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PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA (PTR) E AMÉRICA LATINA

3.5. Destaque às primeiras experiências na América Latina

Na América Latina, na perspectiva de Stein (2008), os programas de transferência de renda começaram a ser desenvolvidos no final dos anos 1980 e início da década de 1990, ganhando visibilidade a partir da experiência desenvolvida no México, que, seguido da brasileira, passaram a se constituir em referência para os demais países da América Latina. Os referidos programas, e os criados posteriormente seguindo os mesmos pilares, se expandiram em inícios do novo milênio, tendo por base os objetivos traçados pela declaração da Conferência de Copenhagen e os Objetivos do Milênio, quando foi estabelecida a meta, para o ano 2015, de reduzir em 50% a pobreza registrada no ano de 1999, em 189 países.

Depois de uma experiência piloto em Honduras, com o Programa de Asignación Familiar (PRAF) em 1990, criado com o objetivo de aumentar a demanda de serviços de saúde (transferência de três dólares para crianças com menos de três anos) e educação (bônus escolar durante o ano letivo), em 1995, aparecem as primeiras experiências em municípios brasileiros como Campinas (SP), Paranoá (DF) e Ribeirão Preto (SP). Anos depois, novas iniciativas se somam a estes esforços no Brasil, como Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), Programa de Garantia de Renda Familiar Mínima (1997), Projeto Agente Jovem (2000), Bolsa Alimentação e Auxílio-Gás (2001) e Cartão Alimentação do Fome Zero (2003), projetos que procuram reduzir a

pobreza, incrementar a assistência às escolas e decrescer a incidência do trabalho infantil.

O México, que é outro referente na região, foi um dos primeiros países a introduzir um programa de transferência condicionada, com o Programa de Educación, Salud y Alimentación – Progresa, que teve início em 1997, e depois mudou de nomenclatura, sendo conhecido como Oportunidades, porém, já com alterações pelo governo vigente (desde 2014, Prospera). Este programa entrega a cada família subsídios de saúde e educação com a condição de que essas famílias levem seus filhos menores de seis anos aos serviços de saúde, e que aqueles entre seis até 17 anos, cumpram com os deveres da escola. O programa Oportunidades substituiu os programas gerais de alimentos e é totalmente financiado pelo governo nacional.

O programa Prospera tem como diferencial em relação aos demais programas mencionados, estar dividido em oito modalidades, que estão em destaque no site do Programa, que são:

i. Recursos econômicos destinados à mulher

ii. Bolsas para crianças e jovens desde terceiro de primaria até o último grau. iii. Fundo para jovens finalizem estudos superiores

iv. Apoio com material escolar v. Serviços de saúde

vi. Complementos alimentares para crianças entre seis e 23 meses e menores com índices de desnutrição entre 2 e 5 anos.

vii. Renda para idosos

viii. Apoio para o consumo de energia nas casas.

Retornando aos primeiros anos da experiência mexicana

(Progresa/Oportunidades), esse Programa foi replicado nos demais países da região utilizando como parte de sua metodologia a combinação de focalização familiar e de área geográfica. Já em setembro de 2014, o atual presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, anunciou que se vivenciava o início de uma nova etapa com o programa Prospera, que dava mais espaço a novos lineamentos que já estavam sendo

considerados na agenda de Oportunidades, como programas que promoveriam a educação direcionada para adolescentes e o acesso a microcréditos. Um programa que segundo Secretaria de Desarrollo Social (SEDESOL), hoje beneficia a 6.1 milhões de famílias mexicanas.

Desde então, outras iniciativas passaram a ser desenvolvidas na Colômbia, Equador e Honduras, como destaca Stein (2014), até o ano 2000, onde as novas experiências começaram a ter maior visibilidade, considerando os objetivos vinculados às Metas do Milênio do ano 2000. (Tabela 5).

Tabela 5 – Programas de Transferência de Renda na região

Pais Programa (início) Programas finalizados

Argentina Asignación Universal por Hijo para

Protección Social (2009)

Familias por la Inclusión Social (2005-2009); Jefes y Jefas de Hogar Desocupados (2002-

2005)

Belice

Creando oportunidades para nuestra transformación social (Building

Opportunities for Our Social Transformation, BOOST) (2011)

Bolívia

Bono Juancito Pinto (2006); Bono Madre Niño-Niña «Juana Azurduy de Padilla»

(2009)

Brasil Bolsa Família (2003)

Bolsa Escola (2001-2003) / Bolsa Alimentação (2001-2003)

Chile Chile Solidario (2002)

Colômbia

Familias en Acción (2001); Red Juntos (Red para la superación de la pobreza extrema)(2007); Subsidios Condicionados

a la Asistencia Escolar (2005)

Costa Rica Avancemos (2006) Costa Rica Avancemos (2006) Superémonos (2000-2006)

Equador Bono de Desarrollo Humano (2003) Bono Solidario (1998-2002)

El Salvador Comunidades Solidarias Rurales (ex Red

Solidaria) (2005)

Guatemala Mi Familia Progresa (2008)

Honduras

Programa de Asignación Familiar (PRAF) (1990); Bono 10.000 Educación, Salud y

Nutrición (2010)

PRAF/BID II (1998-2005); PRAF/BID III (2007- 2009)

jamaica Programa de avance mediante la salud y la

Educación (PATH) (2002)

México Oportunidades (ex Progresa) (1997)

Nicaragua

Red de Protección Social (RPS) (2000- 2006); Sistema de Atención a Crisis (SAC)

(2005-2006)

Panamá Red de Oportunidades (2006)

