 - 86,4 Depressão 3.802 (9,2) 90,6 89,5 - 91,6 Tuberculose 119 (0,3) 73,9 64,5 - 81,6 Tendinite ou tendossinovite 2.058 (5,0) 86,2 84,6 - 87,7 Cirrose 158 (0,4) 71,8 63,9 - 78,6

*Tamanho da amostra considerando o peso relativo

Os resultados da regressão logística bivariada são apresentados na tabela 3. As variáveis de saúde; número de morbidade autorreferida, referência de ter realizado consulta médica nos últimos 12 meses e autopercepção de saúde foram as que apresentaram maiores forças de associação com o desfecho na análise bivariada.

A tabela 3 apresenta ainda os resultados de regressão logística multivariada. Todas as variáveis de saúde (número de morbidade autorreferida, referência de ter realizado consulta médica nos últimos 12 meses, autopercepção de saúde e posse de plano de saúde) diminuíram seu efeito quando ajustadas pelas outras variáveis.

Nas variáveis de saúde a chance de utilizar medicamentos de uso contínuo foi maior para os que tinham pior autopercepção do estado de saúde e aumentava com o aumento do número de morbidade referida dentre as 12 investigadas na PNAD. As razões de chance também mostraram que aqueles que realizaram consulta médica nos 12 últimos meses, os que possuíam plano de saúde e possuem porta de entrada no sistema de saúde apresentam uma chance maior de utilizar medicamentos de uso contínuo.

40

Tabela 3: Análise de regressão logística bivariada e multivariada de utilização de medicamentos de uso contínuo por variáveis de saúde, demográfica e socioeconômica.

Análise Bruta Análise Ajustada

OR IC 95% OR IC 95% Faixa Etária 60-64 anos 1 - 1 65-69 anos 1,21 1,14 - 1,28 1,3 1,16 - 1,44 70-74 anos 1,58 1,48 - 1,68 1,54 1,37 - 1,72 ≥75 anos 2,01 1,88 - 2,14 1,74 1,55 - 1,94 Sexo Masculino 1 1 Feminino 2,04 1,96 - 2,13 2 1,59 - 2,52 Região Norte 1 - 1 - Nordeste 1,29 1,15 - 1,44 1,66 1,43 - 1,93 Sudeste 2,38 2,13 - 2,66 2,73 2,36 - 3,15 Sul 2,37 2,10 - 2,67 3 2,50 - 3,61 Centro-Oeste 1,92 1,70 - 2,18 2,28 1,88 - 2,75 Área do domicílio Urbano 1,81 1,69 - 1,95 1,15 1,02 - 1,30 Rural 1 - 1 - Classes socioeconômicas Alta Média 1,67 1,52 - 1,83 1,62 1,23 - 2,13 Baixa 1,24 1,18 - 1,31 1,38 1,18 - 1,61 Plano de saúde 1 - 1 - Sim 1,88 1,77 - 2,00 1,54 1,42 -1,68 Não 1 - 1 -

Consulta médica nos últimos 12

meses

Sim 6,4 6,02 - 6,81 3,09 2,87 – 3,32

Não 1 - 1 -

Porta de entrada no sistema de

saúde

Sim 1,88 1,78 - 1,99 1,36 1,33 - 1,45

41

Tabela 3 (Cont.): Análise de regressão logística bivariada e multivariada de utilização de medicamentos de uso contínuo por variáveis de saúde, demográfica e socioeconômica.