Paraguai Tekoporã (2005); Abrazo (2005)

Peru Juntos (2005)

Rep. Dominicana Solidaridad (2005)

Trinidade e Tobago Programa de transferencias monetarias

condicionadas focalizadas (TCCTP) (2006)

Uruguai Asignaciones Familiares (2008)

No Chile ganhou visibilidade o programa Chile Solidario, criado em 2002, que buscava abordar a pobreza a partir da combinação de dois elementos, a família, como núcleo da sociedade, e a integração de redes de serviço para a atenção familiar, tomando como base sete categorias: identificação, saúde, educação, dinâmica familiar, habitação, trabalho e renda. Após a seleção, as famílias ingressam no Chile Solidario por meio do Programa Puente, no qual permanecem nos dois primeiros anos, recebendo um benefício de US$ 330 mensais por família. Aquelas famílias que cumprem totalmente com o Programa Puente recebem um bônus de renda, com duração de até três anos, no valor equivalente a um subsídio mínimo familiar.

Na perspectiva de Stein (2014), desde então, 35 programas foram implementados e estão em funcionamento em 20 países da região. Isto representaria, tomando como base dados de Cechini (2013), aproximadamente 127 milhoes de latinoamericanos e caribenhos beneficiados, sendo o Bolsa Família (13,8 milhoes de famílias) e Prospera (6,5 milhoes de famílias) os mais amplos, considerando o número de beneficiados, como apresenta o Gráfico 2.

Gráfico 2 – Famílias beneficiadas de alguns programas

Para os promotores destes programas, estas iniciativas oferecem um alívio imediato às limitações básicas e à abertura para o mercado de consumo, a fim de satisfazer necessidades básicas, podendo considerar-se como um primeiro passo na procura de um contato de famílias pobres e indigentes com sistemas de proteção amplos e integrais. Complementando esta visão, na perspectiva do Banco Mundial (2009), as transferências condicionadas melhoram a eficiência e a efetividade das redes de proteção de diversas maneiras, já que é o único instrumento que alcança vários objetivos relacionados com saúde, nutrição e educação, tudo isso distribuindo devidamente os recursos graça a lineamentos focalizados que permite uma melhor identificação dos beneficiados. Tomando como base essa afirmação, passamos às particularidades das experiências brasileira e peruana.

O detalhe é que mesmo com objetivos a curto prazo (alívio da situação de pobreza) ou a longo (fortalecimento de capacidades para evitar a reprodução intergeracional da pobreza) e com o crescimento do gasto público social na área da assistência, como destaca Stein (2014), o valor médio do investimento ainda é limitado (inferior a 0,5% do PIB), isso também levando em consideração que nem todos os programas acompanham o desempenho da economia local. Por exemplo, só os programas do Chile, Colômbia, México e Uruguai têm ajustes automáticos segundo as taxas de inflação. Na maioria de casos os ajustes acontecem por decretos executivos ou presidenciais e sem periodicidade.

No caso dos programas brasileiro e peruano, podem-se identificar semelhanças no que se refere às bases nas quais se justifica a sua criação e objetivos. Os dois programas, Bolsa Família e Juntos, expõem seus propósitos no sentido de erradicar a extrema pobreza, com vistas a garantir direitos de cidadania entre os grupos mais excluídos socialmente, mediante a transferência de recurso mínimo. Seus objetivos consistem em promover a utilização de serviços saúde e educação, que ainda poderiam ser colocados na categoria de limitados, considerando o abismo social que esses grupos atravessam, tendo em vista a marcante desigualdade de renda, oportunidades e qualidade de serviços, em comparação com grupos com maiores recursos.

Fala-se que a transferência de renda, em países como o Brasil e o Peru, oferece ajuda de maneira imediata apresentando-se como um aliado na distribuição de recursos públicos, na tentativa de amenizar as dificuldades vivenciadas por milhões de familias em situação de miséria e extrema pobreza. Mas, até que ponto isso se configura como tal? Como as desigualdades sociais podem ser diminuídas, com a lógica utilizada pelos Programas e com transferências de um valor tão reduzido? Certamente, tais aspectos impossibilitam a erradicação da pobreza e, dificilmente, promovem a autonomia dos beneficiados. Isso porque as situações sociais devem ser dimensionadas, mas não somente como consequências decorrentes de limitações monetárias e/ou mudanças de dados estatísticos, considerando a origem e a responsabilidade que recai sobre os modelos econômicos implementados em estados capitalistas.

No caso brasileiro, em 2002, o país já desenvolvia uma diversidade de programas sociais que beneficiavam cerca de cinco milhões de famílias, como o Bolsa Escola, vinculado ao Ministério da Educação, Auxílio Gás, vinculado ao Ministério de Minas e Energia e o Cartão Alimentação, vinculado ao Ministério da Saúde, cada um geridos por administrações burocráticas diferentes. A criação do Programa Bolsa Família consistiu na unificação e ampliação desses programas sociais num único programa social, com cadastro e administração centralizados no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Já no cenário peruano, o programa Juntos constituiu-se como a primeira experiencia de PTR no país. Foi criado pela Presidência de Conselho de Ministros em abril de 2005, como um incentivo mensal fixo de S/.100 nuevos soles ($33 dólares americanos aproximadamente), de uso livre, às famílias mais pobres do país. O Programa buscaria cumprir os compromissos de participação e complementaridade nas áreas de nutrição, saúde, educação e cadastro. A ideia sería restituir os direitos básicos dos peruanos mais pobres, assim como lutar contra a desnutrição crônica infantil e a pobreza extrema.

Figura 1: Fronteira Brasil-Peru