Análise Bruta Análise Ajustada

OR IC 95% OR IC 95% Autopercepção do estado de saúde Bom ou muito bom 1 - 1 - Regular 2,7 2,56 - 2,85 1,57 1,47 - 1,68 Ruim ou muito ruim 4,62 4,20 – 5,09 2,05 1,83 - 2,30 Número de morbidades autorreferidas Nenhuma 1 - 1 - Somente uma 8,35 7,77 - 9,00 7,5 6,92 - 8,14 2 – 3 24,04 22,18 - 26,06 17,38 15,91 – 18,99 ≥ 4 79,38 67,74 - 93,02 41,46 34,99 - 49,12

Para as variáveis socioeconômicas e demográficas todas apresentaram pelo menos uma interação estatisticamente significativa. Os termos de interação sexo*região, sexo*área de localização de domicílio, sexo*classe socioeconômica e faixa etária*classe socioeconômica foram estatisticamente significativas. As razões de chance considerando as interações são apresentadas na tabela 4.

Nos homens, na maior parte dos grupos formados nas categorias de região, faixa etária e área de localização de domicílio a chance de utilizar medicamentos de uso contínuo foi maior para a classe alta quando comparado com a classe baixa. A maior razão de chance de utilização de medicamentos de uso contínuo entre a classe alta e baixa foi observado nos homens ≥ 75 anos que moravam na área rural da região Sul (OR=8,3) e aqueles entre 70-74 anos que moravam na área rural do Sudeste (OR=9,4). Chama atenção também o grupo de homens entre 70-74 anos que moravam na área rural da região centro-oeste que apresentaram um efeito inverso, em que a classe alta teve uma chance 70% menor de utilizar medicamentos de contínuo comparado com a classe baixa. Com exceção das regiões Norte e Centro-Oeste, que apresentaram resultados próximos entre as áreas geográficas (urbano/rural), em todas as regiões as razões de chance de utilização de medicamentos de uso contínuo entre a classe alta comparados com a classe baixa em geral foi maior na área rural.

Para as mulheres, na maioria dos subgrupos de região e faixa etária a prevalência de utilização de medicamentos também foi maior para a classe alta comparado com a classe baixa. As razões de chance de utilização de

42

medicamentos de uso contínuo na classe alta comparado com a classe baixa também variou de acordo com região e faixa etária, sendo as maiores razões de chance encontradas para mulheres que viviam na área rural, tinham ≥75 anos e moravam na região Sudeste (OR=6,5) e região Sul (OR= 5,5). Em todas as regiões, na maioria dos subgrupos de idade a razão de chance de utilizar medicamentos de uso contínuo entre as classes alta e baixa foi maior na área rural.

Quando comparados homens e mulheres, em geral a razão de chance de utilizar medicamento de uso contínuo entre as classes altas e baixa foram mais acentuadas para os homens quando comparado com as mulheres tanto na área urbana quanto rural.

Já com relação à chance de utilizar medicamentos de uso contínuo entre os que pertenciam a classe média em comparação com a classe baixa também houve variação de acordo com sexo, região, faixa etária e área de localização do domicílio. Entretanto, as razões de chance entre as classes média e baixa foram menores quando comparadas com as diferenças entre as classes alta e baixa, variando de 0,7 a 1,8.

43

Tabela 4: Razão de chance (OR) para utilização de medicamentos de uso contínuo considerando as variáveis de interação sexo*região, sexo* área de

localização de domicílio, sexo*grupo socioeconômico e faixa etária*grupo socioeconômico

Região

Norte Nordeste Sudeste Sul Centro Oeste

Classe socioeconômica Classes socioeconômicas

Classes socioeconômicas

Classes

socioeconômicas Classes socioeconômicas

Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa Alta Média Baixa

Homens Area Urbana Faixa Etária 60 - 64 0,99 0,76 1 2,12 1,02 1 1,2 0,88 1 1,32 1,1 1 1,36 1,09 1 65 - 69 1,06 0,76 1 1,38 1 1 1,36 0,94 1 0,99 0,65 1 1,12 0,96 1 70 - 74 2,19 0,75 1 2,61 0,93 1 1,61 0,77 1 1,15 1,1 1 3,15 1,02 1 ≥ 75 2,56 1,2 1 2,21 1,33 1 1,43 1,08 1 1,45 1,16 1 1,17 0,86 1 Area Rural Faixa Etária 60 - 64 2,24 1,41 1 3,38 1,32 1 1,17 0,76 1 2,08 1,19 1 1,75 1,57 1 65 - 69 0,95 0,84 1 2,42 1,03 1 3,57 1,16 1 1,37 0,77 1 0,83 1,21 1 70 - 74 1,51 1,73 1 3,6 0,79 1 9,38 0,81 1 1,30 0,61 1 0,32 0,63 1 ≥ 75 2,56 1,75 1 2,1 1,25 1 1,13 0,96 1 8,27 0,66 1 2,26 1,04 1 Mulheres Area Urbana Faixa Etária 60 - 64 1,51 1,14 1 1,36 1,27 1 1,15 1,06 1 0,94 1,16 1 0,97 1,15 1 65 - 69 1,16 1,19 1 1,41 1,15 1 1,12 1,01 1 0,96 1 1 0,88 0,86 1 70 - 74 1,82 1,24 1 2,03 1,21 1 1,16 0,96 1 1,42 1,02 1 2,53 1,36 1 ≥ 75 2,05 1,6 1 2,35 1,42 1 1,45 1,22 1 1,46 1,51 1 1,46 1,35 1 Area Rural Faixa Etária 60 - 64 1,71 0,88 1 1,31 1,48 1 1,35 1,12 1 2,02 1,02 1 4,89 1,67 1 65 - 69 0,77 1,09 1 2,99 1,26 1 1,01 1,13 1 1,1 1,48 1 1,22 1,51 1 70 - 74 - 0,59 1 3,22 1,38 1 0,33 0,99 1 0,65 1,26 1 2,75 1,5 1 ≥ 75 3,46 1,12 1 4,17 1,38 1 3,72 1,33 1 6,16 1,25 1 5,45 1,27 1

44

Discussão

A prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo em idosos encontrada neste estudo (66,8%) foi menor que a encontrada nos idosos beneficiários do Medicare dos Estados Unidos (70%) (CHEN et al, 2011) e nos idosos que vivem na Inglaterra e país de Gales (75%)(MOXEY et al, 2003). Nas regiões Sul e Sudeste a prevalência de utilização de medicamentos de 71,6% e 71,8%, respectivamente, foram bastante próximas a desses países desenvolvidos. Outros estudos brasileiros, apesar das diferenças metodológicas, também encontraram uma prevalência de uso de medicamentos em idosos próxima a encontrada nesse estudo, variando de 69,7 a 73% (CARVALHO et al, 2005; LOYOLA-FILHO et al, 2006; FILHO et al, 2004).

Embora o Brasil apresente uma prevalência de utilização de medicamentos de uso crônico comparável com a de países desenvolvidos, as ações no campo farmacêutico no país parecem não acompanhar essas altas porcentagens. Exemplo disso é a falta de sistemas de informação sobre uso de medicamentos que permitam investigações como segurança, como ocorre em outros países (STROM, 2012). Um outro exemplo é a participação do profissional farmacêutico, cuja ação é especialmente importante em pacientes idosos com doenças crônicas (ROSENFELD, 2008). Nos Estados Unidos, por exemplo, os farmacêuticos participam da equipe de saúde de forma ativa, fazendo avaliação do estado de saúde do paciente, monitorando e avaliando as repostas do medicamentos, e fornecendo informação aos pacientes sobre seus tratamentos (ASPH, 2006). Na Inglaterra, existe a prescrição suplementar que é uma parceria entre médico e farmacêutico para escolha do melhor tratemento (ROZENFELD, 2008). No Brasil, entretanto, o farmacêutico muitas vezes não aparece como uma figura importante na equipe de saúde (TROCON, 2009). Um estudo sobre adesão a medicamentos mostrou que nenhum dos 110 pacientes mencionou o farmacêutico como o profissional que o aconselhou sobre o tratamento (DEWFUL, 2007).

A prevalência de utilização de medicamentos de uso contínuo de acordo com os indivíduos que autorreferiram cada uma das morbidades referidas na PNAD devem ser interpretadas com cautela uma vez que não necessariamente o medicamento é usado para a doença que se referiu. Esses dados permitem ter uma estimativa do mínimo de indivíduos que podem não estar utilizando medicamentos

45

regularmente para cada uma das morbidades. As análises nessa pesquisa não permitem, entretanto, avaliar as práticas terapêuticas. Para os idosos que autorreferiram diagnóstico de diabetes e hipertensão pelo menos 7,3% e 7,8% respectivamente, não utilizam medicamento continuamente. Para diabetes, o consenso brasileiro (Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes, 2009) recomenda que o tratamento medicamentoso em idosos, principalmente nos casos de glicemia leves e moderado leve, só comece após tentar mudanças no estilo de vida. Para hipertensão arterial, a recomendação(VI DIRETRIZES BRASILEIRAS DE HIPERTENSÃO) também é optar por tratamento medicamentoso somente nos casos em que há riscos adicional médio ou alto. Neste sentido, é possível que parte dos indivíduos com recomendação medicamentosa não estejam tomando os medicamentos regularmente, porém é possível também que uma parcela que não necessitava de tratamento medicamentoso esteja fazendo.

A utilização de medicamentos de uso contínuo foi mais elevada naqueles com pior estado de saúde (maior número de morbidades autorreferidas e pior autopercepção do estado de saúde), achados semelhantes aos encontrados em outros estudos ( LOYOLA-FILHO et al, 2006; CHIRCHILLES et al, 1992). Ter realizado consulta médica nos 12 últimos meses também foi associado a utilização de medicamentos de uso contínuo, o que também pareceu estar de acordo com investigações anteriores que indicam que a maior parte dos medicamentos consumidos recebeu prescrição médica (RIBEIRO et al, 2008; CARVALHO et al, 2005).

Possuir plano de saúde também foi associado positivamente com a utilização de medicamentos de uso contínuo, provavelmente devido ao fato de pessoas que possuem plano de saúde usarem mais os serviços de saúde (TRAVASSOS et al,

2000), e consequentemente terem mais acesso a prescrição de medicamentos. De igual forma, aqueles que tinham um serviço de saúde de uso regular também apresentaram uma maior chance de utilizar medicamentos, indicando que sistemas com porta de entrada mais bem definidas também estão associados com uma maior utilização de medicamentos.

As análises indicam que as desigualdades socioeconômicas para utilização de medicamentos podem ser diferente dependendo de outras características demográficas. Esse fato pode ser um indicativo de que a utilização de

46

medicamentos não depende apenas do preço ou disponibilidade do serviço público, com já identifcado em outros estudos(LUZ et al, 2011; SCHAFHEEUTLE et al, 2002; SANTOS et al, 2004). Por exemplo, indivíduos vivendo em uma mesma área geográfica e região tiveram chances de utilização de medicamentos diferentes.

O presente estudo apresenta algumas limitações como a ausência de métodos de validação da autorreferência de medicamentos de uso contínuo, como por exemplo, apresentação da prescrição médica ou caixa de medicamentos (BERTOLDI et al, 2008).

Os achados dessa investigação demonstram que a prevalência de utilização de medicamentos de uso continuo em idosos no Brasil, é próxima a encontrado em países desenvolvidos (CHEN et al, 2001; MOXEY et al, 2003), sobretudonas regiões Sul e Sudeste. Esses dados trazem a preocupação de que embora uma grande parcela dos idosos utilizem medicamentos continuamente, o país não possui uma estrutura consolidada de farmacovigilância e orientação farmacêutica. Além disso, os resultados sugerem desigualdade na utilização de medicamentos de uso crônico de acordo com condições socioeconômicas e demográficas. Espera-se que os resultados nessa pesquisa contribuam para identificar grupos prioritários de idosos que parecem utilizar menos medicamentos que o necessário provavelmente devido

Documentos relacionados